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iis see saris Ting cap [Bio Ek HP (Mayda Sapa Ps Canine 87) orm Ra/ ah vids e copidnyne Sapo esa ns engine): ‘Resa Saae Ls Topo ng Lai de Dias hap (Oa inceeieng Side Caleta (leo) IWsoscn da Hacla Nacoal de Se Piles Seg Are L732) Lima, Nisa Trindade (org) Snide ¢ Democracit: histdria e penspectivas do SUS, / Organinido por Niet Tena Lina, Sls Geren Pho Coelho Ele. Rio de fancivo: Editors Feta, 25, 504 p. tab, geal mapas Demoeraia 2Stise $US (88) —hsn 4 Refer satis 1. Gerehena, Sang) Idle, Havio Coco (on). II Tndo, DD -20ed 3621 2006 EDITORA FIOCRUZ ae Bras 4036 ~Térseo~ sil 112 ~ Alanguinkior 21040-361~ Rie de acico- Rj ‘els (21) 3882-9039 e 3882-9041 ‘Telex (21) 38829006 -maik editors @fnenuzbe hpi /srreoceuatn/ editors SAUDE E DEMOCRACIA HISTORIA E PERSPECTIVAS DO SUS SIA TRINDADE LNA SILVIA. GERSCHMAN LAO COELHO EDLER JUUO MANUEL SUEZ sero A iO@® _centralizagio no governo federal, imporcincia do setor pri |.] A SxiDe wa Constructo vo Estapo NACIONAL No Brastt: Rerorma Saniténia em Penspectiva HistoRica Na inde Lira Csi M. 0. Foseca Gibeto Hocran eee ere ene reins Fen coeties enemas eee Sistema Unico de Saiide (SUS) no Brasil consiste no legado com o qual a im- plantagio do projeto de Reforma Sanka eve de lidar. agdes vercalicadas, Sistine medico-hospiaite sciolzagig refesindo-e este imo termo & sep ragio histérica entre snide plea e assstncia médica previdenciin. Tal herrea slo pode ser crediada ao reyime miltar, a despino do expresso crescimento da medicina prvads, promovido pels polticas de Estado naquele periodo ‘As cxgens das demas catactrisens apontadas encontam-se em momentos anteriores, com a expansio da autoridace estatal por meio de politicas de sade durante a Primeiza Repiblica (1889-1930) e a instracionalizagio de um modelo \, vertcalizado, centralizado e setoralizado durante o primeira governo de Getulio ‘Vargas (1930-1945). O processo histSrico de consteugio desse modelo ¢ os primeitos projetos de reforma durante o eurto perfodo democriico que antecedeu o regime militar de 1964 ainda estio a merecer esforgos mais abrangentes de andlise. Neste ‘capital, procurs-se contribuir para este objetivo, destacando-se a importincia de uma reflex sobre a histria das polticas de saide, em sua relagio com 0 processo de construgio do Estado Nacional, (© tema da heranga reeebida pelo movimento sanitarista remete A discussio representagdes predominantes sobre o passacio acional. De fato, a forma como se concebe a historia da saiide no € muito distinta de outros cemas presentes na imaginagio socal ¢ politica brasileira. De modo simplifica- do, pode-se dizer que tém sido duas as tendncias predominantes, Na primeira, préptia aos atores que protagonizam processos de mudanga,o présente € vivi ” Sane Src do como uma espécie de marco zero no qual se clude qualquer possibilidade “de continuidade histérica com os momentos pretéritos. Adotada por atores sociais com posigdes das mais diferenciadas no especuio politico-ideolégieo, segundo essa perspectiva o olhar para o pasado assume quase sempre 0 sentido de rompimento com uma tidigio que se procura superar, tomando- se 0 presente como ponto de ruptura e, portanto, algo que preseinde da explicasto histériea Gantos, 2005). Foi o que ocorres, por exemplo, com 0 movimento revolucionsrio de 1930 em relagio & Primeica Repibliea ~ ou, como ficou mais conhecida, a Repiblica Velho, expressfo cunhada pelos participantes daquele movimento & aque se tornou de uso corrente. Bo que acontece muitas vezes hoje nas andlises sobre o Brasil que surge com a redemocraizagio pés-regime militar, em 1985, ¢, principalmente, depois da constiuiglo de 1988. E também no que se refese a0 discutso que, no inicio da anual déeada, sob a influéncia dos ventos neolibe- ‘ais, preconizou o fim da Era Varga, vatcinando um novo papel ¢ formato para o Estado brasileiro. Do mesmo modo, a edosio de vigoroso movimento sanitarsea na segunda metade da década de 1970, em pleno contesto autortiro, € 4 posterior institu- cionalizacio Ge milias de suas teses na Constcigio de 1988, endem a ofuscar rmovimentos € propostas ocotidos em periodos anteriores. importante acents- ar a artculacio de movimentos sanitaristas em outros contextos histéricos, como, ‘0 da Primeira Repiiblica, no qual a sade, pela via da politica, foi ileada & posigio de grande problema , 20 mesmo tempo, de solugZo nacional. Cabe ainda assina- lar a importincia atribuida a questdes relaivas & saiide nas propostas de civilza- lo, tema recortente em fins do sécalo XIX e primeiras décadas do século XX, € de desenvolvimento, autntica palave-chave que pauta 0 debate racional ¢inex- nacional a past da Segunda Guerra Mundial, com 2¢ sucessivs (equalificagdes deze temo: desenvolvimento econdmico, socal ¢ humana |A segunda tendéncia predominante na imaginasio social ¢ politica bra sileira caminha em diego oposta, qual seja 2 énfase na continuidade, quase sempre de tudo aquilo que 6 negativo: a reiterada tese de que no Brasil mada mudou ao longo de mais de cinco séculos, persistindo uma realidade de desigualdades e exclusio social. Nao se trata de contrapor imagens positivas ce negativas sobre o pais ¢ seu pracesto histérico, mas de assinalar as transfor- magdes de grande magnitude ocorridas a0 longo das das, entre elas 0 clevado grau de urbanizacio, 1 formagio de expressivo lei jimas quatro déca- aiden Cora Ga Han | torado, a crescente complexidade do Fstado e da sociedade, inclusive com a articulasio de novos interesses. Em perfodo recente, destaca-se ainda a efeti- vagio de dircitos politicos, no obstante os sérios obsticulos & conquista da cidadania cocial ¢ civil [Em ambas as vertentes assinaladas, sio criadas dificuldades para a com- preensio do presente pelo recurso & perspectiva histérica e, a0 mesmo tempo, para se identificar os fueuros possiveis, com base em visio ni inear dos pro- cessos de mudanga ¢ no reconhecimento da complexa dialética entre constran- igimentos e agio humana. Analisar por novos fngulos a historia social, econdmi- cae politica consiste em condigZo indispensivel para que se aval alternativas possiveis em diregdo a uma sociedade mais justa, democritiea e em que efetiva- mente se promova maior eqiidade papel das politicas de saiide na rmagio das nogdes dé cidadania, na construgio dos Estados Nacionais ¢ das burocracias piiblicas © nas mudancas nas relagdes entre Estado € sociedade tem sido crescentemente reconhecido. No Brasil, pesquisas realizadas desde a década de 1980 apontam para o fato de 2s politicas, instituigbes e idéias mobilizadas em torno desse tema serem consti- tutivas da formagIo do Estado Nacional, dos processos de extensio da cida- apoiados em luma critica acentuada ao liberalismo, © qual sssociavam a pratica politica vigente na Primeira Republica, defendiam um modelo de Estado nitida- ‘mente centralizador ¢ intervencioniss. Jé os setores oigitquicos dssideateny lutavam pelo federalismo como modelo de Estado ideal, interessados em Manter a autonomia estadval ¢ restringir a interferéncia da Unio. s 10 | Sune Brom © universo temicico do debate politico € idcoligico esteve drecionado pam o papel do Estado diante dos problemas rocais, enfatizando a constes- Gio da Nagio como principio aorteador das politicas adotadas. As eritcas 20 liberalismo eram sistematicamente reteradas, com base nas interpreta- g8es elaboradas por intelectusis que ganhavam repercussfo naquele momen- ta? A nogio de interesse nacional ~ normalmente identficado pelos autores como o bem comum de toda a populagio ~ aparecia em oposigfo as especi- fickdades regionais, que estariam vinculadas 40 poder local ¢ @ intercsses privados. Criicavase o papel tradicional das oligarquins brasilcias € 0 obs- ticulo que representavam 20 desenvolvimento econdmico, politico ¢ social, que tera sido acentuado pelo ‘excesso? de federalism durante a Primeira Repiibica ‘A avalagio sobce a poltica panidiria ambsim era influenciada por essa linha de interpretagio, que enfatizava o predominio do interese local sobre o8 interesses ¢ a8 necessidades da Nagio e percebia os senadores ¢ deputados como representantes das facses locais que os clegiam, As idéis defendidas por Oliveia Vianna, por exemplo, na defesa de uin goveeno centralzador © autortirio,bastante proximas is propostas nacionalistsjéanteriorment difn- dias por Alberto Torres, pontavam a organizagio do Estado Nacional como © tinico caminho paca que o pats safsse da erise em que se encontravaediigisse (0s seus destinos (Camargo, 1989). A politica socal que comegou a ser exbogada por Vargas a parti de 1930, © que se intensificow principalmente no pés-37, represcntava sob virios aspectos o eco dests interpretages. Como argumen tava Oliveira Vianna: “O nosso grande problema ¢justamente liberta © gover- no ou a administasio nadenal da influéncia desses partidos lat, que aunca se puderam tomar naan, apesar dos grandes esforgos dos grandes estacis- tas do Impétio” (Vianna, 1987: 131, grifos do autor) Fm suma, as questdes que obtverisrelevincia no debate intelectual do periodo estiveram direcionadas para o tema da relagio entre o governo cen tral ¢ 08 Estados, através do contraponto entre Naso € Federagio, entre centralizacao descentrlizagio, af incluindo as definigdes sobre o papel que dleveriam desempenhar @ municipios e suas relagSes com o governo centel Com este quadro interpretativo © diante das condigaes de instabilidade politica que marcaram os primeiros anos da década de 1930, as mudangas Bae of autores gue eatram desas guesses, encatram-se Oveia Vianna, Azevedo Amara, ‘Alero Torres, Franco Campus, Nestor Duatee Alsi de Andre sem Ce Ea Hcl el significativas na esfera institucional da saiide s6 comegaram a ser efetivadas a partis de 1934, ano em que Gustavo Capanema assumiu 0 Mesp, dedican- do-se, desde logo, & realizacio de ampla reforma nas instituigses que com- punham essa agéncia estat Até aquele momento, as divergéncias observadas em relagio ao futuro politico do pais haviam repercutido sobre 0 recém-criado ministério, buscan- do-se definir um formato institucional compativel com © projeto politico vito- soso nas disputas desencadeadas no pés-30. Os primeiros anos do Mesp fo- sam marcados pela indefinigio e pela inconstincia de propostas € projetos, 0 que se refletiu na alternincia da pasta ministerial. Em seus quatro primeiros anos, ela foi conduzida por txés ministros — Francisco Campos, Belisirio Penna «Washington Pires ~, até que, apés a promulgasio da nova eatta constitucional, Gustavo Capanemm-foi indieado para 0 cargo, nele permanecendo até o final do governo Vargas Em sua dimensio institucional, as ages piblias de saide acompanhacam 2s dstngSes estabelecidas entre Ministério do Trabalho Indstra ¢ Comércio (ATIC) o Mesp. Muito além de uma simples divisio eespecifeario de fun is con msds drcalf cree de cae Gegh en un consaate Satecairaa ragio e consolidagio de politcss soins, a separagio correspondea a um for- mato diferenciado de reconhecimento de dretos soci. De um lado, estabelecen-se o areabouso jusidico ¢ material da assistén- cia médica individual previdenciiia, desenvolvida no MTIC, que com 0 Passer dos anos se soraasla uma da princpais eefecsacies para « peesta- so de servigos pablicos de saide, Era destinada aos inseridos no merea- o formal de trabalho « amparada por pancipios corporadvos que dell nia aqueles reconhecidos como cidadios, caracterizando © que foi de- finido por Wanderley Guilherme dos Santos como ‘cidadania regulada’ Gantos, 1998). Do outzo lado, no Mesp, atrelada A educasio, ficow a saide piblica. Ou melhor, tudo o que dissesse respeito & saiide da popu- lagio e que nfo se encontrava na dea de abrangéncia da medicina previ- denciéria. Ao Mesp cabia a prestagio de servigas para aqueles identifica- “dos como pré-cidadios: os pobres, os desempregados, 0s que exerciam TT Rimbnintito a9 wisinéco obedecew 1 suite segiéncncronokgics: Femciaeo Campos (18 ‘noe 1930 ce 1981, Blais Penna Ger 1931 ade 193), Fnac Campos Gun 9DD 4 1952) 1 Wiehington Pe 19524 pL 30, 2 | Soe Oro atividades informais, ou seja, todos aqueles que no se encontravam habili- tados a usuftuir os servigos oferecidos pelas caixas ¢ pelos institutos previ- denciirios* Essa definigio a respeito do seconhecimento de direitos sociais implicou, a0 mesmo tempo, a associagio entre assisténcia médica previdencitia ¢ traba~ Ihadores urbano® e a énfase das ages de saiide piiblica como politicas e mode- los de servicos voltados predominantemente para a populacio cural Um texto publicado em 1948 pelos sanitaistas Emani Braga e Marcolino Candau sintetiza ‘com rara sensibilidade este fato: No Brasil, especialmente nos Gltimos anos, observou-s, sob 0 controle dlo governo, 0 desenvolvimento de um extenso programs de assisténcia médico-social compulsério para as classes assalariadas, programa esse ‘gue, apesar de vir atender a uma razodvel parte de nossa populacio, nao pode ainda cogitar da grande massa constituida pelos habitantes da zona rural, os quais por nio teabalharem em regime regular de emprego, nfo sendo portanto obrigados a contribuit para as organizagdes de seguro ‘dico-social, véem-se, em sua maior, totalmente desprovidos de qual- quer tipo de assisténcia médico-sanitiria, a nio ser aqui e ali e assim ‘mesmo muito mal, aquela que é prestada pelos servigos oficiais de sai de e pels instituigdes de caridade. (Candau e Braga, 1948: 21) “Tal dualidade tornou-se uma das marcas do sistema de protesio social de saiide no Brasil, que intensifica sua institucionalizario exatamente nesse contex- to, formalizando no campo da sade uma separagio que até entio vinha sendo, apenas esborada, Iniciou-se, portanto, durante o primeito governo de Get lio Vargas, a distingao institucional entre duas ‘reas de gestio em politicas publicas de sade, que marcaria definitivamente as ages de satide no Brasil Nesse periodo, a politica de saide expande ¢ torna mais complexa a conti guragio do processo de construcio material simbéliea do Estado Nacional, que ‘expetimentara, como jé foi visto, um desenvolvimento importante nas décadas de 1910 e 1920, quando a sate piblica, definida como elemento constituinte do projeto de construsio da nacionalidade, visbilizou a presenga do poder piiblico fem diversas regiSes do pals, através da criagio do DNSP e da instituigio de ppostos de profilaxia rural no interior (Hochman, 1998; Lima, 1999), Par uma sil avargene ca hthin dh atsiénia médenprevideola, ver Olive e Tex (0985 ay (980 + Devese observa que © scoabeciment de diitor sacs par op tabalbadotes ris 2 va a ‘Scone en 1973, como esabecimenta Jo Fundo de Asisttach 99 Tobahator Rul (Puna. A aie a Caves edo Mc al No novo cenitio polico desencadeado » pans de 1930, as alierages insinlooss adotcas no campo expecico da sue piblca extrem tl clonades aot partmenos idealégicos, que ecbsdiaam os oofles relatives 4 ere ein arte ee esse procetso de transis. As mudangssinsnucionais apresentaram ree cio dita com os projetos paliicos do governo em vigot, 10 mesmo tempo ae ele See ee eset een Aaa ace oelpereran (ree ce esteem eae aay ta oleae elfen aoe aaa polles, beologiea « inenlonal Ieee ees eee pence ee ee pce swat ceniitgis Roc cSonpenbada por urn Uecenenieapto eco) ee eee et ae ee eee eee ee ere meee Aare Cee are eater projets folic ieologicn do gaygeno de conatinizio do Evado Nectoctlber- Sr etabelecendo mecantmos buocttcos que vablizarsem a integeasdo das ts esfersadminlsrvas— federal esadua emnicipal (Ga an teen nt eas alors etc eden a een te te eee nk tech ete nen aera eee aS Ge ee RENO nes Coeareem coer co iecss sees atc ere ogee ae een eee ee ddo Deparnmenss Nacional de Snide (DNS) — 0 qu ps 1937, substan © DNSP = um doa pence ésglos do Map, maponstrel pela exeouto das eal oectia easels ‘A falta de orlentacto dos dicigentes extaduais, a austncia de téenicos cspecalizados © a cartacia de recursos faancciros eram os problemas que, ta amlingio de Jofo de Barros Bacreto, demandavam uma agio mais efeiva (do governo federal nos extados, Para siciontlos, o icesor do DNS acen- tuava a dificudade de centealizas a administacio sanitsa devido 4 grande extensio terstorial do pals, Em sua perspective, era mais senso coordenat “Gs agBes através de normas gersis bem definides A partir dai, teve inicio um periodo de iatenso trabalho normativo com elaboragio de leis, cegulamentos e cddigos sanitérios, que objetivavam pa- * dronizar as atividades dos diversos servigos de sate nos estados em seus inimos detalhes, acompanhando 0 procesto de burocratizacio do Estado, a 4 | sureetosaon ‘que se intensificava, O proprio diretor do DNS elaborou um minucioso cédigo de normas pata a organizagio estadual da sate piblica em todo 0 pais, que previa, entre outras agbes, a reforma nos sistemas estadvais de satide para imple- Imentagio de um sistema distrital de centros de saiklc, realizagioy de cursos de especializagio para téenicos do setor juatamente com a criagio das respectivas catreiras profissionais ea reformulaeZo do modelo de financiamento is atividades de sade publica Barros Barreto, 1937)? A reforma administativa no Mesp, em 1941, conduzida por Barros Barre- to, implicou a verticaliancio das agBes de sade, a centraizacio e a ampliaglo da base territorial da agio do governo federal, A anilise do organograma do DNS, apés a seforma, indica a segmentagio das ages em servigos nacionais voltados a doeneas especificas: febre amarela, malicia (servigo 20 qual se subordinavam ages contra a doenga de Chagas e a esquistossomose), céncer, tuberculose, lepra ce doengas mentais, Tal estrurura, baseada em ages e campanhas verticalizadas, manteve.se praticamente inalterada até 1956, quando, em decorréncia da criaga0, do Ministério da Satide em 1953, houve a integrago de parte expressiva dos servigos no Departamento Nacional de Endemias Rurais Fonseca, 2001), [As novas ditetrizes adequavam-se em muitos aspectos is propostas que vinham sendo debatidas em-férens internacionais, preconizadas ¢ aplicadas __em particular nos Estadas Unidos, incorporando as prioridades definidas para a aco piiblica em sate pela agenda dos congressos e conferéncias patro- inados pela Organizagio Pan-americana de Saide (Opas). No periodo de 1930 a 1945, 2 Opas realizou virios congressos internacionais, mantendo uma agenda regular de debates relativos a politica de satide e procurando se conso- lidar como {rum de interagio entre os diversos paises da América Latina (© modelo de gestio em saiide adotado no Brasil adequou as propostas | defendidas nos encontos internacionais as earactersticas do contexto politico € do projeto ideolégico do novo governo, enfrentando as condigSes expecifcas da tealidade brasileira ¢ of interesses em jogo fa Area de atuasio do ministério. Estabeleceu-se tum padrio de atuagio publica que combinava centralizagio nor- 7 Famer Bur orgnou-se por vas eras itemiclonl em ss gland lora oxe-ametca- fu sei cas infncn sore a propsta que aprescnays pia © modelo inatcoal de fs qs ish conde adoro mo pun © sort brads wb ou pedal de etciadie ‘aed dos Estado Unidos que hai iad [Nene pin 4 Opsspatocinos a tezapo de IX, X © Xi Confeéeia Sain Pan-American, {in Life (1930, em Bogs (193 « no Rio de Joncco (10), Alem deo, promenwcn noe ano ‘Menon ste eveta Il IV ¢ V Confracs Pen-Arcan de Dror: Navini Se Se, (1585, 1980 1984, ods reads er Washagton (Lina, 20 Datos Ber, 1936, 1941, 188) Sse Gti te ate aaa rl matva © descentizasio excoutva, canalizando para a instincia adminstativa cstadual 0 gerenciamento dos servigos publicos de sade, ob a orientagio do roverno central ‘Ateinkide 1 esses objetvos, foram criados distros saniticios que po- diam vatiar em extensio como também no niimero de municipios que os constituiam, nos quais foram instalados postos de saide fxos ot itnerantes com o intito de chegar is repides do interior dos estados. © fortlecimen to da instincin estadual como foco de controle politico era tio evidente que, procétro de implaneagio do sistema distil, 0 “governo central aventava a possibilidade de nao existicem servigos de satide centre as medidas previstas mantidos pelos municipios. Privilegiando a esfera estadual como foco de controle e itradiagio da po. Iitica pablica a ser adotada, a direcio nacional de saiide estabelecia um vinculo direto tanto com of diretores estaduais de satide como também com os ditt zgentes politicos locais que, nesse momento, jf se encontravam sob o regime de interventorias. Desa forma, esse modelo de acio hierarquizado possibiliava, também, maior contzole do governo federal sobre as instincias locais, assegu- zando uma adequagio entre © modelo de organizagio saniticia proposto e os interesses politicos em conflto. Barcos Barreto expde de forma clara estes inte esses a0 enumerar as vantagens do sistema distri que permite um trabalho mais uniforme, mais econmico e mais ef cente, postibilitande cam 0 comando tnico do Estado, um melhor recrutamento e preparo de pessoal, o estabelecimento de cartiras para os diversot agrupamentos de funcionatios, a mais fécil mobilizacio de forgas paca 08 pontos de maior perigo ¢ © que muito importa, uma preservagio maior, para os servigos, da influéncia politica, sempre mais (.) ativa nos municipios. (Barros Barreto, 1937: 302, grfos aossos) O processo de constnucio e consolidacio de um arcabougo burocratico/ institucional no Ambito da saide piblica a partic de 1930, € em particular de forma mais intensa a partir de 1937, caractetizou-se por essa nova configacagio das schgdes de poder entre 0 governo federal ¢ os governos loctis. O dese- ‘abo do wufere no campo especifico da saide piiblica resultou da correlagio de forsas politicas, modelando os servigos como um instrumento de poder fem tal jogo. E ai ficam evidentes as correlagdes entre os interesses politicos, 1s parimettos ideol6gicos que norteavam a ago pilblica € 0 modelo institu- ional que gradativamente se estruturava, e 6 Suc Devs Estavam configuradas as condigées para a consagragio de um modelo Forcemente éentralizado de gestio publica em sade. Através da instirucionaliza- ‘slo, buroeratizagio © profissionalizacio, definiu-se lugar e o papel da saiide ho processo de construsio do Estado © da Nagio. Foram consolidadas as lbases de um sistema nacional de satde piblica, que se destinava a uma ampla parcela da populagio brasileira e definia um formato especifico para assegurar determinados direitos 4 sate ‘As especificidades que marcaram a dvea de atuagio do-Ministério da Edu- cacio ¢ Satide (MES) ~ que, em 1937, substituiu o Mesp — em relagio ao MTIC neste processo de eriagio e consolidagio institucional evidenciavam que o temna da celagio entre as trés instincias executivas ~ governo federal, estados ¢ muni- ipios — se firmaria como um dos eixos definidores da politica piblica neste ‘campo de intervensio social. © tema esteve presente nas décadas seguintes nos debares e nos processos decisérios sobre o perfil da politica publica de snide brasileira, demonstrando que qualquer proposta de ceforma instinacional preci ‘sava considerar esta vatiivel e suas implicagies para 0 contexto politico do ‘momento. Foi o que ocorreu nos anos seguintes quando o formato centraliza- do de gestio comegou a ser questionado. Saude piblica, democracia ¢ desenvolvimento (1945-1964) Com a queda de Vargas, em outubro de 1945, a eleigio de Eurico Gaspar Dutra e a promulgagio de uma nova Constituigio em 1946, o pais inicia um pperiodo de 19 anos de experiéncia democritica. A satide piblica, ainda que herdeiea dos aparatos estatais construidos nos 15 anos do primeiro govern ‘Vargas, teve sua estruturn centralizada com miltiplos programas e servigos ver- Licalizados para implementar eampanbas e ages sanitiia burocracia foi confrontada com novos contextos ¢ contornos politicos € sociais que caracterizaram o Brasil até 1964, Ainda que com limites, 08 ru- mos da saide pabliea e da assisténcia médica foram debatides e decididos, pela primeiea vez, em um ambiente mais democritico, caracterizado por Aisputas politico-partidirias, leigdes livres, funcionamento dos poderes re- ‘publicanos, Uberdade de imprensa e arganizagio e demandas por direitos incorporacio. O lugae da satide na consteugio do Estado e da Nagio ganhow no- vos sentidos diretamente relacionados a0 contexto do chamado ‘otimismo 1 ue a(n oad ao rl sanititio’ vigente no cenério internacional desde 0 pés-guerra. Propugnava- ‘se 0 poder da ciéncia e da medicina em combater e mesmo erradicar, medi- ante novos recursos tecnolégicos ¢ terapéuticos — especialmente os insetici- das de asio residual, como © DDT, ¢ o¢ sntibisticos © antimalisicos — as doengas infectocontagiosas em todo © mundo. Associado a esse otimismo, institufa-se a idéia de que a sade era um bem de valor econémico, e de que Investimentos em ‘capital humano' eram fandamentais para o desenvolvi- mento € progresso das nagbes, especialmente dos paises mais pobres. "A malitia assumia lugar de destaque nesta compreensio sobre o ‘fseu- lo vicioso entre doenga ¢ atraso” (Myrdall, 1952; Winslow, 1955), sendo apontada por muitos como ‘a doenca econémica’ por exceléncia (Packatd Brown, 1997). Esses novos significados e interesses presentet na associagio centre satide € desenvolvimento passaram a marcar os espagos institucionsis no campo da saide publica Packard, 1997). Ocorreu nesse periodo um intenso debate sobre os sadmicos das it _ doengas como obsticulo 20 descavolvimento dos paises, particularmente no ue se tefere & expansio agricola ¢ & peodutividade do stabalho. Pobreza e docnga formavam as bases do que o antropélogo colombiano Arturo Escobar chamou de “a invengio do Tereeito Mundo”. O desenvolvimento teia adqui Fido um stefur de certeza no imaginiso social pés-guctra, tounando-se im- possvel conceituar a realidade social em outros termos,jé que ela taba sido {eolonizada pelo diseurso do deicivoWimento™ (Escobar, 1995: 5). O com- bate as doengas tansmissveis visava a classifica tetsitérioe © populagSes © incompori-los assimetricamente 20 mundo modemo e capitalists Os programas de controle erradcasio das chamadas doencas topical pssoram a atmo interess ds instinigSes nacionaise dos governos dos pales que assumiam a ideranga mundial, mas também das agéncias internacional criadas para cootdenar, em diversas frente, planos globais de desenvolvimento assocados sade, Ene eas, a Organizagio Mundial da Saide (OMS) 2Opas ~ transformada entio em Eseriésio Regional da OMS para as Améccas — 0 Fundo das Nagdes Unidas pata a Infinca (Unicel) ea Organizagio das Nagdes Unidas para Agricultura ¢ Alimentagio (FAO). ‘A saide internacional eteve emoldarada pelasoxganiagSes funciona do Sistema das NagGes Unidas que se estraruraram no contento do ps-Seynda Guerra Mundial eracterzado pela Guetsa Faia, ¢ peas reorentagbes da poli _©a norte-americana para a América Latina. Entre elas, destacam-se 0 programa So ee eae a « Saux Dewan do Presidente Truman, de 1949, conhecido como Ponto IV, e, posterior tment, a Allanga Fura 6 Progress, a década de 1960. Resake-seo especial inurese por pare das adaaineasocs nocewamercanan pela eredicaio da esr eae eile erat taro bilateral Pacha, 1997, A proposta conssin na extensio por todo 0 mundo das caraccrisdeas das vociedades detenvolvidas do ‘mundo livze': “too nivel de Indasualizgto c whariaaplo, eango tnico du ogieulir, Treinen da prodacto mcd e dos pudtes de vo wlopin da edocx Go moderns. Teanformaydex pas as ais capi, inca e tecnologia era onaiersdst0e principls Ingredients (Escobar, 1995) ‘ho longo desse pesiodo 0 Bea exteve imecto ao debate sobre 0 sig: sifeado dé pubdetenvoviments.c os meios de superto, a necesidade ou Tan Ge te ialor afb per acecc IndwtlaboarSo ea unllaagto de tdenias de pleneamenes c ecrvengto do Extado na economia, © eonfko tsininuanne fol ene bel, ue edicavam o planejamento exoodrciee © Sislamberram 0 desecrcvimeato baseado em moe Incentive As avidades fericolas,¢ ‘descnvolvimentista’, que propugnavam agSes part © aumento ds produgio de bens de consumo, o alasgamento do mercado interno e 0 fumeno da tenda nacional com a defeea de uma maior intervensio ¢plai- feagio estatl (Later, 1975; Bielschowsky, 2000) A sade, ainda que nfo ccapase mais © memo lugar em um discurto cvllzador que tvern nas dat tines décadas da Primelea Repiblica, fol integrada de diferentes todos 2 ideologa do desenvolvimento’ e esteve presente — mesmo que tetorieamente ~ fas inicadvas de planejamento extaal e nos projtoe de desenvolimeaio em competzao no pala Pena, 1977). ‘No Bras conecto eae «Inpordncia eoondmica da ade © « poss tuade de ‘congue das doeagas pleas’ em valoszada © ganhava ign cados espectins 10s pécjtos de desenvolvimento, Fmulados a pats da redemocratzagio do pals, e especialmente na déctda de 1950, efaizavam 4 necesidade de combate ds eademias uri das quis a masa era 0. grande puridigea Como afsmou 9 presidents Busico Gaspar Duta em ment gem dlgida no Congresco Nacional em 1949: [As condigies sanitiias de um pals circunscrevem-Ihe rigidamente 0 de- senwolvimento econdmico-social. No caso do Brasil — onde talvez se processe, camo ji foi assinalada por tantos estudiosos, a maior experién- cia conhecida de adaptagio da civiizagao enropéia a um ambiente topi- ‘ae aCneai eat Mc Bal cal — a melhoria geral das condicdes sanititias ¢ © desenvolvimento econdmico-social sio, verdadcitamente, termos co-estensivos do mes- mo problema, isto €, 2 asseguracio de possibilidades de progresso. (Brasil, 1949: 127) ‘Ao longo do periodo de 1945 a 1964, todos os pronunciamentos ofici- ais © 8 posigdes politicas ao campo da satide piblica associavam saide ¢ ‘doenga aos problemas do desenvolvimento e da pobreza. Nio havia ret6rica contriria a essa constatacio, repetida iniimeras vezes por presidentes e mi- nistros. As divergéncias € 0s conflitos ocosriam em torno do entendimento sobre as relagdes causais e sobre as estratégias politicas e institucionais de superacZo da doenga ¢ do subdesenvolvimenta, O.‘sanitarismo deseavolvimentista'analisado por vitios autores (Labra, 1985; Escorel, 2000; Braga e Paula, 1981), que tinha em Samuel Pessoa, Mitio Magallvaes e Gentile de Melo seus principais representantes, reagia a0 campa- nikismo, & centralizacdo, a fraglidade dos governas locais e 20 baixo conheci ‘mento do estado sanititio do pals pela falta de informacBes e dados vitais — legados do Estado Novo ~ ¢ propugnava a compreensio das relagées entre pobreza ¢ doenca e sua importincia para a transformagio social ¢ politica do pais. Ainda que heterogéneo internamente, esse ‘novo saniterismo’ integrava a conente ntional-detenvcivimentis eve expretearia com maa igo no pro cestode radealizagio poiea que marcou o inci da déada de 1960. a bern mais compl © mmbificemda stensfo came squces que scr: vam que « doenga em um obatclo ao desemaimente e 1 sie conn préceulto exsenciel pars or avngos sos e exondmicos no mundo em deen ‘ohimen,¢ os degewolvimenisad’hue comoprerndam nlp st efits 0 combate As doencas pana superrio da pobreza. Cada plo da tendo prodasis agendas nmtuconise polos dlfrenciadas. AO anasros bates sede sale € desenvolvimento no campo dase intermaciona na décaa de 1950, hiss td ings John Fustey 2000 agers uma abomagen em quem rege exe ‘eae da melodia dat exndises weibcin e do berets econSon eitearh amciaes atts dimension os estunuscs como psilos, once ents ag rents exemos dependendo dos conestosineracional, ronal e leak *Q eamrols ou a exatcaio das docopas comunifrcs como peb-e custo par 0 detenwohiments econtimico socal woe concslo 4b {he embors o conte das doenasseja necesstn, 0 desenvoWimen- f tocioeconémico € un pré-equsizo pars a melhor de snide. 6 50 | Sues Domo ‘+ Acrenga de que as campanhas contra as doengas deveriam ser dirigidas verticalmente contza cada doenga especifica e ‘impostas de fora’ versus ‘compreensio de que as campanhas contra as doencas deveriam ser drigidas horizontalmente em relagio’a um conjunta de daengat e envalver a promogio de condigées bisicas de infra-estrutura saniaria. + Defensores da ideologia do desenvolvimento como valor universal vers a crenga de que o sistema internacional cria e perpetua 0 sub- desenvolvimento de maneira que os paises pobres fiquem presos num. permanente sistema de desigualdades Esses conflitos estavam bastante explicitos no Brasil nesse period, muitas vvezes articulando grupos diferentes dependendo da dimensio do contlito. Cada polo de cada dimensio significava um formato institucional e politico bastante iverso para a saide pablica e visées diferenciadas sobre desenvolvimento eco- némico e social. A histéria da sade piblica de 1945 a 1964 apresentou lentos movimentos na disogio de alguns desses pélos. (Os marcos instimcionais desse periodo ~ como a criagio do Ministério da Saide, em 1953, @ reorganizagao dos servigos nacionais no Departamento Na- ional de Endemias Rurais (DNERu), em 1956, 2 campanha nacional contra a lepra, as campanhas de contzole e ertadicagio de doencas, como a mali, de 1058 a 1964, e a 3* Conferéacia Nacional de Saude, em 1963 — reforgam pon- tos importantes. Em primeico lugar, a permanéncia da disjuncio entre sat- de paiblica e assisténcia médica com énfase da primeira nas populagdes ru- ris; em segundo lugar, 0 foco das ages sobre doengas especificas; ¢, por fim, 0 deslocamento do processo de discussio e decisio para arenas fora da Dburocracia pablica, tais como o Congresso Nacional ¢ a politizagio da sai- de nos congressos de higiene ¢ nas conferéncias nacignals. De certo modo, ‘cada uma dessas facetas nos remete aos pélos dos eixos da discussio sade © desenvolvimento mencionados anteriormente. “De 1945 2 1964, 0 pats continuava a ser predominantemente rural. O com- bate is endemias rurais e as doencas transmissiveis mantinha-se, portanto, como a principal preocupagio dos organismos de sade publica. Porém, a questo da inclusio da assisténcia médica na satide publica é incorporada na agenda dos maédicos e sanitaristas. Em trabalho jé citado, apresentado no VII Congresso Brasileiro de Higie ne, realizado em Sio Paulo em 1948, Marcolino Candau ¢ Eenani Braga ecoavam a posigio sespiana, influenciada por Winslow, de no se estabelecer Seo Cot de ae

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