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Medição de viscosidade de líquidos pelo método de múltiplas reflexões acústicas com conversão de modo

Resumos

Este trabalho apresenta uma célula de medição de viscosidade dinâmica de líquidos usando a conversão de modo de ondas longitudinais para ondas de cisalhamento e vice-versa. O método baseia-se na medição do coeficiente de reflexão complexo de uma onda de cisalhamento incidindo numa interface sólido-líquido. As ondas refletidas na interface sólido-líquido são medidas no modo longitudinal por uma membrana de PVDF de grande abertura, para evitar erros devido ao efeito da difração. Foi desenvolvida uma estratégia para a medição de viscosidade pelo método de múltiplas reflexões relativas que possibilita medir a velocidade de propagação no sólido. Medições da viscosidade de óleos automotivos (SAE90 e SAE140) e de um produto alimentício líquido (glucose de milho) foram feitas no intervalo entre 1 e 5MHz. Os resultados experimentais mostram a dependência da viscosidade dinâmica com a freqüência da onda de cisalhamento.

Ultra-som; viscosidade; conversão de modo


This work presents a cell to measure the dynamic viscosity of liquids using a wave mode conversion from longitudinal to shear waves and vice-versa. The method is based on the measurement of the complex reflection coefficient of shear waves at a solid-liquid interface. The reflected waves at the solid-liquid interface are measured in the longitudinal mode by a large aperture PVDF membrane to avoid errors due to the acoustic diffraction. A viscosity measurement strategy was developed based on the relative multiple reflection method that guarantees the measurement of the propagation velocity for the solid. Measurements of the viscosity of automotive oils (SAE90 and SAE140) and a kind of corn glucose were made in the range of 1 to 5MHz. The experimental results show the dependency of the dynamic viscosity with the frequency of the shear wave.

Ultrasound; viscosity; wave mode conversion


Medição de viscosidade de líquidos pelo método de múltiplas reflexões acústicas com conversão de modo

Flávio BuiochiI; Ricardo T. HigutiII; Celso M. FurukawaI; Emílio C. N. SilvaI; Julio C. AdamowskiI

IEscola Politécnica da USP, Departamento de Engenharia Mecatrônica e de Sistemas Mecânicos, Av. Prof. Mello Moraes, 2231 - CEP 05508-900 - São Paulo SP, Brasil, fbuiochi@usp.br

IIUnesp, Faculdade de Engenharia de Ilha Solteira, Departamento de Engenharia Elétrica

RESUMO

Este trabalho apresenta uma célula de medição de viscosidade dinâmica de líquidos usando a conversão de modo de ondas longitudinais para ondas de cisalhamento e vice-versa. O método baseia-se na medição do coeficiente de reflexão complexo de uma onda de cisalhamento incidindo numa interface sólido-líquido. As ondas refletidas na interface sólido-líquido são medidas no modo longitudinal por uma membrana de PVDF de grande abertura, para evitar erros devido ao efeito da difração. Foi desenvolvida uma estratégia para a medição de viscosidade pelo método de múltiplas reflexões relativas que possibilita medir a velocidade de propagação no sólido. Medições da viscosidade de óleos automotivos (SAE90 e SAE140) e de um produto alimentício líquido (glucose de milho) foram feitas no intervalo entre 1 e 5MHz. Os resultados experimentais mostram a dependência da viscosidade dinâmica com a freqüência da onda de cisalhamento.

Palavras-chave: Ultra-som, viscosidade, conversão de modo.

ABSTRACT

This work presents a cell to measure the dynamic viscosity of liquids using a wave mode conversion from longitudinal to shear waves and vice-versa. The method is based on the measurement of the complex reflection coefficient of shear waves at a solid-liquid interface. The reflected waves at the solid-liquid interface are measured in the longitudinal mode by a large aperture PVDF membrane to avoid errors due to the acoustic diffraction. A viscosity measurement strategy was developed based on the relative multiple reflection method that guarantees the measurement of the propagation velocity for the solid. Measurements of the viscosity of automotive oils (SAE90 and SAE140) and a kind of corn glucose were made in the range of 1 to 5MHz. The experimental results show the dependency of the dynamic viscosity with the frequency of the shear wave.

Keywords: Ultrasound, viscosity, wave mode conversion.

1 INTRODUÇÃO

De todas as propriedades físicas do líquido, a viscosidade é a que requer maior consideração no estudo dos escoamentos, pois ela oferece resistência ao cisalhamento, dificultando o seu fluxo em tubulações, cavidades de moldes etc. Além disso, é utilizada para o desenvolvimento e controle de qualidade de produtos, sendo crucial sua medição para inúmeras indústrias nos campos da química, farmácia e produção de alimentos, entre outras. Métodos típicos de medição de viscosidade em baixas freqüências não são apropriados para o controle de processos em tempo real, pois dependem do arrasto de uma superfície oscilatória imersa no líquido, dificultando sua aplicação. Um exemplo clássico é o viscosímetro rotacional, que pode obstruir o escoamento dos líquidos que passam por uma pequena fenda definida por um cilindro móvel que gira coaxialmente dentro de outro cilindro estacionário. Um método que se apresenta mais viável para o controle em tempo real em altas freqüências, empregando ondas ultra-sônicas na obtenção da viscosidade de líquidos é o método da reflexão ultra-sônica, desenvolvido por Mason et al. (1949). Esse método baseia-se na medição do coeficiente de reflexão complexo de uma onda plana de cisalhamento incidindo obliquamente ou normalmente na interface entre um sólido e o líquido cuja viscosidade se quer medir.

Uma estratégia de medição baseada no método de reflexão relativa com incidência normal, desenvolvida recentemente por Buiochi et al. (1998 e 1999), utiliza uma célula de medição de viscosidade dinâmica de líquidos usando a conversão de modo de ondas logitudinais para ondas de cisalhamento e vice-versa. A célula de medição apresentada por Buiochi et al. (1999) emprega um transdutor piezoelétrico que gera ondas longitudinais e uma membrana piezoelétrica de PVDF (Poly-Vinylidene Fluoride) que responde somente ao modo longitudinal, utilizada como receptor das ondas refletidas na interface sólido-líquido. A conversão de modo ocorre na face oblíqua de um prisma de alumínio ou acrílico (polimetil metacrilato) imerso na água e a reflexão da onda ocorre numa interface desse prisma em contato com o líquido. Os resultados experimentais obtidos com a célula com reflexão relativa (CRR) mostram uma boa reprodutibilidade das grandezas medidas, tais como: magnitude e fase do coeficiente de reflexão complexo e viscosidade dinâmica do líquido. Entretanto, há algumas desvantagens na utilização da CRR: a montagem impede a medição da velocidade de propagação da onda de cisalhamento no prisma usada na determinação da viscosidade; as medidas da magnitude e fase do coeficiente de reflexão são mais sensíveis ao nível de ruído quando se utiliza o prisma de alumínio, pois as variações medidas devido à interface alumínio-líquido são pequenas; e quando se utiliza o prisma de acrílico não se pode empregar freqüências mais elevadas devido ao maior coeficiente de atenuação do acrílico comparado com o alumínio.

Este trabalho apresenta uma nova estratégia de medição baseada no método de múltiplas reflexões relativas com incidência normal, utilizando a célula descrita acima com o prisma de alumínio fixo a uma linha de retardo de acrílico de faces paralelas, designada como linha de retardo de medição (Fig. 1). As múltiplas reflexões ocorrem no interior dessa linha de retardo, de modo a possibilitar a medição da velocidade de propagação da onda de cisalhamento nesse meio. Essa combinação prisma de alumínio e linha de retardo de acrílico, possibilita o aumento da freqüência de excitação na medição do coeficiente de reflexão complexo na interface acrílico-líquido. Medições experimentais com líquidos em repouso são conduzidas com a célula com múltiplas reflexões (CMR). Foram utilizados nas experiências dois óleos automotivos, SAE 90 e SAE 140, e um produto alimentício à base de glucose de milho, designado pelo nome comercial de Karo.


É importante frisar que a viscosidade dinâmica depende da freqüência da tensão de cisalhamento atuante sobre o líquido. Um líquido classificado como Newtoniano é caracterizado por uma viscosidade que não depende da taxa de deformação com a qual é medida. Esse comportamento viscoso é observado quando se tem uma superfície sólida em contato com o líquido, oscilando em baixas freqüências (da ordem de Hz). Porém, esse mesmo líquido será classificado como não-Newtoniano quando submetido a altas freqüências de excitação (da ordem de MHz). Nesse caso, o líquido passa a ter simultaneamente o comportamento elástico e viscoso, sendo designado como um meio viscoelástico (Barnes et al., 1989).

2 ASPECTOS TEÓRICOS

A teoria que utiliza o método da reflexão de ondas de cisalhamento na determinação de viscosidade de líquidos pode ser encontrada em diversos artigos e livros (McSkimin e Andreatch Jr., 1967) (Moore e McSkimin, 1970) (Harrison e Barlow, 1981) (Whorlow, 1992). Como apresentado na Fig. 1, o método da reflexão da onda de cisalhamento com incidência normal é descrito abaixo.

Considerando uma onda de cisalhamento, plana e harmônica, propagando-se num meio viscoelástico (meio 2) ao longo do eixo z e tomando a direção de movimento das partículas como a direção x, a equação dessa onda pode ser descrita por:

onde ux é o deslocamento transversal na direção x, o módulo de cisalhamento complexo do meio 2, e r2 a densidade do meio 2. O módulo de cisalhamento complexo é definido pela razão entre a tensão de cisalhamento pela deformação de cisalhamento, = G '+ jG", onde G' é o módulo elástico, e G" o módulo de perda. O módulo de perda está relacionado com a viscosidade dinâmica h2 pela seguinte equação:

onde w é a freqüência angular. A impedância acústica característica complexa de uma onda de cisalhamento no meio 2 é dada por:

Considerando a mesma onda de cisalhamento inicialmente propagando-se do meio 1 (linha de retardo de medição) para o meio 2 (amostra), o coeficiente de reflexão complexo na interface é dado por:

onde Z1 = r1c1 é a impedância acústica característica do meio 1, um material sólido com densidade r1 conhecida e velocidade de propagação c1 a ser determinada. Em geral, o sólido introduz uma atenuação muito pequena, logo sua impedância pode ser considerada real. O meio 2 é o líquido cuja viscosidade se quer medir e que apresenta uma impedância complexa. Assim, o coeficiente de reflexão complexo pode ser representado numa forma exponencial = R12ej(p+q) = -R12ejq, onde R12 é a magnitude e (p+q) a fase. Sabe-se que a onda de cisalhamento refletida na interface quando o meio 2 é o ar (referência), apresenta R12 = 1 e q = 0. Conseqüentemente, na interface a tensão de cisalhamento refletida está 180o fora de fase da tensão incidente. Agora, ao se colocar o líquido no meio 2, resultará um decréscimo na fase q (quantidade negativa) e R12 será reduzido em relação à referência. Assim, será visto mais adiante que as quantidades mensuráveis, da magnitude R12 e da variação de fase q, serão determinadas a partir de uma referência, que é a onda de cisalhamento refletida na interface quando o meio 2 é o ar.

Finalmente, o valor da viscosidade dinâmica, utilizando os conceitos vistos acima, é obtido pela seguinte expressão:

Essa expressão mostra que só é possível medir a viscosidade do líquido (meio 2) conhecendo a priori a sua densidade e a densidade do sólido (meio 1).

3 MÉTODO DE MÚLTIPLAS REFLEXÕES

O método de múltiplas reflexões é usado para aumentar a sensibilidade das quantidades medidas experimentalmente (McSkimin e Andreatch, 1967). Neste trabalho é proposto o uso desse método aplicado à célula CMR (célula com múltiplas reflexões) usando conversão de modo e incidência normal. A CMR para n reflexões é apresentada na Fig. 1 e consiste de um emissor de cerâmica piezoelétrica, um receptor de membrana de PVDF, uma linha de retardo de acrílico, uma linha de retardo de água, um prisma de alumínio e uma linha de retardo de medição de acrílico. A amostra líquida é colocada sobre a linha de retardo de medição. O emissor gera uma onda longitudinal pulsada no acrílico que atravessa a membrana de PVDF e gera o sinal aT. A onda longitudinal alcança a face oblíqua do prisma onde é convertida numa onda de cisalhamento. Essa onda propaga-se no prisma até alcançar a interface definida pela linha de retardo de medição, onde o sinal é parcialmente transmitido e refletido. A parte refletida retorna para o receptor como a0. A parte transmitida propaga-se no interior dessa linha de retardo, refletindo-se n vezes na interface definida pela amostra. Então surgem n ecos refletidos na interface com a amostra que retornam para o receptor de membrana, representados pelos sinais a1, a2, a3... an. No método de múltiplas reflexões relativas também se faz um conjunto de duas medições à mesma temperatura, uma para a amostra de ar e a outra para a amostra líquida. Usando ambos os n-ésimos ecos das respectivas medições, an(ar) (quando a amostra é ar) e an(liq) (quando a amostra é líquido), tomam-se suas transformadas de Fourier, selecionando os respectivos valores complexos An(ar) e An(liq) para uma dada freqüência no espectro de cada sinal. Assim, a relação entre esses valores fornece a expressão do coeficiente de reflexão complexo:

Como na outra célula, CRR, também se pode utilizar uma normalização com relação às transformadas de Fourier dos sinais aT(ar) e aT(liq) para eliminar o problema da instabilidade da eletrônica e do transdutor emissor entre as duas medições. A CMR também permite utilizar uma outra normalização em relação às transformadas de Fourier dos sinais a0(ar) e a0(liq). Neste trabalho, não há a necessidade de utilizar a normalização porque as duas medições são feitas uma após a outra.

Assim, a magnitude R12 e a variação de fase q do coeficiente de reflexão complexo são calculadas por:

Antes de substituir essas quantidades mensuráveis na equação (5), para obter a viscosidade dinâmica do líquido, deve-se calcular a velocidade de propagação da onda de cisalhamento no meio 1. Esse cálculo é baseado na medição da diferença de tempo Dt entre dois ecos consecutivos refletidos nas interfaces da linha de retardo de medição (meio 1), utilizando-se a técnica de correlação cruzada, melhorada com a utilização da transformada de Hilbert (Cabot, 1981). Assim, conhecendo a priori o comprimento da linha de retardo de medição 1 , calcula-se a velocidade de propagação c1 dada por:

4 CÉLULA DE MEDIÇÃO

A célula CMR é projetada para garantir o ajuste do ângulo de incidência da onda longitudinal sobre a face oblíqua do prisma, a fim de se ter uma incidência normal da onda de cisalhamento na interface de medição. O melhor ajuste é obtido quando as amplitudes dos sinais recebidos são maximizadas. O ângulo de incidência da onda longitudinal na face oblíqua é (90 - x) graus e o ângulo de refração da onda de cisalhamento na face oblíqua é (90 -g) graus, conforme pode ser visto na Fig. 1.

A Fig. 2 mostra a foto da célula utilizada neste trabalho para operar à temperatura de 20oC com um ângulo de incidência de aproximadamente 19o e um ângulo de refração de 43o. O efeito no ângulo de refração devido à variação de temperatura é de aproximadamente ±0,6o para uma variação de ±5oC. Como o efeito no ângulo de refração é muito pequeno, o ângulo de incidência da onda longitudinal pode ser ajustado uma única vez para uma faixa de temperatura adequada.


O ajuste do posicionamento do conjunto emissor-receptor em relação ao prisma é feito por meio de dois movimentos de rotação e um de translação, como mostrado na Fig. 2. O movimento de translação é importante na verificação da superposição de ecos espúrios com os ecos de interesse, afastando e aproximando o conjunto emissor-receptor da face oblíqua do prisma. Sabe-se que a variação das amplitudes dos sinais é mais sensível ao ajuste da rotação II do que ao da rotação I, pois é a rotação II que garante a conversão de modo. A linha de retardo de medição mostrada nesta figura tem comprimento 1 = 4,07mm e diâmetro 70mm.

Os emissores usados nos experimentos são transdutores comerciais, piezoelétricos e de banda larga com freqüências centrais de: 1,6, 3,5 e 5MHz. O receptor é uma membrana piezoelétrica de PVDF de 28mm de espessura com ambas as faces metalizadas com ouro, formando os seus eletrodos. Essa membrana apresenta um diâmetro de 55mm (diâmetro ativo do receptor) capaz de interceptar todo o campo acústico, a fim de eliminar o efeito da difração acústica. Um lado da membrana é colado à linha de retardo I com uma fina camada de adesivo do tipo epóxi, e o outro lado está em contato direto com a água. O controle de temperatura na célula de medição é realizado com um banho termostático contendo água.

5 DESCRIÇÃO DO SISTEMA DE MEDIÇÃO

O diagrama esquemático do sistema de medição utilizado nos experimentos é apresentado na Fig. 3. O emissor é excitado com trens de senóide a uma taxa de repetição de 1kHz, usando um gerador programável de funções (Tektronix AFG 5102) e um amplificador de potência (Amplifier Research 150A100A). Os sinais recebidos pela membrana de PVDF são amplificados até 60 dB por um analisador ultra-sônico (Panametrics 5072PR). Esses sinais são digitalizados por um osciloscópio digital programável (HP54820A) e transferidos para um computador utilizando-se o protocolo de comunicação GPIB. O processamento desses sinais é feito utilizando-se o software Matlab . A fim de comparar os vários resultados experimentais deste trabalho, o osciloscópio foi sempre ajustado com a taxa de amostragem de 500MHz e com média de 1024 aquisições por sinal.


6 RESULTADOS EXPERIMENTAIS

Os resultados experimentais foram obtidos com a CMR e permitiram verificar a pequena influência no ajuste do ângulo de incidência devido à variação de temperatura. Foram realizadas três experiências: a primeira à temperatura de 20,0±0,5ºC com o ângulo de incidência ajustado para maximizar as amplitudes dos ecos, a segunda à temperatura de 23,0±0,5ºC com o mesmo ângulo de incidência ajustado anteriormente e a terceira à temperatura de 23,0±0,5ºC com o ângulo de incidência agora ajustado a esta temperatura, maximizando as amplitudes dos ecos. Em cada experiência foram utilizados os transdutores de freqüência central 1,6, 3,5 e 5MHz, e também em cada uma dessas freqüências foram realizadas medições com os líquidos SAE90, SAE140 e Karo (glucose de milho), nesta ordem, uma ou duas vezes. Em cada medida obtida são adquiridos oito vezes os ecos a1(ar) e a2(ar) refletidos na interface acrílico-ar e mais oito vezes os ecos a1(liq) e a2(liq) na interface acrílico-líquido. A partir desses ecos, estimam-se a média e o desvio padrão da viscosidade na particular freqüência de máxima energia da FFT, utilizando cada um dos pares de ecos (a1(ar) e a1(liq)) e (a2(ar) e a2(liq)). Os transdutores foram excitados com trens de senóide, contendo um ciclo na freqüência de 1,6MHz e três ciclos nas freqüências de 3,5 e 5MHz. Mediu-se a viscosidade, tomando-se a magnitude e fase da transformada de Fourier dos sinais nas respectivas freqüências de 1,4, 3,4 e 4,5MHz. A Fig. 4 mostra os sinais refletidos na interface de medição, obtidos na primeira experiência com o ar e o líquido Karo para cada freqüência de excitação. Os sinais a1(ar) e a2(ar) são representados com linhas pontilhadas e os sinais a1(liq) e a2(liq), com linhas contínuas.


As viscosidades medidas do SAE 90, SAE 140 e Karo com o viscosímetro rotacional (baixa freqüência) à temperatura de 20,0±0,5ºC foram, respectivamente, de 0,58Pa.s, 1,31Pa.s e 10,07Pa.s; e à temperatura de 23,0±0,5ºC foram, respectivamente, de 0,48Pa.s, 1,05Pa.s e 7,07Pa.s. A densidade da linha de retardo de acrílico é 1180 kg/m3 e as densidades medidas com um picnômetro para o SAE 90, SAE 140 e Karo são, respectivamente, de 891kg/m3, 899kg/m3 e 1411kg/m3. Essas densidades foram consideradas iguais para ambas temperaturas, por apresentarem pequenas variações nesta faixa de temperatura.

Os resultados de todas as experiências obtidos para a magnitude R12 , variação de fase q e viscosidade h2 em função da freqüência são mostrados na Fig. 5 para os óleos automotivos e na Fig. 6 para o Karo. As médias obtidas com os primeiros e segundos ecos refletidos na interface de medição são indicadas com o mesmo símbolo: '' para a primeira experiência com o ângulo ajustado a 20,0ºC, '' para a segunda experiência sem ajustar o ângulo a 23,0ºC e '' para a terceira experiência com o ângulo ajustado a 23,0ºC. O desvio padrão das medidas não foi representado por ser menor ou da ordem de grandeza dos símbolos utilizados nas figuras.



Nessas mesmas figuras são apresentadas as curvas teóricas obtidas pelo modelo de Maxwell com dois tempos de relaxação, mostrando o comportamento viscoelástico dos líquidos (Whorlow, 1992). Para as curvas do modelo de Maxwell foram utilizadas linhas contínuas e para os seus respectivos desvios ocasionados por uma variação de temperatura de ±0,5ºC foram utilizadas linhas pontilhadas. Uma aproximação com os dados experimentais foi obtida admitindo-se os seguintes módulos elásticos instantâneos de cisalhamento: G¥,a = 0,4 ·107Pa e G¥,b = 1 ·109Pa para o SAE 90, G¥,a = 0,5 ·107Pa e G¥,b = 1 ·109Pa para o SAE140 e G¥,a = 0,4 ·108Pa e G¥,b = 1 ·109Pa para o Karo. Essas contantes foram consideradas independentes da temperatura. Além disso, admitiram-se nas simulações que os valores das viscosidades de cada elemento de Maxwell são metade das viscosidades a baixa freqüência. Para a velocidade de propagação na linha de retardo de medição foram utilizados os valores medidos de 1355m/s e 1350m/s nas temperaturas de 20,0ºC e 23,0ºC, respectivamente, que correspondem às médias obtidas nas três freqüências de análise. Observou-se uma pequena diferença na velocidade de propagação entre as freqüências, por causa do aumento do coeficiente de atenuação com a freqüência no acrílico. Essa diferença entre a mínima e máxima freqüência foi de 1%.

Conforme mostram a Fig. 5 e a Fig. 6 o aumento de 3ºC na temperatura das experiências mostra que a célula de medição é capaz de detectar o aumento na magnitude R12 para qualquer um dos líquidos em qualquer freqüência, porém a diminuição da variação de fase q só foi possível ser detectada para o Karo independente da freqüência e para os outros líquidos na freqüência de 1,4MHz. Esses resultados mostram que a sensibilidade na medição das quantidades mensuráveis aumenta com a viscosidade. Porém essa sensibilidade não aumentou com a freqüência devido à baixa relação sinal ruído, resultando num desvio padrão maior.

Um resultado importante pode ser visto entre a segunda experiência (círculo) e a terceira experiência (triângulo), que a variação do ângulo refratado resultante do acréscimo de 3ºC na temperatura não influi no valor da viscosidade. Como a variação da temperatura é pequena, causando pequenas variações no ângulo refratado, isso torna as medições com os líquidos independentes do ajuste preciso do ângulo de incidência para uma faixa de temperatura adequada.

Observou-se na freqüência de 1,4MHz, que a magnitude e a fase do coeficiente de reflexão complexo se repetem independente do eco de reflexão com diferenças menores do que 0,5% e 8%, respectivamente. Na viscosidade essas diferenças foram de no máximo 9% para o SAE 90, 7% para o SAE 140 e 3% para o Karo. Essas percentagens foram calculadas em relação aos valores obtidos com o primeiro eco e mostram que a CMR funciona tanto para o primeiro eco quanto para o segundo eco. Isso também vale para as outras freqüências, mas com diferenças pouco maiores.

Os valores calculados da viscosidade, usando a magnitude e a variação de fase do coeficiente de reflexão complexo medidas na célula em alta freqüência, têm uma grande diferença quando comparados com os valores obtidos pelo viscosímetro em baixa freqüência. Foi verificado nas experiências que somente a magnitude do coeficiente de reflexão complexo se aproxima mais do modelo de líquido Newtoniano e apresenta uma maior precisão do que a medição da variação de fase. Assim, utilizando somente a magnitude no cálculo da viscosidade, segundo Shah e Balasubramaniam (1996), foi verificado que esse procedimento fornece bons resultados na estimativa da viscosidade em baixa freqüência, os quais concordam melhor com os valores obtidos pelo viscosímetro. Os desvios percentuais em relação à viscosidade obtida com o viscosímetro foram de -1% a -15% em 1,4MHz, de -3% a -22% em 3,4MHz e -7% a -30% em 4,5MHz. Os menores desvios, em cada freqüência, foram sempre obtidos com o líquido mais viscoso (Karo).

7 CONCLUSÃO

Os resultados para a viscosidade obtidos em alta freqüência (MHz) são menores que os obtidos com os viscosímetros usuais, que funcionam em baixa freqüência. Foi escolhido um modelo baseado em dois tempos de relaxação (Modelo de Maxwell) e foram determinados os parâmetros que ajustam as curvas teóricas aos resultados experimentais para cada líquido estudado. Com esse modelo foi possível verificar o comportamento viscoelástico dos líquidos, cuja viscosidade dinâmica diminui com o aumento da freqüência, fornecendo uma interpretação satisfatória para a faixa de freqüências empregada neste trabalho.

A estratégia baseada no método de múltiplas reflexões relativas utilizou uma célula com o prisma de alumínio fixo a uma linha de retardo de acrílico, designada como CMR. Os resultados obtidos mostram que mesmo para uma pequena variação da temperatura sem ajustar o ângulo de incidência na face oblíqua do prisma, que maximizaria os sinais, as medições continuam coerentes com os resultados obtidos após o ajuste deste ângulo. Vários resultados experimentais obtidos com a CMR indicam uma boa repetitividade das grandezas medidas.

Na estratégia proposta anteriormente para o método da reflexão relativa, utilizando a CRR, só é possível adquirir o primeiro eco refletido na interface de medição do prisma e não se pode calcular a velocidade de propagação neste meio, que é um dos parâmetros acústicos usados na determinação da viscosidade dinâmica. Por outro lado, para o método de múltiplas reflexões, utilizando a CMR, a velocidade de propagação pode ser calculada entre o eco a0 e o eco a1 ou a2 refletidos na interface de medição.

8 AGRADECIMENTOS

À FAPESP por fornecer recursos financeiros para a aquisição de materiais e equipamentos utilizados neste trabalho. À FINEP/RECOPE (sub-rede sensores e atuadores, rede de automação industrial) pelo apoio ao intercâmbio de pesquisadores da área.

Artigo submetido em 18/12/2000

1a. Revisão em 2/10/2002

Aceito sob recomendação do Ed. Assoc. Prof. Jacques Szczupak

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    19 Nov 2003
  • Data do Fascículo
    Set 2003

Histórico

  • Recebido
    18 Dez 2000
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