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Húmus

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Colecção Mil Folhas, #57

Considerada a obra-prima de Raul Brandão, foi publicada em 1917. Trata-se de um romance-monólogo, centrado em dois monólogos interiores: um primeiro orador e o seu alter-ego, um filósofo lunático. Com a narração dominada por estes dois pontos de vista, as restantes personagens são remetidas para o plano do grotesco. A obra explora a contradição entre o mundo aparente e o autêntico, onde se descobrem monstruosidades não sonhadas.

221 pages, Hardcover

First published January 1, 1917

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About the author

Raul Brandão

88 books85 followers
Raul Germano Brandão (Foz do Douro, March 12, 1867 – Lisbon, December 5, 1930) was a Portuguese writer, journalist and military officer, notable for the realism of his literary descriptions and by the lyricism of his speech. Brandão was born in Foz do Douro, a parish of Porto, where he spent the majority of his youth. Born in a family of sailors, the ocean and the sailors were a recurrent theme in his work.

Brandão finished his secondary studies in 1891. After that, the joined the military academy, where he initiated a long career in the Ministry of War. While working in the ministry, he also worked as a journalist and published several books.

In 1896, Brandão was commissioned in Guimarães, where he would know his future wife. He married in the next year and settled in the city. Despite living in Guimarães, Brandão spent long periods in Lisbon. After retiring from the army, in 1912, Brandão initiated the most productive period of his writing career. He died on December 5, 1930, age 63, after publishing a profuse journalistic and literary work.

Published works:

1890 - Impressões e Paisagens
1896 - História de um Palhaço
1901 - O Padre
1903 - A Farsa
1906 - Os Pobres
1912 - El-Rei Junot
1914 - A Conspiração de 1817
1917 - Húmus (1917)
1919 - Memórias (vol. I)
1923 - Teatro
1923 - Os Pescadores
1925 - Memórias (vol. II)
1926 - As Ilhas Desconhecidas
1926 - A Morte do Palhaço e o Mistério da Árvore
1927 - Jesus Cristo em Lisboa, with Teixeira de Pascoaes
1929 - O Avejão
1930 - Portugal Pequenino, with Maria Angelina Brandão
1931 - O Pobre de Pedir
1933 - Vale de Josafat

Source: http://en.wikipedia.org/wiki/Raul_Bra...

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52 (6%)
1 star
25 (3%)
Displaying 1 - 30 of 93 reviews
Profile Image for Joana.
45 reviews18 followers
August 12, 2017
Custou ler porque foi ao âmago do meu ser. Fica a citação que declamei em voz alta, quando me perguntaram que tipo de livro era este:
"Eterna contradição de todo o meu ser. Não sabes o que queres nem como queres. Não sabes no que crês nem no que não crês. És um impulso. Vais até à cova levado por todos os ventos, sempre a barafustar sem sentido. Explicas tudo, ignoras tudo, adivinhas tudo. És um mar de Inverno num dia de Verão."
Profile Image for Ana.
690 reviews103 followers
January 6, 2023
Não me lembro onde li, nem quem foi que disse, que se este livro fosse um quadro, era O Grito, de Munch, mas a comparação parece-me bastante acertada. Não é, portanto, uma leitura ligeira nem reconfortante, mas os livros também não se querem todos ligeiros nem reconfortantes.

Estranhamente, apesar do ambiente de quase horror, de não haver propriamente um enredo nem uma história, e de ter sentido um certo alívio quando cheguei ao fim, frequentemente dei comigo a ter vontade de pegar no livro e a ter alguma dificuldade em o pousar.

Não foi uma leitura agradável, e tenho noção que não entendi tudo o que li, mas ainda assim, sinto-me satisfeita por ter lido este livro.
Profile Image for Maria Ferreira.
220 reviews40 followers
December 29, 2020
“Ahhh, se Brandão tivesse escrito em inglês, estaria agora na lista dos grandes livros postos à venda.” Não tenho a menor dúvida.
Fonte: https://observador.pt/especiais/obra-...

Raul Brandão (1867-1930) foi detentor de uma alma inquieta.
Jornalista, dramaturgo, romancista, pintor.

Húmus é um diário, onde o autor vai escrevendo os seus pensamentos.
Tem apenas uma única pseudo-personagem, Joana, que simboliza a origem da vida e o pouco que a vida tem de belo.
O homem nasce e morre, e durante a sua curta existência , é escravidão, é fome, é doença física e psicológica. A morte está presente em todas as casas, em todos os lugares, e afeta todos: homens, mulheres e crianças.

Está claro hoje como no passado que o sol não nasce para todos, quem nasce rico é rico, quem nasce pobre é toda a vida pobre, tal como refere Sérgio Trefaut, http://www.cinept.ubi.pt/pt/pessoa/21..., no seu mais recente filme Raiva. https://www.youtube.com/watch?v=tt7Kn....

Raul Brandão era um homem abastado, convivia bem com a sua classe, com os intelectuais e académicos. Crente em Deus, mas pouco crente na humanidade.

Brandão mostra-nos a hipocrisia do ser humano, a arrogância, a avareza, a corrupção que nos conduz de ânimo leve à aceitação da escravidão do homem pelo homem.
Escrito há 100 anos, é impressionante como continua atual.
Profile Image for Luís.
2,081 reviews865 followers
May 1, 2023
In this work, Raul Brandão made the best example that captured the smallness of human existence, praising the tragedy that characterized the city's arrival in his dream and resorting to processes of deconstruction of narrative time to perceive this frustrating intention better.
Profile Image for tiago..
372 reviews128 followers
September 30, 2022
É a segunda vez que leio este livro. Renovo e fortaleço a minha impressão inicial: nunca li obra que se comparasse a esta. É sem dúvida alguma e até hoje o livro mais impactante que já li na minha vida.

Húmus é, como aliás várias das obras de Raul Brandão, difícil de descrever. Talvez a melhor forma de o fazer seria chamar-lhe um "diário da hipocrisia humana". Brandão explora a absurda opressividade das normas e convenções sociais, impostas numa sociedade impotente pelo peso dos mortos que antes dela vieram. Os mortos, sempre os mortos que pesam como uma sombra opressiva. Quando a ilusão da religião é arrancada dos olhos dos homens, uma espécie de revolução se opera: são os mortos que voltam à vida, são as lúgubres personagens que habitam a vila que se apercebem que dedicaram toda a sua vida à ninharia; e o sonho ali tão perto, ao alcance das mãos: "Pressinto uma vida oculta, a questão é fazê-la vir à supuração." O livro acaba em apoteose, numa revolução coletiva do espírito humano, a "revolução dos desgraçados" que já tinha previsto em El-Rei Junot , em que a convenção é atirada pela janela fora e uma só palavra vive nas bocas da gente: Viver. Palavras realmente não fazem justiça a esta obra-prima: inquietante, assombrosa, transformante, mas, sobretudo, bela.

Não é de forma alguma literatura leve - é um livro para ser lido com calma, umas quantas páginas por dia, para absorver bem tudo o que o escritor tem para dizer. Um livro para ler e reler várias vezes, até espremer todo o sumo que tenha para dar.
Profile Image for Dário Moreira.
72 reviews16 followers
March 12, 2020
"Que outra coisa fizeste na vida senão esperar a morte? É a tua maior preocupação. Debalde a arredamos: a vida não é senão uma constante absorção na morte. Então para que nasci? Para ver isto e nunca mais ver isto? Para adivinhar um sonho maior e nunca mais sonhar? Para pressentir o mistério e não desvendar o mistério? Levo dias, levo noites a habituar-me a esta ideia e não posso. Tenho-te aqui a meu lado. Nunca se cerra de todo a porta do sepulcro. Estou nas tuas mãos... Adeus sol que não te torno a ver, e água que te não torno a ver. Árvores, adeus árvores que minha mãe dispôs; adeus pedra gasta pelos seus passos e que meus passos ajudaram a gastar. Para sempre! para todo o sempre!"

"Toda a gente precisa de qualquer estonteamento para suportar a vida." e "A vida é muito maior pelo sonho do que pela realidade."
Profile Image for Célia | Estante de Livros.
1,148 reviews255 followers
May 24, 2018
Húmus: Camada superior do solo, composta em especial de matéria orgânica, maioritariamente vegetal, decomposta ou em decomposição. [Priberam]

Depois várias tentativas, finalmente decidi como deveria começar a escrever esta opinião. Saber o que é o “húmus” é uma boa forma de começar a compreender do que fala esta obra, que mesmo depois de lida parece deixar a impressão que se trata apenas da ponta do enorme icebergue que se esconde debaixo. Jamais teria a presunção de afirmar que percebi tudo o que Raul Brandão quis expressar em Húmus ou de tentar explicar o impacto e a importância deste livro na literatura portuguesa, portanto vou limitar-me a tentar transmitir-vos como foi a minha experiência de leitura.

Húmus não é um livro que se preste a uma leitura fácil e rápida. Várias foram as vezes em que voltei atrás e reli algumas passagens, na tentativa de perceber o seu significado. Não é que o português seja demasiado complexo, mas o facto de grande parte do livro ser escrito num estilo de fluxo de consciência profundamente filosófico e existencialista, sem que exista propriamente um enredo, torna-o um desafio acrescido.

Para mim, foi isso que Húmus foi: um enorme desafio. Comecei a lê-lo com toda a vontade, mas tive de o deixar repousar durante uns dias antes de voltar a imergir no húmus que, no final de contas, é aquilo em que todos nos transformaremos. Raul Brandão torna a morte e o fim de tudo numa completa obsessão delirante. Este texto tem tanto de passagens belíssimas como de devaneios quase incompreensíveis e desesperantes, mas que, no final de contas, acabam por formar um todo de incontáveis e ricas camadas.

Finda a leitura, sinto-me mais rica. Porque li, porque aprendi, porque conheci. Porque me fez refletir sobre o sentido da vida, o que me parece ter sido o objetivo último de Raul Brandão. No final, ficou a certeza que quero continuar a explorar a sua obra. Não para já, mas um dia certamente.

Uma vida resume-se em duas linhas, sintetiza-se em dois ou três factos. Se a vida fosse só isso não valia a pena vivê-la. A vida é muito maior pelo sonho do que pela realidade. Pelo que suspeitamos do que pelo que conhecemos. Se nos contentamos com a superfície, não há nada mais estúpido — se nos quedamos a contemplá-la faz tonturas. É por isso que eu teimo que a Morte não tem só cinco letras, mas o mais belo, o mais tremendo, o mais profundo dos mistérios. Prepara-te.
Profile Image for David.
1,522 reviews
November 5, 2021
Do you remember that profound statement, “life is nasty, brutish and short” by the English philosopher Thomas Hobbes? In this case, “life in a Portuguese village is nasty, brutish, and very existential.” Let me elaborate.

Published in 1917, Raul Brandão wrote what could possible called a masterpiece. His contemporaries would be Fernando Pessoa, his compatriot, but also James Joyce, Virginia Woolf and T.S. Eliot. Very good company.

We all know the famous painting, The Scream by Edward Munch. Brandão states it, “O mundo é um grito (the world is a scream). I thought of this painting immediately. In fact there are several references to the bridge. Did he see this painting? Is the book about the painting? I would have to dig deeper.

At face value, this is just the diary of a man having an existential angst about his world around him. Poverty fills his day. The boredom of same things happen every day. He questions god, religion, the people, the village. Life, death, man, woman are all caught up in this lament. Is he mad? What drives him to these philosophical rants?

There are some brutal honest talk here.

“Todo o homem é uma série de fantasmas e passa a vida a arredá-los.” (Every man is a series of ghosts and he passes through life deflecting them).

“Deus é eterno com a máscara sempre renovada.” (God is eternal with a a mask always renewed)

“O mundo é feito de dor — a vida é feita de ternura.” (The world is made of grief; life is made of affection).

“O muro não existe — derrubaram o muro” (The wall doesn’t exist - tear it down). Hmm, was Roger Waters inspired?

“Todos nós somos árvores” (we are all trees) environmental niceties.

“Os mortos é que estão vivos! os mortos é que estão vivos!” (The dead are those alive; the dead are those alive) yes I wonder about this a lot!

“Os maiores dramas passam-se porém no silêncio.” (The major dramas pass, in silence)

Enough. There is a thread of balance throughout his year long diary. So he screams, the angst gets out, he questions everything and perhaps, (no give away) resolves things in a most ambiguous manner.

This book is very good. Some will just hate it. I thought I was losing it at times. It reflects the times. The world entering the twentieth century. This would be a bitter pill after Proust. If he could even know what was in store for him (good and bad). Brandão died in 1930.

Yes maybe this needs to be added in with those other great writers of their day.

I quite enjoyed the apropos image, “Das Schweigen (keep quiet)” by Johann Heinrich Füssli.
Profile Image for Rita.
705 reviews139 followers
January 9, 2023
Apesar de possuir o formato de diário descontínuo, datado quase mês a mês, Húmus é, sobretudo, uma obra de ficção. Um romance que mistura uma prosa poética e experiências com a linguagem. Ambientado no modorrento cenário de uma vila, Húmus relata o quotidiano desse lugar e é dessa forma que nos leva a uma reflexão metafísica sobre os insolúveis enigmas que cercam a existência humana.

É um livro lento, pesado, profundo, depressivo, angustiante e sem esperança. Mesmo lendo pouco de cada vez voltou a deixar-me exausta.

E todos os dias acordamos mais velhos, todos os dias acordamos mais inúteis. Todos os dias acordamos com mais fel. E todos os dias com mesuras, sem gritos de terror, nos curvamos sobre esta mesa de jogo, não vendo, fingindo que não existe, o espanto que está ao nosso lado, e o espanto pior que trazemos connosco. Chama-se a isto o quotidiano. Isto não tem importância nenhuma. Com isto enchemos a vida até chegar a morte. Esta mesa de jogo é a nossa existência vulgar, a vida de todos os dias, com o galope da outra vida ao lado. Não se passa nada! Não se passa nada! No Verão o calor sufoca, de Inverno a mesma nuvem impregna o granito, e apega-se, amolece, dissolve pilares das janelas, casebres e a oliveira da praça, só tronco e duas folhinhas cinzentas. Em volta um círculo de montanhas, descarnadas e atentas, espera a tragédia — e as montanhas não desistem. De quando em quando, na solidão que à noite redobra, caem do alto da Sé as badaladas, uma a uma, pausa a pausa. O som tem um peso desconforme.

Estamos aqui todos à espera da morte! estamos aqui todos à espera da morte!

[A Vila]


Na realidade isto é como Pompeia um vasto sepulcro: aqui se enterram todos os nossos sonhos…
[A Vila]


(...) trabalho persistente do caruncho que rói há séculos na madeira e nas almas
[A Vila]

Debaixo destes tectos, entre cada quatro paredes, cada um procura reduzir a vida a uma insignificância.(.) edificar um muro feito de pequenas coisas diante da vida. Tapá-la, escondê-la, esquecê-la. O sino toca a finados, já ninguém ouve o som a finados. A morte reduz-se a uma cerimónia, em que a gente se veste de luto e deixa cartões de visita.
[A Vila]

- A alma - diz ele - ao contrário do que tu supões, a alma é exterior: envolve e impregna o corpo como um fluido envolve a matéria. Em certos homens a alma chega a ser visível, a atmosfera que os rodeia toma cor. Há seres cuja alma é uma contínua exalação.
[O Sonho]

E o que me resta nas mãos inermes, nas mãos para que olho com espanto e terror, nas mãos de velho, senão grotesco, farrapos de grotesco, restos de grotesco, com alguma tinta em cima?... Não; viver é que é bom, viver com o instinto, como os ladrões e os bichos, os malfeitores e as feras, sem pensar, sem sonhar, sem palavras nem leis, até cair a um canto, morto e feliz, de barriga para o ar. Isso sim! isso sim!...
[O Sonho]

O tabique caiu, e contemplo a vida. Mas entre mim e mim interpõe-se um muro. O drama não tem personagens nem gestos, nem regras, nem leis. Não tem acção. Passa-se no silêncio, despercebido, entre mim e mim. É um debate perpétuo.
[Atrás do Muro]

Não existindo tu, consciência, o que tu te intrometes na minha vida! E tanto faz analisar-te, discutir-te, negar-te, incomodas-me sempre. Estás morta - estás viva. Na cova hei-de chorar inultimente por te ter obedecido. Hei-de revolver-me com desespero, por teres conseguido amolgar-me e amesquinhar-me. Por mais que queira fazer-me de ti, tu impões-te-me. Quando te julgo aniquilada, aí começas a falar outra vez.
[Atrás do Muro]

É que a morte regula a vida. Está sempre ao nosso lado, exerce uma influência oculta em todas as nossas acções. Entranha-se de tal maneira na existência, que é metade do nosso ser. Incerteza, dúvida, remorso... Nunca se cerra de todo a porta do sepulcro, sentimos-lhe sempre o frio.
[A Vila e o Sonho]

Eu não sei quem sou e até o meu metal de voz estranho. Eu não sou quem falo. A meu lado, atrás de mim, vem um cortejo de fantasmas, uma cauda disforme que me conduz e empurra, e adiante de mim há uma projecção de vida até aos confins dos séculos.
[A Vila e o Sonho]

— Estou farta, senhor padre Ananias! Estou farta de o aturar a si, de aturar os outros, e de me aturar principalmente a mim mesma!
[A Vila e o Sonho]

Por trás do muro é que está a paixão, o crime, o desespero e a vida esplêndida e feroz
[O Sonho em Marcha]

A terra gorda e remexida, todo o planeta que não pode com o peso dos mortos, se revolve até às raízes. Poeira doirada misturou-se a este húmus que estremece é acorda para realizar outra vida a que nunca se atreveram, para pôr em prática o sonho dos vivos e dos mortos.
[Fevereiro]

O tempo era limitado, a paciência pegajosa, o gesto lento. Agora que a vida dura séculos ninguém espera um minuto.
[Outra Vila]

Acuso-te de teres comprometido a minha situação no universo. Acuso-te de não me deixares ser infame. Acuso-te de me dares o remorso. Acuso-te de impedires o instinto. Acuso-te de teres transformado a vida e criado a consciência. Acuso-te de me deixares sozinho com este peso em cima, com a ideia da vida e com a ideia da morte. Acuso-te de me levares para um calvário como o teu, para me tornares grotesco, e de me colocares em frente de ideias com que não posso arcar. Acuso-te de não poder mais, e de me instigares a mais ainda. De me obrigares a olhar cara a cara o assombro que não existe; a morte que não existe; a consciência que não existe. Subverteste o mundo. Forçaste-me a criar outro mundo, a olhar para cima e a clamar no vácuo. Acuso-te de não me deixares atascar à minha vontade em lodo, de não me deixares mentir, matar, chafurdar. Acuso-te de me impelires para cima, quando a minha vontade era ir para o fundo. Acuso-te de não me deixares ser bicho.
[Deus]

(…) de que nos servem estas palavras? É preciso criar outras, empregar outras, obscuras, terríveis, em carne viva, que traduzam a cólera, o instinto e o espanto.
[Céu e Inferno]


#incunábulos @mastodon
Profile Image for Paulo Rodrigues.
215 reviews13 followers
March 8, 2023
"Agora só eu mando. A vida vou julgá-la com os meus próprios olhos. Vou tomar fôlego, vou tomar peso à vida. Sei-a de cor e salteado. Sei o que valem os preconceitos, as ilusões e as palavras — sei o que vale o dinheiro. Não torno a ser iludido.
A vida é um combate, que só se vence pela bajulação, pela manha ou pela audácia — todos os meios são bons. Os escrúpulos não servem para nada, a convenção tolhe-nos os braços. Meia dúzia de regras afiadas bastam. Honestidade  para que confiem em nós — piedade a bastante para que não nos assaltem os cofres. Fora disto logro.
Se tenho forças uso-as.
A vida nestas bases é talvez monstruosa, mas não posso modificá-las. Aproveito-as. Tiro da vida o que ela me pode dar. Com ilusões podia-se ser pobre — sem ilusões só se pode ser rico."

Este clássico de Raul Brandão, é um retrato melancólico da vida.
Centrado numa vila imaginária ou não, 
o escritor vai-nos apresentando a vida de várias personagens peculiares onde reconhecemos  um vizinho, familiar, amigo ou conhecido . Húmus nasce em plena primeira guerra mundial e isso percebe-se em cada linha escrita, onde as injustiças as invejas as diferenças sociais estão expostas ora com humor ora com a crueldade certa, cada frase tem o número certo de palavras nem mais nem menos, uma beleza e acertividade que fará corar de vergonha  muita gente que hoje tem o despudor de  se assinar como escritor(a).
Um clássico intemporal deste grande escritor de seu nome Raul Brandão
Profile Image for Ana.
230 reviews87 followers
November 24, 2017
Húmus é considerado a obra-prima de Raul Brandão e um dos marcos da literatura portuguesa. É uma obra que patenteia uma atmosfera melancólica, decadentista e obsessiva, que versa a busca do sentido da existência, a condição humana, a obsessão com a morte e a existência ou não de Deus. A obra, um extenso monólogo, que assume um carácter marcadamente reflexivo, sem enredo e sem personagens na acepção padrão do termo, é construída sob a forma de entradas de um diário arrumadas em capítulos, cuja ordem de leitura senti poder ser aleatória, uma vez que é dessa forma que os pensamentos parecem passar para o papel.

Achei uma leitura difícil, que me exigiu bastante concentração para uma compreensão adequada (mesmo assim estou certa de que bastante me escapou). Por vezes também me entediou um pouco pela repetitividade das várias questões versadas, quase a roçar o neurótico. Apesar dos excelentes pedaços de prosa, não foi uma leitura que no global me encantasse (muito provavelmente por limitação minha), embora também não tenha desgostado. Estou certa de que esta é uma obra que requer um momento e um estado de espírito próprios para ser completamente absorvida e apreciada.

Excerto:

Não me compreendo nem compreendo os outros. Tudo me parece inútil, e agarro-me com desespero a um fio de vida, como um náufrago a um pedaço de tábua.
Nem sei o que é a vida. Chamo vida ao espanto. Chamo vida a esta saudade, a esta dor; chamo vida e morte a este cataclismo. É a imensidade e um nada que me absorve; é uma queda imensa e infinita, onde disponho de um único momento.
Talvez o mundo não exista, talvez tudo no mundo sejam expressões da minha própria alma. Faço parte de uma coisa dolorosa, que totalmente desconheço, e que tem nervos ligados aos meus nervos, dor ligada à minha dor, consciência ligada à minha consciência.

(p. 209)
Profile Image for Paulo Hora.
42 reviews11 followers
September 25, 2015
Como estou desgastado no final desta leitura, vou apenas resumir o livro numa frase: uma escrita alucinante, recheada de várias passagens preciosas e com um final apoteótico.
Profile Image for Sara Jesus.
1,323 reviews103 followers
July 21, 2018
É um diário e um conjunto de reflexões.
Aborda a vida, a morte, a arte e Deus.
São principalmente as reflexões sobre Deus que tornam este livro uma obra prima.
Profile Image for André Carreira.
24 reviews25 followers
May 31, 2016
"Há no mundo uma falha. Os poentes são labaredas roxas com resquícios de escarlate e dois, três grandes jactos violetas que se espalham pelo céu--uma maravilha quimérica. A outra primavera prolonga-se: superabundância de flores nas árvores, espiritualidade na matéria, como se as árvores antes de morrer se esgotassem em sonho."

O livro é extenuante até dizer chega; se não o fosse, seria uma obra-prima. Repetição atrás de repetição atrás de repetição, ad nauseum, e morte e morte e mais morte: atrás das velhas há ainda outra coisa e atrás dessa coisa está ainda outra coisa mais velha que as velhas que é a morte. Vamos morrer, vamos morrer!
Já entendi. Quem te lê não é surdo, Brandão--a tua monomania merece um descanso. Acalma-te, homem. Respira.

As repetições atropelam-se e o ritmo frenético que as tuas palavras assumem retira todo o prazer de as ler; enfastia. Como cada frase pretende ser mais incisiva que a outra chega-se a um ponto em que se tornam todas vazias. A subtileza é uma arte.
Por vezes, Brandão esquece-se da morte, e aí a sua escrita é linda. Ganha tonalidades além do cinzento.

Filosoficamente estaria obrigado a ceder pelo menos quatro estrelas a Humús. Acerta no alvo: o que é que acontece quando a máscara cai por terra? não haverá sempre outra máscara por detrás? O que fazemos da nossa vida se nunca morrermos? não será o esforço uma tentativa de fuga à morte?.. Literáriamente, não consigo justificar-me se lhe der mais que três. Destaca-se de dentro do leque de personagens que não têm história além da rotina tépida a que Raúl as submete uma única que se desenvolve: Joana. Todas as outras jogam com o que podem; com a ausência de um inferno que as constrinja reina a Vontade de Poder, tão querida a Nietszche--e mesmo aí, são constrangidas pela decisão do autor de as pôr a lamuriar a vida que não aproveitaram.

"Todos os heróis são mártires, todos os santos foram iludidos até à morte."

Perto do final, parece-me que o autor toma outra posição filosófica--a espiritualidade do homem e a compaixão são a expressão humana de Deus, "...e o erro provém de que reduzimos a vida espiritual ao mínimo, e a vida material ao máximo."

Por muito que o livro seja intelectualmente brilhante, foi-me um peso lê-lo. Talvez gostasse mais da escrita de Brandão não se este não se tivesse concentrado apenas no âmago, na essência asfixiante do que motiva e move as pessoas. 6/10.
Profile Image for Valdemar Gomes.
256 reviews36 followers
October 2, 2020
Uma densidade filosófica que convida o Nietzsche, o Sartre e o Camus a sentarem-se.

Numa mundo narrativo bem próximo d'A Farsa, igualmente na temática, acaba por fazer adicionar uma perspectiva interessante, a da guerra e a quebra do quotidiano.

Às vezes aborrecido ou pesado o tema repetitivo, mas também isto é um recurso estilístico para ficarmos imersos na mundana repetição e expectativa de uma riqueza que nunca (?) chega. A riqueza em si é usada como tapete motivacional para viver que, tirando ela, esconde um buraco existencialista que chega a abanar as fundações divinas e da justificação de classes.

Uma escrita sombria, irónica e sádica.
This entire review has been hidden because of spoilers.
Profile Image for Ricardo Alves.
99 reviews16 followers
August 25, 2014
Dizer que o Húmus (1917) é um livro único e ser único Raul Brandão na nossa literatura é uma banalidade que, por sê-lo, não deixa de ser verdadeira. Todos os livros que li dele são enormes, à imagem da grande estatura e da densidade do seu autor.
«A vila», o microcosmos que é o mundo, a vida que se nos escapa por entre as mãos, enquanto vivemos ninharias, enquanto alguns de nós a vêem fugir como numa peneira e a maioria, tendo essa percepção instintiva e animal, nem pensa nisso, entregando a insignificância da sua passagem pela existência à ganância, à convenção, à emulação até à cova de um cemitério.
A vida é demasiado grande e nós incompatíveis com essa grandeza. «Ouço sempre o mesmo ruído de morte que devagar rói e persiste...» E onde estão as Teles e as Sousas, que se odeiam, as Fonsecas e as Albergarias, Donas Engrácia e Biblioteca, Restituta e Procópia, o Elias de Melo e o Melias de Melo, podemos substituir os seus nomes pelos da maior parte de nós. «O nada a espera e a D. Procópia a abrir a boca com sono, como se não tivesse diante de si a eternidade para dormir». E ainda os outros, paisagem como o Gabiru ou adereços como a criada Joana, vivendo a vida dos outros, como se para outra coisa não tivesse vindo ao mundo: «Sempre a comparei à macieira do quintal: é inocente e útil e não ocupa lugar, e não vem Inverno que não dê ternura, nem Inverno sem produzir maçãs.»
O Raul Brandão é isto: ternura e lágrimas.
September 4, 2022
Não só os sentimentos criam palavras, também as palavras criam sentimentos. As palavras formam uma arquitectura de ferro. São a vida e quase toda a nossa vida - a razão e a essência desta barafunda. É com palavras que construímos o mundo. É com palavras que os mortos se nos impõem. É com palavras, que são apenas sons, que tudo edificamos na vida. (p. 159)
Profile Image for Smirlah.
16 reviews
June 10, 2011
A verdade é que não passei da página 38... Estas lamurias e divagações não são para mim; húmus já eu tenho suficiente na minha vida.
Profile Image for mariana.
170 reviews
September 3, 2020
Como descrever Húmus?... Tentarei fazê-lo, embora tema que vá falhar.

Húmus é o purgatório da Humanidade. É um livro sobre a incerteza, a hipocrisia, a ausência de valores, a insignificância e a grandeza, o ilusório, a finitude e o infinito; sobre o que de mais antagónico há no ser humano. É o livro da descrença, do anti-dogmatismo.

Em Húmus, tudo é consciência - demasiada consciência. Em Húmus, tudo é questionado (e ainda bem).

Terei de o reler, pois esta é uma obra que merece várias releituras e que pede calma e tranquilidade no espírito do leitor.
Profile Image for Sofia.
Author 4 books129 followers
February 9, 2011
Posted on my book blog.

"Húmus" is a monologue / diary about the emptiness of life, the misery of the human condition, and the grotesqueness of the hidden lives everyone leads.

This was the first book I read by Portuguese writer Raul Brandão. As a classic, it would have benefited from some kind of introduction or background - as it was, without a context, I had a harder time getting into it.

It was very well written, with a few beautiful passages, but I found it rather repetitive and self-pitying. Not really my cup of tea.
Profile Image for Paula M..
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September 29, 2019
A morte ... a morte ... e quase sempre a morte . A morte com deus , a morte sem ele . Um lugarejo pouco nítido e uns personagens quase fantasmagóricos ...
Um tormento.
Profile Image for Inês .
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October 10, 2020
"Os túmulos estão gastos d'um lado pelos passos dos vivos e do outro pelo esforço dos mortos."

Numa escrita agonizante que berra e uiva, "Húmus" espelha e acusa o leitor nos seus vícios, caprichos e inércias num caos contínuo que tem tanto de claustrofóbico como de acolhedor.
Profile Image for Inês Monteiro.
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March 3, 2021
Comecei por achar este livro uma obra-prima perdida na selecção temporal literária que confere longevidade a apenas alguns textos. No entanto, à medida que avançava nas páginas, fui-me desapaixonando. Não há dúvida de que Raúl Brandão possui uma escrita lírica, bela e arrebatadora em certos momentos, mas não estou certa que funcione em prosa. Fica sempre a meio caminho de uma coisa e de outra. Torna-se repetitiva nas formas e nas temáticas, ao ponto de se tornar num livro com uma enorme carga depressiva. Sublinhei muitas reflexões e passagens interessantes às quais gostaria de um dia voltar, mas não tenho desejo de voltar a ler a obra na íntegra. Falta-lhe algo, sem dúvida. Para começar, uma nota introdutória ou um prefácio. Esta edição teria muito a ganhar com umas palavras iniciais de um estudo sobre 'Húmus'.
Não sei como classificar este livro, mas sei que não é algo que vá agradar a qualquer leitor.
1 review1 follower
April 1, 2018
Um quadro expressionista escrito em português. Talvez por isso nunca tenha virado moda, nem sido comentado pelos meios de comunicação social.
A vida, em Húmus, projeta-se através e desenrolsa-se ao ritmo das estações, numa viagem ao cosmos que se assemelha ao Livro do Desassossego de Pessoa, pela abordagem ao drama quotidiano, dos Homens, face à vida absurda que passa a correr.
Profile Image for Artur Coelho.
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September 11, 2022
Um livro no cruzamento entre o romantismo decadente e o modernismo. Descobrimos uma vila e os seus habitante, sob o ponto de vista de um narrador que só se dá a conhecer por uma espécie de alter-ego malévolo. Mas não se trata aqui de uma história de narrativas lineares, antes, a obra é uma sucessão de impressões cerradas, pensamentos dispersos, tentativas introspetivas de descrever a vinda interior de personagens fugazes.

É um livro amargo, expressionista, com uma prosa fortíssima. É, também, sensualista, o foco narrativo não está em factos ou histórias, mas sim em impressões, no transmitir de sensações, intuições. Percebe-se que a prosa tenta mostrar o processo de pensamento a formar-se, com ideias por vezes incómodas, outras fatalistas, a sucederem-se de formas nem sempre lógicas.
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