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Seca em Portugal: as preocupações dos agricultores de norte a sul do país

O impacto da seca na região Norte, no Oeste e no Alentejo.

Seca em Portugal: as preocupações dos agricultores de norte a sul do país

Agricultores do Norte precisam de fevereiro chuvoso para salvar próximas culturas

A seca que se faz sentir no Norte “ainda não é uma situação alarmante”, mas os agricultores pedem um fevereiro chuvoso para que as culturas do próximo ano não fiquem comprometidas.

Pelo que lhe vão dizendo os associados da APT – Associação dos Agricultores e Pastores do Norte, a seca “ainda não é uma situação alarmante” no Norte do país, conta à Lusa o diretor João Morais.

O engenheiro agrícola esclarece que a região sofre de “uma seca meteorológica, não uma seca hidrológica, como existe no Sul”, e isso acontece “porque ainda há água nos solos”.

Para o diretor-geral da Associação dos Jovens Agricultores de Portugal (AJAP), Firmino Cordeiro, “é quase impressionante estarmos a falar de seca em meados de janeiro”.

“O que se passa é que, para além desta coisa da covid-19, que nos tem afligido a vida, temos de lidar com uma coisa ainda mais complicada, que são as alterações climatéricas, com os transtornos que estão a dar em todas as geografias do mundo, e em particular no nosso país”, prossegue.

Este dirigente explica que, apesar de o Norte ser mais chuvoso do que o resto do território continental, a região tem, “por um lado, o Norte mais litoral, Entre Douro e Minho”, que “deve ser das zonas do país onde há mais chuva, mais humidade”.

“Por outro lado, Trás-os-Montes e Alto Douro, nomeadamente na denominada ‘terra quente transmontana’, é das zonas do país onde chove menos, contando mesmo com algumas zonas do Alentejo profundo”, assinala.

Com uma situação de falta de água mais grave na região de Trás-os-Montes, Firmino Cordeiro considera que se vive uma “situação extremamente delicada” até mesmo no litoral.

“Chegar a meados de janeiro com pouca água acumulada no solo é terrível. É terrível para as culturas que tradicionalmente se fazem nessa região mais litoral, como o vinho verde, milho de silagem, milho branco, outras fruteiras, kiwi, limoeiros, horticulturas ao ar livre, quase sem regadio, na zona de Póvoa de Varzim e outras zonas daquela mesma região do Entre Douro e Minho”, explicou.

Quando a água nos solos começar a escassear, é preciso começar a regar e “a rega é um problema, porque é retirada de poços e furos, que, não chovendo, ficam com uma capacidade de reposição muito mais delicada”.

Já na região de Trás-os-Montes e Alto Douro, as culturas de sequeiro, como “o olival tradicional, o amendoal, as vinhas na região do Douro” vivem em “solos muito débeis, à base de xisto, com pouca matéria orgânica, solos com pouca capacidade de retenção da água”.

“Nessas zonas, a água, quando chove de forma regular no inverno e na primavera, fica retida naquelas camadas. Se ela desaparece, se ela não entra, ela não está lá. Dizima a cultura deste ano e dificulta a cultura do ano seguinte, porque a planta tem de acumular reservas para as futuras rebentações do ano a seguir”, explica o dirigente da AJAP.

Mesmo com uma seca nos meses de inverno, “as árvores são plantas fantásticas que conseguem recuperar quando aquilo que lhes falta chega, desde que não seja demasiado tarde”.

É por isso que Firmino Cordeiro defende que, “até final de fevereiro, uma ou duas boas semanas de chuva podiam resolver muitas das falhas deste momento”.

Também João Morais considera que o problema “poderá ser colmatado”, se houver chuva em fevereiro.

O dirigente da APT refere que os agricultores e também os pastores de gado bovino, caprino e ovino “ainda têm reserva” e que, “à partida, a situação ainda está controlada, mas, se não tivermos chuva nos próximos meses, vai ser bastante alarmante”.

“Vamos rezar aos santinhos, para quem acredita, e quem não acredita, que faça melhor por este país e pelo mundo, porque isto é o problema do século e as pessoas ainda estão a olhar um bocado para o lado”, remata.

Horticultores da região Oeste já regam culturas nesta altura do ano

A falta de chuva começa a preocupar a Associação Interprofissional de Horticultura do Oeste (AIHO), que alerta que há agricultores a regar as culturas, o que não é costume nesta altura do ano, disse hoje o presidente Sérgio Ferreira

“A situação preocupa se continuar sem chover e se viermos a ter falta de água nos próximos meses, porque não temos grandes reservas de água e a que temos é à superfície, afirmou Sérgio Ferreira à agência Lusa.

Contudo, “por enquanto ainda têm água” neste período.

Ao contrário do que é habitual nesta altura do ano, os agricultores têm estado a regar as culturas devido à falta de água, dada a fraca precipitação das últimas semanas, acrescentou.

“Estamos a fazer rega em terrenos que nem estavam preparados para isso nesta altura do ano”, sublinhou.

O dirigente alertou que é cada vez mais difícil combater a falta de água com o aumento do preço da eletricidade e dos combustíveis, indispensáveis para captar água do subsolo ou das linhas de água, uma vez que os sistemas de regadio são raros ou inexistentes na região.

“Com o aumento dos custos energéticos, as regas são cada vez mais caras” e isso “preocupa”, devido à falta de retenção da água existente à superfície ou no subsolo.

O setor da horticultura fatura cerca de 500 milhões de euros, emprega entre sete a oito mil trabalhadores quer nas explorações agrícolas, quer nas centrais de processamento e transformação dos produtos, e escoa os produtos para exportação e para os principais mercados nacionais, estima a Associação Interprofissional de Horticultura do Oeste.

A maioria das explorações está concentrada em Torres Vedras.

Em julho, este município, duas associações de regantes e outras duas entidades estabeleceram parcerias para o estudo de soluções para o aproveitamento de água para a agricultura neste concelho.

A horticultura é o principal subsetor agrícola mais dependente de água na região.

A região Oeste é composta pelos concelhos de Alcobaça, Bombarral, Caldas da Rainha, Nazaré, Óbidos e Peniche, do distrito de Leiria, e por Alenquer, Arruda dos Vinhos, Cadaval, Lourinhã, Sobral de Monte Agraço e Torres Vedras, do distrito de Lisboa.

Agricultores de Portalegre “apreensivos” devido à falta de chuva

A Associação dos Agricultores do Distrito de Portalegre (AADP) mostrou-se hoje “apreensiva” pela falta de chuva na região, porque, apesar de a situação ainda não ser “dramática”, as culturas de primavera/verão “estão muito longe” de estarem asseguradas.

“As culturas de primavera/verão precisam de muita água e, por enquanto, não estão garantidas, estão muito longe de estarem garantidas”, alertou à agência Lusa a presidente da AADP, Fermelinda Carvalho.

Quanto às culturas de outono/inverno, segundo a responsável, estão nesta altura “a precisar de mais água”, mas, por agora, a situação “ainda não é dramática” para a maior parte.

“Mas, dentro de pouco tempo, é [dramático], se não chover”, alertou Fermelinda Carvalho.

A dirigente relatou ainda que, devido à falta de chuva, as pastagens “estão muito fraquinhas, muito atrasadas”, situação que leva o setor a considerar que este está a ser um ano agrícola menos positivo.

“Estamos apreensivos, não estamos perante um bom ano agrícola”, frisou, manifestando ainda alguma expectativa quanto à primavera, período do ano que “é fundamental na agricultura”.

A presidente da AADP argumentou que, “por vezes, na primavera as coisas recompõem-se, desde que chova muito”, mas, neste momento, a chuva que já caiu “é insuficiente”.

Os “níveis muito baixos” que as barragens começam a apresentar é, igualmente, uma situação que está a preocupar o setor, segundo a responsável.

“Ao nível de água no campo, tivemos um início de outono que não foi mau. Choveu qualquer coisa, mas para as reservas de água está muito mau e começa a ser muito preocupante, até porque não temos perspetivas” para os próximos tempos de que vá “chover a sério”, acrescentou.

Contactado pela Lusa, Luís Rodrigues, da Associação de Regantes e Beneficiários do Caia, em Elvas (Portalegre), indicou que a campanha deste ano “está assegurada”, bem como o fornecimento de água às populações.

Em termos agrícolas, o responsável alertou que, devido à irregularidade da precipitação, esse fator provoca transtornos aos agricultores, que não conseguem programar campanhas a dois ou três anos.

Luís Rodrigues indicou ainda que a albufeira de Caia apresenta 109 milhões de metros cúbicos de água armazenados, estando a 57% da sua capacidade total, que é de 203 milhões de metros cúbicos de água.

A climatologista Vanda Cabrinha disse à Lusa, na terça-feira, que a situação de seca em Portugal, especialmente no Sul, começa a ser preocupante, mas considerou que ainda não chegou aos piores níveis dos últimos 20 anos para esta altura.

A situação de seca “entre fraca e moderada” já se verificava no último trimestre de 2021 e não há para já previsões de chuva significativa, pelo menos até ao fim de janeiro, segundo a mesma climatologista.

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