Lembranças desnatalinas

Sempre DE-TES-TEI o Natal. Desde que me lembro, criança e adolescente, já odiava aquilo. Celebração social, comercial e de confronto familiar. “Engordaste!” (família gaúcha, tchê). “Não tens namorado?” E a melhor de todas: “Indo bem na escola? Hum… Tu és inteligente, assim não vais casar” (juro, e era um tom de desalento). Eu amarrava a tromba e assim permanecia durante todo o djingobéu. No fim da festa, invariavelmente na casa de vovó, saíamos em cortejo carregando sacolas, com meus pais invariavelmente brigando. No dia seguinte, almoço… na casa de vovó.

pesaram

Chato, chato, muito chato. E sempre suarento, calor de dezembro com nozes (nozes!) e pinheirinho. Naquelas reuniões em que me escapava qualquer sentido comunal, tribal, transcendental, eu só me sentia cobrada e desconfortável. Esse meu lado da família não primou pelo bom humor e a descontração que temperam e adoçam os rituais. Depois até descobri outros ramos divertidos, a família ficou  bem mais engraçada, amorosa. Mudaria o Natal ou mudei eu? Ho ho ho.

Deixei de ir aos natais e almoços familiares assim que pude mandar em mim mesma. Agora era hora de assumir – e sumir. Não adianta chamar, oh não. Os anos voaram, os velhinhos e as velhinhas foram indo embora. Natal se tornou data para viajar – sempre no dia 24, com Olivia a tiracolo, minha jovem e maravilhosa companheira de estrada. A partir de 2005, o caminho foi o do aeroporto. Com a primeira quimioterapia, de maio a outubro de 2009, a tradição se quebrou.

Retomei as viagens mas em épocas diferentes: período de Natal tem estresse de aeroporto congestionado, multidão em todo canto, fila em museu, quero não, obrigada.  Tenho ficado em casa. Nesse Natal, dias antes de começar a tomar a medicação nova – em tese, chega quarta-feira, dia 27 -, fugi para a serra, com dois amigos muito queridos que também não estavam nada natalinos. Foi bom mesmo. Casa simples e chique, lugar divino, emprestado pelos carinhosíssimos proprietários. Banho de rio e comida gostosa. Nenhum vestígio de feliz navidad, a não ser os muitos vídeos pipocando nos canais de conversa (ai ai). Foi um bate-volta. Adorei.

O ano que vem, para mim, começa antes do dia 31, com a medicação. Festa de réveillon também já saiu da minha vida há muitos anos, essa por preguiça mesmo (e calor, e falta de saco para enfrentar engarrafamento). Então, pronto, meu réveillon vão ser as quatro primeiras cápsulas de Ibrutinib. No ar condicionado.

(Obrigada, Berná, pela Morticia deliciosa)

 

 

 

Sobre lucianamedeiros

Luciana: Carioca, jornalista, safra de 1961, uma filha, muitos amigos. Mora no Rio.
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