• ALESSANDRA CODINHA
Atualizado em
Joan Didion  (Foto: Reprodução)

Joan Didion (Foto: Reprodução)

Ícone de estilo e referência na literatura, a jornalista Joan Didion morreu hoje aos 87 anos em decorrência de complicações da doença de Parkinson. Nascida em Sacramento, na Califórnia, ela foi colaboradora da Vogue americana nos anos 60 e era considerada uma grande voz da ficção norte-americana. Além disso, ficou conhecida por narrar a contracultura dos anos 1960 em seu best-seller de ensaios "Rastejando até Belém" (Editora Todavia), bem como em suas memórias de 2005 "O Ano do Pensamento Mágico" (Editora Harper Collins Brasil), que detalha a dor após a morte de seu marido, John Dunne. “É fácil ver o início das coisas”, escreveu ela certa vez, “e mais difícil ver o fim”.

Didion, além de escritora, também fez alguns trabalhos como modelo em anúncios para a Gap, em 1989, e para Celine, em 2015, e nada disso abalou seu status no mundo literário, nem afetou a influência que exerceu sobre os milhões de leitores que tentaram imitar seu estilo ao longo dos anos.

Joan Didion na Céline (Foto: Divulgação)

Joan Didion na Céline (Foto: Divulgação)

“É difícil ter uma ideia sobre a Califórnia que seja livre de sua influência”, escreveu Dana Goodyear sobre Didion na Vogue em 2005. O mesmo vale para Nova York, para onde Didion se mudou em 1956. “Nova York não era uma mera cidade”, escreveu Didion em “Goodbye to All That”, seu ensaio de 1967 sobre deixar a cidade: “Em vez disso, era uma noção infinitamente romântica, o misterioso nexo de todo amor, dinheiro e poder, o brilho e o próprio sonho perecível”. 

Além de ter se formado em literatura inglesa na Berkeley, ela também trabalhou como editora-assistente e ensaísta para a Vogue de 1956 a 1964. A escritora entrou para o time da revista após desistir de uma pós-graduação.

“Não perdíamos prazos, não cometíamos erros, aprendíamos rápido ou não permanecíamos", escreveu em 1992.

Em 1972, Didion foi diagnosticada com esclerose múltipla após passar por períodos de cegueira nos dois olhos. A escritora, porém, viveu com a doença em remissão durante a maior parte de sua vida. Já em 1979, publicou "O Álbum Branco" (Editora Harper Collins Brasil), uma coleção de seu trabalho no jornalismo.

Casada com o roteirista John Gregory Dunne, com quem teve uma filha, ela aparecia em colunas de fofoca ao lado de nomes como Bianca Jagger, Paul Morrissey e Linda Ronstadt.

Eventualmente, Didion afastou-se de sua não-ficção de reportagens observacionais e introspecção e publicou os elogiados "Salvador" (1983), "Miami" (1987), "After Henry" (1992), "Political Fictions" (2001) e "Where I Was From", em 2003.

Em 1988, ela e o marido voltaram para Nova York, onde permaneceram até a morte repentina de Dunne, vítima de um ataque cardíaco em dezembro de 2003, pouco antes do 40º aniversário de casamento. Na época, a filha do casal, Quintana, estava inconsciente na unidade de terapia intensiva do hospital Beth Israel, sofrendo de uma pneumonia, que evoluiu para choque séptico.

Didion atrasou o funeral de Dunne por três meses até que Quintana estivesse bem o suficiente para comparecer. Ela, porém, morreu um ano e meio depois, em agosto de 2005, poucos meses depois de a escritora receber a Medalha de Ouro da Academia Americana de Artes e Letras. Didion escreveu "O Ano do Pensamento Mágico" sobre sua dor e ganhou o Prêmio Nacional do Livro.

Em 2007, ela e Scott Rudin adaptaram o livro para o palco como um show solo estrelado por Vanessa Redgrave. O luto se tornou um dos aspectos definidores do perfil público de Didion.

Em 2011, Didion publicou "Noites Azuis" (Editora Harper Collins Brasil), sobre o envelhecimento e a perda de sua filha - um livro que o "New York Times" descreveu como sendo uma obra em que ela enfrenta “o fato desanimador de que contra os piores ataques da vida nada vale, nem mesmo a arte; especialmente arte". No ano seguinte, Didion recebeu a Medalha Nacional de Humanidades do presidente Barack Obama. “Estou surpreso que ela ainda não tenha recebido este prêmio”, comentou o ex-presidente a repórteres na ocasião.

Para muitos, por meio de seus escritos sobre amor e perda, inocência e decepção, nostalgia e memória, Didion inventou uma forma de estar no mundo: uma observadora, judiciosamente acima da briga, segurando tudo em um distanciamento elegante. “Há algo de belo, suave nela, mas também inflexível e remoto, e um tanto enervante do jeito que alguém que é ao mesmo tempo, distanciado e sábio pode ser”, escreveu Susan Orlean sobre Didion em um perfil para a Vogue em 2002.

Talvez sua frase mais famosa seja: “contamos histórias para nós mesmos para viver”. E que histórias! “Muitos escritores escrevem introspecção incômoda, reportagens detalhadas, comentários culturais contra-intuitivos ou jornalismo de estilo de vida. Mas até agora apenas Didion fez todos os quatro em síntese perfeita, uma prosa que, na melhor das hipóteses, pode disparar em cada cilindro e trabalhar em vários campos da imaginação ao mesmo tempo”, escreveu Nathan Heller para a Vogue em 2014 em um ensaio que elogiou seu talento para a composição como “Mozartiana”.