As crianças e as amizades: um guia para decifrá-las (e para nos acalmarmos) - Pumpkin.pt

As crianças e as amizades: um guia para decifrá-las (e para nos acalmarmos)

guia amizades crianças

Vamos fazer amigos!

Os últimos dois anos letivos têm sido atípicos, e interferiram muito com as rotinas das abobrinhas.

A ansiedade iniciou sessão e esteve presente em todos os grupos de pais e mães no whatsapp: “os vossos também têm que usar máscara para ir fazer xixi?”, “a minha não pode levar comida de fora da escola!”, “o Dinis ontem disse-me que brincou sozinho, são normas da escola por causa do COVID ou aos quatro anos é um anti-social do pior/não tem amigos/sofre bullying“?

A amizade na primeira infância é maravilhosa, e uma das primeiras valências sociais que as crianças adquirem. Vamos dar-vos algumas ferramentas para proteger as vossas abobrinhas (e o vosso coração).

A emoção de os ver crescer para lá de nós

Ver os nossos filhos percorrer mundos onde nós não estaremos sempre presentes para os proteger pode ser muito assustador – mais para nós do que para eles. É natural ter pensamentos pouco ortodoxos quando sabemos que as abobrinhas foram empurradas, arranhadas, mordidas ou postas de parte por outras crianças.

Esta urgência de proteção é na verdade um instinto biológico, já que fomos, como pais, programados para ajudar a nossa prole a sobreviver.

E claro que não vamos à escola empurrar de volta uma criança que podia ser nossa filha (não vamos!), mas entendemos perfeitamente essa sede de vingança perante a suspeita mais ou menos confirmada de que as nossas crias estão a ser agredidas física ou psicologicamente, principalmente quando temos também mais ou menos confirmada a certeza de que não conseguem ainda defender-se.

No entanto, é importante perceber que o nosso filho estar envolvido num conflito nem sempre significa que seja vítima de bullying, tal como brincar sozinho não é sinónimo de solidão ou de incapacidade para fazer amigos.

Até aos 3 anos, as crianças interagem principalmente através da brincadeira em paralelo; ou seja, brincam ao lado umas das outras, mas não umas com as outras. É entre os 3 e os 5 anos que os miúdos aprendem a estar juntos na mesma atividade, embora nesta altura seja muito normal que prefiram, ainda, a companhia dos pais, e não tanto a de outras crianças.

É nesta idade que a brincadeira ganha um carácter de representação; adoram brincar aos pais e às mães, aos super-heróis e aos animais da selva. A brincadeira mais agressiva também é esperada nesta fase, principalmente quando os contactos com as outras crianças são ainda muito iniciais, precoces ou acontecem depois de um longo período de afastamento (olá, quarentena!).

crianças fazer amizades

As crianças são egocêntricas, preocupam-se acima de tudo com elas próprias, e estão ainda a desenvolver capacidades como a da partilha – tudo nosso, nada deles, já diriam os outros -, a da paciência (quem tem uma criança que odeia esperar pela sua vez levanta a mão!) e a da participação nas dinâmicas sociais e de grupo, a típica “boa educação” que tantas vezes parece faltar-lhes apesar de até os termos inscrito naquele curso de boas maneiras e saber estar (é mentira).

A empatia, por exemplo, só começa a desenvolver-se a partir dos 5 anos. No entanto, é muito raro que, nestas idades, lhes ocorra “ficar chateado” com alguém por mais do que dez minutos. As crianças ofendem-se muito facilmente e, felizmente ou não, têm a capacidade de perdoar muito rapidamente também.

Por isso, é normal que à segunda-feira a vossa menina diga que a Constança foi muito má para ela, vocês sintam uma profunda raiva gigantesca do raio da miúda que fez a vossa chorar, e logo na terça-feira levem com ela em vossa casa a comer os vossos iogurtes em amena cavaqueira com o vosso tesouro mais precioso. É a emocionante vida social de uma criança do pré-escolar a acontecer.

A zanga? Ah, provavelmente queriam as duas ser a bebé e nenhuma a mãe. Chato.

Brincar sozinho não é sinónimo de bandeira vermelha

Nem azul, verde, amarela ou qualquer outra cor. Há uma diferença substancial entre ser solitária, excluída e gostar de estar um bocadinho em paz para se acalmarem ou diminuirem os estímulos. As crianças também se sentem cansadas da brincadeira, do convívio e do barulho, por incrível que pareça.

Apesar de as personalidades se cimentarem mais tarde, é no jardim de infância e na pré-primária que começam a revelar-se, e tal como nós, há crianças que adoram correr, saltar e suar, e outras que preferem sentar-se com um livro ou um puzzle.

Só faz sentido falar com os educadores quando a criança começar a queixar-se, regularmente, de ser posto de parte, ou se vos disser, constantemente, que o Zé Manel lhe bateu. É provável que o adulto presente vos consiga dar um contexto mais amplo do problema (será que o nosso filho não bateu no Zé Manel primeiro?), mas que também possa ficar atento e agir se necessário.

Como somos todos diferentes, há crianças que podem não contar que algo as incomoda, e aí sim convém estar atento aos sinais: não dormem bem, deixaram de comer, recusam-se a ir à escola? Então se calhar passa-se mesmo alguma coisa. E é importante perceber o quê. Procurem ajuda profissional para que o vosso filho entenda que não tem culpa e se fortaleça.

O que posso fazer para ajudar o meu filho a fazer amigos?

fazer amigos crianças 2

A criança não se sente confiante para interagir com as outras? Porquê? Precisa de ser mais estimulado? Que seja!

Brincar e interagir são facetas essenciais e intuitivas do ser humano. Há, em todos nós, uma necessidade elementar de socialização e, para todos nós, os amigos ideais. Às vezes encontramo-los com 3, outras vezes com 10, às vezes com 18 – e até aos 30! Desde que ninguém lhes faça mal, então nada de errado há em preferir brincar sozinho ou em ter poucos amigos. O vosso filho pode simplesmente não se ter cruzado com a criança certa.

Ensinem-lhes a importância do respeito, da diferença, da tolerância, da gentileza e da bondade. Sendo boas pessoas, todos teremos amigos, mais cedo ou mais tarde. Incentivem-nos a ajudar outros em dificuldade, em estender a mão, a defender os mais frágeis.

Marquem “encontros para brincar” com outras crianças filhas dos vossos amigos, reforcem as interações positivas, não participem demasiado e deixem-nos ir tomando conta da situação.

Facilitar o encontro com os “amigos certos” pode passar também por inscrever as crianças em atividades extracurriculares de que gostem muito: o gosto em comum é o primeiro passo para a partilha.

Livros sobre a amizade:

Contem-lhes histórias sobre amizade, partilha e sobre como fazer amigos. Deixamos alguns dos nossos favoritos!

Somos Amigos?, de Anabel Fernández Rey

livros somos amigos

Somos amigos? é um álbum direcionado para pré-leitores e primeiros leitores que aborda a construção da amizade entre um menino e um urso: duas personagens à partida muito diferentes, mas que irão complementar-se ao ajudarem-se mutuamente.

Amigos, de Eric Carle

amigos eric carle

Era uma vez dois amigos que andavam sempre juntos. Juntos brincavam e corriam e dançavam e contavam segredos um ao outro. Mas um dia o rapaz ficou sozinho. A sua amiga partira… “Amigos” é a história de uma grande amizade entre um rapaz e uma rapariga que partilham jogos e confidências… até ao dia em que a distância os separa.

Eric Carle evoca em “Amigos” as recordações da sua infância em Nova Iorque, a sua cidade natal, que deixou aos 6 anos, quando os seus pais decidiram regressar à Alemanha, de onde eram originários.

A Árvore da Escola, de Antonio Sandoval

a árvore da escola

No pátio da escola havia uma árvore. Só uma. O Pedro gostava de correr perto daquela árvore durante o recreio. Quando passava ao seu lado olhava-a de soslaio, para não chocar com ela. Um dia parou e reparou nela.

Era fininha, com ramos delgados, pareciam de arame, e tinha algumas folhas secas. Pedro aproximou-se e acariciou-lhe o tronco. De repente, brotou uma folha nova. “A Árvore da Escola“, com texto de Antonio Sandoval e ilustrações de Emilio Urberuaga. conta a história de uma espécie botânica única no mundo: uma árvore que se alimenta de carinho e companhia.

Uns raminhos frágeis e delgados florescem e transformam-se numa árvore frondosa, capaz de receber ninhos e passarinhos, baloiços e crianças, e até uma cabana que se faz biblioteca. A certa altura, da árvore nasce uma semente e o ciclo de carinho e crescimento recomeça com uma nova árvore e uma nova escola…

Uma história bastante acessível ao pré-escolar e que permite abordar a importância do cuidado às plantas, o ciclo de vida e, de uma forma mais geral, o quão necessário são a amizade e o amor para que qualquer ser vivo possa crescer forte e saudável.

Um Amigo para o Ursinho, de Steve Smallman

Chegou a primavera! O Ursinho acordou de um longo inverno cheio de pressa para ir cheirar as flores, explorar a natureza, dançar, pular… e, até, fazer um amigo! Enfim, tantas coisas para o que lhe parecia pouquíssimo tempo. Conseguirá dedicar tempo para realmente apreciar tudo isso? E perceberá que o amigo que procurava esteve sempre ao seu lado?

Um Amigo para o Ursinho” é um livro sobre amizade e sobre mindfulness, sobre viver o momento, para ursinhos muito ocupados!

O Lobo que Tinha um Novo Amigo, de Orianne Lallemand

o lobo que tinha um novo amigo

Certo dia, um lobo branco, pequenino e com óculos chega à Floresta. Ele é muito divertido e engraçado, e o Lobo e os seus amigos adoram-no, mas ele também é irrequieto e desastrado, e as suas asneiras chateiam os novos amigos.

O Lobo que Tinha um novo Amigo” é uma história sobre aceitar quem é diferente e sobre o próprio aceitar a sua diferença, porque, afinal, somos todos diferentes.

Malaquias faz um Novo Amigo, de Mário Cordeiro

malaquias faz um novo amigo

Empatia é a capacidade de nos aproximarmos dos sentimentos dos outros e fazermo-los nossos, pois desta forma seremos mais capazes de os acompanhar na dor e na tristeza, na alegria e nos sucessos.

Solidariedade é sermos capazes de dar um pouco de nós, do nosso tempo, das nossas posses, em função das necessidades dos outros, por quem sentimos empatia, «obrigação moral» e sentido ético.

São, pois, estes os temas abordados em “Malaquias faz um Novo Amigo“, que lembra o contexto dos refugiados. Malaquias vai ter de vencer os seus preconceitos e a sua desconfiança face à chegada de um novo animal à floresta.

Descobrirá, com a ajuda dos amigos e do professor Sabichão, que uma atitude de abertura, empatia e solidariedade é o ponto de partida para que todos saiam a ganhar.

Desculpa-me!, de Barry Timms

O Esquilo e a Coruja eram os melhores amigos… até ao dia em que tiveram uma TERRÍVEL DISCUSSÃO!

Quem será o primeiro a pedir desculpa? E será que um pedido de desculpas é suficiente para reatar a sua preciosa relação?

Desculpa-me!” é a história perfeita para ensinar às crianças a diferença entre pedir desculpa com sinceridade e sem sinceridade.

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2 comentários em “As crianças e as amizades: um guia para decifrá-las (e para nos acalmarmos)

  1. Vera Martins Setembro 30, 2020

    Boa tarde!
    Gostei muito do artigo publicado assim como de quase todos. A minha tem 9 anos e diz me que brinca sozinha por vezes porqie ninguém quer brincar ao que lhe apetece brincar na altura. a mim como mãe parte me o coração mas a ela não, vive bem com isso. a pergunta é se existe algum livro sobre a importância da amizade mais adequado à idade dela ou acha que algum destes é indicado. Obrigada

    1. Filipa Lopes - Equipa Pumpkin Outubro 1, 2020

      Olá, Vera,

      Muito obrigada pelas palavras, ficamos contentes!

      Um livro que lemos com a idade da sua menina e que nos ensinou muito sobre o valor da amizade, do respeito e da individualidade foi “Harry Potter e a Pedra Filosofal” – e, depois, os restantes livros da saga. As nossas abobrinhas adoram este universo mágico e sentem até que fazem parte destes grupos de amigos tão especiais. “Pax”, de Sarah Pennypacker, também é uma história muito bonita. “O meu Amigo de outro Mundo”, “O Número das Estrelas” e “Apenas um Desejo” também são livros maravilhosos, que ela vai certamente adorar.

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