B1, B2, C1... Qual nível de inglês preciso para uma vaga internacional?

B1, B2, C1... Qual nível de inglês preciso para uma vaga internacional?

Qual nível de inglês preciso para uma vaga internacional?

 Vejo muita confusão no LinkedInho, em vários níveis. Vejo profissionais de TI confusos, tech recruiters confusos, gestores de vagas confusos. Quase sempre, vejo as pessoas superestimando ou subestimando os níveis, sem entender exatamente o que eles significam e quando cada nível é de fato necessário. Então, detalhemos.

Primeiramente, é importante destacar que os níveis A1, A2, B1, B2, C1 e C2 são categorizados pelo Quadro Comum Europeu de referência para idiomas (CEFR – Common European Framework of Reference for Languages), e que em geral as universidades sabem muito bem do que estão falando quando pedem um nível B1, B2, C1 ou C2 para um aluno ingressar em um programa de graduação ou pós-graduação, por exemplo. Por outro lado, empresas geralmente não entendem muito bem esses níveis e acabam confundindo o tech recruiter, que vai na onda e pede para a vaga um nível muito acima do que ela realmente precisa.

Em segundo lugar, é preciso destacar que os níveis A1-C2 não são níveis de fluência. Não se trata de uma “caminhada rumo à fluência”, onde você começa no A1 sem conseguir fazer muita coisa e só vai ser considerado fluente quando chegar ao C2. Não! Em todos os níveis, você precisa ter fluência. O que muda com com cada nível são os CONTEXTOS em que você consegue se comunicar de forma fluida, o leque de possibilidades que você tem para se comunicar e o nível de acurácia/perfeição que você implementa. Se você tem nível A1, significa que você consegue se comunicar com fluência nos contextos familiares, de apresentações pessoais, descrições básicas etc. Ou seja, naqueles contextos, você tem vocabulário suficiente, usa estruturas adequadas, tem pronúncia adequada e consegue se comunicar de forma fluida (sem quebras ou muitas pausas). E você consegue fazer isso em todas as habilidades: ler, escrever, ouvir e falar.

Parênteses rápido: já participei de entrevistas onde a vaga pedia nível avançado C1, mas o nível do recrutador que me entrevistou era B1, logo fiquei curioso sobre como ele conseguiria avaliar meu nível ou saber quando um candidato teria nível C1. Além disso, analisando o escopo da vaga e a job description, não fazia o menor sentido aquela vaga pedir nível C1. Um B1 já era muito mais do que o suficiente. E isso acontece com muita frequência. How often? Every day!

Você sabia que a maioria dos nativos de um idioma não tem nível C2 no próprio idioma? E nem C1? É isso mesmo! A maioria dos brasileiros não tem nível C2, nem C1 em português. E a maioria dos americanos e ingleses não têm nível C2 ou C1 em inglês. E olha só: todos os nativos são fluentes - comunicam-se de forma fluida. Então, desde já, perceba dois pontos importantes: 1) Nível de idioma não está diretamente relacionado com fluência, mas com riqueza de vocabulário e diversidade de estilos que você consegue aplicar na sua comunicação; 2) Você não precisa ter nível C2, C1 e nem mesmo B2 para a maioria das vagas de TI ofertadas por aí. B1 é mais do que suficiente, eu diria, para 99% das vagas de TI. Explico melhor a seguir.

Sobre o primeiro ponto, sabe quando você lê um livro do Machado de Assis e, mesmo entendendo (quase) tudo, você percebe que não usa metade daquele vocabulário no seu dia a dia? Ou, por exemplo, quando você ouve um podcast jornalístico e se dá conta que, mesmo entendendo (quase) tudo, você também não usa 1/5 daquele vocabulário no seu dia a dia? Isso ocorre porque você está acostumado a usar sempre a mesma forma de dizer algo, ao invés de variar entre várias formas possíveis. Seu leque de vocabulário passivo (aquele que você entende quando ouve e lê) pode ser amplo, mas seu leque de vocabulário ativo (aquele que você realmente usa quando fala e escreve) é muito menor. Da mesma forma, quando você fala e escreve, não necessariamente você fala corretamente, com uma gramática bonitinha. A mesma coisa ocorre com nativos do inglês, e este é mais um motivo pelo qual a maioria dos nativos não têm nível C2, C1 ou mesmo B2 no próprio idioma.

A seguir, tentarei responder a algumas perguntas: O que um falante de cada nível consegue fazer? Como este nível é popularmente conhecido no Brasil? Como as escolas de idiomas costumam vender cada nível? Como as empresas costumam entender cada nível? Quanto tempo se demora, em média, para obter cada nível em uma escola de idiomas regular? Que tipos de jobs de TI eu conseguiria exercer com cada nível? Quando cada nível é realmente necessário?

#A1:

Segundo o CEFR, o falante A1 "é capaz de compreender e usar expressões comuns do dia-a-dia e frases básicas com o intuito de satisfazer necessidades concretas. Consegue se apresentar e apresentar outras pessoas, além de fazer e responder a perguntas sobre detalhes pessoais, tais como onde vive, pessoas que conhece e coisas que possui. Consegue interagir de forma básica, desde que a outra pessoa fale devagar e com clareza e esteja preparada para ajudar". Ou seja, o A1 consegue usar expressões do dia a dia, resolver problemas de comunicação muito básicos, fazer perguntas simples e compreender respostas simples, apresentar-se e apresentar outras pessoas, perguntar detalhes sobre outras pessoas, mas sempre precisando que a outra pessoa fale de forma mais tranquila. Apenas conhecer algumas palavras e frases soltas não significa nível A1. Para muitas escolas de idioma, este falante tem o “nível básico” (embora, pelo CEFR, este seja apenas metade do nível básico). Já as empresas, em geral, acham que este falante só sabe falar as cores em inglês. Em geral, você demora 1 ano para obter este nível em uma escola de idiomas (com, em média, 3-4 horas de aulas por semana).

 

#A2:

De acordo com o CEFR, o falante A2 "é capaz de entender frases e expressões comuns relacionadas a áreas de relevância imediata, como informações pessoais, de família, compras, geografia local, emprego etc. Consegue se comunicar em tarefas simples e rotineiras que requerem uma troca simples e direta de informações sobre assuntos familiares e rotineiros. É capaz de descrever em termos simples aspectos de sua formação, ambiente e assuntos em áreas de necessidade imediata". Ou seja, além de tudo o que o A1 consegue fazer, o A2 ainda consegue falar sobre trabalho, família e vida pessoal de forma um pouco mais ampla, falar de rotinas, de atividades do dia a dia (e, para isso, ele precisa saber se expressar no passado, presente e futuro, dentre alguns outros contextos). Em resumo, o A2 consegue se virar em uma viagem internacional de turismo “sem passar fome”, mas ainda não está totalmente pronto para entrar no mercado internacional de TI, a menos que seja uma vaga onde ele não tenha que falar muito durante o dia. Se ele tiver que apenas falar por alguns minutos na daily meeting sobre o que fez no dia anterior, seus blockers e o que vai fazer no dia, já dá certo, mas não muito mais do que isso. Para muitas escolas de idioma, este falante tem o “nível intermediário” (embora, formalmente, pelo CEFR, este seja apenas o nível básico completo). Já as empresas, em geral, acham que este falante é aquele cara que desenrola algumas coisas, mas não o suficiente para o que elas querem – e aqui, muitas vezes, elas estão certas. Em geral, você demora 2 anos para obter este nível em uma escola de idiomas (com, em média, 3-4 horas de aulas por semana).

 

#B1:

Segundo o CEFR, o falante B1 "é capaz de entender e se expressar dentro dos principais pontos de uma conversa normal sobre assuntos que lhe são familiares abordados regularmente no trabalho, no ambiente escolar/acadêmico, no lazer, etc. Consegue produzir texto simples e conectado sobre tópicos familiares ou de interesse pessoal. É capaz de descrever experiências e acontecimentos, sonhos, esperanças e ambições e explicar motivações para opiniões e planos". Isto é, o B1 é o falante que consegue "se virar" em praticamente todas as situações do dia a dia, sem grandes problemas. É a pessoa que a gente conhece como aquela que “desenrola bem” no inglês. Este falante tem um bom leque de vocabulário e de estruturas gramaticais, suficientes para que consiga se comunicar em uma variedade muito grande de temas, sem grandes dificuldades. Claro que a pronúncia não é perfeita, nem a gramática, e que certamente o vocabulário é limitado. Com B1, você já consegue fazer uma faculdade em inglês, trabalhar em diversas áreas (especialmente na de TI, sem nenhum problema), participar de reuniões em inglês, fazer apresentações básicas, falar com colegas, resolver problemas de rotinas e discutir soluções com colegas etc. Para muitas escolas de idioma no Brasil, este falante tem o “nível avançado” (embora, formalmente, pelo CEFR, este seja apenas o nível intermediário independente). Já as empresas, em geral, acham que este falante é aquele cara que fala, mas que fala muito mal, que não é o suficiente para o que elas querem – e é aqui onde elas estão MUITO ENGANADAS. Provavelmente, o gestor da vaga tem nível B1, mas acha que tem nível C1 e pediu para o tech recruiter colocar na job description que a vaga pede nível B2. Isso é muito comum, especialmente quando o gestor não é nativo. Em uma empresa que tem funcionários de várias nacionalidades, a maioria dos falantes de inglês não nativos tem nível B1. Se você é júnior ou pleno, e não pleteia uma vaga onde precisa interagir diretamente com clientes nativos, B1 é mais do que suficiente. Em geral, você demora 3-4 anos para obter este nível em uma escola de idiomas (com, em média, 3-4 horas de aulas por semana).

 

#B2:

O CEFR diz que o falante B2 "é capaz de compreender as principais ideias de textos/áudios complexos sobre temas concretos e abstratos, incluindo discussões técnicas em sua área de especialização. Consegue interagir com um certo grau de fluência e espontaneidade que torna possível uma interação normal com falantes nativos sem esforço para nenhuma das partes. Consegue produzir textos claros e detalhados sobre uma ampla gama de assuntos e explicar um ponto de vista sobre uma questão atual, apresentando as vantagens e desvantagens de várias opções". Ou seja, neste nível, você vai conseguir se comunicar com muita clareza e precisão (e aqui, entra, necessariamente, aperfeiçoamento de pronúncia, precisão de gramática e expansão de vocabulário, pois apenas “se comunicar” ficou lá no B1 - aqui é preciso um pouco mais de acurácia). Com este nível, você consegue se comunicar com nativos sem dificuldade, consegue escrever e-mails/relatórios quase que com perfeição, e com bastante riqueza de detalhes, mostrar todos os pontos positivos e negativos em uma reunião de negociação com o cliente, apresentar propostas e interagir de forma espontânea e natural. A maioria das escolas de idioma no Brasil nem chega a oferecer este nível, pois param no B1. As poucas escolas de idioma que oferecem este nível são as que, de fato, tratam os níveis no formato internacional, e sabem que, pelo CEFR, este é o nível Upper-Intermediate (pós intermediário), embora muitas o chamem de Avançado++ ou algo do tipo. Para muitas empresas, este é o nível mínimo que um colaborador de TI precisa ter – e aqui elas demonstram profunda falta de compreensão dos níveis. Repito: a maioria das vagas que vejo pedindo nível B2 (ou, às vezes, C1, que seria o avançado), só precisam de B1, e o próprio recrutador tem nível B1 (e o gestor da vaga, também). Repito: em quase todas as funções de TI, se você é júnior ou pleno, B1 será mais do que suficiente. Se você é sênior && pretende trabalhar em funções de liderença, como tech lead/scrum master/product owner/product manager/project manager && precise fazer reuniões de negociação/apresentação, vendas, relatórios e e-mails diretamente com clientes nativos, AÍ SIM VOCÊ PRECISARÁ TER NÍVEL B2. Em geral, você demora 5-6 anos para obter este nível em uma escola de idiomas (com, em média, 3-4 horas de aulas por semana), mas ressalto que poucas ofertam este nível, e as poucas que o ofertam quase nunca conseguem realmente produzir um falante B2 ao final do curso. Ocorre que o falante B1 já está tão tranquilo com seu inglês, que só vai focar no B2 quando realmente sentir necessidade (ou quando perceber que este é o degrau que falta para duplicar/triplicar seu salário).

 

#C1:

Percebeu que o nível B2 já é bem alto, né? Então o C1 é aquele falante que “deita e rola” no idioma. De acordo com o CEFR, o falante C1 "é capaz de entender uma ampla variedade de textos longos e complexos e reconhecer significado implícito e sutil. Consegue se expressar de forma bastante fluida e espontânea sem pausas ou quebras para buscar expressões. Consegue usar a língua flexível e efetivamente para fins sociais, acadêmicos e profissionais. Consegue produzir (de forma oral e escrita) textos claros, bem estruturados e detalhados sobre assuntos complexos, mostrando um uso controlado de padrões de organização de um texto, conectores e marcadores de coesão". Para conseguir fazer tudo isso, o falante usa uma vass(...)ssta gama de vocabulário, conectores, expressa-se de forma muito elegante, muitas vezes complexa, em um nível altíssimo. C1 não erra pronúncia, sabe usar connected speech like a native, usa fillers like a native, entona o idioma like a native, usa phrasal verbs like a native (e não apenas aqueles 50 mais conhecidos), não apenas sabe mas fala a mesma coisa de 15 formas diferentes, usa conectores dos mais variados, não tem a menor dúvida de como usar as prepositions in/on/at, não confunde to vs for, entende nativos falando praticamente 100% independentemente do sotaque (até a Adele, tá?), enfim, já superou os obstáculos do idioma. Conto nos dedos as escolas de idioma no Brasil que ofertam este nível. E você não vai precisar deste nível em praticamente nenhuma vaga de TI, a menos que você seja o CEO e queira fazer uma palestra no TED (embora, para cá, o B2 já seja o bastante). Por outro lado, algumas empresas pedem nível C1, quando na verdade o que precisam é do nível B1. Até hoje, nunca fui entrevistado por nenhum recrutador/gestor que tivesse nível C1. C1 será necessário quando a vaga for para a área de humanas – por exemplo, se você for trabalhar com jornalismo, content writing, cinema, enfim, precisando escrever e falar em altíssimo nível. Para a área de TI, honestamente, não vejo necessidade de C1 para absolutamente nenhum tipo de vaga.

 

#C2:

E o C2? Acho que, por ora, podemos parar no C1, right?

*Spoiler: este artigo está escrito em um nível em algum lugar entre B1 e B2 de português.


Fonte: Using the CEFR: Principles of Good Practice - Cambridge University Press, 2011.

Bruno Eugênio

Gerente de Engenharia de Software | Gerente Técnico

5 m

Excelente explicação! Eu tenho aulas com uma professora nativa e sempre tive essa “neura” com meu nível na escala CEFR e ela me disse algo nessa linha que você falou: muitos nativos não conseguem chegar nos níveis mais altos. Meu nível segundo ela? B2 no caminho do C1. E uso bastante pra entender apresentações, tenho contato com pessoas que falam o idioma fora do trabalho, etc… e ficava dizendo sempre que “não era suficiente” 🫠

Congratulations pelo artigo. Muito bom e com uma desmitificação pertinente ao surto dos níveis de inglês!

Camila Rezende

Curiosa, desbravadora e apaixonada por Comunicação, Tecnologia, Design, Fotografia e Arte. Aberta a oportunidades de trabalho em Marketing, Comunicação, Vendas, Graphic Designer e NoCode Developer.

9 m

Adorei! O artigo tem conteúdo, está bem escrito e divertido (para mim está C1 em português, kkk), gratidão!

Vanessa Campelo

Product Strategy | Product Management| Design Thinking | Inovação | Transformação Digital | Project Management | Agile Professional | Gestão de Mudanças

10 m

Que artigo maravilhoso!!! Você consegue indicar as escolas que trabalham baseadas nesses níveis?

Morgana Almeida

Data Analytics | Analytics Engineer | Data Science | Membro ANPPD®

1 a

Nossa, o melhor esclarecimento que encontrei sobre a questão da fluência em Inglês e o que é preciso para conseguir uma vaga! Muito obrigada pela 🤯!

Entre para ver ou adicionar um comentário