REVOLUÇÃO E CONTRA-REVOLUÇÃO NA PALESTINA
Da Partilha Imperialista à Vitória do Hamas
Osvaldo Coggiola
Índice
1. Antecedentes históricos, 3
2. Surgimento do movimento nacional palestino, 26
3. Resistência nacional e guerras de ocupação, 41
4. Do “Mapa da Estrada” ao Muro da Vergonha, 53
5. Os EUA e a guerra contra o Iraque, 67
6. Acordos e Terceira Intifada, 79
7. De Sharon ao Hamas, 88
Cronologia, 106
Bibliografia, 109
1. ANTECEDENTES HISTÓRICOS
Desde 1990, ano da primeira Guerra do Golfo, os EUA embarcaram em uma série de aventuras
militares no assim chamado “tabuleiro euro-asiático”, definido como o corpo geopolítico do
planeta, com centro político-militar no Oriente Médio.
No quadro da crise galopante da ex URSS (que seria dissolvida em 1991) e do chamado “bloco
socialista”, o poder americano buscava garantir uma série de objetivos, mais ou menos definidos
pelos seus gurus geopolíticos que, a exemplo de Samuel Huntington ou Zbigniew Brzezinski,
pouco se caracterizam pela profundidade de pensamento: a) Conquistar uma posição hegemônica
no processo de restauração capitalista, na ex URSS, na Europa do Leste e na China (The
Economist, de Londres, chegou a afirmar, em 1999, que o alvo final de uma operação no Oriente
Médio seria a China); b) Controlar, ou acentuar seu controle, das rotas estratégicas de
fornecimento de recursos energéticos (petróleo e gás, principalmente) para todo o planeta - e, em
primeiro lugar, para Europa e Japão – a partir dos principais países produtores, situados no
Oriente Médio; c) Impor seu controle sobre a explosiva situação do Oriente Médio, isolando e
condicionando, especialmente, o regime surgido no Irã com a “revolução islâmica” de finais da
década de 1970; d) Influenciar e tutelar o processo de expansão da União Européia, em direção
do Leste europeu e, em especial, da Ásia Menor (ou seja, da Turquia, pais muçulmano de 70
milhões de habitantes); e) Disciplinar o conjunto das potências capitalistas, em especial suas
concorrentes “Europa” e Japão, através da chantagem militar, impondo uma posição militar
dominante dos EUA nos pontos estratégicos do globo.
A primeira Guerra do Golfo tomou como pretexto a luta pela derrubada da ditadura de Saddam
Hussein e a defesa da soberania nacional do Kuwait, invadido pelo Iraque (que, historicamente,
sempre considerou o território do emir Jaber al Ahmed al Sabah como a 19a província do Iraque).
O pretexto não resistia a menor análise, toda vez que o regime do açougueiro de Bagdá era a
própria criatura do imperialismo norte-americano (o próprio Saddam Hussein era denunciado
como agente da CIA pelos movimentos nacionalistas e da esquerda árabe), e tinha sido
abundantemente armado e usado pelos EUA e a Europa para conter a revolução iraniana, como
fautor da guerra Irã-Iraque da década de 1980 (que deixou milhões de mortos). A “soberania
nacional” do Kuwait não passava de um pretexto cínico, pois o país nunca passou de um enclave
semi-colonial de propriedade familiar, propiciado pelo imperialismo no processo de
descolonização do Oriente Médio, ou seja, carecia e carece dos atributos de um Estado nacional.
Em que pese as derrotas impostas ao exército iraquiano na operação “Tempestade no Deserto”, a
“operação de polícia” de George Bush Sr. culminou num fracasso estratégico, pois o regime de
Saddam se manteve em pé, e se transformou num fator de desestabilização de toda a região do
Golfo Pérsico, ao mesmo tempo em que ele era desestabilizado pelo ressurgimento do
movimento nacional curdo, também atuante na Síria, no Irã e na Turquia, países em que se
divide a população desta “nação sem Estado”. O apoio dado a Israel para arrasar o movimento
nacional palestino, em qualquer país do Oriente Médio em que atuasse, fracassou rotundamente,
pois a guerra foi o marco da radicalização palestina e do nascimento da segunda Intifada.
A imposição de uma zona de exclusão aérea e o bloqueio militar, econômico e comercial
imposto ao Iraque (que produziu centenas de milhares de mortos, especialmente crianças, num
Iraque privado do acesso a medicamentos e gêneros essenciais) se transformou num fator de
mobilização da opinião pública mundial, sobretudo nas próprias metrópoles imperialistas, contra
a belicosidade ianque.
Guerra Infinita e Crise Mundial
A primeira Guerra do Golfo foi concebida, como dito, como uma operação de polícia
internacional, teve cobertura legal
______________________________________________________________________________
____________________________________________da ONU, e se apoiou num amplo leque de
alianças com o conjunto das potências capitalistas e com as burocracias “socialistas” contrarevolucionárias. A segunda, encabeçada pelo governo de George Bush Jr., foi concebida – depois
dos nunca esclarecidos atentados de 11 de setembro de 2001 –[1] como um degrau de uma
estratégica “guerra infinita” contra o terrorismo. No governo de George W.Bush, foi emitida a
Diretiva Presidencial nº 17 sobre Segurança Nacional, na qual os EUA assumiram, oficialmente,
o direito do “ataque preventivo”. Os EUA passaram a ter o direito “legal” auto-atribuído de
lançar mão de todos os meios necessários, os nucleares inclusive, para esse tipo de ataque.
A dita “guerra infinita” se apoiou numa aliança aos frangalhos com regimes direitistas da Europa
(Blair e Berlusconi), eles também em completa crise política, e com alguns regimes fantoches do
outrora chamado Terceiro Mundo. Quanto à ONU, ela foi reduzida, na melhor das hipóteses, a
um organismo impotente, e na pior (mais realista) a uma caixa de registros (às vezes com algum
protesto) das investidas militares do imperialismo anglo-ianque em qualquer ponto do planeta.
Segundo David Ignatius, “o famoso comentário feito por John Maynard Keynes, de que os
economistas deveriam deixar de se preocupar tanto com o que acontecerá a longo prazo, porque
a longo prazo estaremos todos mortos, não parece tão engraçado nos dias atuais. Mas, quando
pensamos nos efeitos econômicos do episódio de 11 de setembro, é importante distinguir entre os
efeitos de curto prazo – que foram devastadores – e as conseqüências a prazo mais longo, que
podem ser bem diferentes. Muitos comentaristas expressaram o receio de que o episódio de 11 de
setembro lance a instável economia global na recessão. Isso poderá ser verdade, a curto prazo.
Mas não creio que essa psicologia deflacionária perdure – pela simples razão de que não há meio
de os Estados Unidos e seus aliados saírem dessa confusão sem gastar muito dinheiro. A
começar pelo pacote de estímulo da administração Bush, de reduções de impostos e novos
gastos, que injetará até US$130 bilhões de dólares na economia no próximo ano. Acrescente-se a
isso o custo da própria guerra, que, segundo o presidente Bush, poderá durar anos e levar ao
deslocamento de tropas americanas para os mais diversos pontos do mundo. Acrescentem-se os
bilhões de dólares que serão gastos com novas tecnologias destinadas a defender um público
amedrontado do antraz e de outros horrores terroristas. Todos esses custos atingirão uma soma
elevadíssima. Em outras palavras, guerras custam dinheiro. E a história nos ensina que as guerras
tendem a ser inflacionárias e não deflacionárias. A longo prazo (com pedidos de desculpas a
Keynes), um mundo mais seguro custará dinheiro: para cobrir o custo de sensores capazes de
detectar a presença de antraz e outros venenos; de remédios para vacinar pessoas contra essas
doenças; de dispositivos de segurança capazes de detectar redes terroristas e ajudar a frustrar
seus planos. E, sim, para cobrir o custo de reconstrução nacional em países como o Afeganistão.
Algumas dessas despesas terão um efeito multiplicador sobre a economia global como um todo.
Afirma-se, com freqüência, que a 2a Guerra Mundial pôs fim à grande depressão da década de
30. A única boa ação de Osama bin Laden poderia consistir no fato de ter colocado em ação as
forças que porão fim ao grande colapso econômico de 2001”.[2]
As vitórias militares e o impressionante arsenal bélico posto em ação entre 1990 e 2005, não
conseguiram nem conseguem ocultar o panorama desolador da estratégia político-militar dos
EUA no Oriente Médio e na Ásia Central. Os regimes impostos (Iraque e Afeganistão) carecem
da mais elementar estabilidade política e até do controle de seu próprio território; o Afeganistão
não virou uma “democracia estável”: continua sendo um narco-Estado com duas ou três cidades
dirigidas militarmente por fantoches norte-americanos, e o resto do país dividido por bandos em
guerra, enquanto a fome e a miséria seguem endêmicos (claro que há uma novidade por lá além
de um boom na produção de ópio: o número bem maior de bases militares dos Estados Unidos ao
longo da rota do oleoduto e das zonas de interesse norte-americano pelo óleo e o gás da Ásia
Central; sem falarmos em novas bases militares ao lado da fronteira chinesa); em vez de um
progressivo isolamento e cooptação do regime iraniano, o contencioso com este se agravou (pela
reabertura de três centrais nucleares, uma delas de enriquecimento de urânio), abrindo-se
também uma frente de sérios choques com os aliados tradicionais dos EUA na região, em
especial a Arábia Saudita (base, afinal de contas, da família Bin Laden, berço suposto do centro
do “terrorismo internacional”); a falaciosa “democracia confessional” do Iraque – organizada
pelos ocupantes, dos quais não passa de uma marionete - se evidencia incapaz de debelar a
resistência armada contra a ocupação imperialista;[3] no centro da crise, na Palestina/Israel, a
situação é de desagregação política; a crise do Oriente Médio se projeta de modo multidirecional como um fator de crise da Ásia Central, da Rússia e das ex repúblicas soviéticas, e, via
Turquia, da própria União Européia.
Analisar a invasão do Iraque como uma operação de conquista do petróleo conduzida por um
poder político vinculado aos negócios do petróleo, e que usa a “ameaça terrorista” como
pretexto, é correto, mas não basta. Que razões levam Bush Jr. a ir mais longe que os anteriores
presidentes dos EUA e a agir em bases políticas tão estreitas, por fora da ONU, numa ação tão
ambiciosa estrategicamente (não somente contra Saddam, mas ameaçando o eixo do mal, que
inclui uma Coréia do Norte que dispõe de bombas nucleares)?
Por que uma economia combalida e sufocada pela maior dívida pública e pelo maior déficit
orçamentário do mundo, se lança a gastar muito mais com a operação de guerra do que os
próprios ganhos que obteria com o petróleo iraquiano?[4] Bush Jr. representa muito mais do que
uma fraude eleitoral (ou um presidente com impulsos belicistas). O Iraque é o alvo do ataque,
mas nem representa todo o alvo, e tampouco é o principal objetivo. As mobilizações mundiais
contra a guerra certamente tem essa consciência: não se trata “apenas” do petróleo, nem das
loucuras do pequeno Bush, nem da defesa, pelos EUA, de qualquer valor moral, civilizatório ou
humano, mas de uma ação macabra de maiores proporções contra a humanidade trabalhadora.
O petróleo não explica tudo, embora explique uma parte importante. Os Estados Unidos vivem
uma crise do petróleo, e marcham para uma escassez dessa matéria-prima no médio prazo. Se
tivessem que depender apenas das suas reservas e da sua produção, seu petróleo acabaria em
pouco menos de dez anos. Os EUA são o maior consumidor mundial de petróleo e, segundo
Bush, “os países que produzem petróleo não gostam dos Estados Unidos”. Metade ou mais do
petróleo consumido pelos Estados Unidos é importado. Como a dependência das demais
potências – a exceção é a Rússia - é ainda maior (Japão, Alemanha, França, Itália dependem em
quase 100% das exportações de óleo e a China é cada vez mais dependente) estamos diante de
uma situação que faz pensar que dominará o mundo quem dominar o petróleo do Oriente Médio.
As reservas internacionais de óleo estão concentradas em quatro áreas: pela ordem, as maiores
reservas estão na Arábia Saudita (onde há relativo controle político americano), no Iraque, na
Venezuela e na Ásia Central (ex-repúblicas soviéticas). As reservas de petróleo do Oriente
Médio chegam a mais de 700 bilhões de barris contra uns 30 bilhões dos Estados Unidos. Com a
queda da URSS, o Oriente Médio e as repúblicas petrolíferas da Ásia Central que pertenceram à
URSS, passaram a ser a jóia mais cobiçada pelos grandes grupos internacionais dos EUA e da
Europa.
Os EUA instalaram bases militares duradouras na Arábia Saudita, Turquia e Catar, como fruto da
primeira guerra contra o Iraque. Antes da Guerra do Golfo, eram 10 as bases americanas na Ásia
Central, agora elas são 22. Também tem a ver com a disputa do óleo o fato de que os Estados
Unidos limitaram, nesses 12 anos, a autoridade política e militar do Iraque justamente ao norte
(curdo) e ao sul (xiíta), através de bombardeios incessantes: ali, ao norte e ao sul, se encontram
as maiores reservas de petróleo do Iraque. Dentro desse quadro, iniciativas como a de converter
divisas de petróleo em euros (decisão tomada no seu momento por Saddam Hussein) certamente
ganharam um significado importante.
E não apenas Saddam: na contramão da tutela que os americanos praticam sobre a Arábia
Saudita (maior reserva mundial de petróleo) e da invasão do Iraque (segunda maior reserva), os
maiores rivais dos EUA na Europa (Alemanha e França) estabeleceram acordos com o Iraque em
torno do petróleo, acertando a compra do óleo em moeda européia (euro) e não mais em dólar, ao
mesmo tempo em que a China e a Rússia também vieram firmando acordos com o Iraque. Ou
seja, as segundas reservas mundiais de óleo, situadas num país onde as empresas dos Estados
Unidos não podiam por os pés, ameaçavam vir a cair em mãos dos rivais econômicos dos
Estados Unidos. E a própria Arábia Saudita – de onde saiu Bin Laden - já não é mais a mesma:
ameaçou aumentar o preço do óleo. Os EUA vinham perdendo o controle do preço do petróleo.
Um estudioso do assunto julgou que “do ponto de vista da ação das transnacionais, o objetivo da
invasão do Iraque seria afastar da região as empresas francesas, russas, chinesas, italianas e
outras, que têm contratos de desenvolvimento no Iraque e no Irã, para que sejam substituídas por
petrolíferas sediadas nos EUA como a Exxon-Mobil, a Chevron-Texaco, a Conoco-Philips, a
Schlumberger ou a Halliburton”.[5] O Secretário de Estado dos EUA, Colin Powell, afirmou
perante a comissão de relações externas do Senado dos EUA (em 6 de fevereiro de 2003) que “o
sucesso da guerra no Iraque poderia fundamentalmente redesenhar a região de uma forma
poderosa e positiva, que fortalecerá os interesses dos EUA”. Ocupando e monopolizando o óleo
iraquiano, os Estados Unidos controlariam, em boa medida, o seu preço mundial, esvaziaram as
pretensões da OPEP (dos venezuelanos, por exemplo) e ainda controlariam de perto e com mais
eficácia, eventuais vôos dos sauditas para fora da órbita dos interesses americanos. Lembrando
também que as ex-repúblicas soviéticas da Ásia Central – cobiçadas pelos Estados Unidos
através da ocupação do Afeganistão – contam com potencial inexplorado de petróleo capaz,
segundo alguns analistas, de uma vez mapeado, superar as reservas do Oriente Médio.
Petróleo e Economia Mundial
O cálculo de alguns analistas é que, se os EUA chegassem a controlar decisivamente o preço
internacional do petróleo – controlando as principais reservas através da invasão do Iraque e
redesenhando politicamente o Oriente Médio e a Ásia Central – poderiam alavancar sua
economia em recessão, tornando-a mais competitiva (o óleo custava 10 dólares o barril ao final
dos anos 90, em 2003 passou dos 30 dólares). Tendo enfraquecido a OPEP, e tendo nas mãos o
preço do barril, poderiam disciplinar economicamente seus rivais mundiais que dependem muito
mais do petróleo que os Estados Unidos (Japão e Alemanha, sobretudo). Além disso, setores da
economia de guerra (o “complexo industrial-militar”) nos EUA imaginaram que um Iraque
ocupado pagaria não apenas parte dos gastos da invasão, como também traria divisas para
empresas norte-americanas que reconstruiriam o país destruído por seus “libertadores”.
A lógica da invasão seria evidente: tudo não passaria de uma operação de rapina, tipicamente
neo-colonial e utilizando os velhos métodos imperialistas, neo-coloniais, só que agora com
canhoneiras mais sofisticadas, as super-bombas, as terríveis bombas de fragmentação e os
projéteis de urânio. A lógica de Bush e dos falcões do Pentágono seria a da força: contando com
superioridade tecnológica e militar incontrastáveis, vão ao campo de batalha resolver seus graves
problemas de óleo. Mas não é só isso o que revela a aparente pouca preocupação dos EUA com o
risco de repúdio e de isolamento político em relação às outras potências.
A questão é que a OPEP e a União Européia adotariam o euro nos seus contratos. Rússia e União
Européia estudam o comércio bilateral em euro, em vez de dólar; Rússia tem 40% do seu
comércio exterior com a Europa, sendo o grosso desse comércio o petróleo (o contencioso russo
com a Ucrânia pôs em evidência a dependência européia). A Rússia e a China converteram, em
2002, boa parte das suas divisas em euro. O Iraque já passara seus petro-dólares para o euro em
novembro do ano 2000. Argélia e Líbia têm planos na mesma direção. O banco central do Irã,
em 2002, já pôs metade das suas reservas em euro. E a Coréia do Norte deixou de usar o dólar
em suas transações exteriores. A Venezuela diversificou as reservas do Banco Central na direção
do euro. A Malásia anunciara sua intenção de adotar o dinar em ouro em vez do dólar.
Mas os EUA, estrategicamente, só sobreviveriam como potência econômica mundial dominante
se debilitassem a zona euro por todos os meios. A “zona euro” já conta com maior participação
no mercado global que os Estados Unidos; a contradição óbvia é que as transações e as divisas
internacionais continuam em sendo feitas em dólar. Daí cresce a pressão sobre a economia norteamericana, cujo peso real global não corresponde à imposição da sua moeda como moeda
internacional. Atualmente, a zona euro converteu-se em maior importador de petróleo do que os
Estados Unidos.
A ação militar dos Estados Unidos no Iraque teve menos a ver com sua força econômica e com
sua potência industrial e comercial, e mais com seu enfraquecimento econômico e com a crise
espetacular dos fundamentos da sua economia, de natureza mundial. A invasão do Iraque foi a
manifestação de uma força militar desigual, consistente em invadir e conquistar um país pobre,
desestruturado, previamente bombardeado por anos, e que mal tinha saído de uma guerra de
quase dez anos contra o Irã, desarmada e esgotada por um bloqueio e confisco econômico de
doze anos patrocinado pela ONU. A ocupação do Iraque tem a ver com o profundo e persistente
impasse da maior economia capitalista do planeta e com sua crise política e histórica.
Como um bumerangue, a própria guerra e ocupação de Iraque se transformaram num fator de
crise econômica, que alimenta de modo direto a crise política nos EUA. Iraque se transformou
num desastre em termos econômicos: a ocupação poderá custar até 30 vezes mais do que o
governo dos EUA inicialmente previu, se as despesas diretas e indiretas ligadas à operação
militar, como o pagamento de pensões para veteranos gravemente feridos ou o aumento do preço
do petróleo, forem levadas em conta. A afirmação, contundente, é do economista Joseph Stiglitz,
professor da Universidade de Columbia, ganhador do Nobel de Economia em 2001, e ex –
diretor do FMI (além de co-autor, com a economista da Universidade de Harvard, Linda Bilmes,
de The Economic Costs of the Iraq War).
Para ambos, o custo total da guerra ao longo do tempo oscilará entre US$ 1,026 trilhão e US$
1,854 trilhão. O governo de George W. Bush estimou, em 2002, um custo de US$ 60 bilhões. O
governo, segundo Stiglitz e Bilmes, só incluiu em sua análise os custos das operações militares e
de reconstrução, mas não os custos orçamentários que não estão incluídos nas operações
militares. Por exemplo, já houve 16 mil militares severamente feridos no Iraque, que terão direito
a atendimento médico e a pensão durante toda a sua vida. E também foram incluídos no novo
cálculo os custos de recrutamento cada vez mais elevados para as Forças Armadas. Não se trata
de um custo operacional, mas é algo diretamente relacionado às dificuldades dos EUA no Iraque.
A segunda categoria diz respeito aos custos não-orçamentários. Se alguém é morto no Iraque, o
custo, de acordo com o orçamento da defesa, é de US$ 500 mil. Entretanto o custo “na
sociedade” é muito mais elevado. A terceira categoria está ligada ao custo macro-econômico da
guerra. Quase todos os economistas concordam que uma parcela significativa do aumento do
preço do petróleo desde a invasão do Iraque tem relação com a guerra. Se estima, portanto, uma
redução do crescimento econômico por conta da guerra do Iraque. Quando todos esses ajustes
são efetuados, não é difícil chegar a um custo que oscila entre US$ 1 trilhão e quase US$ 2
trilhões (lembremos que o PIB da maior economia do planeta é de US$ 11 trilhões, ou seja que
os custos se elevam a algo em torno de 15-18% de toda a economia dos EUA!).[6] A guerra do
Iraque plantou uma bomba de efeito retardado na economia dos EUA.
Acrescentadas as falcatruas comprovadas da Halliburton (empresa a cuja direção pertence o vicepresidente, e verdadeiro “cérebro”, do governo Bush Jr., “Dick” Cheney), e o escândalo das
torturas fotografadas e filmadas de prisioneiros iraquianos (para não falar das torturas e
humilhações sistemáticas aos prisioneiros afegãos na base militar de Guantânamo, a poucas
milhas dos EUA), o escândalo iraquiano passou do estágio de fator de crise da política mundial,
para transformar-se também em fator de crise política interna (depois de ter sido, pretensamente,
o fator que permitiu a re-eleição de Bush) questionando a estabilidade do governo e o próprio
regime político.
A influente advogada, ex deputada do Partido Democrata, Elizabeth Holtzman, atuante no
Comitê de Justiça que encaminhou o impeachment do presidente Richard Nixon, publicou um
artigo em The Nation defendendo abertamente o impeachment de Bush: “Primeiro, não existiam
informações sérias -positivas ou negativas- que sustentassem a alegação do governo quanto aos
contatos entre Saddam Hussein e Al Qaeda. Mesmo assim, o governo repetidamente tentou usar
essa conexão para demonstrar que a invasão era urna resposta justificada ao 11 de Setembro. A
alegação era completamente falsa. Segundo, não havia informações confiáveis que sustentassem
a alegação do governo de que Saddam estava a ponto de adquirir capacidade de produzir armas
nucleares. A maioria dos norte-americanos sabe que os motivos que Bush forneceu para a guerra
se provaram falsos. Para eles, a questão é determinar se o presidente mentiu e, caso o tenha feito,
o que se pode fazer para puni-lo por isso. Ao assumir a Presidência fez um juramento nos termos
do qual ele prometeu que protegeria a execução fiel das leis do país. Não se pode usar o
impeachment para remover um presidente por incompetência administrativa. Mas o presidente
Bush é culpado de incompetência em escala tão imensa ou de indiferença tão descomunal à sua
obrigação de fazer com que as leis sejam fielmente executadas que é possível questionar sua
dedicação ao juramento que fez ou a sua capacidade de o executar.
“O exemplo mais notório é a condução da Guerra do Iraque. De maneira irresponsável e
inexplicável, o governo não forneceu aos soldados estacionados naquele país coletes à prova de
balas ou veículos dotados da blindagem necessária. Um estudo recente do Pentágono constatou
que coletes eficientes poderiam ter salvado centenas de vidas. Por que o início das hostilidades
não foi adiado até que os soldados recebessem o equipamento apropriado? (...) As provas que
dispomos no momento sugerem que o presidente pode ter autorizado pessoalmente a prática de
maus tratos contra prisioneiros. Em janeiro de 2002, depois do início da Guerra do Afeganistão,
Alberto Gonzalez, assessor jurídico da Casa Branca, informou o presidente Bush por escrito de
que maus-tratos praticados por americanos contra prisioneiros poderiam causar processos sob as
leis de crimes de guerra. Em lugar de ordenar que as ações criminosas cessassem imediatamente,
Bush autorizou o uso de uma interpretação elástica das Convenções de Genebra, para proteger
contra processos os americanos responsáveis por abusos contra prisioneiros.
“Em outras palavras, a resposta do presidente quando recebeu informações de abusos contra
prisioneiros foi a de tomar providências que impedissem processos contra os responsáveis pelas
violações, o que implica que tenha acatado os abusos e autorizado sua continuação. Se torturas
ou tratamento desumano de prisioneiros tiverem resultado dessa decisão presidencial, ele pode
ser considerado pessoalmente responsável por uma violação das leis de crimes de guerra. Mais
recentemente, o presidente se opôs à emenda McCain, que proíbe a tortura, quando ela foi
proposta inicialmente, e apoiou tacitamente os esforços do vice-presidente Cheney para aprovar
uma emenda que permitiria que a CIA torturasse ou degradasse prisioneiros”.[7]
Para compreender a natureza do intervencionismo político imperialista no Oriente Médio, é
preciso voltar os olhos para os resultados que, para a região, tiveram os desfechos das principais
conflagrações mundiais do século XX.
Do Império Otomano à Partilha Imperialista
A criação do Estado de Israel, em 1948, sob os auspícios de uma ONU criada pelos acordos
contra-revolucionários de Teerã, Yalta e Potsdam, durante a Segunda Guerra Mundial, foi o
elemento chave na preparação do intervencionismo político, através de uma cabeça de ponte, do
imperialismo capitalista dominante, o dos EUA, no Oriente Médio, no quadro de uma
administração americana (Roosevelt-Truman) que assumia, de modo consciente e explícito,
responsabilidades políticas e policiais mundiais.[8] A partilha da Palestina foi o processo que a
precedeu. Tratou-se, portanto, de uma decisão estratégica de alcance histórico, sobre cujos
pressupostos é necessário se debruçar.
Na origem da divisão da Palestina,[9] encontra-se a partilha imperialista dos restos do Império
Otomano. No século XVI a Palestina, como a maior parte dos territórios árabes, se encontrava
sob o controle da “Sublime Porta” (o Sultão da Turquia). O Império Otomano trouxe o Próximo
Oriente Árabe para as províncias administradas por pachás (governadores). O poder do Império
turco tendeu a esgotar-se nos séculos XVII e XVIII em proveito do poder das autoridades locais,
que sem questionar a supremacia do sultão, adquiriram uma grande autonomia, que não
deixaram de utilizar as potências (Grã Bretanha, França, Rússia, Áustria-Hungria) em sua
competição mútua.
O controle dos mercadores europeus sobre a vida econômica do Império Otomano se ampliou à
medida que declinava a Sublime Porta, para chegar a um estágio em que as potências européias
se beneficiavam de enormes privilégios. A Europa vivia uma fase de desenvolvimento do
capitalismo (e da expansão colonial). A ocupação territorial do Próximo e Médio Oriente pelas
potências européias esteve precedida por uma penetração econômica que levou a dissolução das
estruturas sociais atrasadas do Império Otomano. Assim, já em 1849, o Egito (então parte do
Império Otomano) dependia da Grã Bretanha em cerca de 41% de suas importações e de 49% de
suas exportações. A dominação financeira se materializava no endividamento crescente, a tal
ponto que a dívida otomana se elevava em fins do século XIX a 200 milhões de libras esterlinas.
A princípios do século XX se constituiu o “Conselho de Administração da Dívida Pública
Otomana”, dominado pelos credores europeus, que com seus 9 mil funcionários (em 1912) se
arrogou a arrecadação dos ingressos fiscais do Império Turco.
O Império Otomano era, segundo o czar da Rússia, “o enfermo da Europa” e as potências
tentavam repartir seus despojos. Porém, contra os apetites da França e Rússia em particular, a
Grã Bretanha se opôs, considerando que um Império Otomano, ainda débil, supunha a melhor
garantia para preservar a “ordem”, a estabilidade, já que a dificuldade estava em saber o que
havia para colocar em seu lugar, e também para proteger a rota das Índias do apetite dos rivais. A
política britânica buscava manter o “status quo” no Próximo Oriente, e impedir que outras
potências interviessem ali. Em 1839, a Grã Bretanha ocupou Aden para proteger a rota das
Índias, lançou seus navios contra os piratas do Golfo Pérsico para proteger a navegação
comercial, chegando a exercer um domínio sobre os diferentes governadores do Golfo.
Entretanto, a França desembarcou na Síria em 1860 para “proteger” a comunidade cristã de
“conflitos religiosos” com os drusos (conflitos que o exército otomano acabava de combater)
provocados pelas potências (ficando os franceses como defensores dos cristãos maronitas, os
ingleses dos drusos, os russos dos ortodoxos...). O poder de Constantinopla teve que aceitar a
criação de uma província autônoma na região do Monte Líbano – dentro do Império Otomano –
dirigida por um governo cristão (as tropas francesas permaneceram ali até 1971). Várias revoltas
árabes contra a Sublime Porta foram sustentadas e animadas pelas potências.
Quando o governador do Egito, Mehmet Ali derrotou os exércitos otomanos, as tropas russas
acudiram em ajuda do Império Otomano. Grã Bretanha e França obrigaram a Mehmet Alí a
abandonar os territórios sírios. Depois da infrutífera tentativa do governador (pachá) de
transformar o Egito em uma potência industrial, o país caiu sob uma crescente dependência da
Grã Bretanha. Tanto mais quanto que, desde a abertura do Canal de Suez em 1869, o Egito
ocupou um lugar central para a Grã Bretanha. O endividamento e a crise financeira egípcia
impuseram ao neto e sucessor de Mehmet Alí, Ismael, a venda da parte egípcia do canal ao
governo britânico, que se converteu assim no principal acionista, porém o déficit fiscal subsistiu.
Dois anos mais tarde, o caixa da divida franco-britânica tomou ao seu cargo as finanças do Egito.
Em 1881, ante uma revolta iniciada por oficiais do exército egípcio, que se estendeu a todo o
país, Grã Bretanha interveio bombardeando Alexandria e ocupando militarmente Egito: essa
ocupação não acabará até 1956.
O Sudão foi conquistado em 1898 pelos britânicos através de feroz repressão. Por sua parte, sob
a cobertura do clero russo, o czar multiplicou as compras de terras na Palestina. Finalmente, o
movimento sionista, que nasceu na Europa Oriental, organizou as primeiras ondas de pioneiros
judeus da Europa, instalando-se no final do século XIX na Palestina com a intenção explícita –
contrária à atitude da comunidade judia de 20 mil pessoas que residiam já na Palestina desde o
século XIV – de colonizá-la. “Fomentar, por princípio, a colonização da Palestina por judeus
operários agrícolas, trabalhadores em construção civil e de outros ofícios”, dizia a resolução do I
Congresso Sionista Mundial, celebrado em Basiléia em agosto de 1897.[10] O próprio Theodor
Herzl, fundador do sionismo, era mais simpático à idéia de instalar o “Estado Judeu” na África
Oriental Britânica (a atual Uganda), mas ele morreu, antes que o Congresso Sionista de 1905,
dominado pelos judeus de Europa Oriental, “escolhesse” a Palestina.[11]
A ocupação judaica da Palestina começou a ganhar força no final do século XIX, quando o
mundo afro-asiático estava sendo partilhado pelas potências imperialistas. Nesse período, parte
do mundo árabe-islâmico ainda estava sob domínio do Império turco-otomano, que se estendeu
até 1918, quando a Turquia foi derrotada na Primeira Guerra Mundial, e a Palestina tornou-se um
território sob mandato britânico.
Em 1907, foi constituído pelos sionistas, em Jaffa, um gabinete para estruturar a colonização,
que já vinha sendo realizada lentamente com o dinheiro do barão Edmond de Rothschild e do
“Fundo Nacional Judeu”, estabelecido pelo V Congresso Sionista. Quando começou a Primeira
Guerra Mundial, já existiam 44 colônias agrícolas judaicas na Palestina, e em 1917, quase no
final do conflito na Europa, foi divulgada a Declaração Balfour, do governo inglês, que garantia,
como veremos, a livre colonização da região por judeus, que nesse momento já contavam com
aproximadamente 60 mil habitantes naquele território. O movimento sionista internacional ainda
era pequeno e fraco em relação a outras alternativas, como o Bund e a emigração a países como
os Estados Unidos. Esse fato pode ser explicitado nos números da emigração à Palestina na
época. Durante a administração do Império Otomano, entre 1881 e 1917, de uma emigração total
dos judeus da Europa de 3.177.000 pessoas, apenas 60 mil foram à Palestina. Já na época de
controle britânico, depois da Primeira Guerra Mundial, no período de 1919 até a independência
de Israel, em 1948, de uma emigração total de 1.751.000 judeus, 487 mil foram para a
região.[12]
Na prática, somente após as perseguições nazistas foi que a emigração judaica para o Oriente
Médio aumentou significativamente. Os ingleses, sabendo da delicada situação local, haviam
publicado um Livro Branco, em 1922, limitando a imigração judaica e evitando favorecer a
criação de uma maioria de judeus na região. Mas os anos 1930 viram os problemas se aguçarem,
à medida que uma grande vaga de judeus fugindo da Alemanha chegou à Palestina. Em 1931, de
uma população de 1.036.000 habitantes, somente 175 mil eram judeus. Mas o nazismo empurrou
mais 200 mil judeus para a Palestina na segunda metade daquela década. É nessa época que
aumenta também a atuação da Haganah, a organização sionista armada criada em 1920, que
tinha como objetivo estabelecer um exército próprio para proteger os interesses dos colonos
judeus.[13]
O período da Primeira Guerra Mundial veio a ser o da submissão do Império Otomano às
potências imperialistas. Em vésperas daquela, se estima que as inversões européias, no Próximo
Oriente, se elevaram a 24 milhões de libras esterlinas, no caso da Grã Bretanha; 3300 milhões de
francos por parte da França, e 1800 milhões de francos da Alemanha (nesse mesmo período a
dívida otomana já passava os 63 milhões de libras). Porém, ao mesmo tempo, apareceram e se
desenvolveram a maior parte das organizações árabes nacionalistas que queriam libertar-se do
jugo otomano e, em geral, da dominação estrangeira. Em 1906, os britânicos, reprimiram
brutalmente uma rebelião no Egito. A situação que se criava no Império Otomano exigia às
potências irem mais longe.
Em 1914, o Egito passou a ser um protetorado britânico, a influência inglesa se estendia na
região do Golfo. Em 1917 tem lugar a ocupação da Mesopotâmia e a declaração Balfour,[14]
prevendo a instalação de um “lar nacional” judeu na Palestina, através da qual a Grã Bretanha
preparava a dominação da Palestina, embora esta fosse parte ainda do Império Otomano. Em
1916 estalara a rebelião dirigida por Mustafá Kemal na Turquia, que aboliria o Império da
Sublime Porta e fundaria a República da Turquia. Na península arábica o potentado árabe Ibn
Saúd, instigado pelos britânicos, empreendeu suas primeiras conquistas contra o Império
Otomano (que fora aliado do Império Austro-húngaro e da Alemanha na Primeira Guerra
Mundial).
Ao finalizar a Primeira Guerra Mundial, o Império otomano, derrotado, foi desmembrado. A
França ocupou a Síria em 1920; em 1926 o Iraque foi submetido a mandato britânico, e em 1927
as conquistas de Ibn Saúd foram “reconhecidas” pela Grã Bretanha. Assim como o Tratado de
Versalhes havia multiplicado na Europa, e em particular na região balcã-danubiana, “diques de
estados vassalos”, na expressão do IV Congresso da Internacional Comunista, seu equivalente
para o Império Otomano, o Tratado de Sèvres, multiplicou os “protetorados” no Oriente Médio.
Se a Grã Bretanha havia sustentado e mantido a unidade do Império Otomano com todas as suas
forças durante decênios, esta posição se fez insustentável desde 1913 e impossível depois da
Primeira Guerra Mundial: o desmembramento do Império Otomano estava na ordem do dia.
Retalhamento e Acordos Secretos
A balcanização do Próximo e Médio Oriente se concretizou nos acordos secretos francobritânicos de 1916, conhecidos com o nome de negociações Sykes-Picot, concluídas em
conformidade com a Rússia czarista. A Grã Bretanha exercia um protetorado de fato no Egito e
no Golfo Arábico-Pérsico. Lord Kitchener, amo do Egito, planejava dividir a região meridional
da Síria até Haifa e Acre para formar ali uma unidade territorial separada, sob o controle
britânico. Em contato com o futuro coronel T. E. Lawrence (agente e mercenário britânico
infiltrado na rebelião árabe contra os turcos, depois consagrado pela lenda como “Lawrence de
Arabia”), na ocasião de sua visita à Palestina em 1911, escrevia que seria melhor “que os judeus
colonizassem o país o quanto antes possível”.
Os acordos secretos Sykes-Picot foram feitos públicos pelos bolcheviques em 1917, após a queda
do antigo regime czarista. Desde princípios de 1916, tiveram lugar em Londres conversações
entre os diplomatas Mark Sykes e Georges Picot. Concluíram no mês de março com um
protocolo ratificado por seus governos como parte de um futuro arranjo anglo-franco-russo,
conhecido com o nome de acordo Sykes-Picot. Segundo este protocolo, a Ásia Árabe (mais a
península arábica) ficava dividida em cinco zonas: zona azul e zona vermelha, sob controle
direto da França (azul) e da Inglaterra (vermelha); zona rodeada de azul e zona rodeada de
vermelho aonde se reconheceria a soberania árabe, mas conservando zonas de interesses francês
e inglês. Finalmente, uma zona marrom que considerava a Palestina, menos Haifa (que se
reservava à Inglaterra), submetida o controle internacional. Estes acordos ignoravam por
completo as aspirações nacionais árabes.
No mapa da Palestina, mediante um jogo diplomático, as zonas rodeadas de azul e vermelho
(Síria e Mesopotâmia) se reservavam para protetorado das duas potências. Quanto à cláusula de
internacionalização da Palestina, Sykes a havia aceitado por duas razões: era preciso ter em conta
os interesses da Rússia, que tinha intenção de estar presente em Jerusalém, e cuja participação no
acordo estava prevista, porém, sobretudo era preciso opor uma barreira às ambições da França,
que pretendia exercer seu controle sobre a “Síria histórica”, que compreendia o Líbano, como
também a Palestina. Esta barreira era a internacionalização da região, a que os franceses não
podiam, razoavelmente, opor-se. Porém, esta solução não satisfazia o governo britânico,
seduzido pela idéia do “bastião palestino”.
O premiê inglês Lloyd George qualificou o acordo endossado pelo seu predecessor de
“documento estúpido”. Sykes reconheceu que não estava orgulhoso dele. Para modificar a seu
favor a cláusula palestina, a Inglaterra necessitava do sionismo. Assim pois, não há que
surpreender-se do zelo sionista em favor do acordo, que manifestou-se a partir desse momento,
nem do papel capital que desempenhou Sykes, com o apoio de seu governo, ante Chaim
Weiszmann e seus amigos (a Organização Sionista Mundial), induzindo-os a que apresentassem
ao gabinete da guerra uma versão aceitável do que iria converter-se na declaração Balfour.
O aguçamento das contradições inter-imperialistas determinou a feição definitiva do sionismo.
Como aponta George E. Kirk, “a eclosão da I Guerra Mundial transferiu o centro de gravidade
do movimento sionista do continente europeu para Inglaterra e os Estados Unidos”. As figuras
decisivas passaram a ser Hayyim (Chaim) Weiszman, russo que exercia a cadeira de Química na
Universidade de Manchester e, nos EUA, o advogado Louis D. Brandeis, próximo ao presidente
Woodrow Wilson (que nomeou-o juiz da Corte Suprema). O Comitê Britânico para a Palestina,
inspirado por Weiszman, publicava um jornal com a legenda “Para restabelecer as antigas glórias
da nação judaica na liberdade de um novo domínio britânico na Palestina” (sic).
O único membro não judeu do Comitê, Herbert Sidebotham, jornalista do Manchester Guardian,
escreveu em 1915 um editorial advogando a permanente ocupação inglesa da Palestina, para
defender o Egito. Weiszman solicitou a Sidebotham a redação de um memorando para o Foreign
Office, propondo um Estado judeu na Palestina, para a defesa do Egito e do Canal de Suez. O
memorando foi o antecedente da Declaração Balfour. Sidebotham afirmou que as necessidades
políticas estratégicas da Grã-Bretanha inclinaram a balança a favor do sionismo. Anos depois,
setores do establishment britânico lançaram a queixa de terem sido usados como “testas-deferro” dos judeus...[15]
Assim, o imperialismo britânico buscaria utilizar o movimento sionista, facilitando a imigração
judia para a Palestina, contra as massas árabes, seguindo o velho adágio latino divide et impera, e
para assegurar sua hegemonia regional contra seu “aliado”, o imperialismo francês, já que a
questão chave era a das zonas de influência (francesa no norte, inglesa no sul). Os britânicos
podiam considerar que os acordos Sykes-Picot deixavam a porta aberta a seu projeto de reino(s)
árabe(s), já que a Grã Bretanha desejava anexar a região de Bassora. Aspirava também a instituir
um poder árabe no lugar do sultão otomano.
Isso iria acompanhado da instauração na península arábica da “meia lua fértil” de estados árabes
“clientes da Grã Bretanha”. Em segredo, o xeque Hussein, da Meca, aceitou as propostas anglofrancesas. Membro do clã dos hachemitas da tribo do Profeta, os britânicos pretendiam utilizá-lo
como contrapeso religioso e simbólico frente ao sultão otomano, e para canalizar em seu
proveito a luta dos povos, reunindo-os sob a bandeira de uma suposta “nação árabe”. Foi
proclamada a rebelião árabe, em maio de 1916, generosamente alimentada com fundos da Grã
Bretanha, e apoiada militarmente por ela e a França.
Os britânicos tomaram Bagdá, em março de 1917. Durante o verão, as forças árabes,
comandadas por um filho de Hussein, Faisal, operaram no sul da atual Jordânia contra os
otomanos. Em dezembro os britânicos entraram em Jerusalém. Entretanto, o Ministro dos
Assuntos Exteriores da Grã Bretanha, Balfour, em uma carta a Lord Rothschild (a carta fora
preparada conjuntamente pelos dirigentes da Organização Sionista Mundial e Sykes, teve oito
projetos diferentes entre julho e novembro desse ano) anunciava: “O governo de sua Majestade
considera favoravelmente o estabelecimento na Palestina de um Estado nacional para o povo
judeu”, afirmando assim as pretensões britânicas com respeito à Palestina, teoricamente zona
neutra internacional, segundo os acordos Sykes-Picot. Além do chamamento do Ministro Balfour
a constituição de um “Estado nacional judeu”, a Grã Bretanha afirmava assim o desejo de
estender seu domínio sobre o conjunto dos territórios da Palestina, ligando o Egito aos territórios
do Iraque e da península arábica, até à Índia. Os exércitos britânicos iriam tentar realizar isso na
prática.
Expulsões e Alliahs
As operações decisivas na Síria começaram em setembro de 1918. As forças britânicas
permitiram Faisal entrar em Damasco em outubro. Um mês mais tarde, a Síria estava sob o
controle britânico. Depois do armistício firmado com os otomanos (a 30 de outubro de 1918), os
britânicos continuaram avançando, estendendo sua influência em detrimento da França. Esta se
viu obrigada a ceder Mosul e Palestina aos britânicos, e descobre que, na Síria, os britânicos não
lhe concediam mais que a administração do litoral sírio-libanês. A Síria interior foi confiada a
Faisal. Este firmou um protocolo de acordo com o líder sionista Chaim Weiszmann,
considerando a declaração Balfour como um repúdio dos acordos Sykes-Picot, e se colocou sob
o controle da Grã Bretanha (o Artigo 9 do Acordo, firmado em 3 de janeiro de 1919 por Faisal e
Weiszmann, precisava: “qualquer diferença que puder surgir entre as partes contratantes se
submeterá ao arbítrio do governo britânico”), o que constituía uma arma eventual contra as
ambições francesas.
No entanto, os britânicos fizeram um acordo com os franceses, em novembro de 1919; suas
tropas evacuaram as zonas sírio-libanesas que os acordos Sykes-Picot haviam confiado à França.
Faisal aceitou tratar com esta última, porém, o Conselho Geral Sírio proclamou, em março de
1920, um Reino Unido da Síria, e lhe ofereceu sua Coroa. No mês seguinte a França e Grã
Bretanha decidiram a repartição dos “mandatos”: a Sociedade de Nações (SDN) precedente da
ONU, que Lênin qualificava de “covil de bandidos”, confiou às potências vitoriosas “mandatos”
sobre os territórios, sobre a base do desmembramento do Império Otomano; Síria e Líbano para a
França, Palestina e Iraque para a Grã-Bretanha. Era o fim do projeto da Grande Síria.
Em julho, as forças francesas esmagaram os sírios. Faisal se refugiou na Palestina, onde os
elementos pró-sionistas da administração britânica estabelecem eles mesmos o término do
mandato em 1920. Conseguem que a França ceda a Galiléia e a bacia alta do Jordão, como
desejavam os sionistas. No entanto, a Transjordânia lhes escapou: administrada por Faisal, até
meados de 1920, Abdallah, irmão de Faisal, se instalou ali em novembro de 1920 com a intenção
de intervir na Síria, contra a opinião dos sionistas, que queriam incorporar a margem esquerda do
Jordão à Palestina. Os britânicos aproveitam a ocasião e, em março de 1921, nomearam Abdallah
governador da Transjordânia.
Em 1931, 20 mil famílias camponesas palestinas haviam sido expulsas pelos sionistas. Além
disso, no mundo árabe, a vida agrícola não é somente um modo de produção, como também uma
forma de vida social, religiosa e ritual. Por isso, a colonização, além de retirar a terra, estava
destruindo a sociedade rural árabe. O imperialismo britânico impulsionou a desestabilização da
economia palestina, concedendo um estatuto privilegiado ao capital judeu; lhes destinando 90%
das concessões na Palestina, permitindo que os sionistas tomassem o controle da infra-estrutura
econômica. Se estabeleceu então um código de trabalho discriminatório contra a força de
trabalho árabe, que provocou um desemprego em grande escala entre os árabes. Por isso, desde o
fim da Primeira Guerra Mundial, a rebelião árabe, incitada pelos britânicos contra o Império
Otomano, deixou de dirigir-se aos turcos, para apontar contra os novos colonizadores; se trata da
resistência das massas palestinas empobrecidas contra o colonialismo e o imperialismo, contra os
acordos Sykes-Picot, contra o “mandato” e contra a declaração Balfour.
Os primeiros choques importantes tiveram lugar em maio de 1921, entre manifestantes sionistas
e árabes. O alto comissário britânico, sir Herbert Samuel, que formava parte dos diplomatas
ingleses pró-sionistas, se inquietou e, em seu memorando ao governo britânico, sugere que se
subordine a imigração judaica “à capacidade econômica do país de absorver novas chegadas, a
fim de que os imigrantes não privem de seu trabalho a nenhum setor da população atual”. Em
agosto de 1929, novos enfrentamentos provocaram 113 mortes entre os judeus e 67 entre os
árabes. Em um segundo memorando publicado em outubro de 1930, Londres estimava que “não
diminuiu a margem de terras disponíveis para a colonização agrícola”, e recomendava controlar a
imigração. Palavras desmentidas pelos fatos e questionadas em uma carta do primeiro-ministro
trabalhista MacDonald ao dirigente da Organização Sionista Mundial, Chaim Weiszmann.
Em inícios de 1920, se desenvolveu uma terceira onda (ou alliah) de imigração de judeus do
leste da Europa, canalizada para a Palestina depois que, em 1924, o governo americano fez votar
uma lei que restringia toda imigração aos EUA, ao mesmo tempo em que o governo polaco, do
marechal Pilsudski, tomava medidas econômicas anti-judaicas. Isto provoca uma quarta alliah
mais importante que as precedentes. Porém logo o fluxo se reduz até o ponto de que entre 1927 e
1929 deixaram a Palestina mais judeus dos que nela entraram. A recuperação da imigração data
de 1933, ano da ascensão de Hitler ao poder. Além dos judeus polacos e de outros países da
Europa central, a quinta alliah incluiu numerosos judeus alemães. Em 1936 se assentaram 400
mil judeus na Palestina, a grande maioria azkenazes (judeus de tradição cultural germânica e
língua yiddish).
Cortando na carne das nações, dividindo e desmembrando os povos, através da criação artificial
da Transjordânia, sob o mando de um emir às ordens dos britânicos, separada do resto da
Palestina, onde a Grã Bretanha favoreceu os sionistas e a imigração judaica, dirigida contra as
massas árabes, o imperialismo procurava assegurar seu domínio sobre as massas, com a
colaboração dos sionistas e dos potentados locais.
Em todos os territórios situados sob o mandato britânico ou francês, a repressão foi
extremamente brutal. De 1920 a 1926, os generais franceses Gourauid, Weygand e Sarrail
aplicaram na Síria uma verdadeira ditadura militar e uma repressão sangrenta contra as massas
árabes, que se sublevaram em várias ocasiões, e provocaram conflitos procurando separar a
população cristã dos muçulmanos. No Iraque, em fins de 1919, se desenvolveu uma verdadeira
revolta contra os britânicos, que explodiu durante o verão de 1920 na Thawra (rebelião
iraquiana) contra a instauração do mandato.
Sionismo e Partilha da Palestina
Depois da sangrenta repressão, os britânicos decidiram substituir a administração direta por um
regime árabe, impondo novamente Faisal, designado rei do Iraque em agosto de 1921. Assim, os
britânicos mantém o “mandato”. Também na Palestina se desenvolve uma intensa agitação
contra o “mandato” britânico e a colonização sionista, com as sublevações de 1920, 1921 e 1929,
também reprimidas ferozmente pelas tropas britânicas, com a ajuda das milícias sionistas. Era
preciso que a “ordem” imperasse em toda a região, a fim de assegurar sua exploração e pilhagem
pelas potências européias.
As riquezas petrolíferas do Oriente Médio desempenhavam já um papel determinante na atitude
das potências. Já em 1908, concessionários britânicos descobriram uma primeira bacia no Irã e
no Iraque. Assim, as negociações franco-britânicas sobre a divisão do Oriente Próximo giraram,
em boa medida, em torno a sorte da antiga Turkish Petroleum Company. Em 1931, a Standard
Oil dos EUA descobriu petróleo e obteve, em 1933, uma concessão que abarcava o conjunto da
Arábia Saudita. Era um acontecimento de enorme importância, cujo alcance não foi estimado em
toda a sua amplitude até depois de 1945.[16]
Em 1880, a Palestina pertencia ao Império Otomano. Naquela época estavam assentados ali 25
mil judeus, em sua maior parte judeus espanhóis-sefarditas, instalados na Galiléia no século XVI.
Grande parte dos judeus expulsos da Espanha pelos “Reis Católicos” no século XVI,
encontraram refúgio no Império Otomano, em particular na Bósnia e Tessalônica, província
turca, mas também da Palestina, Iraque e Síria. O argumento dos sionistas “um povo sem terra
(os judeus) para uma terra sem povo (Palestina)” não resiste um minuto ao escrutínio histórico.
Em sua obra A História Oculta do Sionismo, Ralph Schoenman afirma: “Ao final do século XIX
havia na Palestina mil povos ou aldeias. Jerusalém, Haifa, Gaza, Yaffa, Nablús, Acre, Jericó.
Ramle, Hebrom e Nazaré eram cidades florescentes. As colinas estavam laboriosamente tratadas.
Canais de irrigação sulcavam todo o território. Os jardins de limoeiros, as oliveiras e cereais da
Palestina eram conhecidos em todo o mundo. O comércio, o artesanato, a indústria têxtil, a
construção e a produção agrícola eram prósperas. Os relatos dos viajantes dos séculos XVIII e
XIX estão plenos de dados nesse sentido, bem como os informes acadêmicos publicados
quinzenalmente no século XIX pelo Fundo Britânico para a Exploração da Palestina. Na
realidade, foi precisamente a coesão social e a estabilidade da sociedade o que levou a Lord
Palmerston a propor, premonitoriamente, em 1840, quando a Grã Bretanha estabeleceu o
consulado em Jerusalém, a fundação de uma colônia judaica européia para preservar os
interesses mais gerais do Império Britânico”.[17]
A sociedade palestina, ainda padecendo da colaboração dos latifundiários feudais com o império
otomano, era produtiva e culturalmente diversa, com um campesinato muito consciente de seu
papel social. Os camponeses e a população palestina estabeleciam uma distinção clara entre os
judeus que viviam entre eles, e os colonizadores que vieram, já que em 1820 os 20 mil judeus de
Jerusalém se integravam totalmente na sociedade palestina. Quando em 1886 os colonos de
Petah Tíkrah trataram de expulsar os camponeses de sua terra chocaram-se com uma resistência
organizada, mas os trabalhadores judeus não sofreram nenhuma represália.
Quando os armênios que escaparam do genocídio turco se estabeleceram na Palestina foram bem
recebidos. Esse genocídio foi defendido por Vladimir Jabotinsky e outros sionistas, em seu afã
por lograr o apoio turco. Na verdade, até à Declaração Balfour a resposta palestina aos
colonizadores sionistas foi tolerante. Na Palestina não havia nenhum ódio organizado contra os
judeus, ninguém organizava massacres como os do czar ou dos anti-semitas polacos, não surgiu
nenhuma reação simétrica pelo lado palestino contra os colonos armados que utilizavam da força
para expulsar os palestinos de suas terras. Nem sequer as reações espontâneas que expressavam a
raiva dos palestinos contra os constantes roubos de suas terras eram dirigidos contra os judeus
como tais.
Em fins do século XIX e princípios do século XX começaram as ondas de imigrantes judeus sob
os efeitos dos pogroms na Rússia e na Europa Oriental. As autoridades otomanas temiam que a
imigração judaica reforçasse ainda mais a influência européia, pois apenas tinha meios para
opor-se a ela. A primeira onda (1882-1903) provém sobretudo da Rússia. A segunda (19041914) da Rússia e Polônia. Em 1919, depois dessas duas ondas de imigração, estavam assentados
na Palestina 60.000 judeus (muitos dos imigrados partiram de novo, em particular para os EUA)
para um total de 800 mil habitantes. A saída dos judeus da Europa Oriental não encaixara com os
planos dos sionistas: emigravam para a Europa Ocidental e os EUA.
Em 1936, os judeus assentados já eram 400 mil e, em 1947, 600 mil. Este crescimento foi
resultado da nova onda de imigração, protegida pelas disposições do “mandato”. O documento
adotado pela SDN em 24 de julho de 1922, que confiava o mandato sobre a Palestina à Grã
Bretanha, precisava: “O mandatário assumirá a responsabilidade de instituir no país um estado de
coisas político, administrativo e econômico, capaz de assegurar o estabelecimento do estado
nacional para o povo judeu (...) A administração da Palestina facilitará a imigração judaica em
condições convenientes e de acordo com o organismo judaico mencionado no artigo 4.
Estimulará o estabelecimento intensivo dos judeus nas terras do país, incluídos os domínios do
Estado e as terras sem cultivar”.
Os diferentes imperialismos, ao fechar suas fronteiras aos judeus que fugiam da Alemanha
nazista, os canalizavam para a Palestina. Protegido pelas disposições do “mandato”, o estado
nacional para o povo judeu se administrava por si mesmo, com seu sistema de ensino, sua
estrutura econômica, sua milícia, a Haganah, que chegaria a converter-se em um exército. Logo
que os imigrantes judeus instalaram-se nas cidades, seu governo teve como política a aquisição
de terras.
Como explicou o poeta e ensaísta palestino Ghasan Kanafani: “Apesar de que uma grande parte
do capital judeu se destinou a áreas rurais, e apesar da presença de forças militares britânicas e da
imensa pressão exercida pela máquina administrativa em favor dos sionistas, estes lograram
somente resultados mínimos em relação à colonização da terra. No entanto, prejudicaram
seriamente a situação da população árabe rural. A propriedade da terra urbana e rural por parte
de grupos judeus passou de 300.000 dunums (26.800 hectares) em 1929 a 1.251.000 dunums
(112.000 hectares) em 1930. A terra adquirida era insignificante desde o ponto vista de uma
colonização massiva e da solução do ‘problema judeu’. A expropriação de um milhão de dunums
– quase um terço da terra cultivável – conduziu a um grave empobrecimento dos camponeses
árabes e dos beduínos”.
Porém, o objetivo sionista (um “estado judeu” para o que se pensou inicialmente em territórios
da América Latina, logo em Uganda e finalmente na Palestina) era minoritário entre as massas
judias da Europa que, em grande parte, se encontravam dentro de organizações socialistas, como
a organização operária judia, o Bund, que combatia com vigor o sionismo. Sem falar nas
perspectivas de emancipação e na enorme influência que sobre as massas judias exerceu a
Revolução de Outubro, durante seus primeiros anos (em seu livro A Orquestra Vermelha, Gilles
Perrault relata que o esqueleto da organização clandestina da Internacional Comunista, na
Europa fascista, era constituído por militantes de origem judia. O próprio Leopold Trepper,
polonês que dirigia a célebre rede de espionagem soviética que dá título ao livro, era judeu).
Segundo Gresh e Vidal: “O sionismo se alimentou na Europa central e oriental da conjugação de
três fenômenos próprios do século XIX: a decomposição da estrutura feudal dos impérios
czaristas e austro-húngaro, que minou os fundamentos sócio-econômicos da vida judia, as
condições da evolução capitalista que bloquearam o processo de proletarização e de assimilação,
e a escalada brutal do anti-semitismo mais violento que precipitou a centenas de milhares de
judeus ao caminho do exílio. Em direção à Palestina? Não. Na maior parte, para a América. Dos
dois ou três milhões de judeus que saíram entre 1882 e 1914 da Europa Central, menos de 70 mil
se instalaram na Terra Santa, e muitas vezes com caráter muito passageiro. Os dirigentes
sionistas não o ignoravam. Nem a miséria de seus correligionários submetidos ao czar, nem a
discriminação de todo tipo, nem sequer os pogroms bastavam para transportá-los massivamente
para a Palestina. Entretanto, isso era possível com o apoio de uma grande potência. Assim, o
criador da organização sionista ressaltou ante o sultão, além da contribuição que podia considerar
para as finanças otomanas, a ajuda que os judeus palestinos podiam representar para sufocar a
ameaça de uma insurreição árabe”.[18]
Uma mensagem destinada ao chanceler alemão Bismarck assinalava que “a implantação de um
povo neutro na rota mais curta para o Oriente pode ter uma imensa importância para a política
oriental da Alemanha”. Um povo, além disso, “obrigado quase em todas as partes a incorporar-se
aos partidos revolucionários”.
Sionismo e Judaísmo
Herzl utilizava o mesmo argumento com De Witte e Von Plehve, ministros russos e instigadores
dos pogroms: “Se se instalasse na Palestina uma colônia do povo judeu, os elementos radicais se
veriam obrigados a tomar parte no movimento”, em caso contrário, “a frustração dessas
esperanças modificaria toda a situação”, em proveito dos “partidos revolucionários”. Faltava
convencer à Grã Bretanha de que o projeto sionista correspondia ao seu interesse, e não as
distantes regiões africanas ou latino-americanas que em um tempo se tiveram em consideração,
mas sim a Palestina. De saída, o movimento sionista, minoritário entre as massas judias, se
subordinava às potências capitalistas, especialmente a Grã Bretanha, oferecendo-lhes uma massa
de manobra para a sua política de conquista no Médio Oriente.
Durante muitos séculos a utopia da "redenção de Israel" não transbordou do âmbito religioso,
que foi sua matriz. Deu origem a peregrinações e a imigrações individuais ou de pequenos
grupos, que não modificaram o estatuto político da Palestina nem a sua composição étnica, a
qual, apesar das numerosas mudanças políticas e religioso-culturais, parece ter permanecido
relativamente estável desde fins do II milênio a.C. até recente data. A situação começou a mudar
no século XIX. O sionismo surgiu no contexto do triunfo das ideologias nacionalistas, como um
movimento nacionalista secular cujo objetivo era a criação de um estado dos judeus, sendo este
considerado como o único meio de assegurar a identidade e a sobrevivência da “nação” judaica,
assim como de lhe garantir um lugar ao sol entre as demais nações.
Para os seus partidários, o dito estado tomou de certo modo, sob uma forma secularizada, o lugar
que a utopia da "redenção de Israel" ocupava na tradição religiosa. Mas o estado projetado pelos
nacionalistas judeus não tinha necessariamente a Palestina por cenário. Seu principal promotor,
Herzl (1860-1904), como vimos, encarou a possibilidade de criá-lo na Argentina. Falou-se
também de Chipre, da África oriental e do Congo. Diga-se de passagem que a liberdade na
escolha do futuro "território nacional" de que deram mostras os nacionalistas judaicos se explica
pelo fato de se viver então na Europa no apogeu do sonho colonialista. Consideravam-se
colonizáveis todos os territórios situados fora da Europa. Colonizá-los era tido por uma obra
benemérita, pois era "civilizá-los".
Os nacionalistas judaicos não tardaram a optar pela Palestina. Essa escolha, embora não fosse
necessária, era natural e particularmente mobilizadora, por causa da ligação do judaísmo à
Palestina e da atração que ela exerce mesmo sobre muitos judeus que não são religiosos ou
originários desse país. O nacionalismo judaico tomou assim o nome de sionismo, palavra que
deriva de Sião, um dos nomes de Jerusalém na Bíblia. Repare-se também que a escolha da
Palestina se enquadrava nos projetos coloniais das potências européias, sobretudo da GrãBretanha e da França, que preparavam a partilha dos despojos do império otomano decadente.
Foi por isso que o projeto sionista vingou, em que pese a oposição que lhe manifestou a maioria
dos judeus da Rússia, Europa Central e Oriental, engajados nos partidos socialistas ou, depois da
vitória da Revolução de Outubro, nos partidos comunistas, sem falar na influência importante do
Bund na Rússia, Polônia e países bálticos, pelo menos até a década de 1920.
Durante décadas o sionismo foi um movimento de intelectuais askenazes laicos, sem base
popular. Houve componentes do judaísmo, nomeadamente as grandes comunidades sefarditas da
África do norte, que estiveram praticamente à margem desse movimento até à década de 1930 ou
ainda mais tarde. No entanto, o sionismo acabou por provocar profundas divisões nas diferentes
componentes do judaísmo, religioso e secular, askenaze, sefardita e pertencente a outros grupos.
Embora se tenham atenuado ou transformado, essas divisões subsistem ainda hoje. Para a
maioria esmagadora dos rabinos da Europa central e oriental que se encontraram confrontados
com ele, o projeto dos sionistas de criar o estado dos judeus, apoiando-se para isso nos seus
próprios meios políticos, diplomáticos e econômicos, era a negação da esperança na "redenção
de Israel" por iniciativa e obra exclusivas de Deus. Por isso, condenaram o sionismo como uma
manifestação de orgulho, o pecado por excelência.[19]
O partido Agudat Israel (União/Associação de Israel) fundado em Kattowitz (Silésia, Polônia)
em 1912, encarnou essa posição. O partido propunha-se reunir todos os judeus fiéis à Lei para se
oporem ao nacionalismo sionista considerado como uma ameaça mortal para o "autêntico
judaísmo". No entanto, na década de 1930, o Agudat Israel mitigou, por pragmatismo, a sua
oposição ao sionismo, aceitando que a Palestina se tornasse o refúgio para os judeus europeus
perseguidos. Em 1948 reconheceu de fato as instituições do Estado de Israel. Participou em todas
as eleições legislativas israelitas e em vários governos. No entanto, algumas facções minoritárias
não aceitaram a mudança de orientação.
Uma minoria entre os judeus religiosos da Europa central e oriental aceitou bastante cedo
colaborar com os sionistas. Um dos primeiros expoentes desta posição foi o rabino Isaac Jacob
Reines (1839-1915), nascido em Karolin, na Bielorússia. Na origem, essa posição tinha
sobretudo por objetivo não deixar aos seculares o monopólio do socorro prestado aos judeus
pobres e perseguidos. Encarnou-a o Mizrahi (Centro Espiritual) fundado em Vilnius (Lituânia)
em 1902. Segundo essa corrente do judaísmo religioso, nada impede a colaboração com o
sionismo, pois este não é incompatível com a tradição. A idéia da coexistência pacífica do
judaísmo religioso e do sionismo depressa cedeu o lugar a uma integração da ideologia sionista
dentro do sistema religioso tradicional.
O autor dessa integração foi o rabino Abraão Isaac Hacohen Kook (1865-1935) nascido em
Griva, na Letônia, primeiro Rabino-Mor askenaze da Palestina (1921-1935). Contrariamente aos
seus homólogos do Agudat Israel, o rabino Kook viu no sionismo um instrumento de que Deus
se servia para dar início à "redenção de Israel", e no Estado dos judeus a aurora da redenção ou
do reino de Deus. Os principais herdeiros atuais desta concepção do sionismo são o Partido
Nacional Religioso e o Guch Emunim (Bloco da Fé), que reúne os opositores mais irredutíveis à
devolução de qualquer parcela da Cisjordânia e da Faixa de Gaza conquistadas por Israel em
1967, assim como os colonizadores mais zelosos desses territórios.
O sionismo tornou-se mais popular entre os judeus, sobretudo entre os judeus seculares da
Europa oriental e central, a partir de 1881 por causa dos numerosos ataques e pilhagens de que aí
foram vítimas entre esse ano e 1921. De fato, foi a Europa oriental que forneceu os contingentes
de emigrantes judeus que então foram instalar-se na Palestina. As duas primeiras vagas da
emigração coincidiram com as duas primeiras vagas de pogroms, que tiveram lugar
respectivamente em 1881-1884 e em 1903-1906. A esmagadora maioria dos emigrantes era
gente pobre e perseguida. Dirigiam-na intelectuais das classes médias. Estes fizeram financiar a
operação por membros da burguesia judaica ocidental, européia e norte-americana, ansiosa por
desviar da sua porta uma imigração popular judaica que iria contrariar os seus desígnios de
"assimilação" nos países respectivos.
O Papel do Imperialismo Inglês
A Primeira Guerra Mundial teve conseqüências decisivas para a Palestina. As potências aliadas
não esperaram pelo fim da guerra para preparar o desmantelamento e a liquidação do império
turco, aliado da Alemanha. Procurando aproveitar-se do nacionalismo árabe, a Grã-Bretanha
prometeu ao xeque Hussein de Meca o seu apoio para a criação de um estado árabe independente
tendo por fronteira ocidental o mar Vermelho e o Mediterrâneo, em troca da revolta árabe contra
a Turquia. De fato, a Palestina, que fazia parte do território do anunciado estado árabe, era
cobiçada ao mesmo tempo pela Grã-Bretanha e pela França, mas as duas potências admitiram o
princípio da sua internacionalização nos acordos secretos de Sykes-Picot de 16 de maio de 1916.
De fato, as forças britânicas, às quais se renderam as forças turcas em Jerusalém a 9 de dezembro
de 1917, terminaram a ocupação da Palestina em setembro de 1918. A Palestina ficou então sob
administração militar britânica, a qual foi substituída por uma administração civil a 1° de julho
de 1920. Entretanto, na Conferência da Paz reunida em Paris, em janeiro de 1919, as Potências
Aliadas decidiram que os territórios da Síria, do Líbano, da Palestina/Transjordânia e da
Mesopotâmia não seriam devolvidos à Turquia, mas passariam a formar entidades distintas,
administradas segundo o sistema dos Mandatos.
Criado pelo Artigo 22 do Pacto da Liga das Nações a 28 de junho de 1919, o sistema dos
mandatos destinava-se a determinar o estatuto das colônias e dos territórios que se encontravam
sob o domínio das nações vencidas. O documento declarava que "algumas comunidades outrora
pertencentes ao Império Turco atingiram um estado de desenvolvimento" que permite reconhecêlas provisoriamente como nações independentes. Em relação a essas nações, o papel das
potências mandatárias seria ajudá-las a instalar a sua administração nacional independente. O
mesmo documento estipulava ainda que os desejos dessas nações deveriam ter “uma
consideração principal” na escolha da potência mandatária.
Na conferência de San Remo a 25 de abril de 1920, o Conselho Supremo Aliado repartiu os
Mandatos para essas nações entre a França (Líbano e Síria) e a Grã-Bretanha (Mesopotâmia,
Palestina/Transjordânia). O Mandato para a Palestina, que incorporou a Declaração Balfour
sobre o estabelecimento do "lar nacional para o povo judaico", foi aprovado pelo Conselho da
Liga das Nações a 24 de julho de 1922, tornando-se efetivo a 29 de setembro do mesmo ano. Ao
abrigo do disposto no art. 25 do Mandato para a Palestina, o Conselho da Liga das Nações
decidiu a 16 de setembro de 1922 excluir a Transjordânia de todas as cláusulas relativas ao lar
nacional judaico, e dotá-la com uma administração própria. De fato, o território que os sionistas
pretendiam para nele estabelecer o seu estado era bastante mais vasto do que a Palestina.
Abarcava também toda a parte oeste da Transjordânia, o planalto do Golã e a parte do Líbano a
sul de Sidão.
Como previsto, todas essas nações se tornaram efetivamente independentes no curso das três
décadas seguintes: o Iraque (Mesopotâmia) a 3 de outubro de 1932; o Líbano, a 22 de novembro
de 1943; a Síria, a 1º de janeiro de 1944 e, finalmente, a Transjordânia, a 22 de março de 1946. A
única exceção foi a Palestina. O obstáculo que fez descarrilar o processo da independência da
Palestina foi a adoção pela Liga das Nações, seguindo nisso as pegadas da Grã-Bretanha, do
projeto sionista da criação do "lar nacional para o povo judaico" nesse país. A Organização
Sionista Mundial tinha entretanto amadurecido esse projeto e tinha-lhe granjeado apoios muito
sólidos, vindo-lhe o principal da Grã-Bretanha. Esta expressou o seu patrocínio ao projeto
sionista na já referida Declaração Balfour. As "comunidades não-judias" constituíam então um
pouco mais de 90 % da população. De fato, em 1918, a Palestina tinha 700.000 habitantes:
644.000 árabes (574.000 muçulmanos e 70.000 cristãos) e 56.000 judeus.
A Declaração Balfour era originalmente um compromisso que a Grã-Bretanha assumia para com
a Federação Sionista. Mas entretanto ela recebeu o aval das principais potências aliadas e foi
incorporada no Mandato para a Palestina, aprovado pela Liga das Nações a 24 de julho de 1922.
Com efeito, o essencial da Declaração Balfour é citado explicitamente no § 2 do preâmbulo do
dito documento. É ainda reforçado no § 3, graças a dois elementos que não constavam na
Declaração Balfour, isto é, a menção da ligação histórica do povo judaico com a Palestina e a
idéia da reconstituição do seu lar nacional nesse país.[20]
Dos vinte e oito artigos do texto do Mandato seis tinham por objeto o estabelecimento do lar
nacional judaico ou medidas com ele relacionadas. O art. 2, que é o primeiro de caráter
programático, começa assim: "A (Potência) Mandatária terá a responsabilidade de pôr o país em
condições políticas, administrativas e econômicas que assegurem/garantam o estabelecimento do
lar nacional judaico, como está estipulado no preâmbulo".
Sem excluir formalmente o objetivo normal do tipo de Mandato aplicado aos países árabes do
império otomano, que era levar à plena independência a população que então os habitava, o
Mandato para a Palestina tinha outro objetivo, que lhe era próprio, isto é, promover a criação de
um lar nacional judaico – subentenda-se a criação de um estado judaico – com gente que, na sua
maioria esmagadora, estava ainda espalhada pelo mundo e, por conseguinte, deveria ser trazida
de fora. O documento também mencionava as comunidades não-judaicas então existentes na
Palestina e os seus direitos cívicos e religiosos – não refere os seus direitos políticos – mas as
suas menções vêm em segundo lugar e expressam-se sob a forma de ressalvas feitas às medidas
destinadas a implementar o projeto sionista.[21]
Graças ao Mandato para a Palestina, o patrocínio do projeto sionista, que era um elemento da
política britânica, tornou-se política oficial da Liga das Nações. Esta não só deu ao projeto
sionista a caução internacional: forneceu-lhe também os meios para a sua realização. Do seu
lado, as organizações sionistas aproveitaram a infra-estrutura administrativa e econômica que o
Mandato pôs à sua disposição para acelerar a realização do projeto de criação do Estado judaico
na Palestina. Para isso intensificaram a imigração dos judeus da Europa oriental e central, em
três vagas principais: em 1919-1923, 1924-1928 e 1932-1940. Em 1931 os judeus eram 174.610
de um total de 1.035.821 habitantes da Palestina.
Em 1939, já eram mais de 445.000 e em 1946 atingiram o número de 808.230 de um total de
habitantes da Palestina respectivamente de 1.500.000 e de 1.972.560. Por outro lado, o Fundo
Nacional Judaico, isto é, o fundo da Organização Sionista Mundial para a compra e o
desenvolvimento da terra, intensificou a aquisição de terras. Estas tornavam-se "propriedade
eterna do povo judaico", inalienável e que só podia ser arrendada a judeus. No caso das
explorações agrícolas, até a mão de obra devia ser exclusivamente judaica. Por fim, os sionistas
criaram em pouco tempo as principais estruturas do futuro estado, inclusive um exército (a
Haganah).
2. SURGIMENTO DO MOVIMENTO NACIONAL PALESTINO
A maneira como os vencedores da Primeira Guerra Mundial decidiram o destino da Palestina,
servindo-se para isso da Liga das Nações, misturou duplicidade e prepotência. Se questiona até a
legalidade das decisões da Liga das Nações em relação à Palestina em nome das regras que ela
própria fixara. Assim, apesar de ter classificado a Palestina num grupo de nações às quais
reconhecia imediatamente a independência formal e prometia a independência efetiva a curto
prazo, a Liga das Nações impôs-lhe um Mandato cujo objetivo prioritário não era a instalação da
administração palestina nacional, como previa o documento que instituiu o sistema dos
Mandatos, mas, sim, a criação do "lar nacional judaico".
Esse objetivo não só contrariava o processo de transição para a independência política efetiva da
Palestina, mas era incompatível com o próprio princípio da sua independência com a população
que ela então tinha, princípio esse que a Liga das Nações admitira previamente. Por outro lado,
tendo nomeado a Grã-Bretanha para potência mandatária sem ter consultado os palestinos, o
Supremo Conselho Aliado não respeitou a regra fixada pelo Pacto da Liga das Nações, segundo a
qual os desejos das comunidades submetidas a esse tipo de Mandato deviam ser uma
consideração principal na escolha da potência mandatária (artigo 22).
Os palestinos viram no patrocínio que deram primeiro a Grã-Bretanha, e depois a Liga das
Nações, ao projeto sionista, a negação do seu direito à independência. Tanto a Grã-Bretanha
como a Liga das Nações, explícita ou implicitamente, não só lhes tinham reconhecido esse
direito, mas também lhes tinham prometido o seu gozo pleno a curto prazo. Por isso, além do
mais, os palestinos sentiram-se defraudados. Naturalmente, opuseram-se ao projeto da criação do
lar nacional judaico na Palestina desde o primeiro instante – logo que tiveram conhecimento da
Declaração Balfour – e tentaram, por todos os meios, impedir a sua realização, pois temiam que
dela resultasse a sua submissão, não só política mas também econômica, aos sionistas, passando
assim do domínio turco para o domínio judaico, com um intervalo britânico. Apresentaram
protestos contra a Declaração Balfour à Conferência de Paz de Paris e ao Governo Britânico.
A primeira manifestação popular contra o projeto sionista teve lugar a 2 de novembro de 1918,
primeiro aniversário da Declaração Balfour. Essa manifestação foi pacífica, mas a resistência
depressa se tornou violenta, expressando-se em ataques contra os judeus que degeneravam em
confrontos sangrentos. Houve motins em 1920, durante a Conferência de San Remo que
distribuiu os Mandatos, em 1921, 1929 e 1933. De um modo geral, as erupções de violência
eram cada vez mais graves à medida que o Mandato se prolongava e a colonização sionista se
estendia e fortalecia. Os acontecimentos desenrolavam-se segundo uma seqüência que se tornou
habitual. A potência mandatária respondia aos motins nomeando uma comissão real de inquérito,
cujas recomendações reconheciam a legitimidade das reivindicações palestinas e levavam a
anunciar ou a esboçar tímidas medidas tendentes a satisfazê-las. Mas, dado que contrariavam o
objetivo primordial do Mandato, essas medidas ficavam letra morta ou eram depressa
esquecidas.
A Declaração Balfour foi denunciada pelos bolcheviques, para quem a atribuição da Palestina
aos judeus era uma encenação do imperialismo britânico com o objetivo de mascarar e justificar
a abolição do Império Otomano, o que fica ainda mais evidente nas palavras de Lord Balfour,
quem afirmou em caráter privado durante reunião do Gabinete de Guerra no final de outubro de
1917, que a Palestina “não era adequada para formar um lar para os judeus ou para qualquer
outro povo”.
O segundo objetivo britânico foi admitido pelo próprio David Lloyd George, primeiro ministro
da Grã-Bretanha no momento da Declaração Balfour. Atestou em suas memórias que “em 1917
já era evidente a grande participação dos judeus da Rússia na preparação daquela desintegração
geral da sociedade russa depois conhecida como revolução. Acreditava-se que se a Grã-Bretanha
declarasse o seu apoio à realização das aspirações sionistas na Palestina, um dos efeitos seria
atrair os judeus da Rússia para a causa da Entente (…) Se a Declaração tivesse vindo um pouco
antes, possivelmente alteraria o curso da revolução”.
A oposição à colonização sionista tomou a forma de violentas manifestações de rua em 1931 e
nos anos seguintes. Em abril de 1932, marinheiros árabes de Haifa entraram em greve e foram
seguidos pelos portuários judeus, pertencentes majoritariamente ao grupo sionista de esquerda
Hashomer Hatzair, que se recusaram a furar a greve. Formou-se um conselho de greve comum,
apesar das resistências da Histadrut e da Executiva árabe (tanto os sionistas quanto os
nacionalistas árabes eram contrários à luta conjunta dos trabalhadores, pela qual culpavam os
comunistas). A partir de 1934 produziram-se assembléias massivas com centenas de
trabalhadores árabes e judeus das ferrovias, que desembocaram em uma greve de um dia em
Haifa (maio de 1935). Os grevistas formaram um conselho de todos os trabalhadores das
ferrovias e formaram uma delegação de quatro trabalhadores árabes e quatro judeus para
negociar com os patrões (do governo) e chegaram a vencer em alguns pontos de suas demandas.
Alguns meses antes, em fevereiro-março 1935, centenas de trabalhadores árabes e judeus
realizaram uma greve de três semanas, parcialmente vitoriosa, na refinaria de Haifa e no terminal
do oleoduto da Companhia de Petróleo do Iraque.[22]
Em 1933 já era possível notar o crescimento da oposição árabe ao colonialismo britânico. Para
impedir um levante popular, a Grã-Bretanha propôs a criação de uma “assembléia legislativa”
composta por 11 muçulmanos, 7 judeus, 3 cristãos e 5 oficiais do governo. A proposta foi
rejeitada pelos sionistas, não por oposição ao governo britânico mas porque queriam a criação de
uma assembléia legislativa cem por cento judaica (a chamada Knesset Israel).
Sionismo e Imperialismo Britânico
Em 1936, os britânicos, com a ajuda das milícias sionistas, reprimiram ferozmente uma greve
geral de seis meses, enquanto o mufti e os senhores feudais árabes, subordinados ao imperialismo
britânico de quem obtinham seu poder, ajudaram de modo decisivo ao imperialismo. O Alto
Comitê Árabe, dirigido pelos potentados feudais palestinos, chamou a suspender a greve em
resposta a um pedido de Ibn Saúd da Arábia, do primeiro-ministro iraquiano, Nuri Said, e do
Emir da Transjordânia, Abdallah, que suplicaram aos seus “filhos palestinos que confiem nas
boas intenções dos nossos amigos britânicos, que têm assegurado que haja justiça”.
A Grã-Bretanha criou uma comissão de inquérito para averiguar as causas da revolta, que
concluiu os seus trabalhos com a publicação de um informe em 7 de julho 1937. A chamada
Comissão Peel recomendou notadamente a partição do país com a transferência da população
árabe vivendo dentro da região que deveria se tornar um Estado judeu. O programa da Comissão
Peel foi bem recebido pelos sionistas, mas rejeitado pelos árabes. Pouco depois da publicação do
informe Peel, começou o segundo estágio da revolta no Oriente Médio.[23]
A Comissão Peel, a 7 de julho de 1937, fez uma proposta, consistente em dividir a Palestina em
três zonas: um estado árabe, um estado judeu e uma zona sob o mandato britânico. A Agência
Judaica (ramo palestino da Organização Sionista Mundial) aceitou estas conclusões com uma
reserva quanto às dimensões do estado judeu. O Alto Comitê Árabe as rechaçou. Ressurgiram
então os motins: “Londres volta a pôr a repressão na ordem do dia. Vai ser feroz. As tropas
inglesas, a polícia do mandato reforçada com milhares de voluntários judeus, a Haganah, o Irgun,
os homens dos Nashashibi (“Partido da Defesa” do clã árabe dos Nashashibi, apoiado pela Grã
Bretanha) rivalizam em assestar os golpes mais terríveis aos insurretos com a benção dos Estados
Árabes pró-britânicos e dos clãs palestinos. O movimento árabe palestino não se recuperará por
muito tempo dos milhares de mortos, dos inumeráveis presos e deportados, da desagregação de
partidos e sindicatos”.[24]
A revolta de 1936-1939 foi o ata de nascimento do movimento nacional palestino
contemporâneo: em abril de 1936, distúrbios locais entre árabes e judeus degeneraram numa
revolta generalizada dos palestinos. A revolta já não visava só a colonização sionista. Dirigia-se,
sobretudo, contra as autoridades britânicas, o poder estrangeiro, de quem os palestinos exigiam a
constituição de um governo nacional. As autoridades britânicas responderam com uma repressão
violenta e os sionistas com represálias.
Em 1936, Ben Gurion dizia (se referindo à aceitação da partilha da Palestina): “Um estado judeu
parcial não é o objetivo final, mas sim apenas o princípio. Estou convencido de que ninguém
pode nos impedir de nos estabelecer em outras partes do país e da região”. E agregava mais
tarde: “o estado será somente um estágio na realização do sionismo e sua tarefa é preparar o
terreno para nossa expansão. O estado terá que preservar a ordem, não predicando, mas com
metralhadoras”. Já em 1948, segundo seu biógrafo Bar Zohar, em sua primeira visita à cidade de
Nazaré haveria dito: “porque há tantos árabes, porque não os expulsaram?”.[25]
Os palestinos não renunciavam a uma parte do seu território. Os sionistas, que viam um desvio
da política oficial não só britânica, mas também internacional, ainda não aceitavam a idéia de
criar o estado judaico só numa parte da Palestina, o que aparentemente significaria renunciar à
reivindicação da totalidade do país. A revolta palestina continuou e durou até 1939.
Considerando inviável o plano de divisão da Palestina, os britânicos fizeram marcha atrás e
propuseram no "Livro Branco" de 1939 a criação de um só estado para árabes e judeus, no prazo
de dez anos. O mesmo documento propunha o fim da imigração judaica dentro de cinco anos e
limitava a 75.000 o número de imigrantes durante esse prazo de tempo. Além disso, previa uma
regulamentação estrita da compra de terras pelas organizações judaicas. Esse conjunto de
medidas implicava que os árabes constituiriam um pouco mais de dois terços dos cidadãos do
Estado da Palestina. O peso dos dois povos na administração do Estado seria proporcional à sua
importância numérica.
O "Livro Branco" de 1939 confirmou a virada na política britânica já esboçada dois anos antes.
Ao abandonar a idéia da criação de um estado judaico, as autoridades mandatárias romperam
com a política seguida até então. Isso representava um sério revés para os sionistas. Estes
tiveram que adotar uma nova estratégia, a qual comportou três elementos principais.
Promoveram a imigração ilegal, tarefa essa facilitada pelo genocídio judaico que a Alemanha
nazista estava então a perpetrar na Europa central e oriental. Nessas circunstâncias a Palestina
aparecia como o lugar de refúgio para os judeus europeus, sobretudo do centro e do leste. Além
disso, os sionistas procuraram obter o apoio dos EUA para substituir o apoio britânico. Alguns
grupos armados lançaram-se numa campanha de guerrilha contra as autoridades britânicas e os
árabes. Nessa altura a Haganah não era o único grupo armado judaico. Havia também o Irgun e o
Stern, que se destacaram na guerrilha pela sua violência.
A Comissão Woodhead, enviada à Palestina em março de 1938 para preparar a execução do
plano de partilha da Comissão Peel, ao invés de apresentar em seu relatório um esquema
detalhado da operação, qualificou qualquer partilha de absurda. A revolta árabe só terminou em
1939 com um banho de sangue executado pelas tropas britânicas com o auxílio de grupos paramilitares judeus, contra a população árabe.
Stalinismo e Nacionalismo
A revolta de 1936, que começou espontaneamente como uma onda de greves e manifestações,
era parte de um levante mais geral contra o colonialismo europeu que atingiu a Síria e o Egito,
além da Palestina. As classes governantes árabes, grandes proprietários rurais e lideranças
religiosas, tomadas de surpresa, criaram às pressas um Alto Comitê Árabe (ACA) para controlar
a revolta. O Comitê, que começou a operar em 25 de abril 1936, convocou uma greve geral que
durou até outubro deste ano, quando foi desmobilizada por temor, por parte dos altos círculos na
Palestina e demais países árabes, de que se transformasse em uma revolução social e se voltasse
contra o próprio ACA.[26]
Como a Agência Judaica ordenou os judeus palestinos a se alistar no exército britânico (quase
120.000 o fizeram), o PCP (Partido Comunista da Palestina, fundado na década de 1920, mas já a
essa altura dominado pelo stalinismo) chamou a uma “oposição ativa ao alistamento”. Mas a
virada “anti-imperialista” do PCP era apenas um interlúdio. A mudança foi novamente brusca e
repentina quando a Wehrmacht de Hitler lançou a operação Barbarossa contra a URSS em 22 de
junho de 1941. Se em junho de 1941 o PCP declarava a sua oposição ao slogan de “defesa da
pátria”, alguns meses depois o seu órgão central, Kol Haam (Voz do Povo), já publicava o
slogan: “alistamento em massa no Exército britânico, companheiro em armas do Exército
Vermelho!”, e abandonava a demanda pela “independência da Palestina”. Um PCP “reunificado”
se lançava no esforço de guerra.
Durante a II Guerra Mundial cresceu enormemente o potencial de uma luta conjunta dos
explorados árabe-judaica. Pela primeira vez na história da Palestina o trabalho compartimentado
começou a ceder lugar para um grande número de árabes e judeus trabalhando lado a lado. A
força de trabalho urbana árabe aumentou de aproximadamente 40.000 a 130.000 trabalhadores,
100.000 dos quais eram trabalhadores manuais. Como anteriormente, os trabalhadores
ferroviários ocupavam a vanguarda. “A guerra e o período imediatamente após ela seriam
testemunhos não apenas de um grau de colaboração sem precedentes entre os sindicatos
ferroviários árabes e judeus mas também de uma militância inédita” escreve Zachary
Lockman.[27] Trabalhadores ferroviários árabes e judeus de Haifa lançaram reivindicações
conjuntas em 1940, e protestaram juntos em dezembro de 1942, com uma greve de três dias de
todas as oficinas de Haifa desafiando uma proibição oficial contra as greves em setores
essenciais da indústria.
A invasão alemã da União Soviética em junho de 1941 juntamente com o massacre stalinista da
oficialidade do Exército Vermelho, no final da década de 1930 (liquidação de seus generais,
recusa em preparar para o ataque alemão e o bloqueio da resistência nos primeiros dias da
invasão) praticamente levaram à destruição da URSS entre 1941 e 1942. O programa do
internacionalismo comunista era sistematicamente descartado enquanto Stalin liquidava
(assassinava) milhares de comunistas e revivia os símbolos czaristas. Após uma seqüência de
derrotas, e a morte de 20 milhões de russos, a batalha de Kursk (1943) marcou a marcha da
URSS rumo à vitória sobre Hitler. Na medida em que a II Guerra Mundial chegava ao fim, as
vitórias do exército soviético conferiram prestígio aos PCs em todo o mundo, inclusive na
Palestina. Enquanto o PCP atraía setores da esquerda judaica, os militantes da classe operária
árabe eram atraídos à comunista Liga de Libertação Nacional.
Se durante o período de guerra a classe operária cresceu em todo o Oriente Médio devido ao
crescimento da indústria de abastecimento para a guerra e para o mercado local (que deixou de
receber o anterior fluxo de importações), no imediato pós-guerra o potencial desta classe operária
tornou-se explosivo devido à ameaça crescente de desemprego entre trabalhadores árabes e
judeus, causada pelo fechamento das indústrias armamentistas: “O Oriente Médio de hoje não é
o Oriente Médio de vinte anos atrás, com sua população de felaheen atrasados, explorados e
oprimidos pelos príncipes feudais reacionários. Todos esses países experimentaram uma
industrialização considerável nos anos recentes, e este processo recebeu um grande ímpeto
durante a guerra. Com o crescimento da indústria, veio o crescimento da classe trabalhadora, a
emergência de sindicatos, de organizações socialistas, de jornais da classe operária. Os velhos
príncipes feudais, tremendo diante do espectro desta nova classe trabalhadora, lançaram-se nos
braços dos ‘protetores’ britânicos”.[28]
No final de novembro de 1947 as Nações Unidas votaram a favor a partição da Palestina,
atribuindo aos judeus 55% do território apesar de constituírem apenas um terço da população,
vivendo principalmente nas cidades e ocupando apenas 6% da terra. A revolta da população
árabe foi generalizada. Estouraram conflitos e uma greve geral árabe em Jerusalém. Por outro
lado, o Irgun lançou uma série de ataques de “retaliação” e um terror indiscriminado contra a
população civil árabe. A Haganah também executou “contra-ataques” contra a estação
rodoviária de Ramallah e o vilarejo de Khisas na Galiléia, no qual foram assassinados uma dúzia
de moradores.
Em 29 de dezembro o Irgun lançou bombas sobre a cidade velha de Jerusalém matando ou
ferindo um total de 44 pessoas. Na manhã seguinte, terroristas do Irgun realizaram um ataque,
com bombas lançadas de um carro, contra uma multidão de centenas de operários árabes
diaristas reunidos no portão principal da refinaria de petróleo de Haifa à espera de um dia de
trabalho; seis morreram e dezenas ficaram feridos. Minutos depois, trabalhadores árabes
enfurecidos invadiram a refinaria e junto com alguns dos operários da empresa começaram a
atacar os judeus. Quando a polícia chegou já havia 41 trabalhadores judeus mortos e 49 feridos.
Mas a solidariedade árabe-judaica dos trabalhadores não foi automaticamente liquidada pelo
novo clima de ódio inter-comunitário. Quando as notícias do atentado contra os trabalhadores
árabes chegaram às oficinas ferroviárias, o clima de vingança ameaçava produzir um novo banho
de sangue. Sindicalistas árabes arriscaram suas vidas para defender os seus colegas judeus. O
massacre da refinaria de Haifa foi o maior e mais brutal assassinato de civis até aquele momento.
Mal se escondia o propósito do ataque: aumentar a divisão e o ódio entre árabes e judeus. Tanto
o atentado do Irgun quanto a “retaliação” foram dirigidos contra um ambiente de trabalho
conhecido por possuir uma tradição de cooperação e solidariedade de classe entre trabalhadores
árabes e judeus.
Olhando apenas para a área da Palestina no ano de 1948, vemos que o Estado sionista e as
potências imperialistas que o apoiaram dominaram a resistência árabe palestina e oprimiram os
setores onde a luta operária transcendia as fronteiras comunitárias. Ao mesmo tempo, entre
1945-48, evidenciou-se a posição da Palestina como o centro de uma região – o Oriente Médio de grandes disputas inter-imperialistas. As greves e lutas operárias do outro lado do Canal de
Suez, no Egito, e a revolta dos trabalhadores e estudantes no Iraque, poderiam ter estabelecido
contato com a luta operária árabe-judaica na Palestina no período do estabelecimento do Estado
de Israel. No entanto, o potencial revolucionário destas lutas foi bloqueado em grande medida
pela política stalinista de alinhamento com os nacionalismos em disputa entre si.
Com um programa de colaboração de classe, o PC do Iraque se opôs à luta por uma revolução
socialista ou mesmo uma república, enquanto os comunistas egípcios se opunham às demandas
dos trabalhadores de expropriação das indústrias têxteis. Depois, seguindo os ditames de
Moscou, todos apoiaram a criação do Estado de Israel. Na Palestina, a solidariedade operária
árabe-judaica dificilmente sobreviveria às atrocidades que foram os produtos inevitáveis da
guerra inter-comunitária. O próprio contato entre trabalhadores árabes e judeus foi prejudicado
pelo deslocamento físico de grande parte da população árabe da Palestina. Era imprescindível,
para qualquer desenvolvimento harmonioso que beneficiasse os povos árabe e judaico da
Palestina, romper com as divisões comunitárias e derrotar os nacionalismos burgueses em guerra
entre si.
Apesar de sionistas e lideranças feudais árabes fomentarem o ódio entre as duas comunidades,
em quase três décadas de domínio colonial britânico não faltaram exemplos de união espontânea
entre trabalhadores árabes e judeus na Palestina ou tentativas sérias de organizar esta união
classista, empreendidas pela esquerda não sionista, e apoiadas em certa medida pelo Hashomer
Hatzair dentro da perspectiva de criação de um Estado bi-nacional. Após a Segunda Guerra
Mundial houve uma onda de manifestações e lutas operárias. Em Tel Aviv houve uma
manifestação dos trabalhadores das estradas de ferro que em sua marcha gritavam “Os
trabalhadores árabes e judeus são irmãos!”.
Reprimidas brutalmente pelos governos de seus respectivos países, estas lutas operárias e os
militantes comunistas que as lideraram foram ainda condenados ao fracasso pela política do
stalinismo, que favorecia a sua união com reis, xeiques e coronéis árabes, ou com os sionistas na
Palestina, no período crucial do fim do mandato britânico e criação do Estado judeu. Atrelados à
política externa ditada pelo Kremlin, os comunistas viram quebrar sua própria estrutura e todo
desenvolvimento autônomo criado nas décadas de luta. Para criar Israel foi necessário destruir a
solidariedade entre os trabalhadores árabes e judeus. Isto foi denunciado pelo pequeno grupo
trotskista da Palestina, a Liga Comunista Revolucionária da Palestina que, apesar de muito
menor e menos influente do que os grupos stalinistas do PCP ou da Liga de Libertação Nacional,
manteve-se ativo durante a Segunda Guerra Mundial e o período de criação do Estado de
Israel.[29]
Entretanto surgiram outras propostas, como a criação de regiões de autonomia e a federalização,
para tentar apaziguar o conflito o suficiente, apenas, para permitir a continuidade do domínio
externo e da exploração estratégica da região (havia apenas cinco refinarias de petróleo no
Oriente Médio, uma delas em Haifa, Palestina, e o único oleoduto existente partia de Kirkuk,
Iraque, até o porto de Haifa). Era mais fácil para a Inglaterra governar uma região onde as
tensões internas provinham de uma oposição inter-comunitária, entre árabes e judeus, do que se
as linhas de divisão nacional cedessem lugar a uma oposição de classe (já que uma união entre
trabalhadores árabes e judeus voltar-se-ia contra a burguesia local e a potência imperialista
simultaneamente). União esta que era o cenário mais provável caso a Inglaterra retirasse o seu
apoio ao sionismo.
Sob o impacto do massacre de seis milhões de judeus da Europa – um dos maiores crimes, se não
o maior, já cometidos contra a humanidade - a partilha foi aprovada pela ONU em novembro de
1947 (a Inglaterra anunciara a entrega do mandato no início do mesmo ano). Ela foi rejeitada
mais uma vez pelos palestinos, e a sua aprovação pela ONU contou com o suborno quase
escandaloso das delegações de diversos países pequenos e “menos importantes” pelo lobby
sionista. Eclodiram lutas entre as duas comunidades em Jerusalém, Haifa e Jaffa entre outras
localidades, que se espalharam e degeneraram em poucos dias em um conflito generalizado.
O Surgimento de Israel
Nos dois meses que se seguiram à resolução da partilha, houve 2.778 baixas (1.462 árabes, 1.106
judeus e 181 britânicos). Em face dos trágicos acontecimentos na Palestina, até os mais otimistas
na ONU deram-se conta de que a partilha jamais poderia ser realizada sem a aplicação da força.
Israel recebeu um apoio decisivo da União Soviética cujas armas, enviadas pela
Tchecoslováquia, contribuíram para a sua vitória na guerra contra os Estados Árabes que eclodiu
no dia seguinte à proclamação de Israel, em 15 de maio de 1948. Durante a segunda metade do
século XX, os palestinos viveram exilados e refugiados em diferentes países do Oriente Médio.
A comunidade sionista na Palestina, apoiada a partir de 1917 pelo imperialismo britânico, vinha
conquistando seu espaço paulatinamente mediante o incentivo à imigração, a compra de terras de
proprietários árabes feudais ausentes e a expulsão dos trabalhadores árabes da terra. As
instituições fundamentais de Israel (o partido hegemônico, Mapai, trabalhista, a central dos
trabalhadores com funções mais amplas do que a de uma simples central sindical, a Histadrut, o
núcelo do exército, a Haganah, a universidade etc.) foram erguidas antes da criação do Estado.
Saudaram a proposta de partilha de 1937, e defenderam a partilha de 1947, como o avanço que
de fato representava para o sionismo.
Mas a divisão da Palestina não era o verdadeiro objetivo dos principais representantes do
movimento. Enquanto a tradição revisionista criada por Jabotinsky (da qual é herdeira a atual
direita sionista) manteve uma política em certo sentido mais ‘coerente’, porque sempre declarou
que o seu objetivo era conquistar toda a Palestina histórica (jamais dividir “aquilo que Yahweh
lhes havia entregue por inteiro”), o trabalhismo executou, de maneira oculta e com ações que
contradiziam suas declarações, a mesma política na prática. Demonstração disso foi que a
expansão territorial de Israel começou logo da declaração de aceitação da Partilha da ONU e a
fundação do Estado.[30]
A partir de 1942, Washington havia tomado uma parte importante no organismo de coordenação
do desenvolvimento econômico do Oriente Médio estabelecido pela Grã Bretanha. Os EUA
haviam estado, durante muito tempo, ausentes dessa região. As companhias petroleiras norteamericanas se introduziram no Oriente Médio, mediante a aquisição de uma participação de 25%
na Irak Petroleum, o controle de Bahrein, da Arábia Saudita. A parte dos EUA na produção de
hidrocarbonetos no Oriente Médio passaria de 13,9% em 1938 a 55% em 1948.
Foi o ponto de partida da intervenção americana. Constituiu-se uma primeira comissão angloamericana sobre a Palestina cujos resultados foram aceitos pela Grã Bretanha, porém rechaçados
pelo presidente Truman: “Não podemos prescindir dele”, disse então Clement Attlee, primeiro
ministro britânico, falando do empréstimo que negociava com os EUA. Se formou uma segunda
comissão anglo-americana, suas propostas se discutiram no parlamento nos dias que seguiram a
explosão da sede da administração britânica na Palestina, o atentado do Irgun que provocou a
morte de cem pessoas. O governo britânico rechaçou a proposta dos militares de guerra total
contra os sionistas, e propôs um novo plano de divisão sob o seu controle. Truman rechaçou de
novo a proposta. Nesse final de ano de 1946, Londres se dispunha a anunciar sua saída das
Índias; as negociações sobre a retirada do Egito fracassaram: levantes no Cairo e Alexandria
obrigaram o rei Faruk a rechaçar o protocolo de acordo com a Grã Bretanha. Entretanto, durante
o inverno de 1947, a Grã Bretanha sofre escassez de víveres e de carvão e o império estava
desabando. Em uma declaração no Parlamento, o líder trabalhista Aneurin Bevin disse sobre a
Palestina: “Decidimos pedir às Nações Unidas que preconizem uma solução”. A Grã Bretanha
cedia diante dos EUA.
O genocídio perpetrado durante a II Guerra Mundial pelo nazismo dizimara as populações
judaicas da Europa, e pressionou para que centenas de milhares de sobreviventes fugissem. Este
genocídio se realizou em meio a indiferença e ao silêncio de todos os beligerantes, tanto do
imperialismo como da URSS. E nenhum estado abriu suas fronteiras aos perseguidos.
Paradoxalmente, um dos acordos reacionários que precederam o genocídio (o acordo HitlerStalin, que concretizou a partilha da Polônia entre a Alemanha nazista e a URSS) teve o efeito
inesperado de poupar uma parte da população judaica da Polônia oriental do massacre nazista,
não porque Stálin os protegesse da invasão hitleriana, mas porque enviou milhões de poloneses
(incluídos muitos judeus) para campos de trabalhos forçados na Sibéria ocidental, tal como
descrito nas memórias do jornalista polonês (ele próprio judeu) K. S. Karol, depois
mundialmente reconhecido pelos seus trabalhos para a imprensa francesa e pelos seus livros:
“Poco más o menos en las mismas fechas, a finales de 1941, después de una visita a Moscú del
general Sikorski (chefe governo polonês no exílio) concluída con un acuerdo entre su gobierno,
con sede en Londres, y el de Stalin, los pereselentzi y los demás deportados polacos empezarían,
por el contrario, a salir de sus bosques. Esto requirió tiempo, ya que el propio estado soviético
tenía aparentemente dificultades para recuperarlos en los perdidos lugares donde los había
confinado «para siempre». De ahí, a juzgar por el único testimonio que poseo sobre
Liebiedovka, que sus barracones sólo se vaciaran a principios de la primavera de 1942. En
cualquier caso, esta diáspora polaca procedente de las províncias orientales fue lo
suficientemente numerosa como para permitir primero al general Anders reclutar con ella un
ejército -que se batió en Tobruk y en Monte-Casino-, constituir después un comité de patriotas,
de obediencia comunista y formar, en fin, dos divisiones que combatieron al lado del Ejército
Rojo desde Lenino hasta Berlín.
“Ante este desenlace, resultaría tentador atribuir la acción de junio de 1940 a la clarividencia
de Stalin: habría hecho esta gigantesca redada para contar con un vivero polaco, aunque ese
vivero estuviera en el frigorífico siberiano, y poder así disponer en su día de combatientes
contra los alemanes. Pero desde el XX Congreso del P.C.U.S., hasta Moscú rehúye poner en una
misma frase las palabras «Stalin» y «clarividencia». Por lo demás, una tesis tal no resiste el
análisis, en razón de la composición social de los deportados de junio de 1940. A pesar de la
activa ayuda de mi amigo Bronek Baczko, no he podido pues hallar respuesta al enigma que
tanto me inquieta desde hace cuarenta años: Por qué se envió de golpe y con tantos gastos a un
número tal de personas, de todas edades y profesiones, a esa mezcla de caldera y congelador
que es Siberia? Por qué a esas personas precisamente? Para qué? No se habrían podido utilizar
sus competencias en forma más racional, haciéndoles trabajar «lejos de las regiones
fronterizas», sí, pero en un ambiente más familiar que el del país de las «fabulosas riquezas»?
Cuando los archivos del Kremlin se abran, un día llegará a hacerse un estudio sobre todas estas
cuestiones. Sería también ínteresante determinar cuántos de estos deportados -y de sus hijos- se
convirtieron posteriormente en dirigentes de la Polonia popular y cuántos también, después de
haber transitado en 1945-1946, se fueron con Ben Gurion proporcionándole el esqueleto de su
administración”.[31]
Assim, a história provavelmente fez com que a política de saque da burocracia russa tivesse o
efeito impensado de formar boa parte da futura base política askenazi do regime de Ben Gurion,
que encabeçaria a implantação de Israel no Oriente Médio, no imediato segundo pós-guerra.
Ao acabar a II Guerra Mundial, os acordos de Yalta entre o imperialismo e o Kremlin
pretendiam preservar, contra a vontade das massas, a dominação do imperialismo, manter a
dominação sobre os povos coloniais e resolver também os problemas nacionais na Europa. A
conseqüência disso foram deslocamentos massivos da população. Nesse caos europeu, o
imperialismo canalizou centenas de milhares de refugiados judeus, que saiam de uma das
páginas mais sombrias da história contemporânea, para a Palestina, desembaraçando-se de toda a
responsabilidade na matança nazista, para utilizá-los como parapeito contra os povos do Oriente
Médio. Israel tinha já em 1948 uma enorme vantagem sobre a coligação árabe. O seu exército era
mais numeroso, estava melhor treinado e melhor equipado. Além disso, Israel tinha o apoio das
grandes potências e a simpatia da opinião pública ocidental. Os combates cessaram praticamente
no dia 7 de janeiro de 1949, graças à intervenção da ONU. Entre 23 de fevereiro e 20 de julho
desse mesmo ano, os países árabes implicados na guerra, exceto o Iraque, assinaram armistícios
com Israel.
Os territórios ocupados por Israel no fim da guerra constituíam quase 78% da Palestina.
Tornaram-se, de fato, o território do Estado de Israel. Ficaram fora dele a cadeia de baixas
montanhas do centro e do sul da Palestina, a chamada Cisjordânia, assim como a Faixa de Gaza.
Jerusalém ficou dividida: a parte oeste da cidade extra-muros ficou do lado de Israel; a cidade
antiga e o bairro extra-muros a norte ficaram do lado árabe. Israel declarou Jerusalém sua capital,
decisão que ia contra a Resolução 181 da Assembléia Geral da ONU de 1947, que recomendava
a internacionalização da cidade. No dia 11 de maio de 1949, o Estado de Israel foi admitido na
ONU. A 24 de abril de 1950, a Cisjordânia com a parte de Jerusalém sob domínio árabe foi
anexada à Transjordânia, que passou a chamar-se Reino Hachemita da Jordânia. A Faixa de Gaza
ficou sob administração militar egípcia.
Uma Nação Artificial
Entre 700 e 900 mil palestinos do que se tornou o território de Israel, isto é, a esmagadora
maioria da sua população autóctone, encontrou-se na situação de refugiada. Uns fugiram de suas
casas aterrorizados com a aproximação das forças judaicas. O pânico que se abateu sobre a
população palestina foi criado em boa parte pelos massacres cometidos pelas forças judaicas em
vários pontos do país. O mais conhecido é o de Der Yassin, que era então uma aldeia na
vizinhança de Jerusalém. As suas terras estão hoje ocupadas por Giveat Chaul, um bairro da
cidade. A 9 de abril de 1948, um comando do Irgun e do Stern entrou em Der Yassin e
massacrou mais de cem pessoas, homens, mulheres e crianças. A notícia desse massacre
provocou a fuga de cerca de 100.000 pessoas da região de Jerusalém. Outros palestinos foram
expulsos à força. Entre os vários casos conhecidos, os de maiores proporções tiveram lugar em
Lida (a atual cidade de Lod) e Ramlé.
Uma escaramuça com tropas árabes ocorrida no dia 12 de julho de 1948 serviu de pretexto ao
exército de Israel para uma violenta repressão que custou a vida a 250 pessoas, algumas das
quais eram prisioneiros desarmados, assim como para a expulsão de cerca de 70.000 pessoas,
algumas das quais já eram refugiadas. A ordem de expulsão foi dada pelo próprio PrimeiroMinistro, David Ben Gurion. Os seus executores foram Igal Alon e Isaac Rabin. A Galiléia foi a
região do território de Israel onde ficaram mais palestinos. As zonas de maior densidade
populacional palestina ficaram sob administração militar até 8 de dezembro de 1966.
A 11 de dezembro de 1948 a ONU aprovou a resolução 194 que reconhecia aos refugiados
palestinos o direito de regressarem aos seus lares ou de serem indenizados, se assim o
preferissem. Apesar de o preâmbulo da resolução mencionar explicitamente a aplicação desta
resolução, Israel recusou-se e continua a recusar-se a aplicá-la. Apressando-se a arrasar as
aldeias palestinas que tinham sido esvaziadas dos seus habitantes (o número habitualmente
avançado é de cerca de 500 localidades) e distribuindo as suas terras aos imigrantes judeus, Israel
tornou impossível o regresso de uma boa parte dos refugiados aos seus lares. A esmagadora
maioria dos refugiados amontoou-se em acampamentos na Faixa de Gaza, na Cisjordânia, na
Jordânia, na Síria e no Líbano. No dia 1º de maio de 1950 a ONU criou a UNRWA, a agência
internacional que passou a ocupar-se deles.
O estado de Israel, portanto, não nasceu de um desenvolvimento nacional que culminasse na
constituição de um estado, mas de uma decisão da ONU sob a égide dos EUA e da URSS. Em 14
de maio de 1947, Andreij Gromyko se pronunciava na tribuna da ONU por um “estado judeuárabe único com direitos iguais para os judeus e os árabes”, porém precisando: “Se esta solução
resultar irrealizável devido as relações cada vez mais tensas entre os judeus e os árabes, então
teria que estudar uma segunda solução que incluísse a divisão em dois estados independentes,
um estado judeu e um estado árabe”. Após de decretado o fim do Mandato britânico, por maioria
de 2/3 (o que incluiu a França que num primeiro momento havia se abstido e mudou o voto pela
pressão dos EUA), os delegados da ONU decidiram pela divisão da Palestina, em 29 de
novembro de 1947.
Em 30 de novembro desse ano, se iniciaram os enfrentamentos entre os sionistas e os árabes. A
Liga Árabe montou um exército. Porém, persistia o desacordo: o Cairo se pronuncia contra uma
intervenção militar. Amman faz o mesmo contra um governo palestino e quer, contra o parecer
de Egito e Síria, anexar as partes árabes à Transjordânia. Uns dias antes, em 17 de novembro de
1947, dez dias antes da votação na ONU, Abdallah, emir da Transjordânia, teve uma entrevista
secreta com Golda Meir, novo chefe político da Agência Judaica, para acordar “uma divisão que
não o humilhe aos olhos do mundo árabe”. Os britânicos estabeleceram um acordo com o emir
Abdallah, por meio de Glubb Pachá (que não era senão John Glubb, oficial britânico), chefe da
Legião Árabe, que garantia a anexação dos territórios árabes da Palestina por parte de Amman
após a divisão.
Os combates se estenderam ao conjunto da Palestina, não na forma de um conflito tradicional,
senão da guerra de guerrilha. Em novembro de 1947, o Partido Comunista Palestino, até então
anti-sionista, mudou de nome e passou a chamar-se Partido Comunista de Eretz Israel (Grande
Israel). Em 19 de dezembro de 1947, os dirigentes sionistas e a URSS firmaram um acordo de
armamento que será ratificado em janeiro de 1948 por Moshe Sherlak e Andreij Gromyko em
Nova York. A Tchecoslováquia se encarregaria de entregar o armamento para as milícias
sionistas (dos 19 milhões de dólares gastos para armar os sionistas, 11 provinham da
Tchecoslováquia).
Nos EUA, em dois anos se coletaram 100 milhões de dólares para financiar o esforço bélico. Em
abril de 1948, a Haganah passa para a ofensiva, atacando vários povoados. Com a “luz verde” da
Haganah, seu rival de direita, o Irgun, ataca o povoado de Deir Yassin, abatendo. a sangue frio
250 habitantes, principalmente mulheres e crianças, depois de conquistar a vila. O massacre e a
propaganda que fazem deste ato, empurraram ao êxodo os palestinos. Mais de 350 mil
abandonam seu lar antes de junho.
Várias regiões são assim conquistadas. No final de abril, oficiais da Haganah e da Legião Árabe
se puseram de acordo para evitar enfrentamentos entre elas. Com o acordo dos EUA (em 23 de
abril, por telegrama, Truman anunciou que reconheceria o estado tão logo fosse proclamado) os
dirigentes sionistas proclamam em 14 de maio de 1948: “Em virtude do direito natural do povo
judeu e da resolução das Nações Unidas, proclamamos a criação do estado judeu da Palestina,
que tomará o nome de Israel”. O estado é reconhecido pelos EUA e pela URSS, entre outros.
Entre Guerra Civil e Guerra Nacional
Em 15 de maio, os homens do major Glubb, a Legião Árabe, atacaram. No mesmo momento, o
emir Abdallah recebeu uma mensagem do presidente sírio no sentido de atrasar a invasão. Por
outro lado, o emir Abdallah havia modificado na véspera o plano de combate, para concentrar-se
em Jerusalém e a Palestina central (em uma palavra, nos “territórios árabes”, da divisão).
Apostando durante um tempo em um entendimento com os sionistas, Abdallah se resignou à
guerra por razões regionais e internas, não para anular a divisão da Palestina, mas sim para
remodelá-la ao seu gosto: o rei desejava ardentemente anexar-se a parte da Palestina atribuída
pela ONU ao estado árabe, se possível o deserto do Neguev e, sobretudo, Jerusalém. Londres
assegura: na falta de um acerto amistoso, faz votos para que seus aliados capturem uma parte da
Palestina, particularmente o Neguev. Sob a pressão americana e as ameaças cada vez mais
diretas, a Grã Bretanha, deixou de enviar armas à Transjordânia em maio-junho, e depois
chegará a suspender o envio de 500 mil libras trimestrais a Abdallah, para obriga-lo a aceitar o
cessar fogo.
Entretanto, os combates se prolongaram e se equilibraram. Na ONU, os EUA se pronunciaram
por um cessar-fogo acompanhado de sanções. Em 28 de maio, Austin, representante americano,
denunciou os estados árabes que “violavam a lei internacional”, enquanto que no dia seguinte
Gromyko denuncia “uma série de operações militares desencadeadas por um grupo de potências
contra o estado judeu”. Se o exército israelense, uma semana depois da invasão, acolheu de
imediato a proposta de cessar fogo, é porque a disputa trazia prejuízo aparente para ele. Temia
que os frutos já logrados se perdessem por completo. Os exércitos árabes, pelo contrário, se
sentiam de vento em popa. Se bem que os americanos e os soviéticos se deram por satisfeitos
com esta trégua, sua ambição ia muito mais longe, uns e outros examinavam a guerra em curso
em função de sua estratégia para o Oriente Próximo e para o mundo todo.
Uma nova comissão da ONU, dirigida pelo sueco Bernadotte, deu conta das suas conclusões em
27 de junho: remodelação do plano de divisão. Nada de Estado árabe, Jerusalém, o Neguev e os
territórios árabes da Palestina seriam entregues à Transjordânia de Abdallah, enquanto a Galiléia
Ocidental será para Israel. A política dos dirigentes árabes, potentados feudais, não se guiava em
absoluto pela “causa palestina”, mas sim pela defesa de seus próprios interesses, pela
preservação da ordem imperialista de que dependiam. Através da guerra só procuraram
remodelar em seu proveito a divisão, contra os sionistas em quem viam competidores diretos e
ameaçadores. Durante a trégua se enviou mais armamento a Israel, em particular aviões
Messerchmidts apreendidos ao exército alemão por Praga. O exercito israelense passou ao ataque
em 9 de julho de 1948. Desta vez contava com 75 mil soldados, contra os 40 mil dos estados
árabes. Retirada da primeira linha, a Legião Árabe da Transjordânia se concentra na defesa de
Jerusalém, facilitando o avanço relâmpago do exército israelense que só freia em Jerusalém.[32]
Israel anexou a Galiléia central, que a ONU dera ao Estado árabe. Quando chegou outra trégua,
os árabes só conservavam 330 km2 quadrados do Estado judeu, versão ONU, mais o Neguev, de
todo seu território original. Israel ocupava 201 dos 219 povoados árabes e tomava posse de 1300
quilômetros quadrados de territórios árabes, três grandes cidades e 112 povoados. Na ocasião da
segunda trégua, o mediador da ONU, Bernadotte, recomendara que se integrasse a Galiléia a
Israel, em troca do Neguev, e precisava: “Existem motivos imperiosos para fusionar os territórios
árabes da Palestina e Transjordânia”. Britânicos e transjordânios aceitam, egípcios e israelenses
não. Os responsáveis sionistas exigiram o fim da missão. Em 17 de setembro, dois militares
israelenses fardados, imobilizaram o carro de Bernadotte e o mataram à queima-roupa.
Em 15 de outubro, o exército israelense lançou uma nova ofensiva, utilizando massivamente sua
supremacia aérea recém conseguida graças aos envios tchecos de aviões do exercito alemão
vencido. Chegado o armistício, as cifras são 15 mil palestinos mortos e 800 mil exilados. Seu
“estado” versão ONU, estava despedaçado: Galiléia para Israel, Cisjordânia para Abdallah, a
faixa de Gaza conserva certa “autonomia”, porém sob tutela egípcia. Israel ocupa então um terço
de território a mais do que o previsto no plano de divisão da ONU.
Os EUA concederam um empréstimo de 10 milhões de dólares para Israel. No Conselho de
Segurança, os russos atuam “como se fossem nossos emissários”, se felicitava Sherlok, ministro
israelense de Assuntos Exteriores. Egípcios e israelenses firmaram um primeiro armistício em 23
de fevereiro de 1949, um mês depois com o Líbano, e em 20 de julho de 1949 com o novo
governo militar sírio. Começava o acordo entre Tel Aviv e Amman, às costas dos palestinos.[33]
Tudo estava disposto para um acordo israelense-hachemita preparado desde tempos atrás pelas
conversações secretas do rei com os representantes da Agência Judaica, mas também pelo acordo
prático durante os últimos meses. Também durante a operação israelense contra o Egito, em
outubro, a Legião Árabe se concentra sem tocar em armas. A criação em Gaza em 23 de
setembro de um “governo de toda a Palestina”, e depois a eleição do mufti como presidente do
Conselho Nacional, “melam” as relações entre os países árabes. Como resposta, o soberano
hachemita convocou, em 2 de outubro em Amman, um congresso palestino.
Os dirigentes árabes se depararam com o movimento nacional palestino esmagado na prática.
Abdallah, por sua vez, recebe em várias ocasiões a uma delegação israelense. Em troca de
modificações na região de Hebron, o estado judeu recebe uma faixa de território de 3
quilômetros de extensão por 90 quilômetros de largura, para garantir as comunicações entre o
centro do país e a Galiléia. A nova fronteira separa numerosos povos árabes de suas terras.
Finalmente, o ponto mais importante, mantido em segredo: a luz verde para a anexação da
Cisjordânia por Amman.
No “Estado Judeu” desenhado pela ONU havia 219 povoados e 4 cidades árabes. Em 1º de junho
de 1948, l80 destes povoados foram evacuados e 240 mil árabes foram obrigados a partir. Ao que
há de se acrescentar os 152 mil que saíram dos 70 povoados e as três cidades (Yalta, Jenin e
Acre) do “Estado Árabe”, que estão sob controle da Haganah. As cifras oficiais da ONU falam
de “381 mil pessoas deslocadas”. Na realidade, a crueldade dos combates, a barbárie da ação das
milícias sionistas, como no povoado de Deir Yassin, provocam a ruína de centenas de milhares
de palestinos. Com a criação do Estado de Israel, isto se converte em uma estratégia deliberada
de expulsão: mais 300 mil palestinos são expulsos. Aos palestinos que permanecem nas zonas
controladas por Israel, durante o verão de 1948, o exército proibiu toda a colheita. Isto obriga aos
camponeses da Galiléia e de Neguev a fugir. Em Haifa, aonde permanecem mais de três mil
árabes cristãos, o exército procede a um reagrupamento que a própria municipalidade judaica de
cidade denunciará como a criação de “guetos”.
As violências foram de tal calibre que A. Cizling, dirigente sionista “de esquerda”, membro do
partido Mapam, protestou em 17 de novembro no Conselho de Ministros: “Agora alguns judeus
se comportam como nazistas e todo meu ser se estremece”. Mas a repressão continua, selvagem.
Depois do armistício, os dirigentes sionistas respondem com uma negativa ao mediador da ONU
que sugere a “volta” de uma fração dos palestinos. Uma resolução do Conselho de Segurança
propõe hipocritamente organizar esta “volta”, que o Estado de Israel nunca aplicará. Malik, o
delegado da URSS no Conselho de Segurança, estima que um “estudo prolongado da questão
palestina nas Nações Unidas, nos dá todas as razões para crer que a culpa e a responsabilidade de
todas as privações e sofrimentos dos refugiados árabes corresponde ao governo do Reino Unido
e às autoridades militares britânicas no Oriente Próximo”. O “radicalismo” anti-britânico lhe
servia para deixar a salvo a Israel e aos EUA...
A chegada massiva de imigrantes judeus – 350 mil entre 15 de maio de 1948 e finais de 1949 –
impunha as expulsões dos árabes. Uma lei sobre “as propriedades abandonadas” tornou possível
a confiscação dos bens de toda pessoa ausente. Porém, entre os últimos meses de 1948 e o início
de 1949, cinqüenta mil árabes voltaram ao seu lar. Em setembro, seguia havendo 170 mil árabes,
cidadãos israelenses de segunda, submetidos até 1965 ao controle militar. Os outros, quase um
milhão, passaram a viver na Cisjordânia e Gaza, na Jordânia, no Líbano ou na Síria, em
acampamentos miseráveis.[34]
Com a vitória de Israel em 1949, novas fronteiras foram estabelecidas. Cerca de 75% da
Palestina foi incluída dentro das fronteiras de Israel; uma faixa de terra ao sul, que ia de Gaza até
a fronteira com o Egito ficou sob controle do Egito; o restante do território foi anexado pelo
reino hachemita da Jordânia. Jerusalém foi dividida entre Israel e Jordânia. O estado árabepalestino deixou de existir. Quase 2/3 da população árabe deixou suas casas e tornou-se
refugiada. Centenas de milhares de palestinos emigraram para os estados árabes, e os que
permaneceram, ficaram na condição de refugiados em sua própria pátria. Jerusalém, dividida
entre cristãos, judeus, e muçulmanos, tornou-se pólo de conflitos que se estenderam até os dias
atuais.
3. RESISTÊNCIA NACIONAL E GUERRAS DE OCUPAÇÃO
Os conflitos se acirraram e a guerra eclodiu mais de uma vez, em 1956, 1967 e 1973, sendo a
mais importante a Guerra dos Seis Dias, em 1967, quando Israel incorporou a península do Sinai
e a Faixa de Gaza, a Cisjordânia e o território sírio das Colinas do Golã e intensificou sua
política de construção de assentamentos para colonos judeus imigrantes. Quanto aos cidadãos
árabes de Israel, eram considerados cidadãos de segunda classe, não pertencendo à
“comunidade”. Por esta época, uma nova geração de palestinos crescia no exílio, principalmente
no Cairo e em Beirute. Aos poucos, surgiram vários movimentos políticos, sendo o mais
importante o Fatah, uma organização guerrilheira criada por Yasser Arafat,[35] que se pretendia
completamente independente dos regimes árabes cujos interesses não fossem os mesmos dos
palestinos, e que pregava um confronto militar com Israel.
Em 1964, com o apoio dos países árabes, foi fundada a Organização para a Libertação da
Palestina (OLP), sob controle do Egito, constituída a partir do Al-Fatah e que passou a ser
presidida por Yasser Arafat. A OLP era composta basicamente de membros dos exércitos do
Egito, Síria, Jordânia e Iraque, e fora criada durante o encontro árabe ocorrido no Egito, com a
participação de Nasser e Ben Bella, entre outros. Em seguida surgiu também o ELP (Exército de
Libertação da Palestina), uma organização política e um braço armado ainda extremamente
vinculados aos regimes árabes da região.
O “problema palestino” era então visto como uma questão árabe em geral. No IV Congresso da
OLP esse painel começou a mudar, já que contou com a presença da Al-Fatah e da Saïka
(respaldada pela Síria), grupos que começaram a ganhar espaço dentro da organização. O V
Congresso marca um momento especial nesse processo, com o poder político da Al-Fatah, de
Arafat, aumentando substancialmente dentro da OLP, considerando que esta ganhou 33 das 105
cadeiras do Conselho Nacional Palestino, enquanto o próprio Arafat foi eleito presidente. A
Saïka, nessa ocasião, ficou com 12 representantes.
A Al-Fatah, que começou a ser constituída nos anos 1950 e que inicialmente se preocupava em
criar uma organização política que estimulasse uma maior participação da intelectualidade árabe,
após 1962 decidiu colocar suas energias na preparação de um grupo militar, a Al-Assifa, e assim,
ter mais flexibilidade e liberdade de atuação em relação ao pesado aparelho da OLP. Mesmo
sendo em certo ponto um movimento isolado e relativamente pequeno na época, tinha a intenção
de mostrar que os palestinos podiam lutar por conta própria e com seus próprios militantes.
A Al-Fatah cresceu com os anos, e depois de muitas derrotas e vitórias, tornou-se o principal
grupo dentro da OLP. Já a Saïka, ou “a tempestade”, criada em 1966 a partir do IX Congresso do
Baath sírio, era uma organização ligada à Síria, mais “pan-arabista” que a Al-Fatah e com uma
estrutura política e militar menor que aquela. Mas ainda existiam outros grupos importantes. A
FPLP (Frente Popular de Libertação da Palestina), parte do Movimento Nacionalista Árabe, era,
como a Saïka, de ideologia inter-árabe, ou seja, tinha proximidade com o nasserismo e
apresentava uma postura a favor da unidade árabe.
A FPLP sofreu diversas cisões e rachas, que provocaram a constituição de outras organizações.
No final dos anos 1960, seus principais dirigentes e ideólogos começaram a se definir como
marxistas e radicalizaram o grupo. Também foi constituída em 1969 a FDPLP (Frente
Democrática Popular de Libertação da Palestina), um grupo revolucionário marxista saído da
FPLP, dirigido por Nayef Hawatmeh, que se declarava marxista.[36]
Enquanto a Al-Fatah considerava a FDPLP como sectária, esta achava a organização de Yasser
Arafat direitista, acreditando que ela não fazia o suficiente na luta contra o imperialismo e que
não conseguia envolver as massas palestinas num esquema de guerra popular. Outros grupos,
como a Organização Popular e a Liga da Esquerda Revolucionária Palestina mais tarde se
incorporaram a esta organização. Mesmo tendo o apoio relativo da população e vários
combatentes, a FDPLP encontrava-se constantemente com problemas financeiros e dificuldades
em dar continuidade a suas atividades militares.
De qualquer forma, foi o primeiro movimento revolucionário palestino que não dependia
excessivamente da ajuda de outros países e que tinha também maior independência política.
Alguns anos mais tarde surgiram, no esteio do “radicalismo islâmico” pós-revolução iraniana (de
1978), organizações como o Hamas, os Mártires de Al-Aqsa e o Jihad Islâmico.
O Fatah começou a agir dentro de Israel. A população israelense continuava a crescer por força
da imigração. Em 1967, do total de 2.3 milhões de habitantes, os árabes representavam 13%. A
economia crescera em razão da ajuda americana e por causa da contribuição financeira de judeus
do mundo inteiro e também por causa das reparações de guerra da Alemanha. Israel sabia que era
mais forte militar e politicamente do que seus vizinhos árabes. Diante das ameaças de ambos os
lados, israelenses e árabes se enfrentaram novamente e os israelenses vitoriosos ocuparam o
Sinai, Jerusalém, a parte palestina da Jordânia e parte do sul da Síria (as colinas do Golã) antes
do cessar-fogo acordado com a ONU.
A Guerra de 1967
A guerra de 1967 foi o ponto de virada decisivo. A conquista de Jerusalém e o fato de que os
lugares sagrados para muçulmanos e cristãos estavam agora sob controle israelense trouxe uma
outra dimensão para a crise. A Guerra dos Seis Dias, embora justificada pela ameaça imposta ao
estado sionista pelos árabes, na verdade foi de responsabilidade de Israel. O General Ezar
Weizman, na época chefe israelense das operações, admitiu que Egito e Síria, que convencionouse serem os iniciadores da agressão, jamais ameaçaram Israel. Nunca houve perigo de
extermínio. O
General Chaim Herzog, comandante geral e primeiro governador militar dos territórios ocupados
da Cisjordânia admitiu que não havia perigo de aniquilação de Israel. O comando central jamais
acreditou nesta possibilidade. Foi, de fato, uma guerra de agressão israelense, perpetrada para
ampliar ilegalmente as fronteiras do estado. Yigal Allon, ministro do Trabalho e membro do
Comitê Militar Consultivo Eshkols, ao se referir à Guerra dos Seis Dias afirmou
inequivocamente: “Begin e eu queríamos Jerusalém”. Mordechai Bentov, ministro do Interior
israelense, disse: “Toda a história de perigo de extermínio foi inventada em seus mínimos
detalhes e exagerada depois, para justificar a anexação do novo território árabe”. Todo o episódio
foi meticulosamente planejado pelo exército israelense.
A este respeito, o próprio Menachem Begin admitiu: “Em junho de 1967, nós não tínhamos só
uma opção. A concentração do exército egípcio nas proximidades do Sinai não provava que
Nasser iria realmente nos atacar. Devemos ser honestos conosco. Decidimos atacá-lo”. O
ministro da Defesa de Israel fez revelações semelhantes. Moshe Dayan, o festejado comandante
que, como ministro da Defesa em 1967, deu a ordem para conquistar o Golã, disse que muitas
das escaramuças com os sírios foram provocadas deliberadamente por Israel e os residentes dos
kibbutz, que pressionavam o governo a tomar as Colinas do Golã menos por uma questão de
segurança e mais para a agricultura. Dayan atestou que pelo menos 80% de duas décadas de
choques de fronteira foram de fato iniciados por Israel, sob pressão de colonos e comandantes
militares no norte de Israel. Isto coincide com a avaliação do general Matityahu Peled,que
admitiu que “mais da metade dos choques ocorridos na fronteira antes da guerra de 1967 foram
resultado de nossa política de segurança de criar acampamentos nas zonas desmilitarizadas”.
Os israelenses começaram apresentando uma reclamação ilegal de soberania na região (na
fronteira síria) e depois prosseguiram, aproveitando a oportunidade, para usurpar todas as
disposições específicas contra a introdução de forças armadas e fortificações. Repetidas vezes
eles obstruíram as operações de observadores da ONU e, em uma ocasião, até ameaçaram matálos. Eles se recusaram a cooperar com a Comissão Mista do Armistício e quando foram
enquadrados, simplesmente rejeitaram as regras e exigências dos observadores. Eles expulsaram,
quando não forçaram, os habitantes árabes e arrasaram suas aldeias.
Transplantaram árvores como uma estratégia de avançar a fronteira em benefício próprio.
Construíram estradas, violando orientação da ONU. Realizaram escavações em território árabe
para seus próprios projetos de drenagem . O general sueco Carl von Horn, chefe das forças de
paz da ONU na região, observou que tudo isto foi parte de uma política israelense premeditada,
para avançar em direção da Zona Desmilitarizada a antiga fronteira palestina (conforme
mostrado em seus mapas) e tirar os árabes do caminho por todos os meios.[37]
A guerra mudou o equilíbrio de forças no Oriente Médio. Estava claro que Israel era mais forte
militarmente do que qualquer aliança entre estados árabes, e isso mudou a relação de cada um
deles com o mundo exterior. Para os árabes foi uma derrota e para os palestinos representou uma
nova leva de refugiados.
A guerra do Yom Kippur (Dia do Perdão), de 1973, foi provocada por uma intransigência
israelense e não foi uma tentativa de se defender de ameaças militares dos árabes contra a
existência do Estado de Israel. Como Yitzhak Rabin admitiu: “A Guerra do Yom Kippur não foi
feita pelo Egito e Síria para ameaçar a existência de Israel. Foi o uso total de sua força militar
para alcançar um objetivo político específico. O que Sadat (premiê egípcio à época) queria ao
cruzar o canal era mudar a realidade política e, assim, começar um processo (de paz) político em
uma posição mais favorável para ele do que a que existia anteriormente”.
O historiador israelense Benny Morris esclareceu o contexto da intransigência sionista em que
isso aconteceu, lembrando que a primeira-ministra de Israel, Golda Meir, rejeitou uma oferta de
paz razoável do Egito em 1970, forçando, assim, os árabes a iniciarem a guerra de outubro de
1973. De fato, as sistemáticas mentiras e exageros das ameaças contra Israel para justificar a
provocação e o começo das guerras de terrorismo foi a estratégia preferida para a expansão
sionista.
No Líbano, cujos campos de refugiados palestinos se transformaram em bases da OLP,
começaram ataques sistemáticos de Israel a partir de inícios da década de 1970. Em fevereiro de
1973, quando Israel começou sua invasão atacando o norte do Líbano, por mar e ar, matando 31
civis. Escolas, clínicas e outros prédios civis foram alvejados indiscriminadamente e destruídos.
Em dezembro de 1975, mais 50 pessoas foram assassinadas no bombardeio e campos de
refugiados palestinos e aldeias foram varridos pelos aviões de guerra israelenses.
Os ataques não tiveram por motivo qualquer provocação da OLP. Em novembro de 1977, 70
pessoas foram mortas quando a cidade libanesa de Nabatiye ficou sob fogo israelense - de novo
sem qualquer provocação - sendo severamente atacada pelas baterias israelenses em ambos os
lados da fronteira. Em 1978, com a invasão de Israel, a população de Nabatiye foi reduzida de
60.000 para 5.000, e os remanescentes fugiram com medo das bombas israelenses. Tais
acontecimentos continuaram impunemente assim como contaram com a aprovação e apoio dos
“poderes ocidentais”, principalmente dos Estados Unidos.
Em 1974, Yasser Arafat foi, pela primeira vez a ONU, formalizando, assim, a representação
política do povo palestino. Foram baixadas numerosas resoluções por parte das Nações Unidas,
conclamando à paz, ao retorno dos refugiados às suas casas, à retirada dos israelenses dos
territórios ocupados e ao estabelecimento de fronteiras permanentes, nenhuma delas acatadas por
Israel.[38]
O Esmagamento do Líbano
Com base nesse fortalecimento, em 1978, Israel invadiu o sul do Líbano com um exército de
20.000 soldados. A conseqüência foi a morte de milhares de civis libaneses e palestinos e o
deslocamento de centenas de milhares para o norte do país. Um acontecimento desta invasão foi
o massacre de todos os habitantes remanescentes da cidade libanesa de Khiam, promovido pelo
Major Haddad, da milícia israelense, e que agora controlava a região sul do Líbano. Graças ao
bombardeio israelense de anos anteriores, a população já tinha sido reduzida de 30.000 para 32.
A população restante foi massacrada sem piedade por agentes de Haddad e Khiam foi escolhida
como o lugar de seu novo campo de prisioneiros, Ansar I, cujas condições repugnantes e tortura
selvagem lembraram os campos de concentração nazistas. Em agosto de 1979, o governo libanês
relatou que quase 1.000 civis tinham sido mortos nos ataques israelenses subsequentes.
O exército israelense foi responsável pelo saque que se seguiu aos ataques de abril de 1948 a
Jaffa e Haifa; pelo bombardeio de aldeias árabes e da cidade de Irbid, no Jordão; pela limpeza do
Vale do Jordão de toda sua população; deslocamento de um milhão e meio de civis da região do
Canal de Suez, em 1970. A justificativa para a ocupação do sul do Líbano foi a manutenção de
uma Zona de Segurança para a proteção da fronteira norte. Masa a razão estratégica fundamental
foi que Israel queria assegurar um controle sem limites da água do rio Litani, no Líbano. A
Comissão Econômica e Social da ONU para a Ásia Ocidental relatou que Israel começou a usar a
água do rio Litani através de um túnel de 11 milhas, assim como das correntes do Wazzani do
Líbano.
O Conselho de Segurança da ONU reagiu à invasão do Líbano de 1978, baixando as resoluções
425 e 426, exigindo uma retirada inequívoca das forças israelenses e estabelecendo um sistema
de fiscalização do processo de retirada. Mas, em julho de 1981, Israel continuou suas violações
de cessar-fogo, promovendo ataques provocativos a alvos civis libaneses, de acordo com a
estratégia indicada por Moshe Dayan. A retaliação palestina veio e foi respondida por Israel com
um pesado bombardeio que resultou no massacre de 450 árabes - principalmente de civis
libaneses. A OLP aderiu rigorosamente ao cessar-fogo de meados de 1981, enquanto Israel
aumentava as flagrantes violações do acordo, atacando e matando os civis, afundando barcos de
pesca, violando o espaço aéreo libanês milhares de vezes e realizando outras provocações para
obter alguma resposta da OLP que pudesse ser usada como pretexto para a invasão planejada.
Em março de 1979, Egito e Israel assinaram um tratado de paz em separado,[39] do qual os
Estados Unidos foram também signatários. Embora isto resultou na evacuação de alguns
territórios egípcios ocupados e na abertura do Canal de Suez para os navios de Israel, no entanto
este tratado nada fez para efetivar uma retirada das forças de ocupação israelenses de Jerusalém
oriental, da Margem Ocidental e das colinas do Golã, na Síria, e, principalmente, deixou intocada
a raiz do problema - a condição dos palestinos. Na verdade, o tratado resultou no
recrudescimento da tensão no Oriente Médio, que se manifestou por um aumento da
intransigência israelense nos territórios ocupados e no isolamento do Egito do resto do mundo
árabe.
O antecedente mais claro da situação corrente foi, como dito, a Guerra dos Seis Dias em 1967,
quando Israel ocupou os territórios palestinos da Cisjordânia, Faixa de Gaza e Jerusalém Oriental
(a região mais delicada sob o aspecto histórico-religioso tanto para muçulmanos, como para
judeus e cristãos), além das colinas de Golã da Síria e da península do Sinai do Egito, já
devolvida em 1979. O povo palestino, discriminado dentro de Israel e arruinado nos territórios
ocupados, teve sua situação agravada nas décadas de 1970 e 1980, quando o expansionismo
israelense, apoiado pelos EUA, estendeu-se para o Líbano, visando expulsar a OLP do território
libanês.
Foi nesse quadro que mudou a composição política da luta palestina contra Israel, com o
surgimento e crescimento de grupos político-religiosos, destacando-se o Hezbollah ("Partido de
Deus"), organização xiita libanesa apoiada pelo governo islâmico do Irã, o Hamas (Movimento
de Resistência Islâmica) criado por palestinos em 1988, quando se iniciou a primeira Intifada
(levante popular palestino contra a ocupação israelense), a Jihad Islâmica formada por jovens
palestinos no Egito desde 1980.
Em janeiro de 1976, uma resolução do Conselho de Segurança da ONU, vetada pelos EUA,
incorporava o texto de uma outra resolução da ONU (a resolução 242 de 1967), pela qual as
legítimas fronteiras da região seriam as anteriores à Guerra dos Seis Dias, modificando-a, apenas
para definir um Estado palestino numa área de apenas 22% da Palestina árabe (anterior à partilha
da região que criou Israel). Essa resolução foi abertamente aceita e apoiada pela Organização
para a Libertação da Palestina (OLP), pela Europa e pela ex-União Soviética e de uma forma
direta ou indireta, por todos os países do mundo, exceto Israel e os Estados Unidos.
Em setembro de 1982 ocorreu o maior ato de terrorismo de Estado da história contemporânea no
Oriente Médio, quando uma milícia de cristãos, que representava o Estado judeu na ocupação do
Líbano, praticou uma verdadeira chacina nos campos de refugiados palestinos de Sabra e
Chatila, matando quase duas mil pessoas em menos de três dias. Quem abriu o campo aos
milicianos foi Ariel Sharon, depois primeiro-ministro de Israel, sob ordens do primeiro-ministro
da época, Menachen Begin.
Ariel Sharon, então ministro da Defesa de Menachem Begin (do governo da coalição direitista
Likud), prometeu ocupar 40 km do país numa guerra que duraria no máximo 48 horas. A
ocupação estendeu-se até Beirute. Sharon foi considerado culpado pelo massacre de mais de dois
mil civis palestinos indefesos, nos campos de refugiados de Sabra e Chatila localizados numa
região de Beirute controlada por Israel e pelas milícias cristãs libanesas, que em mais de 20 anos
agiu com procuração de Israel em ações coordenadas pelo exército israelense.
O contexto da invasão sem precedentes de 1982, orquestrada basicamente pelo general Ariel
Sharon, foi o seguinte: as coisas estavam razoavelmente calmas, mas em fevereiro de 1982, o
major israelense, Yehoshua Saguym, chefe do Serviço de Inteligência de Israel, se reuniu com
funcionários do Pentágono e o secretário de Defesa, Haig, para definir os planos israelenses para
uma invasão maior. Após esta reunião, Israel pegou equipamentos militares dos Estados Unidos,
no valor de US$217.695.000, e em seguida a sua mídia começou a preparar os americanos para a
operação militar, revelando que a OLP estava recebendo foguetes soviéticos e outros
suprimentos, supostamente com o objetivo de ameaçar Israel. Israel tentou justificar sua
operação afirmando que a OLP estava comprometida com o terrorismo dos estados fronteiriços.
De fato, a fronteira tinha estado calma por 11 meses, sem contar com as retaliações às
provocações israelenses.
Não tendo conseguido uma resposta defensiva por parte da OLP que pudesse ser explorada para
justificar a invasão em grande escala do Líbano, Israel simplesmente inventou uma desculpa para
cumprir seu plano de subjugar o país. O estado sionista alegou que a invasão foi uma resposta a
uma tentativa de assassinato do embaixador israelense em Londres. No entanto, a OLP não tinha
nada a ver com este atentado. Como Israel e toda a comunidade internacional sabiam, esta
tentativa de assassinato foi, na verdade, realizada pela organização terrorista de Abu Nidal que
tinha estado em guerra com a OLP por anos a fio. Abu Nidal sequer tem qualquer espécie de
presença no Líbano.
Aproximadamente 20.000 civis palestinos e libaneses foram mortos, mais de 30.000 feridos, a
capital, Beirute, e grande parte do sul do Líbano foram destruídos, os suprimentos de água e
energia elétrica foram cortados e inúmeras atrocidades foram cometidas pelos soldados
israelenses durante a invasão. Esta seqüência de fatos só foi possível primeiramente devido ao
apoio americano infalível ao regime sionista, que incluía os contínuos vetos aos esforços do
Conselho de Segurança da ONU para parar com o terror.
Nas prolongadas negociações que se seguiram funcionários da OLP e alguns refugiados
palestinos foram evacuados por navio para Túnis e outros países árabes. Alguns familiares, que
deveriam ter seguido e a quem fora prometido salvo-conduto, foram massacrados pelas forças
falangistas sob as ordens de Israel. Mais de 1.000 mulheres, crianças e velhos foram abatidos nos
campos de refugiados de Sabra e Shatila.[40]
O massacre de Sabra e Chatila provocou uma verdadeira comoção mundial, quando a
comunidade internacional responsabilizou o governo de Israel pelos massacres. Manifestações de
repúdio ao governo israelense ocorreram nas principais cidades do mundo, sendo que os próprios
israelenses chocados com a atrocidade saíram às ruas pedindo a queda do governo e uma
investigação (a ocupação do Líbano por Israel, que se retirou do país somente em maio de 2000,
após 22 anos, causou a morte de cerca de 20 mil libaneses e palestinos, quase todos civis). Foi
instalado um inquérito em Israel, que concluiu que Sharon tinha responsabilidade no massacre e
sugeriu que ele deixasse o cargo de ministro da Defesa.
Intifada
Cinco anos depois, em 1987, um caminhão militar israelense atropelou e matou 4 palestinos na
Faixa de Gaza. Este incidente foi o estopim para o início dos combates entre jovens palestinos e
as tropas de ocupação israelense. A revolta, conhecida como a “Revolta das Pedras” (Intifada)
durou 6 anos, resultando em muitas mortes de lutadores palestinos e um profundo desgaste para
Israel, pois eram jovens e crianças enfrentando com paus e pedras as armas sofisticadas dos
soldados israelenses. A Intifada foi a primeira manifestação dentro dos territórios ocupados a
abalar de forma duradoura a rotina da ocupação israelense, iniciada em 1967.
As lideranças da OLP e Yasser Arafat passaram a apostar como nunca antes, em uma ação
diplomática para criação de um Estado palestino soberano com capital em Jerusalém oriental.
Em 1991, realizou-se em Madri a Conferência Internacional de Paz, marco inicial das
conversações diretas entre Israel e os países árabes. Em 1993, os dois lados firmaram em
Washington um acordo de paz que previa a extensão da autonomia dos palestinos na Cisjordânia,
com a retirada das tropas israelenses. Em 1995, Israel e OLP firmaram um novo acordo, desta
vez com a extensão da autonomia a quase toda a Cisjordânia, supostamente importante para o
surgimento de um estado palestino, mas que se torna irrelevante enquanto Israel detiver o
monopólio do uso da força nos territórios ocupados. Yasser Arafat e Ehud Barak se encontraram
diversas vezes mas sem chegarem a um acordo sobre as duas questões fundamentais para os
palestinos: Jerusalém e o direito de retorno.
Na Faixa de Gaza são visíveis as razões para a resistência dos palestinos. Com uma população de
mais de 1 milhão de habitantes, a Faixa de Gaza, chamada de "Soweto de Israel", não é um
estado e não foi anexada a Israel. As forças de defesa de Israel controlam toda a fronteira. Se os
moradores de Gaza quiserem sair dessa área, precisam obter uma permissão dos israelenses.
Muitos palestinos - nascidos a partir de 1967 - nunca saíram da faixa, uma tripa de terra situada
entre o deserto de Neguev e o mar Mediterrâneo, que mede 46 km de comprimento e 10 km de
largura, aproximadamente.
Algumas das piores condições de vida estão no Acampamento de Dehaishem, visitado pelo papa
João Paulo II. Segundo o New York Times, "quase 10.000 refugiados palestinos, quase todos
muçulmanos, vivem em menos de 1 milha quadrada de terra, amontoados em barracos que
formam becos salpicados de sucata de carros velhos, velhas bobinas de fio e lixo. Eles são
refugiados há 52 anos, e muitos deles ainda guardam as chaves de suas casas que foram forçados
a abandonar, na luta que se seguiu à criação de Israel."
A grande maioria dos quatro milhões de palestinos refugiados vive dispersa pelos países árabes
em terríveis condições de vida ou em territórios ocupados por Israel na condição de refugiados
em sua própria pátria. Ainda assim, em 1995 produziu-se o assassinato do premiê israelense
Yitzhak Rabin, praticado por um judeu de extrema direita, indignado com a perspectiva de um
acordo que pudesse vir a reconhecer direitos mínimos aos palestinos.[41] Segundo Shlomo BenAmi, ex-ministro do exterior de Israel, após a guerra do Golfo, os Estados Unidos conseguiram
impor seu programa unilateral, representado pelo "processo de paz", que desde Oslo, tinha como
meta o estabelecimento de uma dependência neocolonial permanente da população palestina na
Cisjordânia e na faixa de Gaza.
A proposta norte-americana para questão palestina envolveu manter a faixa de Gaza separada da
Cisjordânia e esta, dividida em três cantões separados uns dos outros, com a cidade de Jerusalém,
que foi sempre o centro da vida comercial e cultural palestina, expandida com colônias
israelenses. Enquanto isso, os Estados Unidos fornecem vasta assistência econômica e militar,
que permite que Israel expanda suas colônias nos territórios ocupados e imponha um regime duro
e brutal que impediu o desenvolvimento, sujeitando a população palestina a humilhação e
repressão diárias, num processo que se intensificou ao longo dos anos 1990.
A radicalização da luta contra a ocupação israelense se aprofundou com a Segunda Intifada, ou a
Intifada de Al Aqsa, iniciada em 29 de setembro de 2000, após uma visita provocativa do
primeiro-ministro de Israel, Ariel Sharon, à Esplanada das Mesquitas, quando dois dias depois, o
exército israelense matou dezenas de palestinos indefesos que estavam saindo da mesquita de Al
Aqsa, um dos locais sagrados do islamismo. Nos dias seguintes Israel usou helicópteros para
atacar alvos civis, matando muitas pessoas. Todo conflito aconteceu nos territórios ocupados e os
palestinos não responderam ao fogo.
Intervenção Imperialista
Em 3 de outubro de 2000, o presidente Clinton reagiu com a maior transação militar da década,
enviando helicópteros militares avançados a Israel (algo que o país não pode produzir), e o
Pentágono anunciou que não haveria restrições ao uso deles pelos israelenses. Israel logo estaria
usando-os para assassinatos políticos. Os Estados Unidos fizeram reprimendas amenas e
continuaram entregando às forças israelenses os helicópteros mais avançados de que dispunham
em seu arsenal.
Em maio, Israel empregou os seus aviões F16 mais avançados para atacar os palestinos. Pouco
depois, os Estados Unidos concordaram em fornecer mais F16 avançados a Israel.[42] O
histórico revela claramente um dedicado esforço dos EUA, iniciado há cerca de 30 anos, para
apoiar a expansão e a repressão israelenses e solapar os direitos nacionais palestinos.
Os EUA passaram a ser odiados no Oriente Médio por causa de seu apoio a Israel, que soma
entre US$3 bilhões a US$4 bilhões por ano, sustentando incondicionalmente a ocupação
israelense nos territórios palestinos, incluindo o fornecimento de helicópteros, caças F16 e
mísseis usados para reforçar a ocupação. Nos primeiros doze meses da Terceira Intifada, ao
menos 597 palestinos e 170 israelenses morreram.0
No dia dos atentados contra as Torres Gêmeas, 11 de setembro de 2001, ao mesmo tempo em
que se buscavam sobreviventes em Nova York, Israel invadia Jericó, primeira cidade palestina a
conseguir autonomia na Cisjordânia (em 1994), deixando um saldo de 13 mortos e mais de cem
feridos. Em apenas dois dias após o atentado nos Estados Unidos, 20 palestinos já tinham sido
mortos nos territórios ocupados por Israel.
Em 2002, recrudesceu a agressão e a guerra do Estado sionista contra o povo palestino, a
Autoridade Nacional Palestina e seu líder Yasser Arafat, empreendida pelo governo SharonPeres com total apoio dos EUA. A FDI (Força de Defesa Israelense) fez um cerco a todas as
cidades palestinas e à sede da Autoridade Nacional Palestina em Ramallah, onde o próprio
Arafat foi mantido refém com vistas a ser executado pelos homens de Sharon.
O Estado sionista invadiu a Margem Ocidental usando todos os métodos de terror contra as
massas: massacre de civis indefesos, incluindo idosos, mulheres e crianças, assassinatos a sangue
frio, execução de prisioneiros desarmados, prisões em massa e detenção em campos em terríveis
condições, o uso de mulheres e crianças como “escudos humanos” para as tropas da FDI,
demolição de edifícios, destruição dos sistemas hidráulico e elétrico, dos recursos sociais e da
saúde etc. A expulsão de jornalistas estrangeiros, equipes médicas, e observadores
internacionais, das organizações operárias, parlamentares etc. tinha como principal objetivo
impedir que estes crimes de guerra sejam conhecidos e condenados internacionalmente.
A vasta operação militar foi planejada e preparada bem antes dos ataques suicidas a Israel
durante a Pessah judaica, usados por Sharon como pretexto para implementar o seu plano de
limpeza étnica dos palestinos nos territórios ocupados em 1967, combinado com a destruição da
própria ANP. Os planos militares estavam prontos há dois anos, ou seja em 2000, quando ainda
prevalecia a euforia de “paz” dos Acordos de Oslo.[43] Sharon nunca escondeu o seu objetivo de
obter uma “solução final” militar para a questão palestina. Seguindo o colapso dos Acordos de
Oslo e o levante da Intifada do povo palestino, a principal preocupação dos sionistas foi a
liquidação da rebelião popular.
A Intifada, que já durava mais de 19 meses, vinha adquirindo um ímpeto cada vez maior,
principalmente com a participação de palestinos em Israel e o desenvolvimento de operações de
guerrilha de que surpreenderam, por sua escala e eficiência, os próprios militares sionistas. O
caminho para o esforço de guerra de Sharon foi aberto pela “guerra contra o terror” de George
W. Bush Jr., pela agressão imperialista contra o Afeganistão, os preparativos de guerra contra o
Iraque, os ataques ao “Eixo do Mal”, a insanidade da “revisão da postura nuclear” e “utilização
tática de armas nucleares” pelo governo dos EUA.
O imperialismo norte-americano viu a invasão de Sharon dos territórios como parte de uma
campanha de guerra bem maior que se preparava no Oriente Médio. “A noção de que a paz no
Oriente Médio passa por Jerusalém é uma ilusão”, enfatizou o editorial do Wall Street Journal:
“O caminho para a paz no Oriente Médio passa hoje não por Jerusalém mas por Bagdá”.[44] No
momento em que os tanques israelenses ingressavam em Ramallah e na Margem Ocidental,
George W. Bush declarou total apoio de sua administração ao “direito de defesa de Israel contra
os terroristas”. Mesmo o chamado ambíguo, tardio e hipócrita do Presidente dos EUA para que
Israel “considerasse iniciar” a retirada de suas tropas da Margem Ocidental não foi uma proposta
de paz mas uma fraude –que Arafat, sitiado, rápida aceitou. Na realidade, Bush concedeu a
Sharon a permissão e o tempo para terminar suas operações assassinas antes de recuar suas
tropas.
O imperialismo norte-americano e o sionismo se aproveitaram da covardia e disposição para
capitular das classes governantes palestinas. Isto ficou mais uma vez demonstrado pelo colapso
patético da Cúpula Árabe em Beirute às vésperas da guerra de Sharon. A Arábia Saudita propôs
reconhecer a usurpação sionista da Palestina em troca da paz; Egito e Jordânia boicotaram a
Cúpula para questionar o papel de liderança dos sauditas e competir com os sírios; Sharon, de
maneira provocativa, impediu Arafat de participar; e o Líbano, sob as ordens da Síria, impediu
inclusive que Arafat se pronunciasse à Cúpula desde Ramallah.
As lideranças árabes temeram mais a rebelião de suas próprias massas do que a catástrofe
imposta pelo imperialismo e o sionismo sobre a Palestina e toda a região em torno dela. As
manifestações das massas no Cairo, Amman, Beirute e em todo o mundo árabe, resultando
freqüentemente em choques com as forças locais de repressão do Estado, mostraram claramente
que a resistência do povo palestino é a faísca da revolução pela emancipação nacional e social de
todo o Oriente Médio e para além dele. A agressão sionista surgiu da própria decomposição do
sionismo na situação de crise mundial do capitalismo, e seu efeito seria acelerar ainda mais tal
decomposição. Ficou claro que não havia “solução militar” para a crise do sionismo, cujas únicas
esperanças de sobreviver eram por cima de um mar de sangue e de terror.
4. DO “MAPA DA ESTRADA” AO MURO DA VERGONHA
O “Mapa da Estrada” foi uma caricatura dos Acordos de Oslo, celebrados em 1993, por sua vez
outra caricatura de uma solução democrática à questão palestina. O Ministério de Relações
Externas da Autoridade Nacional Palestina informou que "a OLP realizou um compromisso
histórico em 1988, reconhecendo a soberania de Israel sobre 78% da Palestina histórica, na
compreensão de que os palestinos seriam capazes de viver em liberdade no restante 22% sob
ocupação desde 1967").[45]
Todo o "processo de paz" dos anos 1990 foi, na verdade, usado como cortina de fumaça para
continuar a confiscação de terras, que duplicou o número de colonos que vivem na Margem
Ocidental, na Faixa de Gaza e em Jerusalém Oriental - aproximadamente 400.000 – e para
implementar a política de fechamento permanente para a população dos Territórios, substituídos
por trabalhadores estrangeiros trazidos de todo o mundo. O estrangulamento econômico dos
trabalhadores da Margem Ocidental e de Gaza - onde, desde setembro de 2000, o desemprego
cresceu 65%, e onde 75% da população vive por baixo da linha de miséria de dois dólares diários
por pessoa, foi a razão do colapso dos Acordos de Oslo.
Esta catástrofe econômica é o resultado de um objetivo de longo prazo, compartilhado por todos
os partidos sionistas sem exceção, de se desfazer dos palestinos em toda Eretz Israel. A
temporária vitória do imperialismo em Iraque encontrou sua contrapartida nos Territórios
Ocupados no desenho da formação de um novo gabinete sob a direção do primeiro ministro Abu
Mazen (Mahmoud Abbas), um homem eleito pelos norte-americanos e os sionistas, depois de
que Arafat fora declarado “incompetente” (para brecar a Intifada).
O que estava ocorrendo na Margem Ocidental do Jordão era outro processo massivo de confisco
de terras e de segregação mediante a construção de um muro de apartheid de 350 quilômetros de
longitude, e entre quatro e oito metros de altura. A construção do muro levará à confiscação de
aproximadamente 22% da Margem Ocidental, incluindo 80% das terras agrícolas, a extirpação
de dezenas de milhares de árvores, incluindo oliveiras, e o roubo de 20% dos recursos de água.
Ao menos 15 aldeias ficariam presas entre o muro e a "linha verde", em áreas militares fechadas
controladas pela IDF.[46]
O muro significaria a anexação de fato a Israel de um vasto número de assentamentos, e
transformará as aldeias e cidades palestinas em campos de concentração similares aos existentes
na Faixa de Gaza. O planejado Muro Oriental cortaria o vale do Jordão, deixando ao chamado
"Estado palestino" 50% da Margem Ocidental. Na realidade, esse "Estado" consistiria em oito
"bantustões", separados, isolados e controlados por Israel: Jenin, Nablus, Qalqilia, Tulkarem,
Jericó, Ramallah, Bethlehem y Hebrón. Os civis palestinos não serão autorizados a transladar-se
de uma dessas áreas isoladas para outras, sem autorização especial de movimento das
autoridades de ocupação da "Administração Civil".[47] O "Estado palestino" no seria mais que
um conjunto de cantões, entrecortados por rotas controladas pelo exército israelense, e sitiados
pelas colônias sionistas e os estabelecimentos militares que as protegem.
Em entrevista de junho de 2003, Edward Said manifestou: “A única fonte de otimismo, a meu
ver, continua sendo a coragem dos palestinos para resistir. Foi por causa da Intifada e porque os
palestinos se recusaram a capitular diante dos israelenses que chegamos à mesa de negociação —
e não apesar de tudo isso, como alguns insistem em dizer. O povo palestino vai continuar se
opondo aos assentamentos ilegais, ao exército de ocupação, aos esforços políticos para pôr um
ponto final em sua aspiração legítima de ter um Estado. A sociedade palestina vai subsistir,
apesar de todos os esforços que têm sido feitos para sufocá-la... (O plano de paz) não aborda os
problemas e as reivindicações reais do povo palestino. Estamos falando de uma nação que foi
destruída mais de cinqüenta anos atrás. Sua população foi privada de suas propriedades, 70%
dela ficou desabrigada. Ainda hoje, quatro milhões de palestinos vivem refugiados no Oriente
Médio e em outras regiões do mundo”.
E continuava: “Desde 1948 a ONU reafirma a ilegalidade dessa situação e diz que essas pessoas
deveriam ser indenizadas ou repatriadas. O plano de paz, no entanto, não toca nesse ponto. O
plano também não diz nada sobre a ocupação militar que começou em 1967. Estamos falando da
mais longa ocupação militar da história moderna. Milhares de casas foram destruídas e, em seu
lugar, surgiram quase 2 000 assentamentos israelenses habitados por cerca de 200 000 colonos.
A seção leste de Jerusalém foi indevidamente anexada por Israel, que, além disso, nos últimos
dois anos e meio, manteve os 3 milhões de habitantes da Faixa de Gaza e da Cisjordânia sob
toque de recolher e restrições de direitos humilhantes. Nada disso é mencionado pelo plano de
paz. E tampouco a questão das fronteiras de um futuro Estado palestino é abordada com clareza.
Não há menção às fronteiras que existiam antes de 1967, muito menos à idéia de restabelecê-las.
Ou seja, Israel se propõe a reconhecer um Estado palestino — mas provisório e sem território
estabelecido. Na essência, tudo que o plano diz é que os palestinos devem abrir mão da
resistência, parar de lutar. Em contrapartida, Israel eventualmente levantaria algumas das
restrições que impõe ao povo palestino — mas isso é dito sem maiores especificações. O plano
não prevê mecanismos efetivos de implementação de suas fases. Assim como ocorreu nas
negociações de Oslo, em 1993, as decisões ficariam a cargo dos israelenses. Em resumo, estamos
falando de um plano que não leva a lugar algum”.[48]
A Crise do Processo de Paz
A crise do chamado “Processo de Paz” deu-se em momentos em que Israel vive sua maior crise
econômica desde 1948, com o desemprego crescente, o corte dos gastos sociais, a queda de
amplos setores da população judaica e árabe para o nível de pobreza, e uma grande recessão. O
prosseguimento do esforço de guerra prometia atingir ainda mais as massas árabes e judaicas
vivendo dentro da “Linha Verde”, como demonstrou claramente o corte de mais de dois bilhões
de dólares do orçamento do governo, para fins militares. Na crise, a União Européia manifestou
sua total impotência política. O fato de seus representantes terem sido tratados com arrogante
descaso pelos sionistas, quando enviados para protestar pelo massacre da população palestina, foi
mais uma prova de que a União Européia poderia ser um gigante econômico, mas também um
pigmeu político. Assim mesmo, os países da UE integraram a “coalizão contra o terror”
construída pelo terrorista Bush, e neste sentido foram e são também cúmplices dos crimes
perpetrados em nome da “guerra anti-terrorista”.
O desastroso papel das “forças de paz” internacionais, sejam elas da UE ou dos países das
Nações Unidas, para não mencionar a OTAN, já fora claramente demonstrado por Congo,
Chipre, Coréia etc. e depois na Bósnia, Kosovo e Macedônia nos Bálcãs. Elas constituem forças
a serviço do imperialismo, para impor sua vontade e defender seus interesses. O estabelecimento
de protetorados imperialistas é uma forma de escravização, não de independência e liberdade.
Pacifismo e reformismo pintam de forma atrativa o papel das Nações Unidas e da União
Européia e espalham ilusões sobre uma “solução” e uma suposta “paz” promovida pelas
baionetas e canhões das tropas imperialistas. Thomas Friedman, o colunista democrata-sionista
do New York Times, o mesmo que em 1999 saudou os bombardeios da OTAN contra a
Iugoslávia durante a guerra de Kosovo, chamou abertamente por um “Kosovo na Margem
Ocidental”.
Ficou claro que a emancipação é tarefa dos próprios trabalhadores palestinos e fellahin; mas
também é o dever de todos os judeus que se recusam a aceitar a continuação dos crimes sionistas,
cometidos em seu nome por aqueles que confiscaram a história das tragédias do povo judeu,
sobretudo o holocausto nazista.[49] Sharon podia matar quantos árabes quisesse, mas não podia
salvar uma única vida judaica. O governo de Sharon-Peres tornou-se a fonte de uma nova
perigosa onda mundial de anti-semitismo, como demonstraram os ataques reacionários contra as
sinagogas e os judeus na França e Bélgica. O povo judeu teria que romper com o sionismo em
decomposição e reassumir, corajosa e orgulhosamente o seu papel de outrora nas fileiras da luta
pela revolução socialista mundial, a única maneira de pôr um fim ao anti-semitismo. Em
primeiro lugar, teria que apoiar plenamente suas irmãs e irmãos palestinos na luta por uma
Palestina independente, secular e socialista, onde judeus e árabes palestinos pudessem viver
juntos em paz.
Para as massas palestinas e para todos os oprimidos e explorados no Oriente Médio, incluindo os
judeus trabalhadores e pobres, a única solução progressista seria a destruição desta máquina de
guerra, terror e opressão que é o Estado sionista, a expulsão do imperialismo de toda a região, o
estabelecimento de uma República Palestina Secular e Socialista em todo o território histórico da
Palestina, e a unificação de todos os povos da região, árabes, curdos, iranianos, berberes, judeus
etc, em uma Federação Socialista do Oriente Médio.
Em Israel, o “campo da paz”, os herdeiros do sionismo de esquerda, da tradição stalinista, e os
intelectuais denominados pós-sionistas, defendem a chamada “solução dos dois Estados”. São os
primeiros a denunciar os horrores do passado e do presente, a dinâmica colonialista do sionismo,
a escalada e os mecanismos da expulsão dos árabes, as constantes alianças e tentativas de aliança
dos sionistas com potências imperialistas, a possibilidade legal do emprego da tortura e a própria
ausência de uma constituição, a natureza confessional do Estado, o racismo contra palestinos e
judeus não-europeus, a semelhança entre a Lei do Retorno e o Código nazista de Nuremberg etc.,
mas enxergam o Estado de Israel como um fato consumado. Não se dissociam da ideologia
sionista e caem na miséria intelectual da defesa do “processo de paz” (inaugurado pelos Acordos
de Oslo de 1993 e 1995) e criação de um “Estado palestino” ao lado de Israel como forma de
solucionar o conflito árabe-sionista.[50]
Ao final da guerra de 1948-49, o Estado de Israel já havia expandido as suas fronteiras reais para
além daquelas delimitadas pela ONU. Mediante a expulsão ininterrupta dos palestinos de dentro
do Estado e dos chamados “Territórios Ocupados” (com métodos de expulsão direta,
atemorização ou negando-lhes as condições de subsistência) e aproximadamente uma guerra por
década, o Estado sionista continuou, com raros momentos de exceção, expandindo suas
fronteiras às custas do povo palestino. Em outras palavras, a partilha da Palestina nunca foi o
ideal do sionismo, mas apenas aquilo que o movimento conseguiu obter (até o presente). Nos
acordos de 1993 e 1995 (Oslo), quando as fronteiras do Estado já abarcavam bem mais do que a
fatia de 55% designada pelo plano da ONU de 1947, Israel simbolicamente reconheceu a
legitimidade da nação palestina e o seu direito a um Estado próprio ao passo que a OLP ou ANP
declarava pela primeira vez reconhecer o direito à existência do Estado de Israel.
A Intifada estourou como uma revolta da população árabe palestina contra os Acordos de Oslo e
a Cúpula de Camp David, onde ficou claro que o futuro “Estado palestino” incluiria apenas 18%
do território histórico do país, dividido em pelo menos oito cantões, sem controle de seus
recursos hídricos e dependente de Israel. As cúpulas sequer abordaram as principais demandas
do movimento de libertação nacional palestino, quais sejam, a transformação de Jerusalém
oriental na capital palestina e o direito de retorno dos refugiados. Portanto, aos olhos da
população, o chamado “processo de paz” provou ser uma operação para retalhar a Margem
Ocidental e Gaza, estabelecendo um regime de segregação sobre uma série de bantustões
controlados militar e economicamente por Israel com o consentimento da Autoridade Nacional
Palestina.
Uma solução justa e capaz de pôr fim ao conflito não seria a “solução dos dois Estados” porque
ela nega o direito fundamental de retorno dos palestinos expulsos de suas terras e lares, que hoje
somam mais de 3.000.000 de pessoas. Não podemos esquecer tampouco os cerca de 1.000.000
de árabes vivendo dentro das fronteiras de Israel, que se somaram à Intifada dos seus irmãos do
outro lado da fronteira não por solidariedade étnico-religiosa, mas porque se sentem igualmente
sob o ataque e a opressão constantes do Estado de Israel. Em 1948, quando da criação do Estado
de Israel, apenas 7% das terras eram de propriedade sionista. Em 1976, por ocasião da grande
luta contra o confisco de terras e do “Comitê para a Defesa das Terras Árabes”, apenas 20% das
terras ainda estavam em mãos de árabes.[51]
Opressão e Expropriação
Em 2002, menos de 4% das terras dentro das fronteiras de 1948 eram de propriedade árabe. O
confisco engendrou uma proletarização forçada dos cidadãos árabes: camponeses e fellahs
tornaram-se mão de obra barata nas cidades, principalmente no ramo da construção e nas
indústrias de baixa tecnologia. De 1961 a 1994 a proporção de árabes trabalhando no campo caiu
de 48,8% para 4,6%. A taxa de pobreza entre os árabes israelenses é, pelo menos, três vezes
maior do que entre os judeus. Ainda hoje, Israel conta com mais de 50 vilarejos árabes não
reconhecidos pelo Estado, na Galiléia e Neguev, sem acesso a água encanada nem eletricidade.
Essas estatísticas demonstram que dentro do próprio Estado de Israel não estamos diante de uma
grande injustiça perpetrada no passado, mas, pelo contrário, de um processo de confisco contínuo
e aprofundamento da injustiça. Esse problema não seria resolvido mesmo que Israel retirasse
seus colonos e suas tropas de Gaza e Margem Ocidental.
O panorama sócio-econômico dos próprios judeus é o pior desde o período de criação do Estado.
Desde a década de 1990, os direitos trabalhistas e o sistema de assistência social vêm sofrendo
ataques da parte de governantes trabalhistas e do Likud igualmente. O sistema de saúde foi
desmantelado no governo de Rabin. O maior banco do país, instituição da central dos
trabalhadores Histadrut, foi privatizado por Netanyahu. Em uma década apenas, a porção do PIB
destinado ao setor público caiu de pouco mais da metade a um terço e os investimentos no
mesmo setor caíram de 85% a 15%. Os gastos sociais em Israel são hoje inferiores
proporcionalmente aos dos EUA e a sociedade israelense se tornou uma das mais desiguais do
chamado mundo capitalista “avançado”, destruindo cada vez mais o que ainda resta do seguro
desemprego e do sistema de seguridade social.
Os trabalhadores tailandeses, filipinos, romenos e turcos (que somam dezenas de milhares) que o
sionismo importou para substituir a mão de obra barata árabe (impedida de trabalhar em Israel
depois do cerco quase total aos “territórios ocupados” erguido em 1994 com o pretexto de
prevenir ataques suicidas) estão sendo usados como bode expiatório para a crise. O desemprego
em Israel chega a 15% da população economicamente ativa, e a pauperização atinge 30% da
população do país (algumas fontes apontam para meio milhão de israelenses vivendo abaixo da
linha da pobreza). A crise econômica, desemprego, polarização da riqueza e miséria já
começaram a gerar sintomas de resistência entre as massas judias propriamente ditas, com uma
série de greves e manifestações (desde o início de 2002) contra o fechamento de fábricas e os
cortes orçamentários.
As contradições inerentes à criação do Estado de Israel (que se resumem no fato dele ser um
estado colonialista criado no período de decadência do capitalismo, necessitando assim do
suporte de uma potência imperialista) se acentuam no atual momento de crise econômica e
aumento das tensões sociais em todo o mundo. Israel, que vive hoje sua pior crise econômica
desde 1948, vê-se obrigado a simultaneamente reprimir o descontentamento interno gerado pela
crise, a revolta dos seus ‘cidadãos’ árabes de segunda classe, e a revolta nacional palestina.
A melhor receita que encontrou para atacar as três frentes simultaneamente foi intensificar sua
política histórica de expansão dos assentamentos em território palestino, com todas as suas
implicações: transferência da crise interna para o exterior e transformação dos desempregados
judeus em colonos (uma faca de dois gumes já que o custo de manutenção das colônias está se
tornando insustentável no contexto de grave crise econômica), intensificação da vigilância e
repressão policial interna (intimidando tanto árabes como judeus descontentes) e reocupação
militar das regiões conquistadas em 1967, enclausurando os palestinos e realizando massacres
passíveis de serem ocultadas da mídia (o acesso dos repórteres aos locais dos crimes é proibido
ou retardado em semanas; aqueles que tentam ir mais a fundo na investigação dos crimes
sionistas têm sido brutalmente intimidados e reprimidos). Mas se o tamanho da ofensiva sionista
externa e interna reflete a dimensão dos seus perigos intrínsecos –que são portanto bem grandes
e podem ameaçar a sobrevivência do Estado de Israel- devemos lembrar que o que está por trás
da intransigência e poderio sionistas é o apoio dos EUA devido a interesses próprios de controle
do Oriente Médio, reforçado pelo peso do lobby da comunidade sionista norte-americana (há
cerca de 5.000.000 de judeus norte-americanos).
A guerra dos EUA contra o Iraque teve e tem por objetivo real “reorganizar” o Oriente Médio
para aumentar a capacidade de exploração das corporações norte-americanas de petróleo, mas o
motivo aparente (alardeado por Bush) é se proteger do perigo terrorista advindo do mundo
muçulmano. Esta pode se tornar a desculpa que faltava para a liderança sionista implementar o
controle militar direto de Gaza e Margem Ocidental e estabelecer, na melhor das hipóteses, um
“estado palestino” fantoche e um “governo autônomo” mais subordinado a Israel. Isso implicaria
a deportação em massa e a liquidação de toda forma de expressão política independente do povo
palestino.
Nenhuma das três formas de opressão – a opressão nacional palestina, a opressão da classe
trabalhadora judaica e a exploração dos recursos naturais do Oriente Médio pelo imperialismo às
custas da miséria da sua população - poderiam ser eliminadas isoladamente uma da outra. Tanto
as massas palestinas como os trabalhadores judeus são vítimas do sionismo e sua luta só poderia
se tornar conjunta sob a bandeira de um Estado dos trabalhadores, socialista, democrático e
secular em todo o território histórico da Palestina. Não menos importante, é lembrar que a luta
contra o sionismo não se dissocia da luta mais geral dos trabalhadores e massas oprimidas de
todo o Oriente Médio contra o imperialismo.
O “Fundamentalismo Islâmico”
O fracasso do nacionalismo secular árabe-palestino para colocar a luta palestina numa
perspectiva de luta antiimperialista conseqüente, e de unificação socialista do Oriente Médio (o
que exigiria romper com as castas dirigentes dos estados árabes reacionários) levou ao
fortalecimento do nacionalismo religioso. O Hamas, por exemplo, elaborou uma resposta ao
Estado sionista via “Estado islâmico”.
Desde a primeira Intifada, o movimento de caráter religioso tem se fortalecido. Mas isso tem a
ver com a covardia e sujeição da direção da OLP, que se identificou com os acordos de Oslo e a
submissão aos ditames do imperialismo norte-americano. As forças tradicionalmente de esquerda
dentro da OLP, como a FPLP e a FDPLP, embora tenham criticado as posições de Arafat, não se
constituíram como alternativa real de direção às posições da ANP, deixando um espaço vazio
para que aqueles que aparecem como radicalmente anti- Israel assumam um prestígio crescente.
A Palestina era o lugar do Oriente Médio onde a influência política das correntes religiosas era
das menores na região. Basta ver que a formação da OLP era por amplíssima maioria de natureza
laica. Adquiriu um peso muito maior, devido ao desgaste da direção da ANP. O projeto de
Estado islâmico, ainda que venha do lado oprimido na região, é uma saída também teocrática.
Significa abandonar a perspectiva de um Estado laico e democrático. Significa também a
perspectiva de uma ditadura teocrática sobre os povos da região. Os iranianos sentiram na pele o
que significa essa proposta por meio da política repressiva de Khamenei contra os protestos
democráticos dos jovens iranianos e contra os sindicatos e os conflitos trabalhistas.
Além do mais, a postura fundamentalista do Hamas dá pé à propaganda sionista de que os
‘árabes querem jogar os judeus ao mar’, são todos fanáticos etc., e prejudica a possibilidade de
uma convergência entre os setores jovens e radicais do lado israelense contra seu governo, e de
unidade com os palestinos na luta contra o sionismo. Vejamos trechos da carta de constituição do
Hamas: “Em Nome de Alá, o Misericordioso, o Clemente: Vós sois a melhor comunidade que já
surgiu para a humanidade. Vós impões a conduta correta e proibis a indecência; e vós credes em
Alá. E se o Povo da Escritura tivesse acreditado, teria sido melhor para eles. Alguns deles são
crentes; mas a maioria deles são praticantes do mal. Eles não irão vos prejudicar salvo uma leve
ferida, e se eles lutarem contra vocês eles terão de retroceder e fugir. E depois de tudo eles não
serão socorridos. Ignomínia será sua porção onde quer que eles se achem salvos [onde eles se
agarrem a] uma corda de Alá e a uma corda do homem. Eles incorreram no ódio do seu Senhor, e
miséria será jogada sobre eles. Isso é assim porque eles se acostumaram ao descrédito nas
revelações de Alá, e atacaram os Profetas erroneamente. Isso é assim porque eles eram rebeldes e
se acostumaram a transgredir.” Surat Al-Imran (III), versos 109-111...
E também: “Israel irá crescer e permanecer ereto até que o Islã o elimine assim como ele tem
eliminado seus predecessores... Artigo Oito: Alá é seu objetivo, o Profeta seu modelo, O Corão
sua Constituição, a Jihad seu caminho e a morte pela causa de Alá sua mais sublime crença”.
Seria, no entanto, um erro pôr o radicalismo “islâmico”, devido ao seu “fundamentalismo”, no
mesmo plano que o “fundamentalismo” imperialista ou sionista. É o que aparece na postura de
Tariq Ali, [52] quem chega a se queixar, quanto ao sofrimento do povo palestino, que “os EUA
são cegos quanto a isso, e os europeus são parcialmente cegos também”.[53] Tratar-se-ia, então,
de tira-los da cegueira, como saída para a luta antiimperialista? Uma confusão semelhante
aparecia também nos textos do prestigiado intelectual Edward Said, o que motivou um textoprotesto (Onde Edward Saïd está errado) de Khalid Amayreh, editor chefe do Hebron Times.
Segundo Amayreh, a condenação indiscriminada de Said aos movimentos islâmicos,
demonstrava a ausência de uma análise mais objetiva de um fenômeno enraizado na sociedade
árabe, o do ressurgimento islâmico, do qual o Islam político seria simplesmente uma parte de sua
estrutura multifacetada e diversa. E lamentava que Saïd, que sempre esteve na vanguarda ao
expor e refutar as maliciosas interpretações ocidentais referentes à questão da Palestina e a outras
causas árabes, parecia, neste caso, estar repetindo interpretação semelhante sobre os movimentos
islâmicos, que no ocidente, e principalmente nos EUA, têm sido pintados como um novo império
do mal, em substituição à antiga União Soviética.
Khalid Amayreh se poupou a si mesmo de uma análise da evolução mais recente do movimento
islâmico, que emergiu como um movimento político de massas, com alas seculares de esquerda
(como os Mudjahedin iranianos e de outras nacionalidades), para posteriormente ser manipulado
pelos EUA, através da CIA, em função da invasão soviética do Afeganistão (1979), com a
criação de seitas terroristas-religiosas (como Al Quaeda) usadas como carne de canhão contra a
URSS, mas também destinadas a esvaziar a luta de massas contra o inicialmente chamado
“Grande Satã” (os EUA...). O islamismo, seja político ou religioso, não pode ser apresentado
como um bloco sem fissuras e contradições, para o qual não seria necessária uma análise
histórica suscetível de torna-lo mundialmente compreensível aos olhos dos explorados de todos
os países.[54]
Desde o início do século, os sionistas chegaram à Palestina, criaram mitos para justificar sua
instalação – como a “terra sem povo...”- para encobrir a expulsão dos árabes. Basearam-se
sempre sobre a política do fato consumado. Criaram os fundamentos do Estado de Israel antes
mesmo de ser declarada a partilha da Palestina. Aceitaram a partilha dizendo-se satisfeitos,
apenas para continuar a ganhar, passo a passo, cada metro quadrado do pouco território que
sobrara aos árabes palestinos, verdadeiros habitantes, trabalhadores e donos da terra.
Justificaram suas guerras de agressão, incursões militares intermitentes, constante aumento dos
assentamentos, massacre de populações, aldeias inteiras varridas do mapa, outras tantas (cerca de
50) que existem dentro de Israel sem reconhecimento formal e, portanto, sem qualquer infra-
estrutura, na necessidade de se defender contra os terroristas palestinos, contra a ameaça dos
judeus serem “jogados ao mar” ou simplesmente do perigo do aumento populacional árabe
dentro de Israel ameaçar o seu caráter de “estado judeu” (sua fundamentação racista).
Expulsaram os árabes de sua terra, encerram-nos em guetos, estabeleceram postos de controle e o
toque de recolher, limitaram sua locomoção, circulação, o próprio direito ao trabalho e à
subsistência, deixaram que as doenças e a fome os dizimasse, esconderam o fato do mundo,
massacraram e impediram que equipes de reportagem se aproximassem dos locais das agressões,
e colocaram toda a culpa nos árabes palestinos. Com raros períodos de exceção, desde 1948
Israel se expande baseado no “direito da auto-defesa”.
Mas o crime sionista não se resume à expulsão, massacre e criação de uma massa de refugiados
palestinos, nem no fato do processo ter começado no início do século e não ter terminado até o
dia de hoje. Começamos a entender o terror sofrido pelas massas palestinas quando enxergamos
que a sua terra lhes foi tirada passo a passo e que hoje a opinião pública mundial se deixa
enganar pela mentira histórica do “fato consumado”. O terreno está sendo preparado para uma
limpeza étnica mais grave do que aquela de 1948,com os Estados Unidos, país mais poderoso do
mundo, realizando uma guerra para supostamente defender o mundo civilizado do “terrorismo”,
o que, para Israel, poderia ser o último pretexto para aplicar a solução definitiva do “problema
palestino”.
Só podemos começar a visualizar as proporções do crime sionista quando percebemos que a
culpa pela ausência de um Estado palestino é lançada sobre os próprios palestinos, isto é, na sua
não aceitação da partilha da ONU de 1948, “incapacidade” para organizar um poder central
próprio, e, finalmente, que o sionismo vem arrancando dos palestinos sua própria história. A
farsa da “solução dos dois Estados” tem servido justamente para criar a ilusão, para a opinião
pública mundial, de que é possível resolver a situação dos árabes sem eliminar o Estado de
Israel. As lideranças de Israel sabem que seu Estado está atrelado à sobrevivência da ideologia
sionista, e esta à dinâmica expansiva do movimento.
A remoção dos colonos em território ocupado não pode ser levada a cabo sem uma revolução
Para se contrapor a esse cenário de opressão e limpeza étnica, a Intifada teria que passar de uma
guerra de guerrilha a uma guerra de massas, os atentados suicidas teriam que parar de criar
desculpas convenientes para o ataque de Sharon, os trabalhadores judeus teriam que perceber que
a guerra do Estado de Israel é uma guerra de exploração deles mesmos, os trabalhadores. As
massas palestinas e os trabalhadores judeus são as duas vítimas do sionismo (e devem lembrar
que nas décadas de 1930 e 1940 chegaram em alguma medida a lutar lado a lado, em
organizações de esquerda, sindicatos setoriais e greves conjuntas). E definitivamente, tem que se
abandonar de uma vez por todas a utopia reacionária da “solução dos dois Estados”.
A Intifada de Al-Aqsa colocou na ordem do dia uma realidade que vinha sendo encoberta
enquanto durou o intervalo dado pela implementação inicial dos planos de paz de Oslo: que é
impossível uma paz entre palestinos e judeus mantendo-se o Estado sionista de Israel. O
problema está na natureza mesma e na origem desse Estado. Israel é um Estado artificial, um
enclave militar do imperialismo norte-americano, constituído sobre a base de desalojar à força os
legítimos habitantes do território, o povo palestino.
Um Estado Teocrático
Israel tem como definição ser o Estado de uma raça, um estado teocrático, constituído em base a
um critério religioso. Israel foi fundado e se expandiu baseado na dupla ideologia do povo eleito
que ocupa uma terra ‘sem povo’. Mais ainda, seus dirigentes têm, desde sua fundação, insistido
que os outros povos da região não têm identidade própria. É impossível haver paz com um
Estado que se apóia na colonização e na exclusão do povo que vivia no local em que se instalou.
Nenhuma das correntes presentes no movimento sionista e que governaram o estado fogem
dessas definições básicas: que o estado judeu é excludente dos demais povos, que uma política
de exclusão deve ser aplicada aos árabes que habitavam a terra prometida antes. Por isso, até a
central sindical Histadrut, seguindo os ditames do Poalei Zion (que daria origem ao Mapai,
antecessor e um dos componentes do Partido Trabalhista de Barak e Peres) e de seu líder, Aaron
D. Gordon, não somente excluía de suas fileiras os trabalhadores não-judeus, como fazia
campanhas para que os empregadores só contratassem trabalhadores e despedissem os árabes.
“Avodá ívrít” (trabalho para os judeus) é o lema da Histadrut.
Apesar de o financiamento de Israel ser um elemento revelador da natureza desse Estado,
nenhuma das correntes sionistas tem vergonha de reconhecer que desde o início foi financiado
pelos EUA e os poderosos lobbies de milionários judeus. Já nos primeiros anos de sua fundação,
entre 1949 e 1966, Israel recebeu sete bilhões de dólares. Para avaliar o significado dessa cifra,
basta recordar que o Plano Marshall, feito para a Europa Ocidental de 1949 a 1954, chegou a 13
bilhões de dólares. Israel, na época com pouco menos de dois milhões de habitantes, recebeu
mais da metade do que receberam 200 milhões de europeus.
Em outras palavras, Israel recebeu do imperialismo norte-americano cinco vezes mais por cabeça
que o ambicioso plano de reconstrução européia. Uma cifra que define com certa clareza a
natureza do Estado israelense é que já nos anos 70-80 o total da ajuda norte-americana – sem
contar a ajuda da “Diáspora” ou dos empréstimos - representava mil dólares por habitante/ano, o
que por si só equivalia a mais de três vezes o Produto Interno Bruto por habitante do Egito e da
maioria dos países africanos. É conhecido que os EUA entregam a Israel uma ajuda direta no
valor de 5 bilhões de dólares por ano.
A ajuda incondicional e ilimitada recebida nestes 57 anos de existência é o preço pelo serviço
que o Estado sionista presta, é o custo para que esse Estado garanta e desenvolva sem travas sua
função essencial: levar judeus para a Palestina a qualquer preço; expulsar os árabes da Palestina;
desempenhar o papel de “bastião adiantado da civilização ocidental”. As correntes que governam
Israel estão de acordo na estratégia imperialista. As correntes sionistas têm em comum uma
compreensão e uma estratégia para os palestinos que estão resumidas nas palavras de Edward W.
Said: “o sionismo sempre quis mais terra e menos árabes: desde Ben-Gurion a Sharon, passando
por Rabin, Shamir, Netanyahu, e Barak, há uma continuidade ideológica ininterrupta na qual o
povo palestino é visto como uma ausência desejada pela qual se combate”.[55]
As correntes sionistas, ao dizer que os judeus têm todos os direitos à “terra de Israel”, dizem
implicitamente que qualquer não judeu que esteja aí não possui qualquer direito. Até Shimon
Peres, que às vezes parece falar uma linguagem humana, nunca se deixa levar a ponto de
considerar os palestinos sequer como merecedores de um tratamento como iguais. Os judeus
devem seguir sendo uma maioria, possuir toda a terra, definir as leis tanto para judeus como para
os não judeus, garantir a imigração e a repatriação somente para judeus.
As definições da corrente originada nos “revisionistas” de Vladimir Jabotinsky admiradora de
Mussolini e Hitler, que teve continuidade no Likud de Begin, Netanyahu e Sharon foram e são
mais diretas nessa direção. O livro The Iron Wall, de Lenni Brenner, cita o pensamento racista e
fascista desse sionista: “É impossível que alguém se assimile a pessoas que tenham sangue
distinto ao seu. Para se assimilar, tem que mudar seu corpo, tem de converter-se em um deles no
sangue. Não pode haver assimilação. Nunca haveremos de permitir coisas como o matrimônio
misto porque a preservação da integridade nacional somente é possível mediante a pureza racial
e para isso haveremos de ter esse território em que nosso povo constituirá os habitantes
racialmente puros.”
Assim como os afrikaaners da África do Sul, esses racistas consideram os palestinos como seres
humanos inferiores, um não povo; por isso, seus seguidores nas colônias em territórios palestinos
ainda hoje repetem esse discurso: “não se pode chamá-los de povo”. O slogan do sionismo era:
"uma terra sem povo para um povo sem terra". Em 1973, Golda Meir teria afirmado: "Os
palestinos? Isto não existe". Era, no máximo, um problema ecológico do qual era necessário se
livrar, à semelhança dos mangues do Vale do Jordão, dos mosquitos ou da malária. "Fazer
florescer o deserto": outro mito. Aquele de um país árido e desértico que só o sionismo era capaz
de valorizar, desprezando os campos de oliveiras, da cultura em terraços, das figueiras.
De 1948 a 1967, e particularmente após a depuração étnica de 1948 onde mais de 700.000
palestinos foram rechaçados para fora das fronteiras do Estado Judeu, essa negação total do outro
se fortaleceu. A minoria palestina que permanecerá no Estado Judeu representa então menos de
5% da população do país e vive, até 1965, confinada em verdadeiras reservas, sob o controle de
um governo militar que a trata não apenas como um quinta-coluna, mas sobretudo como um
acidente de percurso, um erro num Estado que se pretendia étnicamente puro.
Limpeza Étnica
Os dois antecessores de Sharon, Menachem Begin e Ytzhak Shamir, tinham uma trajetória que
colocava na prática essa concepção em relação à “questão palestina”. Em 1988, Shamir dizia
sobre a Intifada: “Temos de criar a barreira e conseguir que os árabes dessas zonas voltem a ter
medo da morte”. Os trabalhistas, apesar da retórica diferente do Likud, têm a mesma estratégia: a
prática é o critério da verdade. Os dados sobre a ocupação de territórios durante os últimos anos
mostram a mesma política, apenas com ênfases e discursos às vezes distintos.
Moshe Dayan, ministro da Defesa do governo trabalhista em 1967, declarava: “Somos uma
geração de colonizadores e sem os capacetes de aço e o canhão não sabemos plantar uma
árvore.ou construir uma casa. Não retrocederemos ante o ódio de centenas de milhares de árabes
em torno a nós, não desviaremos nossas cabeças para que nossas mãos não tremam de medo.
Este é o destino de nossa geração. Estar preparados e armados”.[56] Rabin, que depois ganhou o
Nobel da Paz, era ministro da Defesa de Shamir em 1988 e tinha como política para enfrentar a
primeira Intifada, segundo o insuspeito Jerusalem Post: “a prioridade absoluta é o uso da
violência, o emprego da força, as surras...Consideram isso mais eficaz que as prisões (porque)
depois destas podem voltar a atirar pedras nos soldados. Porém, se as tropas quebram suas mãos,
já não podem reincidir”.[57]
O último governo de maioria trabalhista, o de Ehud Barak, foi o maior instalador de colônias
desde 1992 nos territórios de Gaza e Cisjordânia ocupados em 1967. Um artigo de Nadav
Shragai no Haaretz de 27de fevereiro de 2001: “O governo começou a construção de 1943
unidades habitacionais nos territórios ano passado – o maior número desde 1992, de acordo aos
dados apresentados pelo parlamentar Mussi Raz (Meretz)”.
Por isso não deveria surpreender tanto que o “pomba” Shimon Peres pudesse aceitar ser parte de
um governo Sharon. A organização israelense Gush Shalom, que luta pela retirada das colônias
nos territórios ocupados através do boicote aos seus produtos, publicou no jornal Haaretz de 16
de fevereiro de 2001: “Dias atrás o Partido Trabalhista declarou que Sharon iria causar um banho
de sangue e a guerra. Agora os líderes trabalhistas correm para integrar o governo Sharon
prontos para fornecer o álibi que ele necessita para o banho de sangue e a guerra”.
A resposta à pergunta sobre o que leva correntes aparentemente adversárias como Likud e
Trabalhistas a formarem governos de ‘unidade’ está no acordo estratégico sobre a natureza do
estado colonizador que leva a uma aliança histórica entre essas correntes, apesar das diferenças
táticas. Por exemplo, levou a que se dividissem sobre a aceitação da partilha da Palestina de
1947, mas não em relação ao que fazer com os árabes residentes. O pensamento de Ben Gurion,
Dayan, Rabin, Peres, Barak tem na matriz a idéia chave de um estado judeu e de que é necessário
construir as bases para isso às custas da expulsão da população árabe. Todas as negociações de
paz são para assegurar esse marco e buscar que os palestinos aceitem viver nos guetos que lhes
foram reservados.
A Palestina histórica tem uma extensão de 27.242 km², Israel ocupa já mais de 22.000 km², ou
seja, mais de 80% do território. A conquista de território por parte do exército israelita foi
acompanhada pelo assentamento de colonos judeus. Já no primeiro ano de vigência dos acordos
de paz de Oslo, Israel confiscou 670 km² de terrenos palestinos para ampliar as colônias e abrir
novas estradas entre elas, depredando, de passagem, mais de 14 mil árvores frutíferas. Nesse
mesmo período, o número de colonos na Cisjordânia (sem contar Jerusalém) passou de 125 mil
para 136 mil. Em dez anos de negociações de paz, o número de colonos judeus mais que
duplicou.
Alguns buscam no Likud ou nos “extremistas judeus” a razão pela qual a expansão dos
assentamentos judeus continua, e se apóiam no fato, correto, de que surgiram em determinados
momentos tensões entre colonos e o governo sionista de turno. Mas esse fato não absolve o
Estado, nem o exime de forma alguma dessa política expansionista, e tampouco disfarça o fato
irrefutável de que a expansão continuou, tanto sob governos do Likud como do Partido
Trabalhista. Shimon Peres afirmava, já em 1995, que os colonos não eram um obstáculo para a
paz; que poderiam ficar na Cisjordânia e na Faixa de Gaza depois do fim do processo de paz.[58]
Basta ver as facilidades para a colonização, indicando que não há nenhum plano real de
descolonização e nisso existe acordo entre os Trabalhistas e o Likud. Para ver o papel do Estado
baste dizer que em Hebrón, para proteger 350 colonos situados no próprio centro da cidade, há
700 soldados; na Faixa de Gaza, no enclave de Netzarum, havia um batalhão inteiro para
custodiar 53 famílias judias. Jerusalém concentra, por diversas razões, boa parte do conflito, e
não por casualidade foi o cenário da explosão da nova Intifada. Os defensores dos planos de paz
e da “solução dos dois Estados” deveriam prestar especial atenção ao processo de Jerusalém.
É com base na teoria da convivência dos dois Estados que Jerusalém foi dividida artificialmente
em duas partes em 1948, por resolução da ONU. A parte ocidental, ocupada por Israel, estava
povoada em sua maioria por árabes. 60 mil palestinos dos bairros ocidentais de Jerusalém e dos
povos vizinhos tiveram de abandonar, por terror, suas casas. Em 22 de junho de 1967, Israel
anexou militarmente a parte oriental, que estava sob controle jordaniano. Durante as décadas de
60 e 70, Israel expande a presença judia mediante a expropriação de propriedades árabes.
Durante a década de 80, colonos judeus vinculados aos setores mais fascistas, com o apoio do
Ministério da Moradia, então dirigido por Ariel Sharon, se instalam no bairro árabe do centro da
cidade, nas proximidades de Haram al Sharif.
O“processo de paz” iniciado em Oslo em 1993, concluiu no Acordo de Washington, assinado
pela OLP, consagrou o abandono da aspiração histórica das massas palestinas. Os signatários,
com o conjunto das potências imperialistas, num apelo ao "retorno ao processo de paz",
engajaram definitivamente a via da frustração das reivindicações nacionais palestinas. O acordo
de Washington foi assinado a 13 de setembro de 1993 por Arafat e Rabin, sob a égide do
imperialisme norte-americano. Na sua primeira cláusula se estipula o reconhecimento pela OLP
do "direito do Estado de Israel de viver em paz e na segurança". E ainda: "A OLP aceita as
resoluções 242 e 338 da ONU (...) A OLP renuncia ao recurso ao terrorismo e a qualquer outro
ato de violência (...) A OLP afirma que os artigos e pontos da Carta Palestina que negam o
direito de Israel a existir são doravante inoperantes e não válidos". O acordo também previa que
correspondia à OLP e aos “notáveis” palestinos a gestão et controle dos palestinos que
habitassem Gaza e Cisjordânia (que representavam só 22% do território histórico da Palestina).
A OLP se comprometia a constituir um "Estado" (embora o termo não fosse empregado no texto
do acordo) correspondente às aglomerações e campos palestinos de esses territórios: ainda assim
a proclamação desse "Estado" foi adiada quatro vezes por injunção dos EUA. No precioso tempo
assim ganho, Israel aproveitaria para levar sua expansão territorial, em extensão e densidade,
mais longe do que nunca antes. Durante os últimos governos trabalhistas e do Likud, foi criado o
projeto da Grande Jerusalém reservada apenas para os judeus. Entre 1996 e 1999, somaram-se a
essa expansão 42 colônias “selvagens”. E em 21 de junho de 1998, o governo israelense dá o
aval formal ao plano da Grande Jerusalém com algumas medidas, entre otras, a que retirava as
permissões de residência aos árabes que figurassem no censo da Autoridade Nacional Palestina
ou tivessem casa nos territórios administrados pela ANP.
O plano se baseou no objetivo declarado de manter um equilíbrio demográfico de sete judeus por
cada três palestinos, em ir isolando a cidade do restante da Palestina, impossibilitando o
crescimento dos bairros árabes e estabelecendo assim uma área de expansão populacional judia
na Cisjordânia. Mediante a anexação de terras, expropriações ilegais de municípios próximos a
Jerusalém (Ramallah, Belém, Beir Sahur) foi sendo criado um sistema de dois anéis concêntricos
de assentamentos judeus que rodeiam Jerusalém por completo. Como disse o prefeito palestino
de Hebrón, “não querem viver a nosso lado, mas em nosso lugar”.[59]
5. OS EUA E A GUERRA CONTRA O IRAQUE
A guerra contra o Iraque teve lugar num marco histórico preciso, o da crise histórica do regime
de dominação social do capitalismo, que se manifesta na transformação das crises financeiras em
bancarrotas capitalistas e falência dos regimes políticos, e a tendência internacional dos
explorados a protagonizar greves, manifestações de massa, piquetes e rebeliões populares. É
neste quadro histórico que o capitalismo busca uma saída por meio da guerra e da submissão
efetiva e real das nações atrasadas e das massas dos desaparecidos blocos “socialistas”.
A invasão no Iraque – como antes a dos Bálcãs e do Afeganistão – mostrou a tendência geral do
imperialismo de resolver a crise mundial pela via das guerras. Este caminho desenvolve um
aprofundamento das contradições do imperialismo norte-americano e das burguesias européia e
japonesa, assim como as convulsões e crises crescentes para as burocracias restauracionistas
chinesa e russa. A guerra contra o Iraque é apenas uma das muitas e extraordinárias
manifestações da crise histórica do capitalismo.
A situação mundial, no entanto, revelou novas fendas profundas na política mundial dos EUA. A
ocupação do Iraque mostrou-se muito mais perigosa e cara do que o previsto pelo imperialismo.
Diariamente, as tropas norte-americanas foram e são objeto de uma quinzena de ataques
guerrilheiros e sofrem, em média, três baixas a cada dois dias. “Bagdá e vizinhança apresentam
uma imagem de caos e desordem, com os soldados norte-americanos apenas capazes de controlar
as principais ruas”, dizem os jornais. Mas os soldados norte-americanos não se sentem seguros
nem em suas próprias bases (porque) a guerrilha está escapando cada vez mais do controle norteamericano. Os operativos “anti-subversivos”, cada vez mais duros e violentos, ao atacar
populações inteiras e deter centenas de pessoas semeiam um ódio maior contra os ocupantes.
As manifestações xiitas, de milhares de pessoas, reclamaram regularmente a saída dos ocupantes.
Os ocupantes passaram a temer uma Intifada xiita. Os serviços públicos essenciais seguem sem
serem repostos. A economia está paralisada e o desemprego atinge 60% da população. Sob a
pressão da guerrilha e da hostilidade da população, as tropas de ocupação encontram-se
“stressadas e descontentes”. O Pentágono sancionou dois soldados que publicamente, em uma
reportagem de TV, reclamaram a renúncia de Rumsfeld. Na imprensa imperialista manifesta-se
uma crescente preocupação pela “baixa moral” das tropas ocupantes. O imperialismo norteamericano não lançou a guerra para liquidar os supostos arsenais de armas de destruição massiva
iraquianos; muito menos para “libertar” o povo iraquiano da ditadura de Saddam.
A guerra contra o Iraque foi um episódio de uma larga escalada militar – que começou com as
guerras de Kosovo e do Afeganistão, com a expansão da Otan até as fronteiras da Rússia e da
China e com os acordos militares estabelecidos com as burocracias das ex-repúblicas soviéticas
do Cáucaso e Afeganistão, Japão, Coréia e Taiwan – e que continuará com novas guerras de
opressão e conquista. O objetivo desta escalada é produzir uma completa reestruturação das
relações entre os Estados e as classes no plano mundial que permita ao imperialismo impor a
aplicação dos selvagens planos que são o último recurso para o resgate do capital, depois do
sistemático fracasso das saídas ‘econômicas’ da crise que se arrasta há mais de trinta anos.
O que esteve e está em jogo nesta guerra vai desde o petróleo iraquiano até a destruição dos
sistemas de seguridade sociais e as conquistas sociais da classe operária nas metrópoles, a
subsistência das burguesias nacionais dos países atrasados e, inclusive, a própria existência da
União Européia. A divisão imperialista que levou os Estados Unidos a atuarem sem o respaldo
das Nações Unidas, a “anulação” do Conselho de Segurança, revela que a crise mundial não
pode ser resolvida no quadro das relações internacionais existentes.
O atentado que destruiu a sede da ONU em Bagdá terminou de confirmar que os Estados Unidos
não controlavam o Iraque. Para a imprensa norte-americana, “o Iraque está fora de controle”.
Desde a queda de Bagdá, a resistência iraquiana passou dos golpes de mão e ataques isolados a
ações múltiplas e coordenadas contra as tropas de ocupação; logo tomou como alvos a
infraestrutura econômica: os oleodutos (a explosão do duto que une Iraque e Turquia obrigou a
suspender as exportações de petróleo) e as plantas produtoras de energia elétrica. Dali passou a
objetivos “políticos”, como a bomba na embaixada da Jordânia (um aliado incondicional dos
Estados Unidos) e à sede da ONU.
Os ocupantes responsabilizaram aos “nostálgicos de Saddam” pelos atentados. Mas, disse o
Financial Times, “há muito mais gente com razões para odiar a ocupação, e seu número está
crescendo”: os 40.000 homens licenciados do exército, com armas mas sem pagamento; as
principais tribos sunitas, que sempre governaram o Iraque; os radicais islâmicos wahabitas
(associados com a Arábia Saudita); os xiitas, que não aceitam voltar a uma posição subordinada;
os islâmicos de outros países que têm ido ao Iraque para lutar contra os ocupantes. Inclusive
foram realizados surpreendentes acordos táticos entre facções sunitas e xiitas para enfrentar os
norte-americanos.
A incapacidade para reconstruir o Estado iraquiano obedece a duas razões. A primeira, as agudas
divisões no seio do imperialismo, onde cada grupo “influente” respalda uma fração iraquiana
distinta. A segunda, a mais importante, é que a crise iraquiana está diretamente relacionada com
os das crises políticas mais explosivas da regiões: a do Irã e a da Arábia Saudita. Para associar à
ocupação aos xiitas, ligados por laços históricos e religiosos aos xiitas iranianos, os Estados
Unidos deveriam chegar a algum acordo político com o regime dos ayatollahs iranianos. Isto não
só significaria uma derrota política para Bush – já que um dos objetivos da invasão era
estabelecer uma ameaça direta contra o Irã – mas também desestabilizaria imediatamente a
monarquia saudita.
Palestina e a “Guerra Infinita”
A crise política da ocupação questionou toda a política norte-americana na região, especialmente
na Palestina. Com o atentado, tornaram-se públicas as agudas divergências dentro do próprio
imperialismo norte-americano acerca da ocupação. Donald Rumsfeld, chefe político do
Pentágono, chocou com seus generais ao afirmar que os Estados Unidos não enviarão mais um
só homem ao Iraque. Dos 155 batalhões de combate do exército estadunidense, 98 se encontram
empenhados em tarefas ativas fora dos Estados Unidos; além disso, já se convocaram 136 mil
membros da Guarda Nacional e das reservas. Com estes números em mão, o conhecido
historiador Paul Kennedy afirmou que o esforço militar norte-americano no mundo é “impossível
de se sustentar a longo prazo”.
O impasse da ocupação representou uma crise maior para a estratégia norte-americana. Para
superá-la, necessita esmagar a resistência e para isso, requer apoio político interno e
internacional. A formação do “Conselho Interino” iraquiano apontou nesta direção. Também o
chamado de Bush a outros países a “colaborar militar e financeiramente” no Iraque. Este
chamado não é uma opção desejável; é uma necessidade política e militar para os norteamericanos.
Rosemary Hollis, do britânico Royal Institute of International Affairs, confirmou: “a OTAN não
pode socorrer aos norte-americanos. Tem somente 80.000 homens, dos quais 37.000 já estão
empenhados no Afeganistão, nos Bálcãs, Serra Leoa e outros lugares. A única resposta são as
Nações Unidas. Conclusão: os norte-americanos não têm outro modo de sair da ratoeira do
Iraque senão aceitando se transforme em uma operação da ONU”. Tudo isso explica as
crescentes exigências de uma “maior intervenção das Nações Unidas no Iraque”. Mas esse apoio
tem seu preço: a repartição dos negócios petrolíferos e de reconstrução do Iraque, até agora
monopolizado pelos norte-americanos.
Por isso, o "regresso à ONU" entrou em violenta contradição com a política de toda uma ala do
imperialismo norte-americano, que viu na invasão do Iraque a oportunidade de golpear as
potências européias e as "organizações internacionais". Outro fator que pressiona para a
intervenção da ONU: a posição dos grandes monopólios petrolíferos, que advertiram as
autoridades norte-americanas que não realizarão investimentos enquanto a situação em relação à
segurança continue tão perigosa. Funcionários norte-americanos de alto escalão se entrevistaram
com os chefes das principais petrolíferas para incentivá-las a investir no Iraque, obtendo em
todos os casos a mesma resposta: sua preocupação com a falta de segurança e de legitimidade
política, dado que a autoridade transitória apoiada pelos Estados Unidos tem muito pouca
representatividade. O presidente da Shell declarou publicamente que "deve haver uma autoridade
legítima e um processo legítimo adequado, capazes de negociar acordos que durem décadas".
Inclusive companhias norte-americanas como a Exxon-Mobil e a Chevron-Texaco decidiram não
investir no Iraque. As contradições enfrentadas pela ocupação militar norte-americana no Iraque
são, objetivamente, explosivas. Para Bush, o controle do petróleo iraquiano seria um mero
subproduto de uma transformação regional muito mais vasta: o estabelecimento de novas formas
políticas e “um novo sistema econômico desde o norte da África ao Afeganistão e Paquistão".
Para o dizer nas palavras que popularizaram o então vice-presidente norte-americano, Dick
Cheney, um dos "cérebros" da guerra, um dos objetivos políticos essenciais da guerra contra o
Iraque é "refazer o mapa político do Oriente Médio". A região que circunda o Iraque verá as
mais dramáticas mudanças desde a queda do Império Otomano e o acordo Sykes-Picot, que criou
o moderno Oriente Médio.
Mas a situação no Oriente Médio também se encaminhava para uma grave crise. Com poucos
dias de diferença, os primeiros ministros de Israel e da Autoridade Palestina foram recebidos na
Casa Branca para discutir a marcha do “Mapa da Estrada”. Longe dos flashes e das câmeras de
televisão, outros homens são os encarregados de pôr em prática, sobre o terreno, o plano
imperialista para o Oriente Médio. Do lado palestino, um desses homens é Mohamed Dahlan,
Ministro de Interior e Segurança. Para essa tarefa, Dahlan recebeu poderes excepcionais de Abu
Mazen, mas principalmente da Casa Branca, que depositou nele toda sua confiança para que
pacifique os territórios palestinos.
Com esses "avais", Dahlan se lançou em uma "guerra secreta" contra as organizações populares
palestinas: fechou emissoras de radio, censurou a imprensa escrita e lançou uma campanha de
"branqueamento" das paredes pichadas com as inscrições contrárias a Israel, ao “Mapa da
Estrada” e ao governo palestino. Outro dos homens chaves para a aplicação do “Mapa da
Estrada” por parte dos palestinos é Marwan Barghouti, assinalado como o chefe das brigadas
militares de Al Fatah e como o "cérebro militar" da Intifada, e que se encontra detido em Israel
há quinze meses. Barghouti apoiou a “Mapa da Estrada” porque, afirmou, "o que tem de bom é
que propõe terminar a ocupação e constituir um Estado palestino".
Que "Estado Palestino" daria à luz o “Mapa da Estrada”? Sharon reafirmou: "compreendemos a
importância da contigüidade territorial na Cisjordânia para (a existência de) um Estado palestino
viável". Mas a contigüidade significa que o futuro "Estado palestino" estará constituído por uma
somatória de retalhos territoriais, cortados e controlados pelo Exército israelense, rodeado de
assentamentos sionistas, localizados entre as zonas "contíguas" palestinas. O que seria então o
"Estado palestino"? Apenas um conjunto de cantões, entrecortados por estradas controladas pelo
exército israelense e sitiados pelas colônias sionistas e os estabelecimentos militares que as
protegem; em outras palavras, um conjunto de guetos militarmente controlados por Israel.
A sistemática campanha de massacres nos campos de refugiados, lançada pelo governo sionista,
foi parte integral da "solução final" da questão palestina que preparavam Bush e Sharon.[60]
Segundo Hasan Abunimah, representante da Jordânia na ONU, o que Sharon chama "um Estado
palestino viável" não seria mais que "um acordo em que se dá aos palestinos um direito limitado
ao auto-governo dentro da Grande Israel, mas sem direitos civis ou políticos estatais". À força de
"fatos consumados", como a muralha, os assentamentos, a destruição de moradias e plantações, o
monopólio das fontes de água e o êxodo contínuo da população palestina, a chamada "solução de
dois Estados", um israelense e outro palestino, parece crescentemente insustentável.
Tampouco foi congelada a construção de assentamentos sionistas nos territórios ocupados. À
retirada de algumas colônias isoladas, segue a construção de outras novas, porém sem
publicidade. Como conseqüência o número total de assentamentos sionistas nos territórios
palestinos continuou crescendo desde que Bush anunciou o “Mapa da Estrada”. Para a
construção da muralha ilegal, que separaria os assentamentos da população palestina, Israel
anexou vastas zonas da Cisjordânia. Do lado "israelense" da muralha, ficaram dezenas de
assentamentos (de fato anexados a Israel) e dezenas de aldeias e povos palestinos, que foram
separados à força dos Territórios. Em Washington, Sharon anunciou que Israel continuará a
construção da muralha. Nem o “Mapa da Estrada” nem a trégua unilateral resolveram a principal
reivindicação imediata palestina: a liberação dos 6500 presos políticos palestinos, muitos deles
sem processo nem acusação alguma, detidos durante as "operações" realizadas pelo Exército
sionista nos territórios nos últimos três anos. Israel anunciou a liberação de apenas 500 detidos,
sem nenhum compromisso em relação aos 6.000 restantes.
O “Mapa da Estrada” criou uma situação insustentável na Palestina: a opressão e ocupação das
tropas sionistas em uma parte substancial dos territórios ocupados, a construção do muro, a
continuidade dos assentamentos e a retenção dos presos, soma-se à própria repressão da
Autoridade Palestina sobre as organizações populares. Segundo o Financial Times "se Bush não
fizer nada para frear Sharon e o profundamente impopular governo de Abu Mazen, é apenas uma
questão de tempo antes que a situação exploda em una nova e sustentada onda de violência".
O “Estado” Palestino
O “Estado” palestino, nessas condições, seria o da miséria palestina: independentemente da
retórica, na hipótese de que se reconhecessem os dois Estados, a verdade é que só um cinismo
sem limites permitiria chamar “Estado Palestino” aqueles guetos de miséria cercados por colonos
e militares sionistas, com franca supremacia econômica, política e militar. O expansionismo
sionista vai associado a dois fatos inseparáveis da vida palestina: a diáspora de quase quatro
milhões de palestinos, de uma população total que não chega a oito milhões, e a miséria mais
completa dos quase três milhões de palestinos que vivem na Faixa de Gaza e na Cisjordânia.
A expansão sionista arruinou a agricultura palestina. Mediante o confisco de terras, a imposição
de quotas para as exportações ao mercado israelense, o controle de importação de ferramentas
agrícolas ou o envio, a preços muito competitivos, do excedente agrícola israelense aos
territórios ocupados, acabou se reduzindo a extensão dos cultivos, limitando o número de peões
nas granjas e empurrando os habitantes de várias aldeias para o mercado de trabalho israelense.
Nesse plano, não faltou a proibição aos agricultores palestinos de exportar produtos agrícolas
para a Jordânia; zonas inteiras de oliveiras e árvores frutíferas foram destruídas.
Uma arma poderosa em mãos dos militares sionistas é a água. Os recursos hidráulicos, devido à
escassez, se tornaram um dos recursos estratégicos no Oriente Médio, e por isso zonas como as
Colinas de Golã foram fonte constante de disputa. Durante anos as ordens militares sionistas
incluíram a destruição de poços de água palestinos, a proibição de que cavassem a mais de 120
metros de profundidade (os colonos sionistas tinham autorização para cavar até 800 metros de
profundidade), a expropriação de poços de proprietários “ausentes” etc.
Desde 1982, todo o sistema hidráulico está sob administração da “Rede Nacional Israelense”. Os
habitantes palestinos de Gaza e Cisjordânia dispõem de 115 milhões de metros cúbicos de água
por ano, o que representa 19% dos recursos de seu país. A economia israelense e os
assentamentos judeus dispõem de 485 milhões de metros cúbicos. Em termos de infra-estrutura,
só 2% das localidades da Cisjordânia têm rede de esgotos; apenas 21% dos habitantes conta com
sistema de coleta de lixo; apenas 44% das localidades cisjordanas dispõem de fornecimento
permanente de energia elétrica e apenas 20% dos habitantes estão conectados à rede telefônica.
Em um estudo realizado no início dos anos 1990, em uma situação “melhor” que a atual, os
dados em matéria de saúde eram relevantes. Dos 830 milhões de dólares de impostos nos
territórios ocupados recolhidos pelas autoridades militares israelenses, somente 300 foram
invertidos em projetos de saúde, educação e assistência social. Nesse período, os gastos da
administração civil em matéria de saúde pública passaram de 40 a 18,3 dólares per capita,
enquanto que na Jordânia a cobertura era de 140 dólares e em Israel chegava a 370 dólares per
capita. Portanto, não é de estranhar a falta de camas e medicamentos nos hospitais palestinos.
Carentes de recursos 500 escolas, oito universidades e mais 11 mil empregados do setor
educativo nos Territórios Ocupados padecem sem o menor financiamento.
A economia palestina vive em fase de completa pauperização, sobretudo desde 1967, quando as
autoridades jordanianas terminaram de descapitalizar toda a margem oriental para favorecer a
industrialização da antiga Transjordânia. O papel da economia palestina na “divisão do trabalho”
está determinada pelos projetos do ocupante. Assim, em um informe de 1970 do Ministério de
Defesa israelense se afirma: “por um lado, os territórios ocupados constituem um mercado
suplementar para as exportações israelenses e as empresas pertencentes ao setor terciário e, por
outro, é provável que acabem convertendo-se em um canteiro de mão de obra não qualificada”.
Já em 1987, mais de 92% das importações de Gaza e Cisjordânia procediam de Israel.
Como cifra comparativa, tem-se que 1992-1993 o PIB de Israel subia para 63 bilhões de dólares,
o da Jordânia a quatro bilhões e o dos Territórios Ocupados foi de 2,2 bilhões de dólares (3% do
PIB israelense!), sendo que um terço desses ingressos procede da mão de obra empregada em
Israel, dos 600 mil palestinos que dependem do mercado de trabalho israelense. O fechamento
dos territórios decretado pelo governo israelense só aumentou a asfixia desse quadro de
pauperização. As taxas de desemprego dispararam de 23 para 50% da população ativa, e se
calcula que nos últimos anos o poder aquisitivo da população de Gaza e Cisjordânia caiu 46%.
Como se fosse pouco, os acordos de paz obrigam a Autoridade Nacional Palestina a “uma
mesma política de importação” que Israel, deixando-lhe como “margem” importar determinados
produtos de países árabes, em quantidades limitadas e a preços acertados previamente com
Israel. Cabe então perguntar qual é a viabilidade de um Estado sem recursos hidráulicos, sem
indústrias, com a agricultura destruída, sem infra-estrutura de moradia, saneamento, educação ou
transporte, e sem independência, sequer formal, para estabelecer relações comerciais exteriores?
Em tais condições de coexistência entre os dois Estados, o chamado “Estado Palestino” não seria
mais que a administração de um gueto, gerente de um bantustão, cujos ínfimos recursos
econômicos dependeriam da “a ajuda exterior”, essa que chega a conta-gotas, dependendo do
quanto o doador goste das medidas adotadas.[61]
Já em 1988, o ex-subsecretário de Estado George Ball (administrações de Kennedy e Johnson)
em seu artigo A paz de Israel depende de um estado-apêndice dos palestinos afirmava: “A
preocupação de Israel por segurança poderia ser satisfeita em boa medida redigindo um tratado
formal com salvaguardas vinculadas e executáveis que impeçam o novo estado palestino ter
qualquer força armada própria e limitem o número e tipo de armas que pode usar sua polícia.
Como salvaguarda adicional, o acordo poderia incluir a instalação de postos de vigilância mais
amplos numerosos e efetivos que os que atualmente funcionam no Sinai a partir do acordo de paz
de Israel com o Egito”.[62]
A assinatura, em setembro de 1993, dos chamados Acordos de Oslo, negociados em segredo
entre o governo israelense e a direção de Arafat, esteve em sintonia com essa proposta antiga dos
funcionários do governo dos EUA. Mas esses acordos também devem ser explicados pela
mudança na estratégia palestina que teve início em dezembro 1988 com a decisão da maioria do
Congresso Nacional Palestino, dirigido por Arafat, de reconhecer o Estado de Israel. Essa
mudança punha no centro da estratégia palestina a negociação sobre a base do reconhecimento
de dois Estados.
Os Acordos de Oslo eram a máxima expressão dessa estratégia, e foram seguidos por uma
enorme difusão, que não poupou elogios e cumprimentos. A declaração mesma começava com a
solene afirmação dos assinantes de que havia “chegado o momento de pôr fim a décadas de
confrontações e conflitos, de reconhecer reciprocamente seus direitos legítimos e políticos, de
esforçar-se por viver em coexistência pacífica, a dignidade a segurança mútua”. Os direitos
legítimos e a dignidade para os palestinos se resumiram em uma “autonomia” carente de recursos
próprios, guetos de miséria cercados pelas FFAA israelenses. Em troca, a direção de Arafat
renunciou não só à autodeterminação, como também a Jerusalém e aos direitos dos refugiados,
ou seja, aos direitos de 55% da população palestina.
Mas além de fracionar a negociação (o tema do regresso dos refugiados ficava de fora), Arafat se
empenhou em fracionar a resistência palestina. Edward Saïd definiu os Acordos de Oslo como
um “instrumento de submissão”, como a “capitulação”: “Israel obteve dos árabes a aceitação, o
reconhecimento e a legitimidade, sem ser obrigado a renunciar à soberania sobre os territórios
árabes ocupados, entre eles, Jerusalém Oriental”. Os acordos estão em sintonia com a
manutenção de Israel enquanto Estado sionista. Se impôs, com a assinatura de Yasser Arafat, a
visão racista e teocrática, que repete soluções anteriormente impostas pelo imperialismo em suas
colônias nos séculos XIX e XX.
Uma definição dada por Edward Said ilustra esses antecedentes e permitiu dar um marco
histórico às negociações sobre a região: “Os acordos de autonomia com os quais os palestinos
(excluímos os quatro milhões de refugiados cuja sorte foi jogada para a nebulosa situação do
‘estatuto final’) tem que conviver são uma curiosa amálgama de três ‘soluções’, historicamente
descartadas, e idealizadas por colonizadores brancos para o problema dos povos antigos da
África e Américas do século XIX. Uma delas se baseava na idéia de que os nativos podiam ser
convertidos em irrelevantes seres exóticos privados de suas terras e mantidos em tais condições
de vida que lhes reduzissem a ser trabalhadores braçais temporários ou agricultores prémodernos. Este é o modelo índio-americano”.
E continuava Said: “A segunda (solução) consistia na divisão de suas terras (reservas) em
cantões descontínuos, e no estabelecimento de uma política de apartheid que dava privilégios
especiais aos colonos brancos (hoje os israelenses), enquanto se permitia aos nativos viver em
seus guetos miseráveis; assim, estes eram responsáveis dos assuntos municipais sem deixar de
estar submetidos ao controle do branco (de novo Israel). Este é o modelo sul-africano.
Finalmente, a necessidade de que estas medidas gozassem de certo grau de aceitação requeria
que um ‘chefe’ nativo assinasse na parte inferior da página. Este chefe obtinha temporariamente
um estatuto mais elevado do que aquele que dispunha antes, recebia apoio dos brancos, um
título, um par de privilégios, e talvez, uma força de polícia nativa, de tal maneira que todo
mundo pudesse apreciar sem dificuldade que se havia feito o melhor para esse povo. Esse é o
modelo seguido pelos franceses e britânicos na África do século XIX. Arafat é o equivalente do
século XX dos dirigentes africanos.”
O segredo oculto na virada para a “estratégia dos dois Estados” foi a política e a orientação da
direção de Arafat. É impossível entender a Intifada sem esse cerco de miséria, asfixia e terror
imposto pelo Estado sionista, mas é pertinente dizer que a Intifada também é um protesto contra
essa política, que legitima o sionismo enquanto condena o povo palestino à fome e ao
desemprego. Vejamos alguns argumentos da esquerda a favor dos dois Estados, suposta solução
pacifica. É um argumento dos que defendem a solução ‘realista’ afirmar que Israel já é uma
realidade após 50 anos de existência. A validade desse argumento seria o mesmo que afirmar,
anos atrás, que o apartheid sul-africano era uma “realidade” após décadas e devia ser aceito
pelos negros com algumas reformas. Tão progressista como exigir aos libertadores da América
que fossem realistas diante do fato evidente de mais de três séculos de presença espanhola ou
portuguesa na América Latina.
Sionismo de Esquerda
Uma corrente de esquerda que advoga pela solução dos dois Estados e a retomada das
negociações de paz é o Secretariado Unificado da Quarta Internacional (SU). Michel
Warshawski, dirigente de seu grupo israelense e especialista no tema, advoga por uma
‘verdadeira paz’ e a coexistência entre dois Estados, sob auspícios da ONU”. Segundo
Warshawski: “Para deter a loucura assassina em curso, é necessária uma intervenção
internacional, decidida a impor ao menos a retirada das forças militares israelenses e a
redefinição de um marco de negociações que possa por fim ao diktat israel-americano. Os
palestinos pedem uma proteção internacional e este chamamento deve ser retomado com vigor
pelo movimento de solidariedade que começa a se reorganizar em todo o mundo, depois de sete
anos de confusão mantida pelos acordos de paz.”.[63]
Ou ainda: “Uma força de interposição internacional seria, sem dúvida alguma, a solução menos
custosa. É o que pedem os palestinos. É também o que pode acelerar o reinicio das negociações,
que o governo de Barak, mais isolado que nunca e incapaz de tomar a menor decisão, a não ser a
de golpear, sabe inevitável. Neste sentido, uma intervenção internacional não serviria somente
para evitar o massacre dos palestinos, mas também para limitar o número de vítimas do lado de
Israel, que não vai parar de aumentar, como confirma o último atentado de Gaza.”.[64]
Ou seja, diante da ofensiva, impossível de ser derrotada por causa da desproporção de forças, o
“realista” e “revolucionário” é apelar para a boa vontade de uma intervenção internacional para,
nada mais nada menos, que impor a retirada das tropas israelenses. Os SU adotou o hábito de
exigir a intervenção da ONU frente a qualquer conflito que se dê no mundo (Bósnia, Kosovo,
Timor, Chechênia). Curioso pacifismo este que encontra na exigência de intervenções militares
da chamada “comunidade internacional” a solução para todos os problemas.
Esse antimilitarismo converte os exércitos da ONU nos instrumentos políticos de todas as
soluções. Uma política que chama as massas permanentemente a confiar em instituições como a
ONU, como se esta fosse neutra ou alheia a problema, como se a ONU ou os exércitos que
intervenham em seu nome estivessem acima dos grandes Estados, acima das classes, como se
não fossem serviçais do imperialismo, em particular do norte-americano. Sem falar na completa
impotência demonstrada pela ONU para impor soluções “humanitárias”, quer seja em Kosovo,
na Iugoslávia, no Oriente Médio ou em Haiti.
Para Warshawski, parece que “a comunidade internacional”, ou a ONU tivessem outra política,
qualitativamente diferente, sobre o conflito, distinta dos “planos de paz” que vêm sendo
aplicados. Como se junto com a intervenção militar da ONU chegassem os planos de paz
‘verdadeiros’, nos quais seriam reconhecidas as legítimas reivindicações palestinas. Não lembra
que foi a ONU que repartiu a Palestina para permitir, primeiro, que se formasse e depois desse
legitimidade internacional ao Estado sionista? Não lembra que foi a ONU que aprovou perseguir
militarmente todos os que se levantaram em armas contra sua resolução de repartir a Palestina? E
não foi sob o auspício da ONU que se negociaram, primeiro em segredo, depois se assinaram os
vergonhosos Acordos de Oslo que tantos sofrimentos trouxeram aos palestinos e contra os quais
luta hoje a Intifada?.
Michel Warshawski sabe que dentre todas as organizações da esquerda mundial, só a IV
Internacional levantou, em 1948, sua voz contra a constituição do Estado de Israel. “Abaixo a
divisão da Palestina! Abaixo a intervenção imperialista na Palestina!, Fora do país todas as
tropas estrangeiras, os “mediadores” e “observadores” das Nações Unidas!”, dizia a declaração
da IV Internacional.[65] Warshawski exige “uma força de interposição internacional” que, se
concretizada, obviamente estaria obrigada a se interpor entre o exército israelense e os jovens
palestinos que protagonizam a Intifada. E se os jovens palestinos não aceitarem parar de atirar
pedras, se negarem a ficar quietos à espera de novos “Planos de Paz”? A solução proposta por
Warshawski só é possível com a condição de parar la Intifada, porque do contrário os jovens
palestinos terão de enfrentar o exército israelense e o da ONU.
Warshawski afirma que essa intervenção “é o que pedem os palestinos”. Deveria dizer, com mais
precisão, que isso é o que pedia Arafat. Não precisar isso é a forma de confundir a defesa dos
palestinos e sua Intifada com a defesa de Arafat e sua política. Arafat clamava pela ONU, para
negociar com Israel e para acabar uma Intifada que surgiu apesar dele e em boa medida, contra
ele. Propor como solução pedir a intervenção da ONU, independentemente da vontade que
acompanhe essa proposta, acaba se convertendo no apoio à permanência do Estado de Israel, o
apoio à política da direção da OLP é o oposto ao apoio incondicional à Intifada.
É necessário retomar a defesa de uma República Palestina laica, democrática e não-racista. A
fortaleza do Estado de Israel, sua existência por mais de 50 anos, não se explica por seu poderio
militar, nem sequer contando com todo o arsenal norte-americano. Como em toda guerra, é a
política e não os meios técnicos militares o elemento determinante.
A virada da direção palestina, a que era dirigida por Arafat, e sua estratégia dos dois Estados, é,
acima de tudo, um triunfo do sionismo, porque “legitimou” o direito de existir de um Estado
sionista. A partir daí, qualquer negociação só poderia levar, mais cedo ou mais tarde, ao
retrocesso sistemático, ao gueto e a miséria. Como afirma Ralph Schoenman, “na realidade, os
supostos defensores dos direitos palestinos que exigem a aceitação e o reconhecimento do Estado
de Israel, seja como for que se disfarcem, estão atuando como advogados do Estado colonial
estabelecido na Palestina. Utilizam a cobertura pseudo-esquerdista da autodeterminação para
‘ambos os povos’, mas essa sofisticada utilização do princípio da autodeterminação, equivale a
um chamamento encoberto a uma anistia a Israel”.[66]
Esse giro estratégico da direção da Al Fatah teve e tem como destinatário o governo norteamericano e as burguesias européias. Trata-se de mostrar “sentido comum” e agradar os
possíveis doadores. A OLP defende uma política “integradora”, “não exclusiva”, de
“convivência entre árabes e judeus”, repetem reiteradamente os defensores do giro estratégico.
Até nesse aspecto tão crucial de toda luta, como a batalha ideológica, o giro parece um certo
reconhecimento tácito dos reiterados e reacionários tópicos que o sionismo sempre agitou: “os
palestinos querem acabar com os judeus”, “querem atirá-los ao mar” , “acabar com o Estado de
Israel é anti-semitismo, perseguição aos judeus”.
A luta por um estado palestino democrático e laico em todo o território do mandato britânico foi
colocada por militantes antiimperialistas palestinos (árabes e judeus), antes e depois da criação
do estado de Israel. Foi também a perspectiva da OLP na sua constituição até, em meados da
década de 1970, sua direção começar a falar na criação de um estado em qualquer parte do
território palestino que se liberasse. Era a aceitação do plano de partição de 1947, proposto pelo
imperialismo, apoiado pelo stalinismo e aceito pelo sionismo.
Deste modo, a direção da OLP preparava o terreno para a renúncia histórica da luta palestina.
Esta se concretizou no processo aberto pelos Acordos de Oslo, que estabelecem a criação de um
estado palestino marionete, em menos de 30% do território histórico de Palestina, e a
preservação do estado de Israel como policia regional.[67]
"Conflito israelense-palestino" é o eufemismo politically correct para referir-se à luta pelas
reivindicações nacionais palestinas, e à agressão colonialista israelense em todo o Médio Oriente.
Essa expressão considera que existe uma simetria entre os palestinos e o suposto direito à
existência do estado sionista. Não existirá direito ao retorno e solução para o problema de
centenas de milhares de refugiados sem o desmantelamento de todo o sistema jurídico-político
montado por Israel: os Acordos de Oslo evitaram sequer a menção do problema. O argumento
central contra um estado palestino único, democrático e laico seria a existência "de duas
coletividades nacionais, a judia e a árabe, e o fato da proposta não atender as necessidades dessas
comunidades para garantir sua existência".[68]
Warshawski é um ativo dirigente do Bloco de Paz, liderado pelo sionista de esquerda Uri
Avineri, quem apóia os Acordos de Oslo e defende "dois estados, para dois povos". Mas a luta
pelos direitos nacionais palestinos e das massas em geral no Médio Oriente é incompatível com a
existência do estado sionista. As mínimas reivindicações sociais, salário, ocupação, terra,
moradia; assim como a plena vigência dos direitos civis para todos os habitantes da região
necessitam o desmantelamento do regime colonial vigente representado pelo Estado de Israel e o
pseudo-estado palestino em formação. Só se pode substituir o regime imperialista vigente, e dar
plena satisfação aos anseios das massas palestinas (incluindo os refugiados) e das massas judias
em uma república democrática e laica em todo o território da Palestina histórica. Há 50 anos,
Abraham León vaticinava que a solução do problema judeu não se resolveria com a criação de
um estado judeu na Palestina, que só poderia ser um novo gheto reacionário.[69]
6. ACORDOS E TERCEIRA INTIFADA
Que outro programa, a não ser o programa fundador da OLP, propunha a convivência entre
árabes e judeus em um só e mesmo Estado? A proposta de uma Palestina democrática, laica e
não-racista defendida pelo programa da OLP aprovado em 1969, marcou toda uma perspectiva
de emancipação, que buscava a convergência entre árabes e judeus, sobre a base da eliminação
do colonialismo sionista. Uma Palestina na qual os judeus que não faziam parte da invasão
sionista eram “considerados como palestinos” Esse programa afirmava: “O movimento de
libertação nacional palestino não luta contra os judeus enquanto comunidade étnica e religiosa.
Luta contra Israel, expressão de uma colonização e baseada em um sistema teocrático racista e
expansionista, expressão do sionismo e do colonialismo”.[70]
Apontava assim uma estratégia para revolução palestina, atraindo o apoio de massas na Palestina
e no resto do mundo árabe assim como de parcelas das massas mais pobres prejudicada pelo
predomínio sionista e das camadas da juventude judia cansadas de servir de bucha de canhão em
uma guerra sem fim para garantir os objetivos colonialistas insaciáveis de Sharon, Peres e
companhia. Um programa e uma estratégia que punham ênfase especial em não confundir de
forma alguma os judeus com os sionistas.[71] O então recém nomeado presidente, Yasser Arafat,
explicando o programa fundador da OLP, dizia: “Como presidente da OLP, conclamo os judeus,
a cada um individualmente, a reconsiderar sua opinião sobre o caminho para o abismo pelo qual
o sionismo e os dirigentes israelenses os conduzem (...) Fazemos a vocês o mais generoso dos
apelos para que vivamos efetivamente uma paz justa, juntos em nossa Palestina democrática”.
A Segunda Intifada, de 1988 a 1992, abriu pela primeira vez a necessidade de que Israel, com
apoio dos EUA, tivesse que negociar, e permitiu a sobrevivência da direção da Al Fatah. E
Arafat se pôs à cabeça da negociação, no quadro definido pelo imperialismo norte-americano,
para chamar a paz e usar os heróicos combatentes das pedras como moeda de barganha. Qual é a
avaliação, depois de mais de uma década, dessa virada? Arafat terminou seus dias como
presidente de um bantustão de miséria e sofrimento, cercado de questionamentos quanto à sua
autoridade, em meio a denúncias de corrupção e torturas, e da divisão da resistência palestina.
A nova (Terceira) Intifada não apenas repetiu as cenas de heroísmo do povo palestino e renovou,
com sua juventude, o compromisso com a luta, mas foi também um questionamento objetivo, de
cima abaixo, dessa virada estratégica, da política dos dois Estados e os “Acordos de Paz”.
Edward W. Said disse que, em defesa da Intifada se tratava de abrir “uma segunda frente”.
Defender a causa palestina, apoiar a Intifada, exigia redobrar esforços para explicar em todos os
lugares do planeta as razões da luta palestina, contradizer os argumentos falaciosos do sionismo,
quebrando o cerco que se quer levantar sobre Palestina e rodeando assim de solidariedade a
Intifada.
Durante todo o ano de 1999 e ao longo de 2000, as negociações sobre a implementação das
propostas da "terra para paz" do acordo de Wye fracassaram repetidamente e, por volta de
meados de 2000, estava ficando óbvio que nenhuma solução aceitável resultaria das negociações.
Como poderia uma solução justa ser alcançada sem que houvesse igualdade entre as partes?
Israel, como o poder de ocupação, continuava a ditar os termos para os palestinos. Fingiu
oferecer concessões magnânimas, quando, na verdade, não oferecia nada. O obstáculo para a paz
é a ocupação, e a manifestação primária da ocupação sempre foram as colônias nos territórios
ocupados.
As colônias são comunidades judaicas de tamanhos variados, algumas sendo cidades
completamente formadas, construídas em terras ocupadas. Elas são ilegais pela lei internacional,
como a própria ocupação, mas elas são alguns dos "fatos concretos" de Israel. Em Gaza, os
israelenses determinam um suprimento de água grosseiramente desproporcional, fornecendo aos
colonos água corrente abundante o suficiente para abastecer suas piscinas, enquanto deixam as
cidades e os campos de refugiados palestinos com abastecimento intermitente e, freqüentemente,
inadequado. Em nome da "autodefesa" (contra o povo cujas terras eles ocupam ilegalmente), os
colonos têm permissão de portar armas de fogo, inclusive as semi-automáticas.
No começo dos anos 1990, antes do início das negociações de Oslo, as construções nas colônias
eram muitas e não verificadas. De fato, eram encorajadas ativamente por Ariel Sharon, que,
quando era Ministro da Construção e Colonização, incitou os colonos a "tomar cada colina".
Sucessivos governos israelenses de todos os partidos permitiram, e até mesmo, justificavam a
contínua construção de colônias. Alguns, como o de Benjamin Netanyahu, sequer disfarçaram
seu apoio aos colonos, mas a construção de colônias sob o governo de Netanyahu não foi tão
grande como sob Ehud Barak, que alardeava seguir a Declaração de Princípios, afirmando ter
paralisado a construção de colônias ou ter limitado sua construção ao crescimento natural,
enquanto, na verdade, autorizava ou fechava os olhos para a expansão em massa. Num ato de
grosseira farsa, Israel afirmou, durante as negociações de Wye River, que Barak tinha
generosamente oferecido enormes concessões aos palestinos, inclusive a soberania sobre a
Margem Ocidental, e que Arafat recusara esta proposta por intransigência.[72]
Quando se fala dos Planos de Paz como “saída para o conflito” e se renuncia à batalha
estratégica pela Palestina democrática, laica e não-racista em nome de um suposto realismo
diante da “força do inimigo”, convém dizer que não se trata de menosprezar nem um milímetro
da força do sionismo e do imperialismo, mas é bom lembrar que os combatentes do Líbano
conseguiram a retirada das tropas de Israel, para o que colaborou a mobilização das mães dos
soldados judeus que não agüentavam mais a perda de seus filhos em uma guerra sem sentido.
Desde o Líbano começaram a aparecer os sintomas da exaustão da juventude judaica com os
anos de guerra em prol do colonialismo. Se criaram grupos de ação contra a ocupação dos
territórios ocupados dentro de Israel (Gush Shalom) e soldados como Noam Kuzar, que se
recusam a servir neles, orientados por grupos como o Yesh Gvul. Seria impensável há alguns
anos que, como em 2001, no dia da comemoração da fundação de Israel haja uma
contramanifestação desses grupos reunindo judeus e palestinos em Jerusalém. A resistência
palestina e árabe ao colonialismo sionista permitiu que se abrissem as primeiras brechas na antes
considerada invencível força armada israelense.
A Retirada da Faixa de Gaza
A partir de agosto de 2005 se consumou a retirada das forças israelenses da Faixa de Gaza. Qual
foi o seu significado? A crise política aberta em Israel pela retirada de tropas e colonos (em
número de 8500), esteve e está longe de ser um episódio isolado e facilmente superável. À
renúncia do ministro de Finanças (e ex premiê de Israel de 1996 até 1999), Benjamin Netanyahu,
somou-se a manifestação de 100 mil israelenses no Muro das Lamentações, a 10 de agosto de
2005, mobilizados pela extrema direita religiosa contra a remoção dos assentamentos sionistas
no território “palestino”.
Na chamada Guerra dos Seis Dias (junho de 1967), Israel se apropriou de um conjunto de
territórios, imediatamente após o cessar fogo decretado pela ONU e acatado por todos os países
envolvidos. As áreas eram: do Egito, a Faixa de Gaza e a Península do Sinai; da Jordânia, a
Cisjordânia e o setor oriental de Jerusalém; de Síria, as Colinas de Golã. Depois da Guerra do
Yom Kippur (1973) e, especialmente, do reconhecimento da OLP (Organização para a
Libertação da Palestina) como representante do povo palestino, na ONU (que lhe conferiu status
de “observador permanente”), a OLP passou a seguir uma orientação mais diplomática,
descartando progressivamente a luta armada, a exceção das ações em Israel e nos Territórios
Ocupados de Gaza e Cisjordânia, onde a direção da OLP pretendia instalar o futuro Estado
palestino.[73] Com saída de Netzarim, Israel encerrou, portanto, 38 anos de ocupação em Gaza.
A Faixa de Gaza é um território da Palestina, sob ocupação de Israel, limitado a norte e leste por
Israel, a sul pelo Egito e a oeste pelo Mar Mediterrâneo.
Desde final da década de 1980, a Faixa de Gaza foi um dos palcos da Intifada palestina contra o
Estado sionista. Desde o seu estabelecimento em 1994, a Autoridade Palestina foi
crescentemente acusada de nepotismo e de prestar favores políticos a um pequeno círculo
próximo a Arafat. Gaza foi palco de uma disputa de poder entre a "velha guarda" da Autoridade
Palestina, liderada por Yasser Arafat, e uma geração mais jovem de militantes armados, e
integrantes dos serviços de segurança, que queriam reformas na estrutura de poder palestina. A
velha guarda foi acusada de corrupção e de não ter agido para garantir aos palestinos segurança e
vida melhor. Também o foram de não terem conseguido formar instituições capazes de sustentar
um Estado palestino.
A retirada israelense faz parte dos acordos do assim chamado “processo de paz”, concretizado
nos Acordos de Oslo de 1993. Centenas de colonos assinaram acordos de compensação com o
Estado para deixar o território antes do prazo de 17 de agosto, mas o exército informou que cerca
de cinco mil pessoas que se opunham à retirada entraram na região para encorajar a resistência à
desocupação. Tropas bateram nas portas das casas para dizer aos moradores tinham 48 horas
para evacuar suas casas antes que forças começassem a retirá-los. O primeiro dia do plano de
retirada não foi tranqüilo. Em Neve Dekalim, a maior colônia da Faixa de Gaza, com uma
população de mais de 2.500 pessoas, muitos manifestantes, vindos do exterior para apoiar os
residentes, construíram barricadas e impediram o acesso dos militares durante várias horas.
A primeira colônia israelense evacuada na Faixa de Gaza chamava-se Dougit, e albergava 79
residentes. No de Neve Dekalim, considerado a capital das colônias israelenses, a polícia e os
militares tiveram de intervir com "força". Foram feitas 50 detenções. Os colonos, ajudados por
ultranacionalistas, que nas últimas semanas se infiltraram nas colônias, para impedir as suas
evacuações, ofereceram muita resistência. A polícia teve de serrar os portões de aço da colônia,
de madrugada, para permitir a entrada no local dos caminhões carregados de conteiners para
levarem os bens das famílias que aceitaram deixar as suas casas de forma voluntária. Em Neve
Dekalim viviam perto de 2500 pessoas, os jovens foram os que mais resistência ofereceram. Os
que aceitaram deixar as suas casas terão direito a uma compensação pecuniária entre os 150 mil e
os 450 mil euros, por família.
Os jornais informaram que mais de 60% dos israelenses eram favoráveis a essa retirada, apesar
da imprensa destacar só os contrários. Os assentamentos desocupados são os de Pe´at Sade,
Rafiah Yam e Douguit, Elei Sinai e Nissanit. O exército israelense fechou o acesso à Faixa de
Gaza após baixar uma barreira em que se podia ler tanto em hebraico como em inglês: "Pare, a
entrada ou presença na Faixa de Gaza está proibida por lei". O vice-primeiro-ministro Shimon
Peres falou aos soldados instalados na fronteira com Gaza, dizendo-lhes que sua tarefa era muito
importante para proteger a “democracia israelense”. "Os assentamentos devem ser evacuados",
declarou Peres à imprensa. "Compreendo os sentimentos dos colonos. Tenho simpatia por eles,
mas eles não poder ir contra a vontade nacional". Segundo o jornal Yediot Ahronot, os líderes
dos colonos enviaram instruções sobre como quebrar a moral dos soldados.
O presidente israelense, Moshe Katzav, pediu "perdão" aos colonos da faixa de Gaza e da
Cisjordânia que serão retirados, em um discurso pronunciado a 17 de agosto: "Em nome do
Estado de Israel, peço perdão porque exigimos que eles abandonem os locais onde moram há
décadas", declarou Katzav, em um discurso que foi exibido na televisão. Segundo o plano de
retirada do premiê israelense, Ariel Sharon, seriam retirados os colonos da faixa de Gaza e de
quatro colônias isoladas no norte da Cisjordânia. "Me identifico com a dor [dos colonos].
Sabemos que os instalamos na faixa de Gaza depois de uma decisão do governo israelense. Eles
demonstraram heroísmo diante do perigo", acrescentou o presidente. A chave da questão está na
frase que segue: segundo Katzav, "chegou o momento de respeitar a decisão das autoridades, do
Knesset (Parlamento) e do governo (...) A oposição à retirada não deve atentar contra a
segurança do Estado" (grifo nosso). O vice-primeiro ministro israelense, Ehud Olmert, por sua
vez, afirmou que a retirada de Gaza seria "total e completa", e que seu país não pretende manter
o controle da Cisjordânia. "Pela primeira vez, os palestinos que vivem em Gaza terão uma
oportunidade real de administrar a si mesmos, sem que ninguém interfira. É o momento para que
os jovens palestinos tenham uma oportunidade de viver uma vida diferente".
A isso se somou o anúncio, pelo chefe do Exército israelense, Dan Halutz, de prováveis
deserções em massa de soldados, e formação de milícias irregulares, em oposição à retirada.[74]
Ariel Sharon, o direitista que outrora chegava a exasperar o direitista Menahem Begin pelo seu
comportamento e idéias “extremistas” teria se transformado na pomba da paz ? Seria esquecer
que a retirada foi precedida, em julho, por uma “limpeza” anti-palestina, com ataques de mísseis
incluídos, na própria Gaza; pela destruição, pelos colonos (e tolerada pelo governo Sharon) da
maioria das estufas dos assentamentos judeus (uma política de terra arrasada); e pela construção
da barreira (muro) interna da Jerusalém, que deixa 55 mil palestinos fora da “Cidade Santa”.[75]
E, principalmente, pelo reforço da presença militar de Israel na Cisjordânia, onde se encontram a
maioria dos assentamentos israelenses nos territórios ocupados durante a guerra de 1967: no
total, menos de 4% dos quase 250 mil colonos israelenses serão afetados pela retirada.
Desmentindo as declarações de Olmert, "a colonização vai prosseguir", declarou Ariel Sharon no
momento da retirada da Faixa de Gaza, deixando claro que não abdicou da Cisjordânia. O
primeiro-ministro israelita garantiu que não abdicaria das colônias da Cisjordânia, apesar da
retirada da Faixa de Gaza. "A colonização é um programa sério que vai prosseguir e
desenvolver-se" na Cisjordânia, afirmou Ariel Sharon, numa conferência de imprensa organizada
após a reunião com o chefe de Estado israelita, Moshé Katsav, em Jerusalém. A Autoridade
Palestina já condenou estas declarações, classificando-as como "inaceitáveis". Mas pouco depois
do início da retirada da Faixa de Gaza, o ministro da Defesa israelita tinha já anunciado que
Israel iria manter o controle sobre seis colônias na Cisjordânia, independentemente dos acordos
concluídos com os palestinos.[76]
Os EUA e Israel
A política israelense refletiu a pressão dos EUA, que sustentam financeiramente Israel desde há
décadas, e que buscam uma saída do atoleiro em que se encontram em toda a região do Oriente
Médio. Os Estados Unidos pediram oficialmente que a evacuação israelense da Faixa de Gaza
“acontecesse de forma pacífica”, para que o plano fosse bem-sucedido e “impulsione o processo
de paz entre Israel e os palestinos”. "Nosso objetivo é, principalmente, que seja um sucesso",
disse o porta-voz do Departamento de Estado, Sean McCormack, em referência ao início da
evacuação. McCormack disse que é preciso voltar as atenções para que haja "um horizonte
político neste processo", sobre a intenção de que a implementação do Plano de Desligamento
ajude a melhorar as perspectivas do processo de paz. Para isso, o porta-voz disse que o
presidente da Autoridade Nacional Palestina (ANP), Mahmoud Abbas, “deve obter êxito em sua
luta contra o terrorismo”. "Abbas compreende que tem a obrigação de desmantelar as redes
terroristas", afirmou McCormack (grifo nosso). Mas, antes da retirada iniciada, o Hamas deixou
claro que manteria a luta armada (que os EUA chamam de “terrorismo”): “Armas são sagradas; é
impossível que as abandonemos”, disse Ahmed al Gyhandour, líder das Brigadas Qassam do
Hamas.[77]
O porta-voz acrescentou que os Estados Unidos iriam enviar a Israel vários “grupos técnicos”,
com o objetivo de avaliar o tipo de ajuda econômica que concederão para receber os colonos
judeus retirados da Faixa de Gaza. McCormack disse que os estudos se concentrarão no
desenvolvimento das regiões de Neguev e Galiléia, onde Israel quer colocar os colonos de Gaza
após a evacuação. O porta-voz lembrou que o presidente americano, George W. Bush,
"expressou seu apoio diretamente" ao primeiro-ministro israelense, Ariel Sharon, no
desenvolvimento dessas áreas. Bush, por sua vez, declarou que o passo seguinte é a retirada do
plano do “Mapa da Estrada”.[78]
Além de terem subsidiado a ocupação de Gaza durante quase quatro décadas, Israel deu a cada
família evacuada US$ 200 mil (!) a título de indenização.[79] Ou seja, que além dos subsídios de
38 anos, Israel (e os EUA através dele) empregarão, no mínimo, 600 milhões de dólares, só para
as famílias judias evacuadas, para garantir o equilíbrio político regional: quantos problemas dos
refugiados palestinos não se resolveriam com essa montanha de dinheiro?[80] O custo total da
retirada chegaria, com todos os gastos, a US$ dois bilhões, o equivalente de todo o orçamento
militar anual de Israel, o mais alto per capita do mundo.[81] E, ainda assim, Naomi Chazan,
analista política e ex deputada pelo Meretz (ex vice-presidente da Knesset, parlamento israelense,
até 2003), declarou que não aposta um centavo na estabilidade do governo Sharon, e que a
perspectiva mais provável seria a queda do governo, com eleições antecipadas, nas quais Sharon
só poderia concorrer como candidato independente, não pelo Likud, devido à cisão instalada no
partido.[82] O colono que assassinou a quatro palestinos, a 17 de agosto de 2005, Asher
Weissgan, declarou, na Corte de Jerusalém encarregada de julgá-lo: “Não me arrependo de
nada”, e “espero que alguém mate Sharon”.[83]
Afirmou um dirigente palestino, que “o principio de estabelecimento do futuro de Jerusalém por
negociação se perderá. Jerusalém nunca será parte de uma Palestina independente. A única opção
que resta é um só Estado. Sharon está atento ao crescente problema demográfico nos Territórios
Ocupados. Uma população palestina que concorre em número com a de Israel, e que a superará
logo, não pode manter-se indefinidamente sob ocupação. A retirada de Gaza e a retirada parcial
des assentamentos mantém a aparência de uma concessão e oferecem o fundamento para uma
solução ao problema demográfico, mantendo a sujeição palestina. Um Estado palestino nos
termos de Sharon não será em absoluto um Estado. O modelo de Gaza será copiado na
Cisjordânia, reduzindo-se o território a guetos isolados em Ramallah, Jenin-Nablus y BelénHebron. Bush pode declarar seu desejo de um Estado palestino ‘viável, contíguo, soberano e
independente’, mas já demonstrou que nunca intervirá contra a destruição deliberada, por
Sharon, desse Estado” (grifo nosso).
E continuou: “A visão de Sharon de uma Palestina independente é semelhante aos bantustões
estabelecidos como reservas para os sul-africanos negros em 1951. Reservas essencialmente
étnicas, estes bantustões também foram pintados para a comunidade internacional como um
passo para a descolonização e para resolver o problema demográfico de África do Sul que, como
na Palestina, viu ultrapassada a minoria governante por uma maioria indesejável. Logo, porém,
ficou claro que o esquema fora desenhado para legitimar a expulsão da população negra... Israel
já está extremamente perto de transformar-se em um estado paria na comunidade internacional,
como a velha África do Sul. Sem o veto estadunidense, o país estaria, com certeza, exposto a
sanções. Se Sharon lhes nega toda esperança de uma pátria viável, livre, os palestinos não terão
outra opção senão lutar por um único Estado bi-nacional e democrático. Antes de ir a
Washington, Sharon visitou Maale Adumim, em Jerusalém Leste, o maior assentamento da
Cisjordânia. Dirigindo-se aos colonos, lhes prometeu que suas casas continuariam sendo parte de
Israel ‘para toda a eternidade’”.[84]
Há (ou havia) 21 assentamentos sionistas em Gaza, com 9500 colonos, em meio a 1,4 milhão de
palestinos; na Cisjordânia os assentamentos são 120, com 230 mil judeus em meio a 2,4 milhões
de palestinos (só está prevista a retirada de quatro assentamentos...). E há o problema do
fornecimento de água para Israel, que vem dos lençóis subterrâneos da Cisjordânia. Todos os
assentamentos foram favorecidos pelo governo israelense com subsídios à moradia e custos de
vida muito inferiores aos de Israel, via subsídios estatais. Na Cisjordânia, durante o primeiro
semestre de 2005, o ritmo das construções nos assentamentos cresceu em 85%. Os palestinos
árabes, por sua vez, são 3,8 milhões distribuídos pelas faixas de Gaza e Cisjordânia, mais outros
quatro milhões que vivem como refugiados nos países árabes vizinhos (dados de 2004),
totalizando oito milhões de pessoas no momento atual.
A Crise do Pacifismo
Yossi Beilin, ex ministro de Justiça de Israel e líder do partido de esquerda israelense MeretzYachad, escreveu que “a proposta de Sharon é não fazer nada depois da retirada, e construir mais
colônias entre Maale Adumim e Jerusalém, para evitar, no futuro, a possibilidade da criação de
um Estado palestino na Cisjordânia... A saída israelense unilateral do 90% dos territórios não
evitará o terrorismo, evitará o reconhecimento de Jerusalém como capital de Israel (e) tornará
quase impossível um acordo de paz mais tarde”.[85] De acordo com Beilin mesmo a retirada,
realizada pelo antigo líder do projeto de colonização israelense, não pode ser mais “bem-vinda”,
pois é profundamente problemática.
E o problema não é tanto por ser "muito pouco para tão tarde": “O problema é que o plano de
Sharon parece estar expressamente desenhado não apenas para contornar um acordo, mas para
evitar que esse se realize. Nesse respeito, o plano de Sharon não parte de uma madura convicção
de que Israel deve negociar com seus vizinhos. E como sempre, tal recusa está repleta de
terríveis ironias, para dizer o mínimo. Considere-se apenas o fato de que Sharon, que
orgulhosamente brande sua recusa de negociar sob fogo, está contudo pronto para se retirar sob
fogo. Recorde-se a recusa de Sharon de soltar prisioneiros palestinos, o que reforçaria o exprimeiro ministro palestino Mahmoud Abbas (Abu Mazen). Alguns meses depois soltou várias
centenas deles para a liderança do grupo terrorista Hizbola. Não é preciso falar, o preço que
Israel continua pagando, tanto político quanto histórico, além do moral, pela recusa de Sharon a
negociar. Este preço vem se provando ser muito alto. Qual a lógica por trás do plano de Sharon?
No nível mais direto e imediato é, de acordo com Sharon, a necessidade de responder a
iniciativas de paz como o Acordo de Genebra....”.
E continuava Beilin: “Mas diferentemente de Genebra, o plano unilateral de Sharon é incapaz de
tratar de dois dos mais sensíveis aspectos entre Israel e os palestinos.: o futuro de Jerusalém e a
solução do problema dos refugiados palestinos. E nesse respeito, o plano de Sharon faz pouco
para avançar para uma solução do conflito. Na verdade, ele se arrisca, até mesmo, a perpetuá-lo.
Por essa razão, o plano de Sharon para desligamento unilateral oferece não apenas esperança,
mas também perigo. Pois se Sharon esta propondo seu plano com o objetivo de esvaziar qualquer
futuro acordo, Israel estará pior. Tal retirada possivelmente reforçará o Hamas e enfraquecerá
os elementos pragmáticos da sociedade palestina, e Israel irá se encontrar sem nenhum parceiro
nos anos vindouros... Bem-vinda, portanto, como a retirada da Faixa de Gaza e do norte de
Samária é, sua dimensão unilateral arrisca torná-la um fato altamente perigoso. Sharon
aparentemente acredita que a retirada da Faixa de Gaza o poupará da necessidade de negociar
com os palestinos. Lamentavelmente, sem tais negociações o conflito nunca chegará ao fim”.[86]
A política de Sharon, portanto, foi ao encontro dos sustentadores do sonho nacionalista
(imperialista) de Eretz Israel: deflagrou uma forte crise política, no entanto, porque as
concessões que os EUA lhe obrigaram a fazer à ANP (Autoridade Nacional Palestina), chefiada
pelo “eleito” (com 62,3% dos votos) Abu Mazen, se constituiram num novo fator de degradação
da já crítica situação econômica e social de Israel. E isto para outorgar à enfraquecida ANP uma
fraca carta para enfrentar a crescente influência do “radicalismo islâmico (palestino)” entre a
população árabe palestina. A política “reformista”, impulsionada pelos EUA para salvar sua já
desastrada aventura bélica no Oriente Médio, ameaçada pelo crescimento da resistência iraquiana
contra a ocupação militar do país, em vez de resolver, torna mais agudas as contradições
herdadas da secular política imperialista para a região.
A esquerda sionista, no fogo cruzado, cumpriu e cumpre o papel de força de pressão para levar o
mais à direita possível à liderança palestina. Assim o comprova artigo recente de seu conspícuo
representante, o Prof. Shlomo Avineri, em que afirma: “Do lado palestino, a consolidação do
controle da Autoridade Palestina sobre uma dezena de serviços de segurança seria um passo
importante... A liderança palestina também poderia dar início à difícil tarefa de dizer aos
refugiados que – ao contrário dos quase 50 anos de propaganda palestina – eles não retornarão a
Israel, mas terão que ser assentados na Cisjordânia e em Gaza, áreas que se tornarão parte do
eventual Estado palestino”.[87] Mais claro,impossível. No mesmo artigo, Avineri teceu uma
apologia do seu (ex?) rival político Sharon (que teria sido responsável por “uma profunda
mudança política”).
Uma nova armadilha política foi tendida ao movimento nacional palestino, tentando que
minguadas concessões territoriais lhe façam abdicar das suas reivindicações e direitos históricos.
Não basta, para se opor a ela, criticar o “unilateralismo” israelense, e afirmar que “questões de
status permanente, referentes às fronteiras, à Cisjordânia e aos refugiados, precisam ser
equacionadas bilateralmente. Qualquer observador sério do conflito palestino-israelense sem
dúvida reconhecerá que não pode haver nenhuma solução unilateral para estes temas”, como faz
Daoud Kuttab, diretor na Universidade Al Quds em Ramallah.[88] A reivindicação de um Estado
republicano, laico e secular em todo o território da Palestina histórica foi posta em jogo na
resposta política que o movimento nacional palestino, em todas suas componentes, fosse capaz
de dar à nova situação política da região, no quadro da resistência dos povos árabes contra a ação
do imperialismo.
7. DE SHARON AO HAMAS
A pressão israelense começou a surtir seus efeitos na campanha eleitoral palestina para as
eleições de janeiro de 2006, cujo aspecto mais espetacular foi a participação do grupo “terrorista
islâmico” Hamas. Com efeito, Hamas omitiu de seu manifesto político toda referência ao fim de
Israel. A declaração de que todas as terras ao oeste do rio Jordão deveriam pertencer a um Estado
islâmico palestino -em outras palavras, que o território de Israel se tome território palestinofigura na carta de fundação do Hamas, de 1988. Apesar da omissão da diretriz no manifesto,
consta nele o compromisso com "um Estado palestino totalmente soberano" e com "a resistência
armada para pôr fim à ocupação israelense".
E todos os propósitos “pacifistas” de Israel, incluindo a “concessão” de direito de voto aos
palestinos de Jerusalém Leste (mas não o direito do Hamas de fazer campanha eleitoral) voltam à
realidade confrontados com uma notícia de inícios de 2006: “Israel podría construir un muro
cerca del Líbano (que) atravesaría una comunidad árabe. La agencia israeli de seguridad Shin
Bet recomendó construjr un muro a través de una comunidad árabe situada sobre la frontera
libanesa para impedir ataques guerrilleros. La construcción de la barrera a lo largo dela
frontera reconocida por las Naciones Unidas después de que Israel se retirara del Sur del
Libano, en 2000, dividiria en dos al pueblo de Ghajar, controlado por Israel desde la Guerra de
los Seis Dias, en 1967. Aunque los habitantes de esta comunidad agrícola pueden desplazarse
libremente dentro de sus limites, están rodeados por campos minados, puestos del ejército
israeli en el sur y bases de la milícia Hezbollah en el Norte. La construcción del muro oblígaria
a Ia mayoria de los 2000 habitantes a desplazarse hacia el Sur, donde quedaria el sector israelí.
De acuerdo con Ia propuesta del Shin Bet, quienes tengan que irse hacia esa zona serian
compensados con propiedades. Sin embargo, cientos de residentes de Ghajar salieron ayer a las
calles de la ciudad para protestar por la propuesta con pancartas que decian "No a la división,
seguire- mos unidos" y "Sólo dejaremos nuestras casas si nos sacan en ataúdes". La mayoría se
opone a la idea y cree que Israel debe negociar con Ia ONU para que la frontera rodee al
pueblo y no lo divida en dos”.[89]
A crise da Autoridade e do movimento nacional palestino é agora gritante, chegando-se até a
levantar a possibilidade de uma guerra civil no campo palestino caso o governo de Mahmoud
Abbas continuar a atacar o Hamas, consoante com o cerco que lhe pretende tender o governo de
Israel.[90] Isto pese à vontade declarada do Hamas, que derrotou Al-Fatah nas eleições
municipais de dezembro de 2005, de integrar suas milícias em um só corpo armado (estatal)
palestino,[91] com o que se transformariam elas próprias num fator de repressão do movimento
popular independente, base da Intifada e de toda a luta histórica dos palestinos em defesa de sua
auto-determinação nacional. Por seu lado, Al-Fatah parece encontrar-se em crise terminal
(“Inclusive se os candidatos de Fatah se impõem [em janeiro de 2006] a vitória só será parcial. O
partido está demasiadamente fragmentado para falar com uma só voz, e Abbas demasiadamente
questionado para que essa voz seja a sua”).
Em Israel, os abalos políticos provocaram uma suposta “revolução” dentro do Partido
Trabalhista (com a derrota interna de seu líder histórico Shimon Peres) e a explosão do Likud,
abandonado por Sharon para formar a Kadima (à qual sumou-se o próprio Peres), nova formação
política capaz de garantir, com seu suposto “centrismo”, a estabilidade de um regime que faz
água por todos os lados, cuja instabilidade se mede pelo fato do Kadima pretender levar como
cabeça de chapa o próprio Ariel Sharon, em que pese este estar definitivamente afastado do
mundo da política e, muito provavelmente, do mundo dos vivos. Ou seja, garantir a estabilidade
de um Estado pondo na cabeça da sua direção política um morto, como na lenda da última
batalha de El Cid Campeador, que dirigiu às suas tropas em estado de rigidez cadavérica.
O “Legado” de Sharon
A chamativa coincidência de esquerda e direita israelenses em qualificar o agonizante Sharon
como a própria encarnação do Estado, junto com Ben Gurion (e esquecendo de modo ingrato a
Ben Gurion de saias, Golda Meir) é a admissão, nada menos, de que toda a argumentação
política em que se sustenta a existência de Israel no Oriente Médio,[92] a saber, a de ser a única
“democracia” da região (contraposta à “barbárie feudal” árabe) não passa de um mito, pois o
Estado sionista nunca se sustentou na livre confrontação democrática de forças políticas de signo
oposto, mas na atuação de “líderes providenciais”, apoiados, claro, num “grande acordo” de
forças políticas pretensamente contraditórias, que iam da extrema direita até a esquerda socialdemocrata e stalinista. Mas isso é o oposto da democracia política. Atribuir-se-á, agora, a crise
de Israel, não à completa artificialidade econômica e política do Estado, em crise econômica
profunda devido à crise econômica mundial e aos minguados subsídios externos,[93] e obrigado
a sustentar uma economia de guerra e um estado policial mal encoberto por uma fachada
“democrática”, mas à falta de um “líder” à altura de Sharon ou Ben Gurion.
O assassino condenado de Sabra e Chatila, o provocador da Esplanada das Mesquitas, Ariel
Sharon, nasceu em 1928 em Kfar Mahal, uma aldeia ao norte de Tel Aviv, quando a Palestina
ainda era parte do domínio britânico no Oriente Médio. Oriundo de uma família de sionistas
russos que imigraram para Palestina no início do século XX, Sharon é hoje proprietário de uma
das maiores fazendas de Israel, e junto com o ex-premiê trabalhista Shimon Peres, é o último
remanescente de políticos que surgiram com a criação do Estado de Israel em 1948. Em 1945
passou a integrar o Haganah, organização clandestina que precedeu o exército israelense,
caracterizada inicialmente como um grupo de judeus sionistas em resistência aos britânicos e aos
árabes. Em 1953, tornou-se líder da Unidade 101 criada para combater os árabes e comandou
uma operação assassina contra a aldeia de Kibya na Cisjordânia, explodindo 45 casas e matando
69 moradores. As ações terroristas dessa unidade incluíram tantas mortes de civis palestinos que
foi necessário emitir uma ordem proibindo matar mulheres e crianças. Em 1956 Sharon foi
acusado por seus superiores de insubordinação e desonestidade na campanha do canal de Suez
durante a guerra do Sinai no Egito.
Segundo o historiador militar israelense Martin Van Cheveld, da Universidade Hebraica de
Jerusalém, os soldados de Sharon avançaram "da forma mais incompetente possível, resultando
em uma batalha totalmente desnecessária, que se tornou a mais sangrenta da guerra". Na ocasião
seus próprios comandados o acusaram de oportunismo desumano, no sentido de tentar construir
sua reputação à custa deles. Em 1967 comandou a divisão de blindados na Guerra dos Seis Dias
e em 1973 liderou a captura do Terceiro Exército do Egito, pondo fim à Guerra do Yom Kippur.
No início dos anos 1970 como comandante militar no sul de Israel, Sharon reprimiu os palestinos
na faixa de Gaza, através de deportações em massa de famílias inteiras, chegando a abrir uma
larga avenida no meio de um campo de refugiados, destruindo centenas de casas. Na esfera
político-partidária a trajetória de Sharon é mais recente, iniciando-se em 1973 quando o premiê
foi um dos principais articuladores das forças de direita que originaram o partido Likud.
Sharon, no entanto, tornou-se conselheiro especial de segurança do primeiro-ministro Ytzhak
Rabin (Partido Trabalhista) em 1974. Entre 1977 e 1981 foi ministro da Agricultura no primeiro
governo do Likud e organizou o primeiro grande movimento de colonização judaica nos
territórios ocupados. Sharon e o sionismo em geral, sempre viram a colonização de terras
palestinas por assentamentos judeus, como a melhor forma de dificultar e impedir a formação de
um Estado palestino com continuidade territorial. Apesar de inicialmente ter se posicionado
contra o acordo de paz (Camp David I) entre Israel e Egito em 1978, Sharon acabou comandando
a retirada dos colonos judeus do Sinai ocupado por Israel desde a Guerra do Yon Kippur. A
trajetória de Ariel Sharon iria ainda ficar mais manchada, quando da invasão do Líbano em 1982,
pelo massacre de Sabra e Chatila. Nessa época, tudo parecia indicar que as ambições políticas de
Sharon haviam se esgotado, quando um de seus conselheiros disse num tom profético: "Aqueles
que não querem aceitá-lo como ministro da Defesa terão de aceita-lo como primeiro-ministro".
Sharon foi ainda ministro do Comércio e da Indústria entre 1984 e 1990, e supervisionou a
gigantesca expansão de colônias judaicas no Ministério da Construção entre 1991 e 1992,
tornando-se finalmente líder do Likud em 1999 e primeiro ministro nas eleições de fevereiro de
2001.
Breyten Breytenbach, escritor sul-africano, que alguma coisa sabia de apartheids, dirigiu em
2002 uma Carta Aberta a Ariel Sharon: “O senhor pensa, de maneira cínica, que pode se safar
enquanto estiver indo na direção dos supostos interesses vitais dos Estados Unidos. Penso que o
senhor se lixa totalmente para os interesses americanos. O senhor deve, sem dúvida, despreza-los
por causa do materialismo grosseiro deles e da ignorância do mundo que revelam. Se vendedor
de carrops usados, Netanyahu, utilizou mais abertamente ainda essa técnica de propaganda
grosseira, como se manipulasse o clitóris de uma opinião pública americana com um dedo sujo...
Não se pode construir um Estado viável com a expulsão de um outro povo quetem tanto direito
quanto o senhor a esse território. O poder não é o direito. A longo prazo, sua política imoral e de
visão curta (e definitivamente estúpida) só servirá para enfraquecer um pouco mais a
legitimidade de Israel como Estado”.[94]
No retrato (quase) necrológico de Aluf Benn, diretor do Haaretz, “os direitos humanos dos
palestinos o interessavam pouco, ao mesmo tempo em que ele pedia o fim da ocupação. Suas
respostas duras aos ataques terroristas, suas promessas repetidas -mas nunca concretizadas- de
afrouxar as restrições impostas aos palestinos, além do fato de repetidamente evitar desocupar os
assentamentos que eram "postos avançados", mostram que, mesmo depois de ter desocupado os
assentamentos, Sharon permanecia distante das posições da esquerda política. Não surpreende
que a maioria dos defensores dos vizinhos palestinos, em Israel e no resto do mundo,
continuavam a enxergá-lo como proponente da guerra e da destruição; mesmo depois de ele ter
se tornado o queridinho do centro político. Sharon passou por uma transformação em sua atitude
em relação ao mundo exterior e ao Oriente Médio. No último ano ele se aproximou da Europa,
que, no passado, ele descrevera como hostil e anti-semita, e reconheceu sua capacidade de
exercer um papel de assistência. No discurso que proferiu na ONU, Sharon pela primeira vez
reconheceu o direito dos palestinos a um Estado próprio. Até então, ele sempre descrevera o
Estado palestino como algo imposto pelas circunstâncias, algo que não era fruto da escolha
israelense, e não como um direito palestino reconhecido como tal”.[95] Em agosto de 2005, no
mesmo momento da retirada de Gaza, foi aprovada pelo parlamento uma lei que não concede
cidadania nem residência permanente aos palestinos casados com israelenses, atingindo mais de
um milhão de árabes residentes em Israel.
O “Terremoto” Peretz
Antes da doença de Sharon, a eleição do secretário geral da Histadrut, Amir Peretz, como
presidente do Partido Trabalhista (PTI), precipitara a crise de todo o sistema político. Tirou o
trabalhismo do governo de unidade nacional com Sharon, provocou um chamado a eleições para
inícios de 2006, e dividiu o Likud. Amir Peretz se distanciara em 1996 do Partido Trabalhista
para formar um novo partido, Am Hehad (Povo Unido). Nele coexistiram elementos da
burocracia da Histadrut com elementos de direita identificados com o Likud. Peretz, de origem
marroquina, foi eleito na Histadrut como um político do sionismo trabalhista.
Pela primeira vez o PTI será governado por um israelense nascido em um país árabe (Amir é
marroquino e migrou com seus pais para Israel quando tinha quatro anos de idade, em 1956, indo
morar na cidade de Sderot, que fica próxima da Faixa de Gaza). A votação foi apertada. Amir
obteve 42% dos votos, contra 40% do líder histórico e ex-primeiro ministro Shimon Peres. A
terceira posição, com 17%, ficou com Beniamin Ben Eliezer. Isso num universo em que mais de
cem mil filiados participaram e sua vitória se deu por uma margem de apenas 500 votos. O novo
líder assumiu declarando querer assinar um acordo de paz com os palestinos, que seja justo e
duradouro, com a retirada das tropas israelenses de todos os territórios ocupados (ele não dá
detalhe de quais seriam as fronteiras de um novo estado palestino). Peretz foi um dos líderes da
gigantesca manifestação de mais de 200 mil israelenses em frente ao túmulo de Itzhak Rabin,
assassinado por um fanático dez anos atrás e signatário, com Yasser Arafat, dos acordos de Oslo
de setembro de 1993.
Na sociedade israelense sempre prevaleceu a dominação dos descendentes e mesmo dos
imigrantes originais vindo da Europa. Os judeus imigrantes de países árabes, do Norte da África
e do Oriente Médio em geral, sempre foram considerados uma espécie de cidadãos de segunda
classe. O próprio ex-primeiro ministro Menachem Béguin, um direitista de marca maior, usou
essas divisões e diferenças, para vencer as eleições em 1977 pela primeira vez, pelo Partido
Likud, quebrando uma hegemonia de 30 anos seguidos do PTI, que governava e dava os rumos
de Israel desde a sua criação pela ONU em 1947.
Durante a gestão de Peretz, a Histadrut vendeu –privatizou– o Bank Hapoalim (banco
“operário”), o maior serviço de saúde de Israel (Kupat Holim Klalit) e o conglomerado de
indústrias Klal, além de grandes e médias empresas que estavam em seu poder: “Peretz firmó
con el gobierno de Ariel Sharon la reducción de los salarios de los empleados públicos (4%) con
el objetivo de “recomponer” el mercado. En 2004, de nuevo consiguió salvar al gobierno de
Sharon acatando las órdenes judiciales que prohibían la huelga general, las cuales violaban
abiertamente la libertad de huelga. Peretz disolvió su “partido obrero” hace seis meses y
reingresó a la bancada laborista, cuando el laborismo ya estaba en el gobierno de unidad
nacional junto al carnicero Sharon y el thatcherista Benjamin Netanyahu. El diario Haaretz
señala que Benny Gaon, un pope del gran capital israelí, ha venido financiando a Peretz desde
su regreso al laborismo y su preparación para las internas, donde finalmente venció. La
elección de Peretz puso en evidencia la fragilidad del gobierno y toda la estrategia sionista.
Ante el fracaso del gobierno Sharon-Netanyahu-Peres, Peretz se ofrece como una alternativa
“social”. La interpretación corriente es que la elección de Peretz revela la gravedad de la crisis
económica y social, que ha dejado a un 25% de la población dentro de Israel debajo de la línea
de pobreza y un 10% de desocupación. Hay una resistencia obrera, que se puso de manifiesto en
el relativo triunfo de los trabajadores del Bank Leumi, quienes impusieron la defensa de las
condiciones de trabajo anteriores a la privatización del banco.Peretz ha dicho que impondrá un
salario mínimo de 1.000 dólares, ¡lo que representa un aumento del 40%!
“No ha dicho de dónde sacará el dinero para esos aumentos, si suprimirá o reducirá los gastos
militares, si desmantelará las colonias judías en Cisjordania, si suprimirá los subsidios al gran
capital, etc. Desde el punto de vista de los obreros palestinos, no ha dicho una sola palabra
acerca de cómo combatirá la desocupación, que en Gaza es del 70% y en Cisjordania del 50%.
En materia política ha declarado que volverá a los acuerdos de Oslo y que es un acérrimo
enemigo de la ley del retorno de los refugiados y de la división de Jerusalén. Se distanció tanto
de la “ultraderecha” (Avigdor Liberman), como, y sobre todo de la supuesta “ultraizquierda”,
es decir de los partidos árabes de la izquierda israelí (Azmi Bishara, de la Asamblea Nacional
Democrática, y Muhamad Barake, del PCI). Además, prometió seguir la represión a las
organizaciones palestinas. En su discurso de asunción frente al comité central dijo: “Como un
hombre de paz, veo al terrorismo como el enemigo número uno. La guerra contra el terrorismo
será sin compromisos”. La elección de Peretz, por el momento, sólo refleja el estado de ánimo
de los afiliados laboristas”.[96]
Em finais de 2005, Sharon declarou querer instituir um regime presidencialista em Israel. A
maioria de Ariel Sharon no parlamento vinha ficando cada vez mais frágil. Depois de sua
retirada unilateral de todos os assentamentos judaicos na faixa de Gaza e do recente acordo para
abrir a fronteira palestina com o Egito na Faixa de Gaza, as divergências internas no seu partido
estavam ficando incontornáveis. Ainda que tivesse mantido a liderança, diversos ministros mais
à direita, radicais, estavam saindo do governo com duras críticas a Sharon. A sustentação de seu
governo só acontecia pela decisão do PTI de voltar a participar do mesmo. Essa situação
reverteu-se completamente desde a eleição de Peretz para líder do Partido e com o pedido
expresso deste para que novas eleições fossem convocadas. Até mesmo o Partido de centrodireita, participante da coalizão de Sharon, o Shinui, vinha defendendo novas eleições.[97]
No entanto, o mais inusitado foi o anúncio em 21 de novembro por parte de Sharon, de sua
desfiliação do Likud, Partido esse que ajudou a formar em 1973, quando ainda era general e
ativo participante de todas as guerras em que Israel se envolveu nesses quase 60 anos de
existência. Essa decisão de Sharon foi classificada pelo maior jornal de Israel, o Yediot
Aharonot, como um “terremoto político sem precedentes” em toda a história do país. Ao tomar
essa decisão, Sharon seguindo a constituição israelense pediu ao presidente de Israel, Moshe
Katav a dissolução do parlamento, que, no caso israelense, é apenas unicameral (não tem
senado).
Sharon apontava a dar uma resposta à fragmentação do establishment sionista. Os pequenos
partidos e as frações internas do partido governante tiveram, na atual legislatura, direito de veto
sobre o governo. Sharon impulsionou o presidencialismo para ter as mãos livres para retirar
umas poucas colônias isoladas na Cisjordânia, garantindo, em troca, o domínio israelense em
Jerusalém oriental (majoritariamente árabe), nas colônias vizinhas à cidade e nos principais
núcleos da zona ocupada no Oeste do Jordão. O governo britânico denunciou a “judaização” de
Jerusalém oriental, realizada através da expulsão de palestinos, a construção do muro e de
milhares de casas para a população judia. Com a morte de Sharon, a perspectiva é de uma maior
cisão política em Israel, alimentada pela polarização social crescente.
A Vitória do Hamas
A 25 de janeiro de 2006, o movimento islâmico Hamas venceu as eleições legislativas da
Autoridade Nacional Palestina (ANP), o que acrescentou um novo elemento à crise política do
regime sionista em Israel. Hamas obteve 74 bancas parlamentares de um total de 132 (56%);
enquanto o Al Fatah de Abu Mazen e Marwan Barghouti obteve só 45 (34%). Distritos inteiros
como Hebron, o distrito norte da Faixa de Gaza e Dir el-Balah foram ganhos em bloco por
Hamas. Em outros, como Nablus, Tul Karem, Ramallah e Jerusalém oriental, o Hamas obteve
75-90%. A esquerda palestina obteve só 10% dos votos em alguns distritos (a FPLP obteve três
deputados; a FDLP, só dois; o Partido Iniciativa Nacional de Mustafá Barghouti, dois, depois de
ter obtido 20% dos votos nas eleições presidenciais). A participação nas eleições na Cisjordânia,
em Gaza e em Jerusalém Oriental foi de 77,69%. A participação na Faixa de Gaza foi de
81,65%, ao passo que na Cisjordânia foi de 74,18%. Ao todo, 1.341.000 palestinos foram
convocados às urnas para escolher os 132 deputados do Conselho Legislativo.
O principal antecedente e causa do resultado foi a retirada do exército israelense e os colonos de
Gaza, que fora percebida como um triunfo político do Hamas, alvo predileto dos atentados
sionistas. A corrupção da direção da ANP foi um dos eixos do “voto repúdio” das massas,
corrupção que reflete a degradação não só de uma direção política, mas de uma classe social, a
burguesia palestina compradora: “Las masas más desposeídas y degradadas en Palestina han
sido la base social del masivo voto a Hamas. Un análisis presentado en diciembre del año
pasado por un experto de las Naciones Unidas indica que casi el 40% de un estimado de 3,7
millones de palestinos en Cisjordania y Gaza han tenido problemas para procurarse alimentos
en 2004; casi otro 30% está en peligro de llegar a esa situación. El mismo informe menciona
que en ese mismo año más del 16% de la población vivía con 1,5 dólar por día en 2004, y que
llegaba al 35% en 2005. Ante esta situación la red social del grupo islámico (escuelas, clínicas,
etc.) vino a reemplazar la total parálisis y la falta de infraestructura de la ANP”.[98]
Além disso, o Hamas tem a seu favor uma enorme rede beneficente na Cisjordânia e na Faixa de
Gaza. Chega-se a afirmar que “com relação à vitória do Hamas... a campanha eleitoral não foi
um referendo sobre guerra ou paz com Israel. O Hamas não venceu porque prometeu varrer
Israel do mapa. Venceu porque prometeu resolver alguns dos terríveis desequilíbrios e as
caóticas distorções que vêm definindo a sociedade interna palestina nos últimos anos”.[99] Mas
essa visão aparece demasiadamente simplista: “Para ter certeza, o próprio Hamas não é uma
organização homogênea e têm discordâncias internas. Pode-se, porém, afirmar que ao colocar em
dúvida ‘o direito de Israel de existir’, o Hamas tentou, embora sem sucesso, colocar na
atualidade a catástrofe palestina, o Nakbah, de que em 1948 não se tinha consciência”.[100] E
não é o menor dos paradoxos que a fundação do Hamas (que significa “ardor”), em 1988, fosse
bem vista pelos políticos israelenses, que viam no grupo um contrapeso à influência de Al Fatah.
A vitória do Hamas (como a de Evo Morales na Bolívia) questiona toda a estratégia de
terrorismo “democrático” promovida pela administração de George W. Bush ou, como disse um
colunista de The New York Times: “O sentimento dominante entre políticos e intelectuais no
Oriente Médio nos últimos dias foi de que o pequeno experimento químico dos EUA tinha
explodido na cara do país. O presidente George Bush vinha promovendo a democracia com
eleições livres como sua principal solução para os males da região – e quando o Hamas venceu
de maneira esmagadora as eleições palestinas, Bush colheu resultados que não poderiam ser mais
contrários aos interesses dos EUA e de seu aliado Israel”.[101] Também está quem assegura –
como o ex-ministro Israel Katz, do partido Likud – que o plano de desconexão unilateral
israelense da Faixa de Gaza “garantiu a vitória de Hamas”. Segundo Katz e outros porta-vozes da
direita, a saída de Gaza “sem condições, sem receber nada em troca, apresentou Hamas como
vencedores que haviam “retirado Israel da Faixa de Gaza”.
Para o diretor do Instituto Português para Estudos Estratégicos e Internacionais, a “comunidade”
(imperialismo) internacional deveria abrir uma frente de debate com o islamismo político, como
uma mudança de posicionamento estratégico: “O risco de transições políticas que possam levar à
vitória de partidos islâmicos representa um paradoxo democrático que a Europa e os Estados
Unidos precisarão aceitar se quiserem arquitetar políticas de reforma inclusivas – em outras
palavras, políticas que sejam o extremo oposto do tipo de imposição democrática praticada no
Iraque ocupado. Realmente, uma das conseqüências menos felizes da intervenção no Iraque foi
reforçar a noção de um “choque de civilizações” entre o Ocidente e o Islã, que por sua vez serve
para criar um clima favorável aos movimentos islâmicos”.[102]
Os líderes do Hamas, Ismail Haniyeh e Mahmoud al-Zahar, também afirmaram que a vitória de
seu partido nas eleições legislativas palestinas teria conseqüências internacionais sem
precedentes: "Nossa vitória é uma lição à comunidade internacional e mudará a atitude de Israel,
dos países árabes e do Ocidente em relação ao conflito palestino-israelense". Al-Zahar afirmou
que "a vitória terá conseqüências sem precedentes e que o Hamas se unirá à Autoridade Nacional
Palestina (ANP) e lutará de dentro contra a corrupção": "A luta armada contra Israel continuará,
e nossa vitória levará Israel a fazer concessões aos palestinos e mudará a atitude da Jordânia e do
Egito em relação ao conflito". E também: "Nossa vitória é um golpe contra os Estados Unidos e
Israel". Por sua vez, Haniyeh reiterou que "a vitória reafirma nossas crenças e nossa estratégia, e
estamos comprometidos com o que anunciamos antes das eleições". Sobre as relações com
Israel, Haniyeh pediu "a resistência contra a ocupação até expulsá-la (dos territórios palestinos) e
nos devolver nossos direitos, e, acima de tudo, Jerusalém, os refugiados e a libertação de
prisioneiros". Al-Zahar pediu a todas as facções que se somem ao programa político do Hamas.
Nesse quadro, não existe uma organização independente e classista da classe operária e as
massas palestinas, que se manifestam esporadicamente, como na greve dos professores na
Cisjordânia, em 1997, ou na criação dos comitês independentes de trabalhadores e
desempregados em Gaza, em 2005. A candidata Mariam Farahat (Um Nidal), mãe de dois
suicidas, se dirigia a milhares de mulheres palestinas em Khan Younis, Gaza; em Hebron, 60 mil
pessoas se reuniram no comício final da campanha do Hamas.[103] Abu Mazen tinha recebido
uma “ajudazinha” de Bush de dois milhões de dólares, para a sua campanha eleitoral, enquanto
cresciam as ameaças de Israel, EUA e a UE, de que não reconheceriam um governo de Hamas.
Em entrevista publicada no site do The Wall Street Journal, Bush afirmara: "No meu julgamento,
um partido político viável é aquele que abraça a paz, que mantém a paz". O Hamas está incluído
nas listas de "organizações terroristas" do Departamento de Estado dos Estados Unidos e da
União Européia (UE).[104]
Sobre uma relação dos Estados Unidos com o Hamas, se este fosse incluído no novo governo
palestino, o presidente disse: "A resposta é: não negociaremos com vocês até que renunciem ao
seu desejo de destruir Israel''. Os Estados Unidos pressionaram o presidente palestino, Mahmoud
Abbas, a excluir o Hamas do governo. Sean McCormack, porta-voz do Departamento de Estado,
disse que a composição do parlamento palestino "se baseará nestas eleições", mas que a escolha
do gabinete e de suas políticas caberia ao poder executivo palestino. McCormack disse que a
relação com a ANP dependeria da não-inclusão no gabinete de militantes do Hamas. "Nossas
opiniões sobre o Hamas estão muito claras", disse o porta-voz da Casa Branca, Scott McClellan:
"Não lidamos com o Hamas. O Hamas é uma organização terrorista. Sob as atuais circunstâncias,
não vemos qualquer mudança nisso". Ele deixou em aberto, porém, a possibilidade de os Estados
Unidos continuarem trabalhando com a Autoridade Palestina, mas não com seus representantes
ligados ao Hamas. É o que já acontecia no Líbano, onde os EUA tratam com o governo, mas não
mantêm contatos diretos com um ministro ligado ao grupo xiita Hezbollah.
O Hamas disse que pretenderia manter sua "política de resistência" quando assumir o governo
palestino: "Por um lado manteremos nossa política de resistência à agressão e ocupação e, por
outro, procuraremos mudar e reformar o cenário palestino", disse Sami Abu Zuhur, porta-voz do
Hamas. E também que "queremos formar uma entidade palestina que una todos os partidos em
torno de uma agenda política independente": "Queremos estar abertos ao mundo árabe e à
comunidade internacional". Ao mesmo tempo, o dirigente máximo do Hamas em Gaza,
Mahmoud Al-Zahar, reiterou que seu movimento não se transformaria em um partido político, e
não negociaria com Israel, "a menos que tenha algo a nos oferecer, e, neste caso, negociaríamos
por meio de terceiros".
Mas o principal negociador palestino, Saeb Erekat, quando admitiu a derrota de seu partido, o
Fatah, para o Hamas, afirmou que a legenda não ia participar de um governo de coalizão: "No
que diz respeito ao meu partido (o Fatah), nós vamos ficar na oposição. Não vamos ser parte de
nenhum governo de união e vamos focar na reconstrução do nosso partido". E o papel de Al
Fatah não é o do cachorro morto.[105] Vejamos: falando em Gaza, Ismail Haniyeh, do qual nos
ocuparemos, afirmou que "americanos e europeus dizem para o Hamas: armas ou Legislativo.
Nós dizemos que não há contradição entre os dois". Na visão mais “otimista” (para o
imperialismo ianque e Israel), o Hamas irá resolver a contradição e se tornar mais pragmático.
Segundo um comentário jornalístico: “Se americanos e europeus tiverem habilidade, vão guiar os
radicais islâmicos para o caminho do Exército Republicano Irlandês (IRA), que ao longo do
tempo rachou entre as facções política e militar, com a primeira pacientemente abafando a
segunda. Mas para tal, o Hamas precisará reconhecer o direito de existência de Israel e dar
passos efetivos para o seu desarmamento”.
Na visão mais “pessimista”, o Hamas irá viver a contradição às últimas conseqüências: vai
aproveitar os espaços institucionais na democracia palestina (como um contrapeso à ineficiência
e corrupção do Fatah), mas também manter a luta armada contra Israel: “Tal opção é intolerável
para americanos, europeus, israelenses e irá resultar no colapso do projeto político de Mahmoud
Abbas. E aqui está mais um dilema: o caos palestino tampouco interessa ao governo
Bush”.[106] (grifo nosso). Na falta de opções, Abbas é o interlocutor dos americanos. Mas em
Washington e em tantas outras capitais, ele é visto como incapaz de desarmar o Hamas,
consumando a conversão da milícia islâmica em partido político que seja fiador de uma nascente
democracia palestina. Do seu lado, tanto Israel como os Estados Unidos e a União Européia
repetiram que não estariam dispostos a negociar com o Hamas, a menos que o grupo renunciasse
à resistência armada.
Abbas tentou salvar sua posição de intermediário múltiplo, a única que (potencialmente) lhe
restou. Elogiou “o espírito democrático do povo palestino”, e reiterou sua vontade de negociar
com Israel: "O pleito transcorreu com tranqüilidade e de maneira exemplar, o que indica
realmente que nosso povo, apesar da ocupação, esteve comprometido com este grande
acontecimento democrático", disse. O presidente da ANP ressaltou ainda que "o povo palestino é
um grande povo e tem um alto sentido democrático". Lembrou todos os problemas e
inconvenientes que tanto seu governo como os palestinos tiveram que superar para realizarem as
eleições, e agradeceu aos observadores internacionais pela ajuda prestada durante o processo
eleitoral à ANP. Ao mesmo tempo, reafirmou à "comunidade internacional" seu desejo de
retornar à mesa de negociações com Israel: "Queremos voltar a negociar com Israel um processo
de paz para colocar em prática os Acordos de Sharm el-Sheikh, com o objetivo de definirmos um
estatuto final".
O dirigente político do Hamas, Khaled Meshaal, telefonou para Abbas prometendo "um
compromisso de parceria com todas as forças palestinas, inclusive com os irmãos do movimento
Fatah". Mas, na Faixa de Gaza, 20 mil manifestantes do Al Fatah reivindicaram a exclusão dos
corruptos e a não-parceria governamental com o Hamas.[107] E a nova premiê alemã, Ângela
Merkel, em entrevista com Abu Mazen (Mahmoud Abbas), reivindicou o reconhecimento de
Israel pelo Hamas, como condição para a continuidade dos empréstimos e da “ajuda” da UE à
ANP.[108]
Pressão Internacional
A linha de intermediação principal entre o imperialismo norte-americano (e da UE) com o
Hamas começou a ser definida através e pelos regimes árabes de Médio Oriente. Líderes
muçulmanos pediram a Israel e ao mundo que aceitassem a vitória do Hamas. Durante o Fórum
Econômico Mundial de Davos, cúpula político-empresarial, os representantes dos governos do
Paquistão e do Afeganistão, além do secretário-geral da Liga Árabe, argumentaram que o Hamas
ganhou merecidamente. "Se o povo da Palestina expressou seu desejo votando no Hamas,
devemos respeitá-lo e dar ao Hamas uma chance de se provar no governo", disse o presidente
afegão, Hamid Karzai.
O presidente paquistanês, Pervez Musharraf, disse que assumir a responsabilidade pelo
desenvolvimento e pela segurança dos palestinos será um desafio para o Hamas. "Não fechem as
portas ao Hamas, avaliemos suas atitudes e pressionemo-lo a se comportar corretamente. Uma
igual pressão deve ser posta sobre o outro lado, Israel. Enquanto se aceita a realidade de Israel,
devemos aceitar a realidade da criação da pátria palestina. E darmos uma chance ao Hamas". "Se
o Hamas formar o governo, ocupar a ANP, tendo a responsabilidade de governar, negociar, obter
a paz, será diferente do Hamas que é uma organização cujas pessoas estão nas ruas", disse o
chefe da Liga Árabe, Amr Moussa.
O rei Abdullah II, da Jordânia, disse que a criação de um Estado independente palestino junto a
Israel é a solução lógica. "Apesar dos resultados das eleições palestinas, a solução dos 'dois
Estados' continua sendo a solução lógica e plausível. Assegura a segurança e a estabilidade na
região e satisfaz a aspiração do povo de um futuro melhor", disse o rei em um comunicado
oficial: "O rei apóia o direito do povo palestino de criar um Estado independente como a única
maneira de restabelecer uma paz global e justa na região".
O presidente do Líbano, Émile Lahoud, afirmou que "ninguém pode negar" o direito dos
refugiados palestinos de retornarem a seus territórios. Cerca de 400.000 palestinos vivem no
Líbano em condições muito precárias em pouco mais de 10 campos de refugiados. "Ninguém
poderá negar o direito do Líbano de prosseguir com sua resistência nacional para recuperar as
ocupadas Fazendas de Chebaa", acrescentou, em alusão ao território, único que Israel não
abandonou quando se retirou do sul do Líbano, em maio de 2000, encerrando 22 anos de
ocupação: "Chegou o momento de que a voz do direito, da legalidade internacional e da justiça
das Nações Unidas prevaleçam em nosso mundo para dar um futuro melhor a nossos filhos".
Lahoud criticou aqueles que, segundo ele, atiçam os problemas no Oriente Médio: "A
comunidade internacional tem a obrigação de alcançar a paz em nossa região, que tem que
enfrentar agitações, divisões e desintegração por causa de guerras atiçadas pela prepotência da
injustiça e pela cobiça estrangeira". O presidente também acusou essas forças de "inflamar as
dissensões confessionais e as ocupações ilegais em numerosos países árabes".
O governo egípcio sublinhou que mantém uma boa relação de trabalho com o Hamas. Mohamed
Habib, vice-líder da Irmandade Islâmica, disse que a vitória do Hamas apontava para a opção dos
palestinos pela via da "resistência": "Israel e os Estados Unidos não terão alternativa a não ser
negociar com o Hamas. Os norte-americanos vão se submeter a isso, especialmente porque o
Hamas não deseja monopolizar o poder". "Os norte-americanos vão manter contatos secretos
com o Hamas. Na verdade, esses contatos já começaram. Mas, em um primeiro momento, eles
vão fazer pressão para que o Hamas mude algumas de suas idéias", acrescentou Diaa Rashwan,
um egípcio especializado nos movimentos islâmicos do Oriente Médio (grifo nosso).
Mohamed el-Sayed Said, vice-diretor do Centro Ahram de Estudos Políticos e Estratégicos no
Cairo, afirmou que os israelenses iriam provavelmente ser mais pragmáticos com o Hamas do
que o governo do presidente norte-americano Bush. Jawan Al Anani, um ex-ministro da
Jordânia, afirmou que os comentários recentes feitos por autoridades norte-americanas sobre as
condições para negociar com o Hamas mostravam que um processo de diálogo já havia
começado.
Abdulaziz Al Mahmoud, colunista de jornal no Catar, disse que o Hamas estava fortalecido
politicamente após ter vencido as eleições em um período no qual conteve a ação de seu braço
armado. "Eles também são seres humanos que desejam viver em paz. Então, acho que eles vão
começar a negociar com Israel, mas como iguais e não como a ANP, que fez tantas concessões
sem nunca ter obtido nada em troca", acrescentou. "O que vem sendo dito, que a vitória do
Hamas inviabiliza o chamado processo de paz, não é verdade. Não há nada a oferecer aos
palestinos além de deixá-los vivendo em grandes prisões, a Faixa de Gaza e a Cisjordânia", disse
Sateh Noureddine, que escreve no jornal libanês As-Safir.
Deputados árabes-israelenses disseram que o governo de Israel semeou a vitória do Hamas.
"Israel está colhendo o que semeou todos estes anos", disse Mohammad Barakeh, deputado da
frente democrática pela igualdade Chadash. O deputado Abdel Malek Dahamshe, da Lista Árabe
Unida, disse que o mundo deve ver a vitória do Hamas como um passo para a paz. "Vou repetir o
que me disse o próprio (Yasser) Arafat muito antes de morrer após a eleição de (Ariel) Sharon
para o governo israelense: este é o homem que pode trazer a paz", disse o deputado. Dahamshe
acrescentou que "o mesmo princípio se repete agora com o Hamas, mas no lado palestino".
O porta-voz do Ministério de Assuntos Exteriores do Irã, Hamid-Reza Asefi, parabenizou o
Hamas por sua vitória. "O povo palestino escolheu incondicionalmente a opção da resistência e
está disposto a apoiá-la totalmente", disse Asefi. Expressou seu desejo de que os resultados do
pleito levassem à consolidação da união do povo palestino e ajudem na reivindicação de seus
direitos. "A participação maciça do povo nas eleições parlamentares indica a firme determinação
dos palestinos de continuar a luta e a resistência contra os ocupantes sionistas": "A República
Islâmica do Irã congratula o grande povo palestino, o movimento Hamas, os combatentes
palestinos e a grande nação islâmica, e espera que a grande presença do Hamas na cena política
palestina alcance importantes avanços para a nação palestina".
O Partido Islâmico do Iraque (PII), um dos principais dos árabes sunitas do país, também
manifestou sua satisfação: "Estamos satisfeitos com a vitória conseguida pelo Hamas no pleito, e
esperamos que sejam aliados do movimento Fatah — que lidera o governo em fim de mandato
da ANP — para formar um executivo de unidade", declarou Nasser al Ani, um dos dirigentes do
PII. Com relação à repercussão dessa vitória no conflito palestino-israelense, Ani se mostrou
otimista ao garantir que o Hamas "impulsiona um programa político que contém canais de
diálogo com os responsáveis israelenses": "Esse diálogo pretende o reatamento do que se
conhece como 'Mapa da Estrada', plano de paz palestino-israelense que estipula o
estabelecimento de um Estado palestino independente".
A “ajuda” dos EUA e da UE à ANP poderia ser mantida, porque Hamas realizou uma virada
política há já bastante tempo. Essa linha “pragmática” tem seu principal expoente em Ismail
Haniyeh, número 1 da lista de deputados, e candidato a primeiro ministro da ANP. Em seu
“discurso da vitória” não falou em destruir o Estado de Israel, mas que Hamas poderia aceitar
“os limites de 1967”. Hamas já disse que está disposto a uma trégua se aceita no governo e
reconhecida por Israel e a “comunidade internacional”. Também assinou os Acordos de El Cairo
(março de 2005), onde se compromete a “manter uma atmosfera de calma”. Haniyeh afirmou em
entrevista coletiva na Faixa de Gaza que o que propõe seu movimento "não são só slogans, mas
verdadeiras mudanças". Haniyeh se comprometeu a tratar assuntos internos palestinos como a
corrupção, a pobreza e o caos, enquanto continua paralelamente com a luta armada contra os
israelenses. No entanto, o Hamas omitiu uma menção em seu programa eleitoral a um apelo à
destruição de Israel.
O Cheikh Ahmed Hajj Ali, membro do Supremo Conselho da Shura de Hamas, disse: “Nossa
prioridade é a de atender a situação interna palestina mais do que confrontar com Israel.
Negociaremos com Israel porque é o poder que usurpou nossos direitos, se Israel concorda com
nossos direitos internacionais reconhecidos, incluindo o direito ao retorno dos refugiados, (nesse
caso) o Conselho da Shura consideraria seriamente reconhecer Israel no interesse da paz
mundial”.[109] Khaled Meshaal, máximo dirigente político do movimento, pediu à União
Européia continuar a ajuda econômica à ANP “desejoso de empreender um diálogo com os
Estados Unidos e a Europa”.
Especialistas do International Crisis Group, fundado por um ex-membro do governo de Bill
Clinton, vinham apontando a mudança do Hamas: “Os especialistas do Crisis Group, que
entrevistaram dezenas de personalidades palestinas e israelenses, além de diplomatas, acreditam
que a decisão do Hamas de participar da eleição nacional corresponda a uma mudança
estratégica e seja acompanhada de modificações no discurso de seus líderes políticos. Para eles,
as eleições constituem uma oportunidade para a comunidade internacional e Israel testarem a
disposição do Hamas de aderir ao processo político – como fizeram o IRA na Irlanda e a OLP
(Organização da Libertação da Palestina) nos anos 80... Assim, após as eleições, o Hamas deverá
promover a promulgação de uma nova lei sobre os partidos políticos, convidados a agir ‘por
meios legais e pacíficos’. O movimento deverá também ratificar uma lei sobre a segurança que o
leve progressivamente a desarmar suas milícias e respeitar um cessar-fogo. Aos israelenses, o
relatório aconselha que ponham fim aos assassinatos políticos e libertem os líderes políticos das
facções palestinas”.[110]
O próprio Quarteto de Madri, integrado por Estados Unidos, União Européia (UE), Rússia e a
ONU, em resposta, pediu que se respeitasse a vitória do Hamas. O Quarteto, que promove o
chamado “Mapa da Estrada”, em um comunicado divulgado na ONU, em Nova York,
parabenizou o povo palestino pelo sucesso de um processo eleitoral que foi "livre, justo e
seguro". A comissária européia de Relações Exteriores, Benita Ferrero-Waldner, responsável
pela ajuda financeira da UE à ANP, afirmou que o bloco está disposto a trabalhar com qualquer
governo, "se o governo estiver disposto a fazer a paz avançar com métodos pacíficos". A portavoz da comissária, Emma Udwin, destacou que os acordos de cooperação da Comissão Européia
são com a ANP e não com "um ou outro partido", e disse que "não esperava" que a vitória do
Hamas atrapalhe os projetos europeus em andamento em território palestino.
A delegação do Conselho da Europa que atuou como observadora nas eleições destacou “o
pluralismo e a eficácia que caracterizaram todo o processo” e parabenizou “o grau de democracia
alcançado”. Numa nota, o Conselho lembrou que nove integrantes de sua Assembléia
Parlamentar permaneceram vários dias nos territórios palestinos para analisar o desenvolvimento
da campanha e do dia da eleição. O resultado “foi positivo pela participação dos candidatos e
partidos, assim como pelo clima em que transcorreu todo o processo, ao longo do qual só
ocorreram alguns problemas menores”: "É um sinal de que os partidos reconhecem agora que o
processo democrático é a única forma de se ir adiante para resolver os problemas que a sociedade
palestina enfrenta", disse o Conselho.
A Rússia também anunciou que respeitará "a eleição democrática" dos palestinos. "Sempre
respeitamos e respeitaremos a eleição democrática do povo palestino, com base na qual se
formarão os novos órgãos legislativos e executivos de poder palestinos", afirmou a Chancelaria
russa em comunicado. A nota indica que as eleições "demonstraram que os palestinos são
capazes de realizar, por si mesmos e em cooperação com Israel, tarefas de grande importância e
escala". O texto acrescenta que, depois deste pleito, "terá uma importância fundamental a
fidelidade de todos os participantes do processo político palestino à solução pacífica dos desafios
para tornar realidade as esperanças nacionais, internacionalmente reconhecidas, do povo
palestino".
A diplomacia russa avaliou as eleições ao parlamento da ANP como "um grande acontecimento
no caminho da democratização da sociedade palestina e da consolidação de suas instituições
estatais" e louvou a alta participação popular no pleito. O comunicado também indicou que tal
atitude do parlamento palestino, sempre que conte com reciprocidade por parte de Israel,
contribuirá para retomar o cumprimento do Mapa da Estrada. Alexandr Kaluguin, representante
especial da Chancelaria russa para o Oriente Médio, afirmou que Moscou manterá sua política de
colaboração com a ANP, "independentemente da composição do futuro governo": "Nossa linha
geral de cooperação com a ANP não sofrerá modificações. Julgaremos o futuro governo por suas
ações", declarou Kaluguin, que encabeçou a missão de observadores russos às eleições
palestinas.
Os próprios EUA, encaixado o golpe da vitória do Hamas, começaram a fazer “política”: Bush,
disse que o Hamas deve renunciar a seus pedidos para "destruir Israel". "Os Estados Unidos não
apóiam um partido político que quer destruir nosso aliado Israel. Eles devem renunciar a essa
parte de sua plataforma. Um partido político que articula a destruição de Israel como parte de sua
plataforma é um partido com o qual não dialogaremos", afirmou Bush. "Se sua plataforma é a
destruição de Israel, isso significa que não é um sócio para a paz. O que nos interessa é a paz".
Bush também expressou seu desejo de que Mahmoud Abbas permanecesse no poder, apesar da
vitória do Hamas: "Gostaríamos que ele ficasse no poder".[111]
O porta-voz do presidente Bush, Scott McClellan, disse que o pleito fora um evento histórico,
mas reafirmou a hostilidade de Washington ao Hamas, inclusive cristalizado como uma força
eleitoral formidável. Para os Estados Unidos, governos europeus e, obviamente, Israel, o Hamas
é uma organização terrorista, e o ex-presidente Jimmy Carter, que chefiou uma equipe de
observadores às eleições palestinas, antecipou a complicação. Ele lembrou que “por lei” o
governo americano não pode negociar com um governo palestino que contenha o Hamas. Este é
o verdadeiro papel das “pombas” internacionais: pavimentar o caminho do terrorismo
imperialista, com argumentos “legais”.
Bush, no discurso perante as duas casas do Congresso, O Estado da União, pediu ao Hamas que
reconhecesse Israel, e se desarmasse. Bush disse que as eleições palestinas "são vitais, mas são
só o começo". Os EUA "apóiam as reformas democráticas em todo o Oriente Médio", sustentou:
"Estabelecer uma democracia requer um Estado de Direito, a proteção das minorias, e
instituições fortes e transparentes que durem mais que uma só legislatura". Sobre as eleições em
Gaza e Cisjordânia, insistiu: "O povo palestino votou nas eleições; agora os líderes do Hamas
devem reconhecer Israel, desarmar-se, rejeitar o terrorismo e trabalhar em prol de uma paz
duradoura".
Mas um dos principais dirigentes do Hamas negou que o movimento tivesse se transformado em
um partido político com sua participação nas eleições parlamentares: "O Hamas continua sendo
um movimento de resistência, e sua participação nas eleições não implica uma conversão a um
partido político", disse Yasser Mansur, quinto na lista do Hamas. Além disso, reiterou a negativa
de seu movimento a reconhecer Israel e destacou os direitos dos muçulmanos aos territórios onde
se estabeleceu o Estado judeu em 1948. No entanto, às vésperas das eleições, Mansur também
ressaltou a proposta de uma trégua a longo prazo com Israel, após a criação de um Estado
palestino na Cisjordânia e em Gaza com Jerusalém como capital.
Além disso, Mansur pediu à comunidade internacional, em particular à União Européia e aos
EUA, que mantenham abertos os canais de contato: "Esperamos que a comunidade internacional
entenda que resistir à ocupação é nosso direito legítimo, que nossa luta está limitada
geograficamente e que não cedam às pressões israelenses para que nos tachem de
terroristas".[112] Mansur antecipou que, apesar de sua negativa a priori a reconhecer Israel, na
hora de resolver problemas locais, como os de um posto de controle e do desemprego, e nos
quais a coordenação com as autoridades israelenses é freqüentemente inevitável, "estamos
comprometidos a ser pragmáticos e tomar uma decisão baseada no que beneficie mais os
palestinos".
Perspectivas Politicas
O primeiro ministro israelense Ehud Olmert, junto ao secretário geral do trabalhismo, Amir
Peretz, anunciaram que não dialogariam com o novo parlamento e governo palestinos. O
ministro da Defesa, Shaul Mofaz, advertiu que Israel seguiria com a política de assassinatos
seletivos, incluindo a membros eleitos do parlamento palestino (grifo nosso). Ainda assim, a
crise política em Israel já se manifestou. “Israel deve ser duro com a nova autoridade palestina
depois da vitória do movimento radical Hamas”, destacou o ex-primeiro-ministro de Israel,
Benjamin Netanyahu, em uma entrevista coletiva com a televisão dos Estados Unidos.
Netanyahu disse que a saída de Israel dos territórios palestinos foi um sinal de debilidade e que a
vitória do Hamas é um grande retrocesso para a paz: "A realidade nos golpeou na cara. Pensamos
que nos retiraríamos, unilateralmente, e conseguiríamos a paz. Só conseguirmos que o Hamas se
posicionasse ante nossos olhos", frisou o líder direitista do partido Likud para a rede de televisão
Fox News.[113]
Mas em Israel, também, as fissuras não aparecem só à direita. A postura oficial de Israel é de não
dialogar com um governo integrado por membros do Hamas. Mas o presidente Moshé Katsav
não descartou uma possível negociação entre seu país e o Hamas:"Se o Hamas se encaminhar em
direção à paz, poderemos avançar rumo à paz", afirmou o presidente em declarações contidas na
edição eletrônica do jornal Yediot Aharonot. No entanto, ele condicionou qualquer avanço ao
"reconhecimento de Israel e ao abandono do terrorismo". "Só então poderemos avançar em
direção à paz", disse: “Não há dúvida que, do ponto de vista de Israel, criou-se uma nova
realidade” (grifo nosso).[114]
A secretária de Estado norte-americana, Condoleezza Rice, disse que as principais potências
mundiais concordaram que o Hamas “deve renunciar à violência” após a surpreendente vitória da
facção nas eleições legislativas da Palestina: "Reafirmamos a visão de que... você não pode ter
um pé no terrorismo e o outro na política", disse em uma entrevista após uma conversa telefônica
com autoridades do chamado Quarteto. A secretária, que descartou a possibilidade de os EUA
darem ajuda financeira ao Hamas, também disse que assegurou a Israel que a comunidade
internacional exigirá que o grupo militante reconheça o Estado sionista.
Numa reação coordenada para pressionar o Hamas, o Quarteto lançou um comunicado em que
fez exigências: "Uma solução de dois Estados para o conflito requer que todas os participantes
do processo democrático renunciem à violência, aceitem o direito que Israel tem de existir, e se
desarmem", afirma a nota. Na entrevista citada, a secretária Rice disse ainda que o Irã "está
sentindo" a pressão internacional sobre suas pretensões nucleares e que Washington vai insistir
em levar o país ao Conselho de Segurança da Organização das Nações Unidas (ONU).
O revide israelense à vitória do Hamas começou a ser preparado de imediato, na questão-chave
da Cisjordânia, muito mais importante que a retirada de Israel da Faixa de Gaza; “(O primeiroministro) Olmert disse que pretende pôr em prática um plano unilateral de separação dos
palestinos na Cisjordânia, pelo qual Israel manterá sob seu controle a parte oriental (árabe) de
Jerusalém, os grandes blocos das colônias judaicas perto da atual fronteira israelense e o Vale do
Jordão, na fronteira com a Jordânia”.[115]
Essa politica visou dar uma resposta à mobilização conjunta judeo-palestina contra o muro de
divisão da Cisjordânia, uma construção que passa no meio de casas e plantações dos palestinos
da Cisjordânia.[116] Na verdade, a galopante crise política e de regime do Estado sionista não
favorece apenas às facções religiosas (árabes ou israelenses), mas também uma retomada da luta
conjunta dos trabalhadores árabes e judeus, na perspectiva de uma aliança classista em cuja base
repousa o futuro de uma Palestina única, livre, secular e democrática.
Ilan Pappe resume a falta de perspectivas históricas, do ponto de vista isralense: “La propuesta
para acabar con el conflicto presentada por el gobierno Sharon-Peres -con la silenciosa
aquiescencia de la izquierda sionista- puede satisfacer a algunos regímenes árabes, como los de
Egipto y Jordania, no serán suficientes para la sociedad civil de estos países, politizados por el
Islam radical. El objetivo estadounidense de "democratizar" Oriente Medio -como lo está
llevando a cabo actualmente su ejército en Iraq- no rebaja, sin embargo, la preocupación de la
vida dentro de la fortaleza "blanca". El nivel de violencia sigue siendo alto y el nivel de vida de
la mayoría baja constantemente. Estas cuestiones no se está tratando: su importancia en la
agenda es casi tan escasa como la de los problemas medioambientales o la de los derechos de la
mujer.
“Lo que importa es que constituimos -me incluyo a mí mismo ya que procedo de una familia de
judíos alemanes- una mayoría de "blancos" en nuestra progresista isla en un mar de "negros".
Denegar el derecho de los refugiados palestinos al retorno equivale a una promesa
incondicional de defender el enclave "blanco". Esta postura es particularmente popular entre
los judíos sefardíes, que originariamente formaban parte del mundo árabe pero que desde
entonces han aprendido que el pertenecer a la sociedad "blanca" requiere un proceso de
Hishtakenezut - de "convertirse en ashkenazi". Hoy son ellos los más vociferantes defensores de
la isla "blanca", aunque muy pocos de ellos, especialmente entre aquellos que proceden del
norte de África, vayan a llevar la confortable vida que disfrutan sus homólogos ashtenazis. Por
muy estruendosamente que se des-arabicen a sí mismos, tarde o temprano se darán contra un
muro de cristal”.[117]
Para The Economist, no seu número prospectivo de 2006, o governo dos EUA está confrontado,
no Oriente Médio, a um teste no qual pode provocar “a pior derrota estratégica dos EUA desde a
guerra do Vietnã”,[118] mas sem acrescentar que este “Vietnã” se produziria em condições de
crise econômica e política mundiais infinitamente mais profundas do que na década de 1970. A
crise explosiva no Oriente Médio pode transformar-se no epicentro de um Katrina geral das
relações econômicas e políticas em que se assenta o imperialismo capitalista em escala mundial.
As questões postas em jogo pela crise no Oriente Médio exigem, para uma efetiva oposição e
expulsão do imperialismo, a unidade de todos os explorados da região. Mas isto só seria possível
com um programa cujo norte estratégico fosse a unidade do Oriente Médio sobre a base de uma
Federação de Repúblicas Socialistas, suscetível de mobilizar todas as camadas dos explorados,
sem divisões “étnicas”, em prol de um objetivo comum. Somente a classe operária poderia
realizar essa unidade política, a única capaz de enfrentar a tarefa histórica posta. Mas isso
implica em superar criticamente as limitações políticas e programáticas das direções
nacionalistas e religiosas.
As principais direções políticas dos explorados, os seus programas, no Oriente Médio, não estão
à altura dos desafios objetivos postos pela situação. Mas o dinamismo político da região é
vertiginoso; a tradição teórica e política acumulada em décadas de luta, nacional e internacional,
serão um poderoso fator de maduração da consciência política das massas e de sua vanguarda.
O maior genocídio da história moderna, o Holocausto judeu sob o nazismo (e com a passividade
cúmplice das potências “anti-nazistas”), foi usado como base para a criação de uma das maiores
injustiças do mundo contemporâneo, a expropriação do povo palestino, e ao mesmo tempo para
criar uma cabeça de ponte para a intervenção imperialista na região que concentra a maior parte
dos recursos energéticos do planeta. Ao longo do século XX, o imperialismo capitalista exalou
podridão por todos os poros; nas últimas décadas, só lhe acrescentou uma dose ímpar de cinismo,
ao veicular seus objetivos em nome da democracia, dos direitos humanos e até dos “direitos das
minorias”. O drama milenar do povo judeu não foi eliminado, mas transformado na base do
drama contemporâneo do povo árabe palestino.
A sobrevivência do imperialismo capitalista compromete a sobrevivência da humanidade como
um todo. O problema palestino não tem solução no “mundo das nações”, ontem portador da
liberdade, hoje catalisador do massacre permanente dos povos. A unidade socialista dos povos
do Oriente Médio, no quadro da luta pela república socialista mundial do trabalho, é hoje um
objetivo de toda a humanidade trabalhadora consciente das potencialidades e perigos da atual
etapa da história.
CRONOLOGIA
1948: Fim do Mandato Britânico (14 de maio). Proclamação do Estado de Israel (14 de maio).
Israel é invadido por cinco exércitos árabes (15 de maio). Guerra árabe-israelense (maio de
1948-julho de 1949). Criação das Forças de Defesa de Israel (IDF)
1949: Assinatura de acordos de armistício com o Egito, Jordânia, Síria e Líbano. Jerusalém é
dividida, sob domínio de Israel e da Jordânia. Eleição do primeiro Knesset (parlamento). Israel é
aceito como o 59o. membro da ONU.
1948-52: Imigração em massa de judeus da Europa e dos países Árabes à Israel.
1956: Campanha do Sinai e Guerra do Canal de Suez.
1962: Adolf Eichmann é julgado e executado em Israel por sua participação no Holocausto.
1964: Criação da Organização para a Libertação da Palestina (OLP), no Egito.
1967: Guerra dos Seis Dias, ocupação dos Territórios e de Jerusalém pelo Estado sionista. Junho:
Israel toma a Faixa de Gaza do Egito como resultado da Guerra dos Seis Dias; o premiê
israelense na época, Levi Eshkol, declara que a área "jamais será devolvida ao Egito". Final de
1967: Eshkol planeja estabelecer colônias judaicas na área capturada do Egito, para criar uma
zona de distensão no flanco sudoeste do país. A idéia encontra oposição dentro do governo, que
teme a transformação da área num alvo para ataques palestinos e a escassez de água no local.
1968-70: “Guerra de Desgate” do Egito contra Israel. Em 1970, “setembro negro” da monarquia
hachemita contra os palestinos refugiados na Jordânia. Junho de 1970: o governo israelense
aprova a colonização de Gaza.
1972 - Israel inicia o estabelecimento de dois postos do Exército em Gaza, que irão se
transformar nas comunidades de Netzarim e Kfar Darom.
1973: Guerra do Yom Kippur
1975: Israel torna-se membro associado do Mercado Comum Europeu, projeto estratégico do
imperialismo do velho Continente.
1977: O Likud forma o governo após as eleições para o Knesset; fim de 30 anos de governo
trabalhista. Visita do Presidente Egípcio Anwar Sadat a Jerusalém. Mais civis israelenses têm
autorização para se mudar para as instalações militares de Gaza, e novas colônias se estabelecem
nesse território ocupado.
1978: Os Acordos de Camp David, patrocinados pelos EUA, apresentam as linhas gerais para
uma “paz abrangente” no Médio Oriente e uma proposta de “auto-governo” para os Palestinos.
1979: Assinatura do Tratado de Paz Israel-Egipto. O Primeiro-Ministro Menachem Begin e o
Presidente Anwar Sadat recebem o Prêmio Nobel da Paz.
1981: A Força Aérea Israelita destrói o reator atômico do Iraque, invadindo o espaço aéreo do
paia árabe, e sem receber nenhuma sanção séria por essa conduta.
1982: Completam-se as três etapas de retirada de Israel da península do Sinai. Setembro: maior
ato de terrorismo de Estado da história contemporânea no Oriente Médio, quando uma milícia de
cristãos, que representava o Estado judeu na ocupação do Líbano, pratica uma verdadeira
chacina nos campos de refugiados palestinos de Sabra e Chatila, matando quase duas mil pessoas
em menos de três dias. O campo fora aberto aos milicianos pelo criminoso de guerra Ariel
Sharon, hoje primeiro-ministro de Israel, sob ordens do primeiro-ministro da época, Menachen
Begin. A ocupação do Líbano por Israel, que se retirou do país somente em maio de 2000,
causou a morte de cerca de 20 mil libaneses e palestinos, quase todos civis. A Operação “Paz
para a Galiléia” expulsa a OLP (Organização para a Libertação da Palestina) do Líbano, depois
de ataques contra a população civil de Beirute e de outros centros urbanos do Líbano. Israel
esvazia a colônia de Yamit, no Sinai, como parte de uma transferência de território para o Egito,
em cumprimento a um acordo de paz. Alguns dos colonos são transferidos para Gaza.
1984: Crise política em Israel: formado um governo de unidade nacional (Likud e Trabalhista)
após as eleições. Operação Moisés: imigração dos judeus da Etiópia (fallachas) para Israel.
1985: Israel assina Acordo de Livre Comércio com os Estados Unidos.
1987: Surge a Segunda Intifada nas áreas controladas por Israel. Primeiro levante palestino em
Gaza. Israel reage criando novas colônias.
1988: Israel: governo do Likud após as eleições.
1989: Israel propõe um plano de paz de quatro pontos. Início da imigração em massa dos judeus
da antiga União Soviética.
1991: Agressão dos EUA contra o Iraque. Israel é atacado por mísseis Scud do Iraque durante a
Guerra do Golfo. Reúne-se em Madrid a Conferência de Paz para o Oriente Médio.
1992: Estabelecimento de relações diplomáticas de Israel com a China e a Índia.
1993: Setembro: Depois de seis meses de negociações secretas em Oslo (Noruega), Israel e a
OLP (Organização pela Libertação da Palestina) chegam a um primeiro acordo sobre uma
autonomia palestina transitória. Israel e a OLP, como representante do povo palestino, assinam a
Declaração de Princípios sobre os procedimentos do “auto-governo interino” para os palestinos.
Os Acordos de Oslo, abrem caminho para a retirada israelense de partes de Gaza.
1994: Fevereiro: assinatura, no Cairo, de um acordo sobre as questões de segurança relativas à
autonomia. Julho: Arafat volta para a Palestina depois de 27 anos de exílio e forma em Gaza um
governo autônomo, a Autoridade Palestina. Agosto: acordo sobre a transferência à Autoridade
Palestina de quatro assuntos civis na Cisjordânia: serviços sociais, fiscalização, saúde e turismo.
Implementação do “auto-governo palestino” na Faixa de Gaza e na região de Jericó. Rabin, Peres
e Arafat recebem o Prêmio Nobel da Paz.
1995: 28 de setembro: Rabin e Arafat assinam, em Washington, um acordo interino sobre a
extensão da autonomia palestina na Cisjordânia, chamado de Oslo 2. 13 de novembro a 21 de
dezembro: retirada israelense de Jenin, Kalkiliya, Tulkarem, Naplusa, Ramalá e Belém.
Ampliação do “auto-governo palestino”, implementado na Margem Ocidental e na Faixa de
Gaza; eleição do Conselho Palestino. O primeiro-ministro Yitzhak Rabin é assassinado num
comício em prol da paz por um direitista israelense. Shimon Peres torna-se o novo PrimeiroMinistro.
1996: 20 de janeiro: Yasser Arafat é eleito presidente da Autoridade Palestina. 5 de maio:
Abertura formal, em Taba (Egito), de negociações sobre um acordo de paz definitivo. 1 e 2 de
outubro: Reunião de cúpula em Washington entre o presidente americano Bill Clinton, Arafat,
Benjamin Netanyahu e o rei Hussein da Jordânia. Israel deflagra a Operação Vinhas da Ira, em
retaliação aos ataques da Hizbollah ao norte de Israel. O Likud sobe ao poder após as eleições
para o Knesset.
1997: 15 de janeiro: Netanyahu e Arafat chegam a um acordo sobre a aplicação da autonomia
palestina em Hebron. 6 de outubro: Retomada das conversas de paz depois de sete meses de
suspensão. 30 novembro: Israel aceita o princípio da retirada limitada da Cisjordânia.
1998: 15 a 23 de outubro: em oito dias, Bill Clinton dedica mais de 70 horas às negociações
israelo-palestinas, que terminam com o acordo de Wye Plantation. O documento define a forma
de uma segunda retirada militar israelense da Cisjordânia e a libertação, por parte de Israel, de
750 prisioneiros palestinos.
1999: 25 de agosto: Israelenses e OLP concluem um acordo de princípios sobre o calendário da
retirada militar israelense da Cisjordânia. A primeira etapa (7% de retirada) foi marcada para
começar em 1º de setembro. 5 de setembro: Ehud Barak e Iasser Arafat assinam em Charm elCheij (Egito) uma versão renegociada dos acordos de Wye Plantation. 8 de novembro: Começo
de negociações israelense-palestinas sobre o estatuto final da Cisjordânia, lançadas oficialmente
em 13 de setembro. 20 de dezembro: Negociadores israelenses e palestinos retomam discussões
sobre o estatuto final de Cisjordânia e Gaza.
2000: 3 de fevereiro: Israelenses e palestinos se separam em uma atmosfera de crise depois do
fracasso da cúpula destinada a relançar as negociações de paz. A direção da OLP anuncia que um
Estado Palestino independente, com capital em Jerusalém, será proclamado em setembro. 11 de
março: O negociador-chefe palestino, Saeb Erekat, se reúne com o israelense Oded Eran, na
retomada das negociações entre as duas partes, em Washington. 21 de março: Israel transfere aos
palestinos o controle total de 6,1% da Cisjordânia. 25 de junho: O presidente palestino, Iasser
Arafat, declara em um discurso em Naplusa, Cisjordânia, que um estado palestino será
proclamado "em algumas semanas". 28 de junho: Arafat recusa uma proposta americana de
organizar uma cúpula trilateral nos Estados Unidos a partir de 15 de julho. 3 de julho: O
Conselho Central da OLP (CCOLP), reunido em Gaza, decide que os palestinos proclamarão um
Estado Independente em 13 de setembro de 2000.
2001: 6 de fevereiro: O líder do partido Likud, Ariel Sharon, 72, é eleito primeiro-ministro de
Israel ao vencer o premiê trabalhista, Ehud Barak, em 6 de fevereiro. Sharon obteve sua vitória
prometendo “segurança” e a retomada do processo de paz com os palestinos só depois do fim da
Intifada (revolta palestina, iniciada em 28 de setembro). 1º de junho: Um militante palestino
suicida mata cerca de 15 pessoas e fere cerca de 70 na orla de uma praia de Tel Aviv, na maior
ação desde o início da nova Intifada. O grupo Hamas reivindica a autoria do atentado. Yasser
Arafat condena a ação e sugere a Israel um comunicado conjunto de cessar-fogo. O governo
israelense, porém, aprova uma reação militar. 28 de setembro: Seis palestinos morrem e dezenas
ficam feridos em choques com soldados israelenses durante protestos para marcar o primeiro
aniversário da Intifada. 17 de outubro: Militantes do grupo palestino Frente Popular para a
Libertação da Palestina matam, num hotel de Jerusalém, o ministro israelense de extrema direita
Rehavam Zeevi.
2002: Road map for peace ou “Mapa da Estrada”, re-definição dos cantões para a Autoridade
Nacional Palestina criar o “Estado palestino”.
2003: Guerra e ocupação dos EUA contra o Iraque, ao arrepio das Nações Unidas e de toda a
ordem jurídica internacional. Dezembro: o premiê israelense Ariel Sharon apresenta plano para
desmontar todas as colônias de Gaza e quatro pequenas colônias da Cisjordânia. Mais de 8.000
israelenses vivem em 21 colônias da Faixa de Gaza. Setembro: falece Edward Said, considerado
o maior intelectual palestino.
2004: Início da construção do Muro da Cisjordânia. Outubro: o Parlamento israelense aprova o
plano de Sharon de retirada de Israel das colônias de Gaza. Morre Yasser Arafat, dirigente de AlFatah e da OLP.
2005: Agosto: começa a retirada israelense da Faixa de Gaza. Amir Peretz derrota Shimon Peres
nas eleições internas do Partido Trabalhista, que se retira do governo de coalizão com o Likud,
provocando eleições antecipadas em Israel. A formação islâmica radical Hamas derrota Al Fatah
nas eleições municipais palestinas de dezembro.
2006: Janeiro: O Hamas vence nas eleições legislativas gerais na Palestina.
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[1] Somente pessoas altamente desinformadas acreditam que os episódios de 11 de setembro e
posteriores [ataques com antraz, etc.] sejam obra de um grupo de fanáticos islâmicos que
costumam se esconder nas cavernas do Afeganistão e bater nas mulheres, entre outros hábitos.
[2] IGNATIUS, David. Crise também pode ser vítima da guerra. The Washington Post / O
Estado de S. Paulo, 22 de outubro de 2001.
[3] Cf. MATSAS, Savas-Michael. Irak: el referendum bajo la ocupación. Uma farsa dentro de
uma tragédia. El Obrero Internacional nº 4, Buenos Aires, dezembro de 2005, e OVIEDO, Luis.
Irak: Los yanquis reculan El Obrero Internacional nº 5, Buenos Aires, janeiro de 2006: “El
llamado “proceso político” (do Iraque) no sólo incluye a los shiítas (religiosos y laicos) y a los
kurdos, es decir al personal político con el que se ha intentado, sin éxito, “estabilizar” Irak. La
novedad es que también incluye a la mayoría de los representantes políticos de la resistencia
iraquí (mayoritariamente sunita). Partes sustanciales de la resistencia llamaron a entrar en la
disputa electoral con el objetivo de obtener tantos diputados a la Asamblea Nacional como sea
posible”. El nuevo “proceso político” incluye, además, “la apertura hacia sectores de la
resistencia del partido Baath (el partido de Saddam)”: como parte de esa “apertura”, pocos
días después de las elecciones fueron liberados 25 altos funcionarios del régimen de Saddam. La
otra novedad es que el embajador norteamericano en Bagdad ha sido autorizado a entablar
negociaciones directas con Irán para encaminar el “proceso político”. El imperialismo negocia
con todos –incluidos los rebeldes, los partidarios de Saddam y los integrantes del “eje del mal”–
para poner en Bagdad un gobierno de “unidad nacional” que le permita “retirarse” de Irak. El
gobierno de “unidad nacional” debería incluir a todas las fracciones relevantes, hoy
enfrentadas política y militarmente: los shiítas, los sunitas y los kurdos. A la cabeza de este
gobierno contradictorio, los yanquis están dispuestos a imponer (fraude mediante) a un hombre
de su confianza: Ilyad Allawi, shiíta laico y, por sobre todo, agente de la CIA. Sin embargo, “las
posibilidades de que emerja un gobierno de coalición amplio, tolerante, multi-sectario, no son
brillantes”, según The Economist. El primer obstáculo es el reparto de los ingresos petroleros:
los shiítas y los kurdos reclaman la propiedad de los hidrocarburos”.
[4] As informações que seguem estão contidas em: DANTAS, Gilson. Iraque: ocupação, barbárie
e imperialismo em crise. Antìtese nº 1, Goiânia, CEPEC outubro 2005, artigo excelente, que
resumimos nas linhas que seguem.
[5] The Wall Street Journal, Nova Iorque, 16 de janeiro de 2003; The Guardian, Londres, 27 de
janeiro de 2003.
[6] STIGLITZ, Joseph (entrevista). Guerra pode custar quase US$ 2 tri. Folha de S. Paulo, 12 de
janeiro de 2006.
[7] HOLTZMAN, Elizabeth. O impeachment de George W. Bush. Folha de S. Paulo, 15 de
janeiro de 2006.
[8] Cf. SALAM, Elie A. Arab-American relations: an interpretative essay. In Han-Kyo Kim
(ed.). Essays on Modern Politics and History. Athens, Ohio University Press, 1969.
[9] Segundo Arnold Toynbee e outros historiadores, o nome Palestina teria se originado de
philistaius que designava o povo filisteu, de que trata a Bíblia no episódio de Sansão e Dalila. Os
filisteus não eram semitas e sua provável origem é creto-micênica, uma das mais conhecidas
vagas dos chamados "povos do mar" que se estabeleceram em várias partes do litoral sul do mar
Mediterrâneo, incluindo a área hoje conhecida como Faixa de Gaza. A Palestina, sendo um
estreito trecho de favorável passagem entre a África e Ásia, foi palco de um grande número de
conquistas, pelos mais variados povos, por se constituir num corredor natural para os antigos
exércitos. No ano 1099, com a Primeira Cruzada, europeus conquistaram Jerusalém e lá
estabeleceram o seu domínio sob o nome de Reino Latino de Jerusalém, cuja existência
periclitante em meio à sociedade islâmica se demorou até o ano de 1187, quando a cidade foi
reconquistada por Salamino (Cf. NOJA, Sergio. Breve Storia dei Popoli Arabi. Milão, Arnaldo
Mondadori, 1997).
[10] Em 1852, só havia em torno de 11.800 judeus na Palestina. Esse número subiu um pouco
nas décadas subseqüentes, atingindo, em 1880, aproximadamente 24.000, de uma população total
de 500 mil habitantes. No período de 1880 a 1914, houve movimentações migratórias de judeus
por todo o continente europeu. Com uma onda anti-semita na Rússia, explicitada pelos pogroms
czaristas, e com uma diversidade de leis restritivas em alguns países da Europa Oriental, começa
a haver um maior interesse na constituição de colônias agrícolas judaicas na Palestina, que
lentamente irão receber, nessa época, diversos grupos de judeus provenientes dessas nações,
assim como ocorrerá, paralelamente, uma leva migratória judia para a Europa Ocidental e
Estados Unidos. Esse período coincide com a criação de diversas ligas anti-semitas, com o I
Congresso Anti-semita Internacional, na Alemanha, em 1882, e com reações dos sionistas,
estabelecendo comitês responsáveis por organizar a colonização agrícola da Palestina. A idéia do
“retorno”, portanto, estava extremamente associada aos preconceitos e perseguições anti-semitas
na Europa, assim como à tentativa de construção de um “lar” onde os judeus pudessem viver sem
serem atacados, e que possibilitasse a construção posteriormente de um Estado nacional seguro e
independente (PERICÁS, Luiz B. Israel e Palestina. IV Internacional, São Paulo, maio de 2002;
ver também: RATTNER, Henrique [org.]. Nos Caminhos da Diáspora. São Paulo, Centro
Brasileiro de Estudos Judaicos, 1972).
[11] KIRK, George E. História do Oriente Médio. Rio de Janeiro, Zahar, 1967, p. 190.
[12] PERICÁS, Luiz B. Op. Cit.
[13] FRANCK, Claude e Michel Herszlikowicz. Le Sionisme. Paris, PUF, 1984.
[14] Em seu livro The Question of Palestine (Nova Iorque, Vintage Books, 1980), o escritor
palestino Edward Said definiu a importância dessa declaração da seguinte maneira: "O que é
importante a respeito da declaração é que, em primeiro lugar, durante muito tempo ela foi a base
legal para as reivindicações sionistas em relação à Palestina e, em segundo lugar, e mais
importante para os nossos objetivos aqui, que foi uma declaração cuja força só pode ser avaliada
quando as realidades demográfica e humana da Palestina ficaram claras na mente. Isto é, a
declaração foi feita (a) por um poder europeu, (b) a respeito de um território não-europeu, (c)
num claro desrespeito à presença e aos desejos da população nativa residente no território e (d)
tomou a forma de uma promessa sobre este mesmo território por um outro grupo estrangeiro, a
fim de que esse grupo estrangeiro pudesse, literalmente, fazer desse território uma nação para o
povo judeu".
[15] KIRK, George E. Op. Cit. p. 191.
[16] Cf. NOUSCHI, André. Luttes Petrolières au Proche-Orient. Paris, Flammarion, 1970.
[17] SCHOENMAN, Ralph. Historia Oculta del Sionismo. Barcelona, Marxismo y Acción,
1988.
[18] GRESH, Alain e Dominique Vidal. Palestine 1947. Une division abortée. Paris, Éditions
Complexe, 2004, p. 42.
[19] WEINSTOCK, Nathan. El Sionismo contra Israel. Barcelona, Fontanella, 1970.
[20] Cf. SANZ, Luis. Guerra y Revolución en Palestina. Madri, Zero, 1976.
[21] SOARES, Jurandir. Israel Palestina. As raízes do ódio. Porto Alegre, UFRGS Editora,
2004.
[22] MARGULIES, Marcos. Israel. Origem de uma crise. São Paulo, Difel, 1967.
[23] Cf. NOVICK, Paul. Solution for Palestine. The Chamberlain White Paper. Nova Iorque,
National Council of Jewish Communists, 1939.
[24] GRESH, Alain e Dominique Vidal. Op. Cit., p. 54.
[25] SCHOENMAN, Ralph. Historia Oculta del Sionismo. Barcelona, Marxismo y Acción,
1988, p.119.
[26] Cf. CLEMESHA, Arlene. De la declaración de Balfour a la derrota del movimiento obrero
árabe-judío. En Defensa del Marxismo nº 30, Buenos Aires, maio de 2003.
[27] LOCKMAN, Zachary. Comrades and Enemies: Arab and Jewish workers in Palestine,
1906-1948. San Francisco, University of Califórnia Press, 1996.
[28] Zionism and the Jewish Question in the Near East. Fourth International. Nova Iorque,
outubro 1946.
[29] Cf. Teses do Grupo Trotskista Palestino (1948). A Verdade n° 36, São Paulo, abril de 2004.
[30] Cf. SARTRE, Jean-Paul (ed.). Le Conflit Israelo-Arabe. Paris, Les Temps Modernes/Les
Presses d´Aujourd´hui, 1968.
[31] KAROL, K. S. La Nieve Roja. Madri, Alianza, 1984, p. 56-57.
[32] FAVROD, Charles-Henri (ed.). Les Arabes. Paris, Le Livre de Poche, 1975.
[33] MASSOULIÉ, François. Os Conflitos do Oriente Médio. São Paulo, Ática, 1996.
[34] Cf. GAUTHIER, Lucien. As origens da divisão da Palestina. A Verdade nº 8, São Paulo,
julho de 1994
[35] Yasser Arafat escapou de mais de 50 atentados, como líder da OLP. Nascido em 1921 em
Egito, seu nome, em árabe - Yasser - significa "fácil" ou "sem problemas". Já adolescente foi
perseguido por sua atividade como dirigente estudantil, durante o curso de engenharia civil no
Cairo. Mais tarde combateu junto com o Exército egípcio na guerra do canal de Suez de 1956 e
daí foi para o Kuwait onde trabalhou como empreiteiro até 1964. Arafat, que poderia ter ficado
milionário durante esta etapa de sua vida, entretanto optou pela política. Uma de suas
compensações pela escolha chegou em 1974, quando a Liga Árabe reconheceu a Organização
para a Libertação da Palestina (OLP), que ele presidia, como "a única representante legítima do
povo palestino". No final de agosto de 1982, por exemplo, ele - cujo nome de guerra era "Abu
Amar" - e várias centenas de guerrilheiros tiveram que abandonar Beirute, onde tinham abrigo. A
cidade havia sido cercada pelo Exército israelense que havia ocupado o Líbano, quando Ariel
Sharon ostentava o cargo de ministro da Defesa. O grupo ficou sem abrigo por pouco tempo. No
dia 28 de agosto daquele ano o presidente tunisiano Zine al Abidín Ben Alí acolheu Arafat em
Túnis. Durante seu exílio tunisiano, o Exército israelense bombardeou o quartel-general da
central palestina e suas imediações causando mais de 60 mortos. Arafat e seus colaboradores
conseguiram salvar-se. Outra vez que pôde escapar foi no dia 7 de abril de 1992, quando o avião
em que viajava desapareceu no deserto da Líbia por causa de uma tempestade de areia. Três
pessoas morreram, mas o líder palestino foi localizado no dia seguinte com pequenos ferimentos.
Entretanto, no dia 1º de junho teve que ser operado na Jordânia para extrair um coágulo cerebral,
conseqüência do acidente aéreo. Depois de 12 anos de exílio no norte da África ele começou a
colocar em prática a instalação do Estado palestino. No dia 11 de julho de 1994 ele se despediu
de seus anfitriões tunisianos com honras de chefe de Estado a caminho da “autonomia” palestina,
que englobava apenas Gaza e Jericó. Arafat veio a falecer em 2004, de causas misteriosas, o que
levou a levantar a hipótese de seu assassinato.
[36] PERICÁS, Luiz B. Israel e Palestina. IV Internacional, São Paulo, maio de 2002.
[37] AHMED, Nafeez Mosaddeq. O sangue nas mãos de Israel. Quando criminosos de guerra
posam de vítimas e o mundo se inclina aceitando. In:
http://www.mediamonitors.net/mosaddeq24.html.
[38] CORN, Georges. Le Proche-Orient Éclaté 1956-1991. Paris, Gallimard, 1991.
[39] Que renderia um Prêmio Nobel da Paz, e depois um assassinato por “radicais islâmicos”, ao
seu signatário egipcio, o raïs Anuar El Sadat.
[40] ONU. Damage to the Lebanese Infrastructure During the Israeli Operation Grapes of
Wrath, abril de 1996.
[41] Rabin o “primeiro premiê nascido en Israel”, concluiu o Acordo Interino com Egito, que
conduziu à retirada israelense do Canal de Suez, em troca do livre tránsito de barcos israelenses.
Como resultado desse acordo, se firmou o primeiro Memorando de Entendimento entre o
governo de Israel e os EUA, garantindo o apóio estadunidense aos intereses israelenses no
cenário internacional, e a renovação da ajuda ianque a Israel. En fevereiro de 1992, Rabin foi
eleito presidente do Partido Trabalhista. Depois da vitória eleitoral de 1992, começou seu
segundo período como Primeiro Ministro e ministro da Defesa. Este período foi marcado por
dois acontecimentos históricos - os Acordos de Oslo com a OLP e o Tratado de Paz com
Jordânia. Depois de obter com Shimón Peres, ministro das Relações Externas, e Yasser Arafat, o
Premio Nobel de la Paz em 1994, iniciou as negociações com os palestinos sobre a autonomía de
Gaza e algumas áreas de Judéia e Samária, e sobre ol establecimento de uma Autoridade
Palestina. A 4 de novembro de 1995, ao retirar-se de uma reunião “pela paz”, Yitzhjak Rabin foi
assassinado por um ativista judeu de extrema direita.
[42] BLUMENTHAL, Sidney. The Clinton Wars. Londres, Penguin Books, 2003.
[43] Le Monde, Paris, 3 de abril de 2002.
[44] Wall Street Journal, Nova Iorque, 2 de abril de 2002.
[45] http://www.mopic.gov.ps/details.asp?subject_id= 55.
[46] The Palestine Monitor
(http://palestinemonitor.org/factsheet/poverty_and_destruction.htm#2).
[47] Ver: The Apartheid Wall Campaign (http://www.pengon.org/wall/report1.html); Israel’s
Apartheid Wall (http://www.lawsociety.org/wall/ wall.html) e Palestine Media Center
(http://palestine-pmc.com/apartheid.asp).
[48] Edward Said nasceu em Jerusalém em 1935 de uma família cristã. Em 1948, com a
fundação do Estado de Israel, ele e sua família foram obrigados a deixar a Palestina. Said
estudou e viveu no Egito e nos Estados Unidos, onde se formou na Universidade de Princeton e
foi professor de literatura inglesa na Universidade de Columbia, em Nova York. Coletâneas
lançadas no Brasil oferecem um panorama de seu pensamento: Cultura e Política, da Editora
Boitempo e Reflexões sobre o Exílio, Companhia das Letras; assim como Freud e os NãoEuropeus, também lançada pela Boitempo. Edward Said militou incansavelmente pela causa
palestina. Faleceu em 24 de setembro de 2003.
[49] A medida que o tempo passa, e não por acaso, acirra-se o debate sobre o Holocausto judeu,
que não é possível sequer resumir aqui. O regime iraniano se propõe, inclusive, organizar uma
conferência internacional para questionar a sua ocorrência, o que provavelmente suscitará o
interesse de alguns saudosistas do nazismo. De um modo geral, a corrente de interpretação
dominante emancipa o Holocausto dos objetivos sociais e políticos do nazismo, da burguesia
alemã, e da luta de classes em geral (poderia se dizer que da própria História, nas interpretações
que o remetem a um atavismo da alma humana, ou gentil), sublinhando seu caráter excepcional e
único (os genocídios africano, americano, armênio, etc., não poderiam se comparar a ele, devido
a que não comportavam uma tentativa consciente de extermínio de um povo). Até historiadores
que se reivindicam do marxismo, como Enzo Traverso, filiam-se a essa corrente. Outra corrente,
minoritária, trata de situá-lo dentro da luta (mortal) de forças sociais e políticas, no quadro da
crise européia da primeira metade do século XX (e como um aspecto central dela, enquanto crise
histórica do capitalismo), que conduziu à II Guerra Mundial. É o que faz, por exemplo, o
historiador (de origem judaica) Arno Mayer, no seu livro A Solução Final na História. A
insistência da corrente dominante no caráter excepcional e único do Holocausto deságua,
políticamente, na justificativa da existência de Israel contra qualquer direito nacional de qualquer
outro povo, ou contra a existência de qualquer base histórica para um Estado nacional, devido,
justamente, às condições excepcionais que presidem o seu nascimento e existência. O sionismo e
o projeto do Estado confissional na Palestina, no entanto, precederam o Holocausto. É preciso
levar em conta que os grandes debates históricos remetem, sempre, a grandes opções sociais e
políticas do presente, em última instância, à opções de classe.
[50] O historiador judeu Ilan Pappe teve palavras terminantes a respeito: “I think that there is a
game in Israel-Palestine: the charade of peace. But what it really means is that again these
politicians on both sides meet in beautiful hotels, with diplomats from all around the world to
discuss nothing, just chatting. And you see very important words such as peace process,
evacuation, disengagement, the end of occupation, creation of a Palestinian state. This is the
"peace industry" as Chomsky said. And on the field, nothing is happening… But, all around,
there is no partner to the chattering and futile exercise of diplomacy that the diplomats and
politicians on both sides. But the worrying side is that ever since Ariel Sharon declares in an
article to begin a new peace initiative in a previous peace initiative which is called the Road
map, ever since that happened, there is a very dangerous trend that everyone in the world
interested in the question of Palestine seems to take part in the game of peace. We have already
seen previous chapters in the game of peace, but before that, not every one took part in. This
time, what we call the Quartet – the European Union, the United Nations, Russia and the United
States – are all congratulating Ariel Sharon for his disengagement. And we have people in
Israel, who supposedly belong to the Peace camp, the Labour Party and from the Peace Now
Movement, who say the same things as the Quartet is saying, namely that they will leave Sharon,
the man who is leading Israel and the Palestinians into a new chapter of the peace-making in
Israel and Palestine… the conflict between Israel and Palestine is not about the occupation ; is
about the ethnic cleansing that Israel did in 1948 and which did not end for one day after 48. So
strategies for peace are not strategies for ending the occupation. This is how they felt our mind
with bubbles, ever since 1967 (…)This is what the Peace Now movement said, this is what the
American said, this is what the Swiss government are going to say, this is about Israeli
withdrawal from the West Bank and the Gaza Strip. No. This in not peace ; and Israeli
withdrawal from the Gaza Strip and the West Bank is an end of their crimes against humanity.
This has nothing to do with peace. Because the palestinian people in the occupied territories are
the only group of people, in the second half of the century, who have been living for 37 years
under the military occupation. This has nothing to do with peace. Can you imagine Switzerland
for ten years under military occupation ? Anyone here knows what a military occupation means.
That a military sergeant can shut you, close your shop, destroy your house at will, every moment
of the day, brutally, by 37 years. What does this have to do with peace ? Do we talk about
oppression in other place in the world and we need negotiate with governments, of ending the
oppression by giving something else ?” (PAPPE, Ilan. There is no peace movement in Israel. In:
www.cmaq.net/es/node.php?id= 21684, site do Centro de Médios de Información Alternativos de
Québec, 14 de julho de 2005; do mesmo autor: History of Modern Palestine. One land, two
peoples. Nova Iorque, Cambridge University Press, 2004).
[51] CLEMESHA, Arlene. Palestina e a “solução dos dois Estados”. IV Internacional, São
Paulo, junho de 2002.
[52] Cf. ALI, Tariq. The Clash of Fundamentalisms. Crusades, jihad and modernity. Nova Delhi,
Rupa & Co, 2002.
[53] BARSAMIAN, David e Tariq Ali. Palestina e Israel. In: Imperialismo & Resistência. São
Paulo, Expressão Popular, 2005, p. 182.
[54] Cf. KEPEL, Gilles. La Yihad. Expansión y declive del islamismo. Barcelona, Península,
2001.
[55] SAÏD, Edward. Palestina: temos que abrir a segunda frente, publicado em Rebelión, 15 de
abril de 2001, traduzido de Al-Ahram Weekly On-line.
[56] ROTSCHILD, Jon. How the arabs were driven out of Palestine, Intercontinental Press, nº
38, New York, 1973.
[57] The New York Times, 21 de janeiro de 1988.
[58] Entrevista a Der Spiegel, Bonn, 5 de março de 1995.
[59] AVISHAI, Ehrlich. Palestine, global politics and Israel judaism. In: Leo Panitch e Colin
Leys (Ed.). Socialist Register. Kolkata, Merlin Press/Bagchi & Company, 2003.
[60] Escrevendo em abril de 2002, a jornalista Denise Mendez descreveu: “Desde hace 3
semanas el ejercito mas moderno y mas sofisticado del mundo ha lanzado sus helicopteros,
tanques, aviones y cuerpos de infanteria contra un pueblo desarmado. A pesar de haber
prohibido la entrada de periodistas al territorio de guerra (lo mismo que la prohibición de
observadores de la Cruz Roja, de la ONU) el mundo ha visto el avance de los carros armados
que aplastan todos los obstáculos incluyendo carros y casas con sus ocupantes , la destrucción
sistemática de todos los edificios de la administración palestina , la sede de la Autoridad , la
radio, la televisión, el corte del suministro de agua y de energía eléctrica. El mundo ha visto los
arrestos y la humillaciones de los presos arrodillados, desnudados y marcados con numero, el
desangramiento de los heridos por prohibición de intervención de la Cruz Roja. El mundo ha
visto el patio del hospital de Ramallah donde se tuvo que cavar una fosa común para enterrar a
los muertos por prohibición de llevarlos al cementerio. El mundo ha visto Jenin reducida a
escombros por obra de los misiles y de los tanques , Jenin la más castigada porque su población
siguió a pesar de una semana de bombardeos, resistiendo al invasor calle por calle y casa por
casa. Todo el mundo se indigna ; hay manifestaciones de protesta en todas partes... Pero Sharon
no se deja impresionar, al contrario contesta con mucha soberbia "tsahal se retirarà de
Cisjordania cuando haya terminado su tarea , o sea cuando haya extirpado el terrorismo”. (...)
El crimen de Palestina sirve de prueba experimental. Se trata de realizar en vivo lo que se
experimenta con los filmes-catástrofe, para que la gente se vaya vacunando de la violencia con
la violencia. Si el mundo entero aprende a ver semejante escenas de horror que ninguna
autoridad internacional puede parar, se va a dividir entre los que se callan por miedo y los que
siguen resistiendo. Pero, dado que la lucha de Sharon es una lucha contra el terrorismo, y como
la lucha de Bush un combate del bien contra el mal , en fin de cuenta, los que seguirán
criticando la violencia anti-terrorista son, por deducción, necesariamente unos terroristas y con
toda legitimidad deberán ser eliminados”.
[61] INBARI, Pinhas. The Palestinians between Terrorism and Statehood. Brighton, Sussex
Academic Press, 1996.
[62] Los Angeles Times, 10 de janeiro de 1988.
[63] WARSHAWSKI, Michel. Crise palestino-israelienne. Rouge, Paris, outubro de 2000.
[64] WARSHAWSKI, Michel, Bombes sur Gaza. Rouge, Paris, novembro de 2000.
[65] In: Quatrième Internationale, Paris, junho de 1948.
[66] SCHOENMAN, Ralph. Op.Cit., pp.117-118
[67] ACHCAR, Gilbert. A estratégia imperialista dos EUA no Oriente Médio. Outubro n° 11,
São Paulo, 2° semestre de 2004.
[68] WARSHAVSKI, Michel. The principle of bi-nationalism and the right of selfdetermination. News from Within, 13 de marco de 1998; e também: One year after: second
thoughts on the DOP. News from Within, 10 de novembro de 1994.
[69] LEON, Abraham. Concepción Materialista de la Cuestión Judia. Buenos Aires, El Yunque,
1975.
[70] Apud GARAUDY, Roger. Palestina, Tierra de los Mensajes Divinos. Madri, Fundamentos,
1986, p.403.
[71] Declaração Política de Al Fatah, 1° de janeiro de 1969.
[72] COHN-SHERBOK, Dan e Dawoud El-Alami. O Conflito Israel-Palestina. São Paulo,
Palíndromo, 2005, p. 201.
[73] BACIC OLIC, Nelson. Oriente Médio. Uma região de conflitos. São Paulo, Moderna,
1991.Bacic Olic. Oriente M o futuro Estado
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[74] RAPOPORT, Meron. Quitter Gaza pour mieux garder la Cisjordanie. Le Monde
Diplomatique, Paris, agosto 2005.
[75] Israele, via alla barriera di Gerusalemme. Corriere della Sera, Milão, 11 de julho de 2005.
[76] Cf. CLEMESHA, Arlene. A retirada da Faixa de Gaza e a armadilha política de Israel na
Palestina. In: www.icarabe.org.br, a partir de agosto de 2005.
[77] Folha de S. Paulo, 13 de agosto de 2005.
[78] A retirada israelense de Gaza "é um passo histórico" que torna mais próxima a paz no
Oriente Médio, afirmou o presidente dos Estados Unidos, George W. Bush. "Após décadas de
promessas quebradas e vidas perdidas, a paz está ao alcance na Terra Santa", disse Bush num
discurso, minutos depois de Israel anunciar oficialmente o fim da evacuação dos 21
assentamentos na Faixa de Gaza. O presidente destacou que a retirada israelense é "um passo
histórico que reflete a liderança audaz" do primeiro-ministro israelense, Ariel Sharon. Neste
sentido, Bush disse que Sharon e o povo israelense "deram um passo corajoso e doloroso" ao
desocuparem totalmente Gaza e alguns assentamentos na Cisjordânia. Após este passo, destacou
Bush, o caminho "fica muito claro": "Estamos trabalhando para um retorno ao Mapa de
Caminho, o plano de paz apoiado por EUA, ONU, União Européia e Rússia" (grifo nosso). Ao
mesmo tempo, o presidente americano ressaltou o apoio de Washington às autoridades
palestinas. "Estamos ajudando os palestinos para que se preparem para o autogoverno e para que
derrotem os terroristas que atacam Israel e se opõem a um Estado palestino pacífico",
acrescentou Bush no discurso a veteranos de guerra. Bush destacou que o povo palestino
manifestou seu desejo de alcançar a paz e a soberania e de ter eleições livres, e que o presidente
da Autoridade Nacional Palestina (ANP), Mahmoud Abbas (Abu Mazen), "rejeitou a violência e
deu passos em direção à reforma democrática". Os EUA concederiam uma ajuda econômica a
Israel para o re-assentamento dos colonos evacuados.
[79] GAWENDO, Michel. Porta a porta, Israel inicia a saída de Gaza, Folha de S. Paulo, 14 de
agosto de 2005.
[80] Bush também prometeu US$ 50 milhões aos palestinos para projetos de habitação e infraestruturas em Gaza. US$ 50 milhões para um milhão e meio de palestinos (pouco mais de 30
dólares per capita), e 600 milhões para menos de 9 mil colonos israelenses!
[81] Folha de S. Paulo, 17 de agosto de 2005.
[82] Folha de S. Paulo, 14 de agosto de 2005.
[83] Espero que alguien mate a Sharon, Clarin, Buenos Aires, 19 de agosto de 2005.
[84] BARGHOUTHI, Mustafa. O pesadelo de Sharon, Mundo Arabe, 8 de agosto de 2005.
[85] BEILIN, Yossi. Idéia de Sharon é não fazer nada depois da retirada. Folha de S. Paulo, 15
de agosto de 2005.
[86] In: http://www.pletz.com/artigos/pa2904.html, a partir de 2 de novembro de 2004.
[87] AVINERI, Shlomo. O caminho unilateral rumo à paz. Valor, São Paulo, 17 de agosto de
2005. O mesmo Prof. Avineri se ilustrava através de análises como a que segue: “O Dr. Shlomo
Avineri manifestou a necessidade diálogo e duma solução pacífica de dois estados; concebeu a
situação do conflito essencialmente pessimista, criticando que até hoje não teria sido feito
nenhum pronunciamento claro da parte dos palestinos e do mundo árabe a respeito dum direito
intocável de existência do Estado de Israel. Na base disso e em vista dos últimos atentados
suicidas, agora não haveria base de confiança par negociações possíveis. Avineri advogou, por
conseguinte, para uma demarcação rigorosa de fronteira entre Israel e as regiões palestinas
(Faixa de Gaza e Banco Ocidental), para proteger Israel consideravelmente de atentados
ulteriores, esperando um “resfriamento do conflito em ambos os lados”. A isso, Alvineri
conferiu uma recusa clara a Yasser Arafat e ao sistema político deste, votando para uma tropa
neutra de proteção nas regiões dos palestinos, a qual deveria possibilitar e controlar a construção
de estruturas democráticas” (grifos nossos). In: www.jcrelations.net/pt/?id=1789, site do
International Council of Christians and Jews.
[88] KUTTAB, Daoud. Depois da retirada de Gaza. Valor Econômico, São Paulo, 18 de agosto
de 2005.
[89] La Nación, Buenos Aires, 4 de janeiro de 2006.
[90] Cf. AGHA, Husssein e Robert Malley. El poder palestino, sin aliento. Le Monde
Diplomatique / El Dipló, Buenos Aires, janeiro de 2006.
[91] SMITH, Craig S. Hamas “político” seguirá hostil a Israel. Folha de S. Paulo, 15 de janeiro
de 2006.
[92]. Deixamos aqui de lado a argumentação religiosa, pois além de indiscutível, no sentido de
não subordinada a qualquer discussão racional, ela só tem poder de convicção sobre os
convencidos de antemão.
[93] Cf. LUZZANI, Telma. La redistribución del ingreso y la paz, grandes urgências para el
futuro israelí. Clarín, Buenos Aires, 15 de janeiro de 2006.
[94] BREYTENBACH, Breyten. Carta aberta ao General Sharon. In: Bei Dao et al. Viagem à
Palestina. Rio de Janeiro, Ediouro, 2004, p. 67 e 69.
[95] BENN, Aluf. Ariel Sharon, um homem de ação. Folha de S. Paulo, 8 de janeiro de 2006.
[96] BETZALEL, Itzhak. Amir Peretz, el Lula del sionismo? El Obrero Internacional nº 4,
Buenos Aires, dezembro de 2005.
[97] El sionismo ante um cambio de régimen. Prensa Obrera n° 928, Buenos Aires, 9 de
dezembro de 2005.
[98] BETHZALEL, Yitzhak. Estruendoso triunfo de Hamas. Prensa Obrera n° 932, Buenos
Aires, 2 de fevereiro de 2006.
[99] KHOURI, Rami G. Ocidente não entende a vitória do Hamas. Folha de S. Paulo, 29 de
janeiro de 2006.
[100] BEN-DOR, Oren. A new hope? Hamas’s victory, Counterpunch, 21 de janeiro de 2006.
[101] GLANZ, James. Democracia liberta forças incômodas para os EUA. O Estado de S. Paulo,
5 de fevereiro de 2006.
[102] VASCONCELOS, Álvaro de. O paradoxo democrático islâmico. Valor Econômico, São
Paulo, 7 de fevereiro de 2006.
[103] www.palestine-info.co.uk
[104] Lhe fazendo eco, o secretário-geral da ONU, Kofi Annan, disse que qualquer grupo que
quiser participar do processo político democrático “deve se desarmar”. Ao ser perguntado se o
Hamas deveria renunciar à "violência" se pretende participar de um governo palestino, Annan
declarou, durante o Fórum Econômico Mundial em Davos, que "há uma profunda contradição
em carregar armas e participar de um processo democrático e ter cadeira no parlamento". "E eu
estou certo de que eles (Hamas) estão pensando nisso", afirmou. Annan disse ainda que está
pronto para trabalhar com o governo eleito e que telefonou para o presidente palestino,
Mahmoud Abbas, para cumprimentá-lo pela organização. O porta-voz de Annan disse que o
secretário-geral "vê essas eleições como um passo importante rumo à conquista de um Estado
palestino".
[105] O sucessor de Arafat à frente do Al Fatah é oficialmente Faruk Kadumi, que vive exilado
na Tunísia, de onde dirige o departamento político da OLP, que se ocupa das questões de
relações exteriores. Mahmud Abbas, co-fundador do movimento, preside as reuniões do Comitê
Central, principal instância do Fatah, mas a autoridade mais popular é Marwan Barghuti, que
cumpre pena de prisão perpétua em Israel e disputou as eleições. O último congresso do
movimento, o quinto desde a sua criação, foi realizado em 1989, na Tunísia. A conferência geral
prevista para agosto de 2005 foi adiada indefinidamente.
[106] BLINDER, Caio. Êxito do Hamas cria dilema para os EUA, Folha de S. Paulo, 28 de
janeiro de 2006.
[107] Fogo, tiros: Fatah protesta nas ruas. O Estado de S. Paulo, 28 de janeiro de 2006.
[108] CREMONESI, Lorenzo. Niente aiuiti UE ai palestinesi se Hamas non riconosce Israele.
Corriere della Sera, Milão, 30 de janeiro de 2006.
[109] Middle East Report, agosto de 2005
[110] LE BARS, Stéphanie e Gilles Paris. Entrée du Hamas au gouvernement? Le Monde, Paris,
20 de janeiro de 2006.
[111] Disse também que "o que também é positivo é que foi um alerta para a liderança,
obviamente as pessoas não estão contentes com o status quo".
[112] Mansur estudou lei islâmica na universidade de An Nayah, em Nablus, e, até se tornar
candidato do Hamas para as eleições legislativas, ganhava a vida como imã em várias mesquitas.
Entre os anos 1992 e 1996, passou a maior parte de seu tempo em prisões israelenses e durante
os últimos anos de confronto esteve detido por Israel sem acusações ao longo de 14 meses.
[113] O Dia Digital JB Online, 27 de janeiro de 2006.
[114] O governo israelense esteve reunido, de imediato, por várias horas, para analisar as
conseqüências da vitória do Hamas. A reunião foi presidida pelo primeiro-ministro interino,
Ehud Olmert, e dela participaram a ministra de Exteriores, Tzipi Livni, o responsável de Defesa,
Shaul Mofaz, o chefe dos serviços secretos, Yuval Diskin, o chefe das Forças Armadas, general
Dan Halutz, e outros altos comandantes dos serviços de inteligência. Os dirigentes dos serviços
de inteligência traçaram junto ao governo cenários possíveis após a vitória do Hamas e
concordaram que o pior de todos eles seria mesmo o de um governo formado exclusivamente por
membros do grupo islâmico.
[115] Olmert anuncia plano para anexar blocos de colônias na Cisjordânia. O Estado de S. Paulo,
8 de fevereiro de 2006.
[116] Judíos y palestinos marchan unidos contra el muro que divide Cisjordânia. Clarin, Buenos
Aires, 21 de janeiro de 2006.
[117] PAPPE, Ilan. Fortaleza Israel. In: www. rebelion.org. 26 de maio de 2005.
[118] DAVID, Peter. Hard going. In: The Economist, The World in 2006, Londres, janeiro de
2006.