30/11/2015 09h43 - Atualizado em 30/11/2015 09h43

Grande Vitória tem 500 mil vivendo com menos de 1 salário mínimo

Região mais rica do estado é marcada por desigualdade de renda.
Em alguns locais, falta iluminação pública e saneamento básico.

Patrick CamporezDe A Gazeta

Dona Seli Santos tem que caminhar todos os dias 500 metros para pegar água no Espírito Santo (Foto: Marcelo Prest/ A Gazeta)Dona Seli Santos tem que caminhar todos os dias 500 metros para pegar água no Espírito Santo (Foto: Marcelo Prest/ A Gazeta)

Mais de 70% dos capixabas inscritos no Cadastro Único para Programas Sociais do Governo Federal (CadÚnico), que serve como instrumento de identificação e caracterização socioeconômica das famílias brasileiras de baixa renda, se enquadram como pobres ou extremamente pobres. O dado é do Instituto Jones dos Santos Neves (IJSN), no relatório do perfil da pobreza no Espírito Santo.

Hoje, 1.494.673 de capixabas estão inscritos CadÚnico. A Grande Vitória, microrregião mais rica do estado, com mais de metade do Produto Interno Bruto (PIB) do Espírito Santo, também é a que concentra grande parte do contingentes pobres e extremamente pobres.

Em Vitória, Vila Velha, Serra, Cariacica e Viana são 511.604 em situação de vulnerabilidade, ou seja, vivem com uma renda média de meio salário mínimo (R$ 394,00). Desses, 360 mil são considerados pobres ou extremamente pobres.

Em termos absolutos, é na Serra que se encontra a maioria da população vulnerável do Espírito Santo: 147.672. Proporcionalmente, na Grande Vitória, Viana e Cariacica, com 38% e 37% de suas populações, respectivamente, lideram o ranking.

Por ser a região mais rica, proporcionalmente os números da Grande Vitória são melhores que os de outras ilhas de pobreza do estado. A questão é que, por também reunir grande parte da população capixaba, 1,7 milhão, os números da Grande Vitória merecem atenção.

Para a pesquisadora e professora da Ufes, Marta Zorzal, Cariacica deve ser pensado como um caso atípico na Grande Vitória. “As demandas do coletivo historicamente foram negadas. Tem carência de infraestrutura e políticas públicas sociais, mas não tem investimento. Falta um prefeito forte para renegociar o pacto da divisão de riquezas com Vitória”, disse.

Mapa da pobreza no Espírito Santo (Foto: Arte/ Jornal A Gazeta)
Situação da pobreza na Grande Vitória (Foto: Arte/ Jornal A Gazeta) (Fonte: Jornal A Gazeta)

Ilhas de pobreza
Nessas “ilhas de pobreza” o nível de qualificação profissional é mínimo e as oportunidades de trabalho são escassas. Parte das famílias vive em casas improvisadas, sem acesso aos serviços básicos, como água tratada e energia elétrica. Em municípios como Ponto Belo, por exemplo, onde a principal fonte de emprego está na prefeitura, 83% da população encontra-se em situação de vulnerabilidade social.

Apesar do PIB capixaba ter dado um salto de 215% na última década, pelo menos 10 mil famílias ainda moram em casas inadequadas ou condenadas, feitas de taipa, madeira aproveitada, palha ou outro material. Outras 160 mil famílias não contam com esgotamento sanitário adequado e 46 mil residências não têm água canalizada, como no caso de Dona Seli Pena Ferreira, de 63 anos.

Há 15 anos, a moradora de Alzira Ramos  acorda cedo todos os dias e caminha cerca de um quilômetro a passos lentos para chegar até a única fonte de água limpa que atende as famílias do bairro. “Já perdi a fé, meu filho”, desabafou.

A poucas quadras dali, já em Chácara Paraíso, Rosana Muniz Alves, de 24 anos, passa pelos mesmos problemas. Grávida de quatro meses, a desempregada precisa da ajuda do sobrinho, de 15 anos, para retirar água de um reservatório próximo de casa.

Rosana e Cleber tiveram que cavar um poço em casa, no Espírito Santo (Foto: Marcelo Prest/ A Gazeta)Rosana e Cleber tiveram que cavar um poço em
casa (Foto: Marcelo Prest/ A Gazeta)

A família vive com o baixo salário do marido, que faz “bicos” como ajudante de pedreiro. “Esse mês consegui fazer uma compra de R$ 300, mas às vezes o dinheiro não dá”, disse.

Rosana, que estudou apenas até a segunda série do ensino fundamental, diz que a infraestrutura do bairro parece ser do século passado. “Não temos nem o básico”, completou.

Quanto às demandas de Alzira Ramos, a Secretaria Municipal de Infraestrutura (Seminfra) afirmou que possui um projeto de drenagem e pavimentação para a Avenida Virgínia Malini Ramos (a principal do bairro), orçada em R$ 725,7 mil. A obra, porém, aguarda liberação de convênio com o governo do estado para sair.

“Outras ruas receberão aplicação de 'revsol', um produto utilizado na pavimentação alternativa e que tem durabilidade de até três anos. Essas vias entrarão no cronograma da Seminfra em 2016”, prometeu a prefeitura.

A administração municipal disse ainda que o bairro será contemplado dentro de um “grande” projeto de extensão da rede elétrica, que atualmente encontra-se em fase de licitação.

Melhora
A diretora-presidente do Instituto Jones dos Santos Neves, Andrezza Rosalém Vieira, destaca que o Espírito Santo vem melhorando sua renda domiciliar per capta, com aumento de 8,1% no rendimento das famílias somente de 2013 para 2014. “Tivemos um aumento principalmente da renda dos mais pobres”, pontuou.

Apesar do resultado, o estado é o 12º com maior desigualdade social no país, com coeficiente de Gini de 0,487 (quanto mais perto de zero, menos desigual), segundo os dados da última Pnad.

A desigualdade entre as rendas dos trabalhadores urbano e rural, entretanto, continua alta. Enquanto na cidade o salário médio ficou em R$ 1,117, em 2014, no meio rural esse valor era de R$ 682.

Andrezza disse que essa diferença é comum. ”O custo de vida no campo é menor. No Espírito Santo tem uma característica de agricultura familiar, que produz para o próprio consumo. Mas, no geral, a renda no campo também tem melhorado mais do que na cidade”, concluiu.

 

 

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