As vantagens de comprar a granel

Eunice Maia // Agosto 3, 2020
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Inspirado no passado e no que de mais tradicional as mercearias antigas tinham, o granel está de mãos dadas com o presente e com o futuro. Evoluiu. Adaptou-se aos tempos. Os relatórios de tendências do mercado apontam a vontade dos consumidores de terem acesso a este tipo de consumo. E está nas nossas mãos dar o sinal de que o granel é, de facto, o futuro. Como é que isso se faz? Comprando a granel!

Numa loja a granel, os produtos são apresentados em dispensadores individuais, com doseadores, e é possível escolher os alimentos na quantidade de que realmente se precisa. Este gesto tem um impacto considerável na redução da quantidade de resíduos destinados a aterros e incineradoras. Além disso, ao incentivar a aquisição apenas da quantidade de que efetivamente necessitamos, estaremos também a diminuir o desperdício alimentar.

O granel e a redução do desperdício

Comprar a granel contribui significativamente para a redução da produção de resíduos de embalagens de plástico e ainda de desperdício alimentar ao nível do consumidor. Produzimos em Portugal 1 milhão de toneladas de desperdício alimentar por ano (96,8 kg per capita); 28,9% na distribuição; 31,4% ao nível do consumidor (Ribeiro: 2018, “Avaliação da venda de produtos a granel em supermercados”).

Ora, o desperdício alimentar doméstico está associado (20 a 25%) ao consumo embalagens. Dados fornecidos pela European Week for Waste Reduction revelavam que cada família descarta 10% dos bens alimentares adquiridos, sendo que muitos não chegam sequer a ser desembalados! A compra de quantidades de alimentos corretamente adaptadas às necessidades de consumo permite reduzir a produção de resíduos.

“A venda a granel pode ser uma solução de futuro se Portugal quiser dar resposta às políticas europeias de Economia Circular na redução de utilização de embalagens de plástico” (ibidem). Faria sentido inclusivamente uma redução do IVA para 6% para produtos adquiridos a granel.

O granel surge assim como fator de redução de desperdício, mas também da prevenção de geração de resíduos, permitindo aos consumidores escolher a quantidade de produto de que precisam e abdicar das embalagens. Desta forma, assume-se como uma medida de prevenção de geração de lixo, atuando ao nível do pré-lixo, incentivando uma lógica de economia circular.

Está, por isso, ao serviço do Objetivo de Desenvolvimento Sustentável 12 – Produção e consumo sustentáveis “Garantir padrões de consumo e de produção sustentáveis”, atuando numa lógica de “pre-waste”, ou seja, de prevenção de geração de resíduos, através da planificação e da adoção de um consumo mais consciente.

O Barómetro Marcas Cidadãs (2019), análise promovida pelo C-Lab, demonstra, aliás, a tendência e a vontade dos consumidores para optar por compras a granel como forma de eliminar as embalagens e como mensagem de sustentabilidade. 68% dos inquiridos acham interessante e adeririam se se alargasse a compra ao quilo/litro a novas categorias de produtos e 77% evitam comprar pré-embalados em plástico.

O que diz a investigação científica sobre o impacto do granel?

No nosso país há ainda pouca investigação científica publicada e revista por pares em torno do impacto das lojas “zero waste”. Há algumas teses, uma especificamente sobre o granel, da autoria de Diogo Ribeiro, antes referida, para a qual tivemos o privilégio de contribuir, mas, como é um conceito recente, há muito por fazer (estudar).

Há, por isso, sem dúvida, uma oportunidade e uma necessidade urgente, para podermos monitorizar com rigor e documentar esse mesmo impacto. 

Num dos fóruns organizados pela Zero Waste Europe em que pude participar, com a presença da Jane Muncke, da Food Packaging Forum, refletia-se precisamente sobre a importância da investigação e da pesquisa em torno do impacto das embalagens. De facto, estas têm um papel fundamental no combate ao desperdício alimentar, por um lado, porque asseguram o acondicionamento e a preservação do produto ao longo de várias fases da cadeia alimentar (envio e entrega para distribuição, transporte, retalho, consumidor); no entanto, por outro, constituem também em simultâneo fator de emissões de gases com efeitos de estufa e, numa ótica de pós-consumo, de poluição (pensemos no efeito dos descartáveis nos ecossistemas marinhos).

Um artigo publicado em 2017 por Elisa Beitzen-Heineke, Nazmiye Balta-Ozkan e Hendrik Reefke no Journal of Cleaner Production, dedicado às lojas zero waste (lojas – mercearias bio a granel – cuja missão está comprometida com a redução de desperdício, analisou e descreveu o seu impacto positivo nas comunidades em que estão inseridas do ponto de vista social, ambiental e económico, salientando:

  • acesso a alimentos mais nutritivos e saudáveis (não processados);
  • controlo das quantidades adquiridas (mais poder para o consumidor) e possibilidade de experimentar novos sabores;
  • a certificação “fair trade” em muitos casos, além da certificação de produção em modo biológico;
  • redução das embalagens e prevenção da geração de resíduos;
  • atendimento de proximidade (criação de laços de afetos com a comunidade);
  • fator conveniência (loja de bairro);
  • inovação e colaboração com universidades no desenvolvimento de design e acondicionamento disruptivos;
  • apoio crescente a produtores e fornecedores nacionais;
  • colaboração com universidades (casos de estudo; estágios;…);
  • ausência de refrigeração (mercearia seca) e períodos de validade extensos com impacto muito significativo na redução do consumo de energia, água e das emissões;
  • maior transparência na cadeia;
  • forte controlo dos princípios HACCP, supervisionados e certificados por entidade externa;
  • forte sentido de comunidade: eventos, workshops, conferências.

Quando visitam e compram numa mercearia biológica a granel, estão a dar o vosso voto e o vosso sinal de que concordam e apoiam a sua missão, contribuindo para este potencial que os investigadores citados identificaram.

Proximidade e laços de afeto

Acredito que esta crise conduziu muitas pessoas de volta aos pequenos negócios dos bairros, ao comércio local. Em dias de distanciamento social e de isolamento, a verdade é que os laços de afeto e de proximidade parecem estar a ser reforçados e valorizados. Há correntes nas redes sociais de partilha destas marcas e destes projetos, há apelos para estimular o que é nosso e agradecimentos aos pequenos produtores que fazem chegar o melhor do campo à cidades.

O regresso ao local, ao bairro, aos vínculos de vizinhança e cooperação sublinha a importância dos conceitos de autossuficiência e resiliência mais do que nunca. Escolher as pequenas mercearias neste momento é também isso: votar através da compra nestes valores para o futuro.

Para facilmente encontrar a mercearia mais perto de si consulte o portal online “A Granel”

Alguns conselhos práticos para comprar a granel:

  1. Fazer sempre uma lista de compras após verificar o que ainda tem em casa;
  2. Leve caneta ou lápis para registar validades (estão sempre afixadas nos rótulos dos dispensadores);
  3. Recuse sacos de plástico de uso único;
  4. Organizar na despensa os produtos comprados a granel, colocá-los em frascos ajuda a ter uma perceção mais rigorosa das quantidades efetivamente gastas.

Nota: Fotografia destaque por Daniela Sousa

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