• Juliana Benetti
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Espelho d'água do Largo do Machado (Foto: WikiRio / Bbzita82 / CreativeCommons)

Espelho d'água do Largo do Machado (Foto: WikiRio / Bbzita82 / CreativeCommons)

Nem todo mundo sabe, mas o Rio de Janeiro foi a primeira cidade do mundo a ser considerada Patrimônio Mundial da Unesco dentro da categoria Paisagem Cultural Urbana (outras cidades brasileiras já haviam sido nomeadas em diferentes categorias). O que também muita gente pode não ter conhecimento é que existe um nome por trás dessa honraria: Roberto Burle Marx, o maior paisagista da história brasileira e um dos mais importantes do mundo. 

Criador do conceito de jardim tropical moderno, Burle Marx foi um dos principais responsáveis pela identidade visual que encontramos hoje na capital fluminense, tendo sido responsável pela criação direta de diversos jardins públicos. Entre os mais especiais, é válido mensionar o jardim do Museu de Arte Moderna do Rio (MAM), o espelho d'água do Largo do Machado, e, o mais importante, o Parque do Flamengo. Infelizmente, todos os mencionados se encontram em situação de abandono, ou muito ruim.

Parque do Flamengo (Foto: Rio Capital Mundial da Arquitetura / Divulgação)

Parque do Flamengo (Foto: Rio Capital Mundial da Arquitetura / Divulgação)

De acordo com reportagem do O Globo, esses lugares, e outros, tornaram-se espaços comuns com lixo acumulado, gramados mal cuidados e bueiros quebrados. Em entrevista ao veículo, Isabela Ono, diretora do Instituto Burle Marx, disse que muitos dos espaços projetados pelo paisagista, uma das suas muitas profissões artísticas, e seus colaboradores, não são conhecidos e, por isso, não compreendidos por parte da população como um patrimônio.

Entre as diversas consequências da degradação paisagística, sempre existirá a possibilidade do Rio perder o status como patrimônio mundial. Liverpool, por exemplo, perdeu em julho deste ano o seu título conquistado em 2004. Na decisão, o argumento usado pela UNESCO foi que reformas prejudicaram a integridade da cidade. Entretanto, independente dos títulos, existe uma enorme importância em conservar o pensamento paisagístico do artista. Isabela pondera que, em particular, o Parque do Flamengo precisaria de um olhar mais delicado por ser um patrimônio vivo, público e democrático.

Praça Senador Clóvis Salgado Filho

Criada para ser um dos principais cartões de visitas no Rio de Janeiro – literalmente pensada no recebimento de turistas –, a praça Senador Clóvis Salgado Filho, que fica em frente ao aeroporto Santos Dumont, encontra-se quase totalmente descaracterizada e com poucos cuidados. Segundo o véiculo, há dois anos já haviam problemas, como lago sem água e tomado pela sujeira, parte da grama morta e ralos quebrados.

Em visita realizada recentemente, foi constastado que a situação apenas piorou. "É um jardim que Burle Marx criou para receber os turistas. Tinha exemplos de nossa flora local. A ideia era ambientar o visitante com a natureza do Rio de Janeiro, mas perdeu completamente esse sentido. É um pedaço do Aterro que está muito malcuidado", disse Vera Siqueira, professora da UERJ e historiadora de arte, em entrevista

Sítio Burle Marx

Em contrapartida aos espaços mencionados, o sítio Burle Marx floresce e, literalmente, cresce, tendo se tornando em julho deste ano Patrimônio Mundial também pela UNESCO. Ainda que existam questões urbanísticas claras que ajudam na preservação do local, como o fato de ser mais isolado e longe do tumulto urbano, a maior diferença entre a Praça Senador Clóvis Salgado Filho e o sítio é principalmente o tamanho do investimento, por exemplo.

Livro sobre o Sítio Roberto Burle Marx, no Rio de Janeiro, também será disponibilizado na versão impressa (Foto: Oscar Liberal / Divulgação)

Sítio Roberto Burle Marx, no Rio de Janeiro (Foto: Oscar Liberal / Divulgação)

O paisagista Roberto Burle Marx morou SRBM entre 1973 e 1994 e doou o espaço ao Iphan na década de 1980 (Foto: Halley Pacheco de Oliveira / Wikimmedia Commons)

O paisagista Roberto Burle Marx morou SRBM entre 1973 e 1994 e doou o espaço ao Iphan na década de 1980 (Foto: Halley Pacheco de Oliveira / Wikimmedia Commons)

O sítio Burle Marx conta hoje com mais de 20 jardineiros, dois botânicos e duas engenheiras agrônomas. Além disso, o BNDES, o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social, investiu na propriedade R$ 5,4 milhões, e o Iphan, Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, R$ 3,3 milhões. Os valores podem mencionados podem parecer alto, mas a importância da preservação do trabalho de Burle Marx é indiscutível. Ao todo, ele criou um acervo botânico com mais de 3,5 mil espécies.

"O Sítio Burle Marx é tombado nas três esferas, a municipal, a estadual e a federal. Mesmo assim, a conservação dele é feita porque é Iphan quem banca, dentro do seu orçamento, com todas as dificuldades que enfrenta. Tem cuidados, os jardineiros são muito dedicados. Mas só o tombamento não adianta, assim como o reconhecimento internacional, porque há bens que foram chamados de patrimônio mundial antes mas que, atualmente, estão sendo retirados dessa lista porque não mantiveram a sua integridade, como eles chamam.", complementa Vera.