Um estudo de três anos descobriu que a Universidade de Cambridge foi diretamente beneficiada pela escravidão e o tráfico de escravos. Embora Cambridge seja frequentemente lembrada por seus famosos abolicionistas, como Thomas Clarkson e William Wilberforce, um novo relatório mostra que a instituição lucrou com o comércio de escravos por muitos anos, com uma parte significativa do seu fundo universitário vinda da exploração de pessoas escravizadas.
O estudo foi conduzido por dois pesquisadores de pós-doutorado de Cambridge, que fazem parte do Grupo de Consulta sobre o Legado da Escravatura, formado por acadêmicos experientes, estudantes e ex-alunos e presidido pelo professor Martin Millet, professor titular de Arqueologia Clássica. O grupo também convidou uma equipe de historiadores de fora da universidade para orientar a pesquisa.
A investigação, que teve início em 2019 e teve os achados preliminares publicados nesta sexta-feira, buscou esclarecer de que formas a universidade esteve envolvida no tráfico de escravos e como a sua política de bolsa de estudos moldou a opinião pública, reforçando ideais racistas entre o século XVII e o início do século XX.
Além de diversos alunos de Cambridge terem sido donos de plantações e pessoas escravizadas, o envolvimento mais direto da universidade com o mercado de escravos veio do seu investimento na Companhia dos Mares do Sul, que comercializou pessoas escravizadas na África, América do Sul e Caribe de 1713 a 1740.
Faculdades de Cambridge como Corpus Christi, Gonville & Caius, Jesus, King’s e Pembroke foram grande investidoras dessas companhias e tiveram “significativos lucros financeiros” através disso, segundo a pesquisa. Muitas faculdades continuaram a receber dividendos sobre seus títulos até seu resgate em 1854.
O estudo observou que o Edifício Gibbs no King’s College foi em grande parte construído com renda proveniente do mercado escravocrata, enquanto o Museu Fitzwilliam foi parcialmente financiado por doações vindas dos lucros do comércio de escravos. Diversas faculdades também investiram na Companhia Britânica das Índias Orientais e depois mantiveram investimentos em outros empreendimentos coloniais na Austrália e na África. Algumas faculdades também receberam doações diretas das companhias coloniais.
Os pesquisadores também descobriram que acadêmicos de Cambridge constantemente desenvolveram e disseminaram ideias racistas que justificavam a escravatura e a colonização. Cambridge foi um núcleo do pensamento de apoio aos Confederados sulistas durante e após a Guerra Civil americana, no século XIX. A universidade disse que uma versão completa da pesquisa será publicada em 2023.
O mundo em imagens nesta sexta-feira
Em resposta às descobertas, o relatório pede a criação de um Centro de Pesquisa sobre o Legado da Escravidão em Cambridge para a continuidade dos trabalhos. A universidade disse que pagará 1,4 milhões de libras (R$ 8,5 milhões) de financiamento inicial para o desenvolvimento das propostas, além de outras atividades.
Segundo o estudo, Cambridge também encomendará e instalará placas que identifiquem e contextualizem as estátuas de indivíduos espalhadas ao redor da universidade.