Advocatus, Nº 19

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Director: João Teives

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Director Editorial: Hermínio Santos

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Mensal

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Ano II

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N.º 19

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Outubro de 2011

Pedro Santana Lopes, sócio da Global Lawyers

Estamos sem ideologia há quase 20 anos Pág. 30

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“Há excesso de ruído”

Há excesso de ruído na política de Justiça, “o que não ajuda a que todos os operadores concorram para a melhoria da prestação de serviços de administração da Justiça”, diz José Lamego, sócio da Lamego & Horta, que deixou de vez a actividade política para se dedicar à advocacia. Funciona com uma equipa de nove advogados e trabalha regularmente com Espanha, Brasil, Alemanha, Londres e Luanda. O mercado português “não representa mais de um terço”, afirma

15 euros

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José Lamego, sócio da Lamego & Horta

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A importância da recuperação de créditos

A troika incluiu a acção executiva entre as prioridades do domínio da Justiça. Foi o reconhecimento de que o tema é fundamental para o bom funcionamento do sector e para diminuir a pendência processual. Rui Varela Gonçalves, da CCA, Bertha Parente Esteves, advogada associada da Cuatrecasas, Gonçalves Pereira & Associados e Rui Pedro Martins, advogado estagiário da BPO Advogados, falam sobre o tema


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Director-geral João David Nunes jdn@briefing.pt Director João Teives joao.teives-14761l@advogados.oa.pt Director Editorial Hermínio Santos hs@briefing.pt Directora de Arte Patrícia Silva Gomes psg@briefing.pt Editora Executiva Fátima de Sousa fs@briefing.pt Coordenador Online Filipe Santa-Bárbara fsb@briefing.pt Directora de Marketing Maria Luís Telf. 961 571 629 ml@briefing.pt Distribuição por assinatura Preço: 180€ (12 edições; oferta de voucher Odisseias) assinaturas@briefing.pt Tiragem média mensal: 2.500 ex. Depósito legal: 308847/10 N.º registo erc 125859 Editora Enzima Amarela - Edições, Lda Av. Infante D. Henrique, 333H, 44 1800-282 Lisboa Tel. 218 504 060 Fax: 210 435 935 advocatus@briefing.pt www.advocatus.pt

Destaques Entrevista

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TURISMO

Agências de viagens e consumidores

Bruno Neves de Sousa, advogado associado da Cuatrecasas, Gonçalves Pereira & Associados, escreve sobre o novo regime jurídico de acesso e de exercício da actividade das agências de viagem e turismo

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UNIVERSIDADE

O clube de Georgetown

São cerca de 30 portugueses que têm em comum a passagem pela Universidade de Georgetown, em Washington, nos EUA. Juntos formam o Georgetown Club Portugal, cujo primeiro evento decorreu no dia 21 de Setembro. Paula Redondo Pereira, fundadora do Club, explica os objectivos

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SOCIEDADES

SRS Advogados prepara o futuro

O encontro anual da SRS Advogados decorreu este ano em Tróia, nos dias 23 e 24 de Setembro. Diversos convidados da área da advocacia, do sector empresarial e do mundo das artes participaram nesta iniciativa

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PASSEIO PÚBLICO

Como uma búlgara chegou a Lisboa

Impressão: Sogapal, Rua Mário Castelhano, Queluz de Baixo 2730-120 Barcarena

Comunicação, Design e Multimédia Av. Marquês de Tomar, 44-7 1050-156 Lisboa Tel: 217 957 030 geral@motioncreator.net

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RAMONDEMELO

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Fez de Lisboa a sua nova casa, adiando o desejo de voltar ao país natal. Magdalena Ilieva, 35 anos, estudava Direito em Bona quando conheceu um português que mudou a sua vida. A capital portuguesa acabou por ser o seu destino e hoje está na Sérvulo Correia & Associados Outubro de 2011

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Cortar a direito

João Teives director

Cem dias Eu elejo como a grande medida destes cem dias o anunciado adiamento da implementação do mapa judiciário, nomeadamente no que se refere à Comarca de Lisboa No balanço tradicional dos cem dias de governo as opiniões dividem-se quanto à medida mais importante tomada pelo Ministério da Justiça, liderado por Paula Teixeira da Cruz. Diria, antes de mais, que a medida que teve, e ainda tem, maior projecção mediática foi a auditoria ao apoio judiciário e o não pagamento dos honorários dos defensores e patronos. Provavelmente seguida pelo não reconhecimento da validade do contrato de arrendamento do Tribunal da Maia, acompanhando, aí, o parecer do Conselho Consultivo da Procuradoria Geral da República que considerou tal contrato nulo. À excepção desses episódios, que correspondem a situações algo insólitas, existem ainda várias medidas legislativas em preparação, como o novo Regulamento das Custas ou a nova Lei de Arbitragem. Tudo exigências do memorando. Sem desprimor para tais medidas, que podem ser, estas sim, estruturantes, eu elejo como a grande medida destes cem dias o anunciado adiamento da implementação do mapa judiciário, nomeadamente no que se refere à Comarca de Lisboa. Não se trata apenas da escolha de reduzir das 39 comarcas previstas anteriormente para 20, passando a definição territorial a ter por base principal não as NUTS mas sim os distritos. Diria que o essencial, qualquer que seja

O que me parecia suicidário, e contraproducente com os objectivos previstos do memorandum, era a forma como foi pensada e vertida em Decreto-Lei a aplicação a Lisboa do novo mapa judiciário. Estamos perante a maior comarca do País

o critério de delimitação da competência territorial da comarca, é que haja, pelo menos dentro da mesma, plena mobilidade dos funcionários e a possibilidade de, com flexibilidade, dar uma resposta com maior oferta judiciária às situações de maior procura. Na prática, criar mecanismos que permitam obedecer a uma regra básica de gestão: adequar a oferta à procura. O que me parecia suicidário, e contraproducente com os objectivos previstos do memorandum, era a forma como foi pensada e vertida em Decreto-Lei a aplicação a Lisboa do novo mapa judiciário. Estamos perante a maior comarca do País. Os cuidados e precauções que devem preceder qualquer intervenção devem ser redobrados. Para além disso não se percebia a urgência absoluta, a ansiedade desmedida, de alargar a Lisboa o novo mapa judiciário. Recorde-se que, na essência, são três os pilares daquela reforma: nova matriz territorial, acentuada especialização e novo modelo de gestão. Ora com excepção do novo modelo de gestão dos Tribunais, Lisboa é a última das comarcas a necessitar da implementação do novo mapa judiciário. Os limites territoriais da comarca e a especialização mantêm-se na íntegra. Na prática tratava-se de uma simples operação de rede-

nominação do existente com uma diminuição acentuada da oferta judiciária. Ora se o que se pretende, no modelo anteriormente proposto, é diminuir a oferta existente, não se vislumbra como seria possível diminuir a pendência. Mas pior ainda do que o modelo encontrado era o timing de operacionalização do mesmo: dia 1 de Dezembro. Começar a redistribuir processos em período de plena actividade judicial é totalmente contraproducente. Em vez de termos juízes e funcionários a trabalhar nos processos temos processos a serem movidos fisicamente de um lado para outro, a serem renumerados e reinseridos no CITIUS, a serem modificadas toneladas de papel e carta timbrado de todos os juízos, varas e secções... Isto para não falar da óbvia necessidade de dar sem efeito múltiplos julgamentos agendados e da perda de conhecimento e de tempo de trabalho dos juízes que, tendo preparado o saneamento do processo, não acompanhariam o processo até à sua conclusão. Em suma, a implementação da nova Comarca de Lisboa iria gerar, em vez de agilização, uma paralisação processual, um acréscimo das pendências e dos atrasos na aplicação da Justiça, não contribuindo, dessa forma, para o cumprimento dos objectivos fixados no memorandum.

DVD

Uma porta que se fecha A porta que se abre e/ou fecha é talvez dos símbolos mais poderosos em cinema, quer para nos levar para outra dimensão, geralmente quando abre, quer para criar um corte, quando fecha. Recordamo-nos disso a propósito do Godfather (1972). Michael e Kay chegam juntos e inseparáveis ao baptizado inicial. No final têm uma discussão em que ele, mentindo, consegue apaziguá-la. Como nos bons velhos tempos ela diz-lhe para celebrarem as pazes com um copo. Mas quando sai do escritório, ele fica a receber os cumprimentos cerimoniais da sua

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consagração e reconhecimento do poder por parte dos súbditos e a porta fecha-se. Dois mundos, dois caminhos. Michael e Kay vão separar-se. Já em The Searchers (1956) temos provavelmente os mais belos planos da história do cinema. A porta que se abre no início para o deslumbrante Monument Valey e a porta que se fecha no final. Ethan fica de fora. Só. Não fará parte do núcleo familiar. Por último, nos Mistérios de Lisboa (2010) a porta que se fecha não é o final mas é o artifício que permite a coda final, um espaço de sonho e memória.

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Entrevista

Fátima de Sousa jornalista fs@briefing.pt

Já foi dirigente partidário, secretário de Estado dos Negócios Estrangeiros, administrador da autoridade transitória do Iraque. Hoje, aos 58 anos, José Lamego é advogado e professor universitário. Mas sempre observador atento da realidade. Da Justiça diz que peca por medidas de bom senso. E que o essencial seria reformar a fundamentação das sentenças, porque “a justiça deve ser célere, não apenas boa”

José Lamego, sócio da Lamego & Horta

Ramon de Melo

Falta bom senso à Justiça

Advocatus | Enveredou recentemente por novo projecto profissional. Foi um regresso à advocacia? José Lamego | Nunca deixei de exercer. Estou inscrito na Ordem desde 1980, sou, aliás, um dos advogados mais antigos, o que se nota no meu número de cédula, que é o 4000 e poucos… Tive algumas interrupções, da primeira vez 6

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porque fui trabalhar para o Banco Mundial e da segunda quando fiz o doutoramento na Alemanha. E depois, por razões óbvias, requeri a suspensão da inscrição quando exerci funções governativas. Esta sociedade tem pouco mais de ano e meio. Somos quatro sócios, estávamos em projectos diferentes e resolvemos juntar-nos em parte por afinidades pessoais.

Advocatus | Como encara actualmente a profissão? JL | A profissão, particularmente em Lisboa, exerce-se em moldes muito diferentes do que quando eu comecei. Então não havia praticamente sociedades de advogados, o que era dominante era o exercício em regime de prática individual. O advogado era polivalente, cobria quase todos os ramos do Direito; hoje já

uma muito maior especialização e, portanto, as condições de exercício da profissão são completamente distintas. Advocatus | Mas considera natural essa evolução para um modelo em que as sociedades de advogados são dominantes? JL | Nos anos 90 constituíram-se várias sociedades de advogados, alguO agregador da advocacia


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mas com um número muito grande de advogados, comungando do espírito de relativa euforia que havia no País. Há quatro ou cinco sociedades com mais de 100 advogados e eu duvido que o mercado português, que está em retracção, comporte, com níveis de rentabilidade razoáveis, sociedades dessa dimensão. É um facto que essas sociedades são as únicas que estão adaptadas e têm meios para grandes operações, por exemplo de fusão e aquisição, mas como não vai haver mais do que uma ou duas por ano em Portugal, o que resta é o mercado mais dirigido a sociedades de menor dimensão. Às vezes, as de maior dimensão também têm de se ocupar bastante com a litigância de massa, com os processos executivos, e isso diminui naturalmente a rentabilidade. De qualquer forma, eu não sou muito regulamentador e penso que o sucesso ou insucesso das actividades profissionais é o melhor caminho a seguir para a correcção das trajectórias. Penso que aprendemos mais com os insucessos do que com os sucessos.

“Há quatro ou cinco sociedades com mais de 100 advogados e eu duvido que o mercado português, que está em retracção, comporte, com níveis de rentabilidade razoáveis, sociedades dessa dimensão”

Advocatus | A Lamego & Horta é deliberadamente de menor dimensão? JL | Fomos, de facto, para um projecto um pouco mais prudente. Somos nove advogados, penso que no próximo ano faremos uma pequena expansão, mas sempre com prudência. Advocatus | A sociedade nasce já em ambiente de crise económico-financeira. Onde vão buscar a vossa rentabilidade? Qual é o vosso mercado? JL | A única maneira de respondermos à situação presente da profissão é com uma actividade muito intensa. É com mais trabalho e com mais eficiência, até porque voltámos a ter níveis de remuneração da década de 90. O nosso princípio é o de manter os postos de trabalho, mesmo que venhamos a diminuir a rentabilidade. De qualquer modo, não nos queixamos. Trabalhamos com regularidade com parceiros espanhóis – em Novembro

“Fazem-se reformas sobre o acessório e não sobre o essencial. E o essencial é, por exemplo, a fundamentação das sentenças. Uma sentença em que o relatório dos factos ocupa dezenas e dezenas de páginas e a fundamentação outras dezenas é um absurdo”

vamos mesmo anunciar um acordo com um escritório na Catalunha -, trabalhamos bastante com o Brasil, que é um país que os nossos clientes estrangeiros procuram, temos uma grande relação com a Alemanha e com fundos de investimento em Londres. Trabalhamos também regularmente com um escritório em Luanda, mas não estamos a encarar a abertura de um escritório próprio, quer devido aos elevados custos de instalação, quer porque há um ambiente de hostilidade geral dos colegas contra a presença de advogados estrangeiros. Eu diria que o mercado português não representa mais de um terço – não tenho os números certos, mas a maior parte dos nossos clientes são estrangeiros, de países europeus, o que nos dá uma relativa folga. Advocatus | Alguns advogados ganharam grande visibilidade mercê de alguns casos muito mediatizados. O que pensa desta exposição? JL | Há uma mediatização excessiva da Justiça, mas diria que, muitas vezes, mais por parte das magistraturas do que dos advogados. O meu modelo é o de um magistrado que observava um grande resguardo em matéria de aparição pública, como considero que o modelo de advogado é mais tradicional, de um profissional que normalmente não se pronuncia sobre os casos que lhe estão confiados. Mas a Justiça é uma das áreas da vida portuguesa onde há demasiada turbulência comunicacional. Com algum anseio de protagonismo, às vezes com aparições excessivas dos órgãos sindicais, e isso leva a que haja um excesso de ruído na política de justiça, o que não ajuda a que todos os operadores concorram para a melhoria da prestação de serviços de administração da Justiça. De qualquer modo, penso que todos somos aliados potenciais na melhoria do funcionamento do sistema. Advocatus | Nessa crítica deixou de fora a Ordem dos Advogados… JL | É verdade que, de há 15 anos para cá, a Ordem assumiu um

“A única maneira de respondermos à situação presente da profissão é com uma actividade muito intensa. É com mais trabalho e com mais eficiência, até porque voltámos a ter níveis de remuneração da década de 90”

protagonismo público maior. Quero dizer-lhe, com toda a franqueza, que votei no dr. Marinho e Pinto e não vejo que haja maior turbulência ou maior tensão do que em mandatos anteriores. Outros bastonários assumiram, até com maior contundência, posições públicas. O actual bastonário, de que fui contemporâneo na faculdade, tem um estilo próprio, são características idiossincráticas. Mas, às vezes, as pessoas para serem ouvidas têm de falar alto. Advocatus | A Justiça está sempre em reforma mas não há reforma que chegue. O que falta? JL | Diria que, às vezes, até em excessiva reforma… Fazem-se reformas sobre o acessório e não sobre o essencial. E o essencial é, por exemplo, a fundamentação das sentenças. Uma sentença em que o relatório dos factos ocupa dezenas e dezenas de páginas e a fundamentação outras dezenas é um absurdo. Não se pode pedir a um juiz que produza sentenças destas. Há sistemas jurídicos em que só quando as partes manifes>>>

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Entrevista

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“A Justiça é uma das áreas da vida portuguesa onde há demasiada turbulência comunicacional. Com algum anseio de protagonismo, às vezes com aparições excessivas dos órgãos sindicais”

tam intenção de recorrer é que a fundamentação é mais extensa. Caso contrário, deve ser bastante estrita, é a única maneira de ter uma justiça mais célere. Os magistrados têm uma boa formação académica, mas há um excessivo formalismo na nossa lei processual que leva a que a produtividade dos magistrados diminua. Era para aí que o essencial das reformas devia ser dirigido. Haverá também sempre contra-indicações, dir-se-á que as sentenças terão menos rigor, que a fundamentação será tecnicamente mais sofisticada, mas a justiça deve ser célere, não apenas boa. E é em matéria de celeridade que a percepção dos cidadãos gera mais crítica. Não se compreende que haja sete ou oito anos para ter uma sentença transitada em julgado. Não há razão para que os processos se arrastem. Estou a lembrar-me do caso UGT (relacionado com o uso de verbas do Fundo Social Europeu). Arrastou-se 20 anos, com pessoas sob suspeição, pessoas que não puderam ver satisfeitas alternativas profissionais porque estavam presas a um processo judicial que demorou 20 anos até transitar em julgado com a absolvição dos principais arguidos. O princípio da estabilidade das leis é importante, mas as reformas que venham a ser feitas devem ter esta visão cirúrgica de desatar os bloqueios, nomeadamente em matéria processual. Advocatus | Diria que as medidas contidas no entendimento de memorando são uma reforma em si ou pistas para uma futura reforma da Justiça? JL | O programa da troika é um programa de emergência, destinado a responder às dificuldades financeiras do País. Genericamente, vai ser benéfico, por introduzir alguma disciplina ainda que por via externa. Eu preferia que fosse introduzida por via interna e por consenso, mas é um guião para um conjunto de reformas. É mais um impulso. As reformas na área da Justiça têm de ser feitas de acordo com um espírito mais programático e menos académico.

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“As reformas na área da Justiça têm de ser feitas de acordo com um espírito mais programático e menos académico. Não é fazer a melhor lei do ponto de vista teórico, mas fazer a lei processual que resolva os problemas fundamentais”

“É um facto que somos muito pouco atreitos à mudança. Há um corporativismo e uma cultura de inacção muito grande; em Portugal, é-se penalizado pelo que se faz e não pelo que não se faz”

Não é fazer a melhor lei do ponto de vista teórico, mas fazer a lei processual que resolve os problemas fundamentais, que são a dilação na elaboração da decisão final, ou seja, a fundamentação. Advocatus | Dito assim parece tão óbvio. Porque é que não tem sido feito? JL | Eu não tenho a pretensão de ter soluções no bolso, nem tenho varinhas mágicas… Mas é um facto que somos muito pouco atreitos à mudança. Há um corporativismo e uma cultura de inacção muito grande; em Portugal, é-se penalizado pelo que se faz e não pelo que não se faz. Do ponto de vista da consolidação orçamental, por exemplo, o que a troika diz é o que toda a gente já falava há seis ou sete anos, tomaram-se medidas parciais, mas a crise de 2008 agravou o contexto internacional da economia portuguesa. As medidas previstas no memorando são, na sua maioria, medidas de bom senso, à excepção da chamada taxa social única, que é uma medida de falta de senso, e da redução de municípios, que também não me parece muito factível. De resto, tudo assenta numa filosofia de senso comum, que muitas vezes traz melhores respostas do que perspectivas muito programáticas e muito elaboradas. Advocatus | Como advogado, mas também como professor da Faculdade de Direito, como vê o acesso à profissão? JL | A situação dos jovens profissionais preocupa-me bastante. O arrastamento do estágio, com exame de entrada e exame de saída, mais do que um controlo de qualidade é uma maneira de restringir o acesso à profissão e de regular questões que serão necessária e impiedosamente reguladas pelo mercado de trabalho e que não deviam ser reguladas por via administrativa. O estágio é muito duro e não garante necessariamente um melhor apetrechamento dos futuros profissionais. Além de que tem implicações socio-económicas graves. Só quem tenha apoio económico O agregador da advocacia


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familiar é que consegue suportar este protelamento de entrada na profissão e na remuneração. Advocatus | Foi dirigente partidário e membro de um governo. É um capítulo encerrado? JL | É. Mantenho as minhas fidelidades de sempre, sou militante de base do Partido Socialista. Fiquei muito satisfeito com a eleição do recente líder, em quem votei, mas é uma satisfação pessoal que faz parte dos meus sentimentos, não da minha actividade diária. Hoje, sou advogado, professor, cidadão. A minha actividade política decorreu até 2001, 2002, enquanto António Guterres foi primeiro-ministro e líder do partido. A partir daí, procurei desenvolver uma vida profissional. Entendo que, em democracia, os políticos devem saber sair a tempo. Já viu a longevidade das lideranças partidárias e sindicais em Portugal? Em democracia, a alternância é a regra, entre partidos e dentro dos partidos. Advocatus | Foi responsável pelas Relações Internacionais do PS, membro do Comité do Médio Oriente da Internacional Socialista e secretário de Estado dos Negócios Estrangeiros, administrador da autoridade provisória do Iraque. À luz desta experiência, como vê os recentes acontecimentos no mundo árabe? JL | Ainda é muito cedo para fazermos o balanço das ditas primaveras árabes. É um facto que há um afastamento das autocracias e uma maior expressão do desejo de participação dos cidadãos na vida dos seus países, mas pode vir a acontecer uma agudização das condições de instabilidade em todo o Médio Oriente. Temos de estar prevenidos para o facto de determinados movimentos terem sempre efeitos colaterais. O impacto de toda esta enorme alteração ainda não está clarificado e não estará nos próximos meses. Vamos ver como será a situação pós-conflito na Líbia, que é uma sociedade muito dividida em tribos, veremos como coexistem sectores O agregador da advocacia

“Ainda é muito cedo para fazermos o balanço das ditas primaveras árabes. É um facto que há um afastamento das autocracias, mas pode vir a acontecer uma agudização das condições de instabilidade em todo o Médio Oriente”

islamistas com sectores tecnocráticos. Há o papel do Egipto, que era o grande estabilizador da região em termos geopolíticos. Temos de ver também qual o papel que a Turquia vai jogar na região, qual a consequência da retirada norte-americana do Iraque – aqui houve um ganho muito grande, que foi o derrube de uma ditadura implacável e perturbadora do equilíbrio na região, mas o pós-conflito foi gerido de uma maneira pouco sábia, sem conhecimento do país, cometeram-se erros cujas consequências ainda estamos a pagar, sobretudo os iraquianos. É preciso ainda ver como se vai posicionar o Irão e se a estabilidade na Argélia se manterá. É um xadrez muito complexo e não o podemos analisar apenas a partir do sentimento positivo do acréscimo de democracia em dois ou três países. Vai ser fascinante

seguir todo o processo de evolução. Advocatus | A situação actual do País tem dado voz a muitos descrentes na União Europeia. Portugal tem futuro fora do euro? JL | Contra esse cepticismo, eu penso que a nossa saída (da crise) só é possível num quadro europeu e mediante o aprofundamento do processo de construção europeia. Estou completamente contra essas vozes que acham que há um destino para Portugal fora do euro. Claro que, se o euro implodir, teremos de caminhar pelos nossos próprios pés, mas o que eu desejo para Portugal é que se ancore na construção europeia. Temos de fazer o trabalho de casa, arrumar as finanças públicas, dinamizar a economia, custa muito mas é incontornável, não há outro caminho.

PERFIL

Prazer e privilégio

“A nossa saída (da crise) só é possível num quadro europeu e mediante o aprofundamento do processo de construção europeia. Estou completamente contra essas vozes que acham que há um destino para Portugal fora do euro”

Das várias actividades que exerce, leccionar é a que dá “mais prazer pessoal” a José Lamego. Na Faculdade de Direito da Universidade Clássica, ensina actualmente Filosofia do Direito a alunos do 1.º ano. E o prazer que retira começa logo na preparação das aulas: “É uma maneira de aprendermos, de continuarmos a aprender, e isso é fundamental”. Prazer dá-lhe igualmente a música clássica. Que ouve em concertos ou em casa, não no escritório porque se concentra melhor no silêncio. Em nome deste prazer, no Verão em que foi doutorando na Alemanha cruzava fronteiras para se deleitar com o talento reunido no festival de Salzburgo. Um “contexto de privilégio”, reconhece, enriquecido pelo facto de ter assistido a todo o processo de reunificação alemã e conhecido personalidades como Willy Brandt, o chanceler da altura, ou Vaclav Havel, líder da então Checoslováquia. “Acompanhei os acontecimentos dia-a-dia. Foi uma experiência importantíssima”. Outubro de 2011

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Coimbra Editora JusJornal

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Estante

A Estante é uma página de parceria entre a Advocatus e a Coimbra Editora, grupo Wolters Kluwer

Coimbra Editora JusNet Um novo paradigma

Os mais vendidos Teoria Geral do Estado e do Direito (3ª) José Fontes 2010 29 €

Código do Processo nos Tribunais Administrativos (5ª) Guilherme da Fonseca, José Martins Claro e José Fontes 2011 20,75 €

Código das Sociedades Comerciais e Legislação Conexa (9ª) Filipe Cassiano dos Santos, Ricardo Afonso 2011 19,34 €

Os anos de 2010 e 2011 trouxeram-nos novos paradigmas para o Direito das Sociedades Comerciais, que é como dizer para a vida das empresas e o funcionamento do mercado, dos quais destacamos dois diplomas. O Decreto-Lei n.º 49/2010, de 19 de Maio, veio reforçar o regime de exercício de certos direitos de accionistas de sociedades cotadas e consagrar a admissibilidade de acções sem valor nominal, assim destronando o princípio ao abrigo do qual a cada acção corresponderia sempre um valor nominal fixo. Fazendo de uma assentada a transposição da Directiva n.º 2007/36/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 11 de Julho, e, parcialmente, da Directiva n.º 2006/123/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 12 de Dezembro. E o Decreto-Lei n.º 33/2011, de 7 de Março, que veio adoptar medidas de simplificação dos processos de constituição das sociedades por quotas, entre as quais avulta o princípio do capital livre, nos termos do qual o capital social passa a ser livremente definido pelos sócios, consequentemente eliminando o limite mínimo de 5.000 euros

Os mais consultados A Sanção Pecuniária Compulsória no Contencioso Administrativo Autárquico Luís Chaves Barroso Batista 2011 29 €

Contrato de Trabalho (3ª) João Leal Amado 2011 31 €

A Protecção Social dos Trabalhadores em Funções Públicas Isabel Viseu, Vasco Hilário 2011 30 €

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que o Código das Sociedades Comerciais (CSC) impunha para este tipo social. A introdução destas novas soluções de organização e constituição do capital social das sociedades ditas de capital, não excluindo as antigas formas de constituição e funcionamento de sociedades, veio trazer novas alternativas para a organização dos pactos sociais de Sociedades por Quotas e Sociedades Anónimas (ou seja, novas formas de organização para a empresa moderna), suscitando uma panóplia de renovados actos societários, quer no acto de constituição de novas sociedades, quer nos actos de alteração e transformação das sociedades existentes. Foi este o mote desta segunda edição do JusFormulários Sociedades. Pedro Dias Venâncio Alexandra Garcia Autores de JusFormulários Sociedades

RESUMO O JusFormulários Sociedades é uma obra destinada ao exercício prático relacionado com o Direito das sociedades, nomeadamente participações sociais, sociedades civis e comerciais, contencioso societário e extrajudicial, entre outros temas. Nesta obra encontram-se diversos formulários, no âmbito do Direito das sociedades, contendo diversas notas com referência a legislação e jurisprudência, bem como de autor, dos quais destacamos:  acção judicial sob forma especial e sob a forma comum;  acordo parassocial;  acta do Conselho de Administração;  carta de renúncia;  constituição de sociedades;  contrato de sociedade civil;  contrato de sociedade comercial;  declaração de reconhecimento;  deliberação social;  pacto de sociedade;  procedimento cautelar;  procuração forense. Para facilidade do uso da obra, inclui-se um CD-Rom com a reprodução dos formulários, para que se possam adaptar a cada caso concreto.

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Recuperação de créditos

A acção executiva está sob os holofotes da troika, ou não fosse o crédito malparado uma das grandes causas da pendência processual. A ordem é para recuperar o crédito e rapidamente. Pelo bom funcionamento da Justiça e pela saúde da economia

António Sampaio/Who

Cobrar é preciso

O crédito malparado tem contribuído, ao longo dos anos, para entupir os tribunais, fazendo crescer decisivamente a pilha de processos por resolver. Pela entropia que causa ao funcionamento do sistema e pelo óbvio prejuízo económico para as empresas e para o País, a troika incluiu a acção executiva entre as prioridades no domínio da Justiça. Com indicações claras para que a pendência processual se esbata, nomeadamente com recurso à arbitragem. É um modelo que coloca em evidência o papel do advogado. A propósito, Advocatus publica três olhares sobre 12

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o problema: o de Rui Varela Gonçalves, responsável pelo departamento de seguros e gestão de risco da CCA, o de Bertha Parente Esteves, advogada associada da Cuatrecasas, Gonçalves Pereira & Associados, e o de Rui Pedro Martins, advogado estagiário da BPO Advogados. Em comum, a opinião de que, num Estado de Direito, se impõe a existência de um eficaz mecanismo judicial de recuperação de créditos, quer como bom sintoma de um sistema jurídico globalmente sustentável, quer como motor do dinamismo empresarial. O agregador da advocacia


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Menos crédito, mais cobrança A recuperação de créditos passará pela adopção de medidas de controlo do crescimento do volume do crédito malparado e de diminuição do volume do crédito vencido Até meados no ano passado, uma das razões mais apontadas para a multiplicação das entidades incapazes de cumprir, pontualmente, as suas obrigações vencidas era a crise económico-financeira internacional subsequente à denominada “crise dos subprimes”, que determinou a revisão generalizada por parte das instituições financeiras dos critérios que presidiam à concessão de crédito, restringindo o mesmo. Mais recentemente, a submissão de Portugal às regras do Fundo Europeu de Estabilização Financeira e do Fundo Monetário Internacional foi outro factor determinante para a diminuição da capacidade financeira das empresas e que desencadeou o aumento do crédito malparado. Porém, esta situação não pode ser imputada tão só aos factores acabados de enunciar. Efectivamente, muitas são as empresas que acentuam os seus esforços sobretudo no aumento do volume de vendas, descurando as diligências de cobrança. Por outro lado, muitas são as empresas que fornecem os seus produtos concedendo aos seus clientes plafonds de crédito e prazos de pagamento mais ou menos alargados, sem que tenham o cuidado de, previamente, se inteirarem acerca da real capacidade económica dos mesmos. Esta situação, aliada à inércia das empresas em recorrerem a procedimentos judiciais de cobrança (reconhecidamente lentos e dispendiosos), está na origem da maioria do crédito mal parado. Assim, a recuperação de créditos passará pela adopção de medidas de controlo do crescimento do volume do crédito malparado e de diminuição do volume do crédito vencido. O agregador da advocacia

“Quer (as empresas) venham a optar pela cobrança não judicial das dívidas através do recurso aos mecanismos de resolução alternativa de conflitos, quer a sua opção recaia sobre a cobrança judicial das dívidas, importante é que a decisão de avançar não seja protelada”

“Impõe-se que o controlo e a gestão de créditos passem a ser realizados pelas empresas de forma mais metódica e mais incisiva, o que não só imprimirá celeridade às cobranças, mas contribuirá para o aumento do volume das mesmas”

Entre as medidas de controlo do crescimento do volume de crédito destacam-se (i) a negociação da diminuição dos plafonds de crédito e dos prazos de pagamento já acordados, (ii) a fixação de plafonds e prazos de pagamento menores para os novos contratos; (iii) a obtenção de garantias que cobram os valores dos fornecimentos, (iv) a recolha de informação comercial, financeira, legal e patrimonial sobre os parceiros de negócio e (v) a contratação de seguros de crédito. Por outro lado, e com vista à diminuição do volume do crédito vencido impõe-se que o controlo e a gestão de créditos passem a ser realizados pelas empresas de forma mais metódica e mais incisiva, o que não só imprimirá celeridade às cobranças, mas contribuirá para o aumento do volume das mesmas. Para implementação destas medidas as empresas poderão recorrer à requalificação de trabalhadores que já tenham ao seu serviço, proporcionando-lhes formação específica nessa área, ou poderão contratar trabalhadores especialmente habilitados a realizar o controlo de crédito e a efectuar a gestão de cobranças. Alternativamente, tais tarefas poderão ainda ser delegadas em empresas externas especializadas em recuperação de créditos, as quais possuem o conhecimento, a capacidade e os meios necessários a promover os procedimentos tendentes à cobrança das dívidas. Nas hipóteses em que a cobrança não for possível realizar através do recurso à metodologia supra descrita, as empresas não deverão ter receio de optar por outras formas de cobrança. Porém, quer venham a optar pela cobrança não judicial das dívidas

Bertha Parente Esteves Licenciada pela Faculdade de Direito da Universidade Autónoma de Lisboa, em 1992, e com uma pós-graduação em Direito do Consumo pela Universidade de Lisboa, em 2006. Advogada associada da Cuatrecasas, Gonçalves Pereira & Associados desde 2006

através do recurso aos mecanismos de resolução alternativa de conflitos, v.g. a arbitragem e a mediação, quer a sua opção recaia sobre a cobrança judicial das dívidas, importante é que a decisão de avançar para qualquer uma destas soluções não seja protelada, na medida em que a celeridade de actuação contribui de forma decisiva para a recuperação do crédito. Outubro de 2011

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Recuperação de créditos

Que futuro? Já consideraríamos um passo positivo se da legislação que se avizinha apenas se consagrasse a obrigatoriedade (com consequências) de cumprimento dos prazos pelo Tribunal (BNI incluído) e Agentes de Execução No memorando da troika haverá que conferir particular destaque aos objectivos traçados para a redução das pendências judiciais e aumento da eficácia dos tribunais. Naquele, determina-se que o Executivo concretize um conjunto de medidas concretas como sejam: 1. Criação de sanções económicas sobre a não cooperação do Executado; 2. Introdução de (verdadeira) arbitragem em sede de acção executiva; 3. Optimização do regime de Julgados de Paz; 4. Imposição do cumprimento dos prazos judiciais. O sistema de execuções judiciais é factor essencial para o bom funcionamento e dinamismo da economia. O seu mau funcionamento é sinónimo de problemas de liquidez, de endividamento empresarial e de desvirtuamento do ambiente concorrencial do mercado. Já na reforma legislativa de 2008, como no memorando subscrito pela troika, as propostas apresentadas movem-se numa relação cirúrgica com os dados do European Payment Index. As medidas que agora se anunciam, e cuja calendarização limite se fixa no 1.º trimestre de 2012, são inegavelmente um bom contributo à eficácia e celeridade desejadas no recurso à força coerciva do Estado para recuperação dos créditos resultantes de incumprimento. No entanto, não antevemos com certeza a verificação das melhorias anunciadas, uma vez que os últimos dados conhecidos do 1.º semestre de 2011 sobre créditos vencidos da Coface apresentam uma tendência crescente, mantendo-se o ritmo instalado após 2009. À margem da indução legislativa 14

Outubro de 2011

“O sistema de execuções judiciais é factor essencial para o bom funcionamento e dinamismo da economia. O seu mau funcionamento é sinónimo de problemas de liquidez, de endividamento empresarial e de desvirtuamento do ambiente concorrencial do mercado”

“À margem da indução legislativa não podemos deixar de assinalar que os resultados positivos que se alcançam primam pela valência do Advogado na mediação efectuada, desde a fase extrajudicial, de forma conciliatória dos interesses dissidentes”

não podemos deixar de assinalar que os resultados positivos que se alcançam primam pela valência do Advogado na mediação efectuada, desde a fase extrajudicial, de forma conciliatória dos interesses dissidentes. Os mecanismos são diversos, preventivos ou reactivos e mais não significam que a adaptação prática ao princípio da adequação que se vêm propagando em múltiplas instigações ao legislador processual. No entanto, de forma assustadora, algumas dessas vozes defendem o retorno da condução da acção executiva aos tribunais, onde a satisfação dos créditos – repare-se que temos por pressuposto nesta fase o incumprimento de uma obrigação, obrigação essa certa, liquida e exigível - sempre padeceu de excessiva morosidade própria do “ritmo do despacho judicial”. Não será certamente esse o caminho, nem o terror que se pretende instalar sob o pretexto da ausência de fiscalização dos Agentes de Execução nos merece acolhimento. Aliás, o papel da CPEE só poderá ser visto como revelador das crescentes preocupações com a fiscalização disciplinar e o crescente número de infracções registadas (e sancionadas) sinónimo do sucesso dessa actuação. Ao invés – e colhe a nosso favor – a fiscalização judicial exercida pelo Tribunal no papel do Juiz é em si mesmo opróbrio da lentidão do nosso sistema judicial. Já a última reforma da acção executiva prometia uma reserva de poderes de intervenção ao Juiz sobre as situações mais relevantes, prevendo inclusive prazos de cinco (!) e dez dias para decisão de questões, reclamações ou impugnações avulsas trazidas pelos interessados a juízo.

Rui Pedro Martins Advogado estagiário da BPO Advogados. Licenciado pela Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa em 2008, completou uma pós-graduação em Direito Penal Económico e Europeu, no Instituto Direito Penal Económico e Europeu da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, em 2010

Olvidou no entanto o hábil legislador que os prazos processuais são meramente indicativos (exceptuando, claro, mandatários e partes), razão pela qual a boa prática de recuperação de créditos desaconselha a sua cobrança judicial. A estes exemplos adicionamos outros, como a total inacção do BNI pontualmente verificada entre as notificações a expedir para o(s) devedor(es), sendo frequente processos aguardarem meses à espera de pesquisas sobre domicílio/sede, a necessidade de a penhora dos depósitos bancários depender de autorização judicial, ou ainda, a necessidade de agilização da penhora de créditos do executado. Já consideraríamos um passo positivo se da legislação que se avizinha apenas se consagrasse a obrigatoriedade (com consequências) de cumprimento dos prazos pelo Tribunal (BNI incluído) e Agentes de Execução. O agregador da advocacia


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À espera de melhores resultados Num Estado de Direito, um eficaz mecanismo judicial de recuperação de créditos é um bom sintoma de um sistema jurídico globalmente sustentável, um importante factor de desenvolvimento económico A legítima satisfação dos créditos dos empresários, mediante a intervenção da Justiça, quando necessário, nem sempre tem vencido as diligências dilatórias toleradas pelo processo civil, contribuindo-se para a visão de que o incumprimento compensa. Não podemos perder de vista o objectivo fundamental, que se traduz no direito a uma decisão em prazo razoável, consagrado no n.º 4 do artigo 20.º da CRP, embora sem cair, na ânsia de soluções rápidas para recuperação do elevado crédito malparado, numa multiplicidade de reformas legislativas. Estas preocupações foram também assumidas no Memorando da troika, impondo-se: 1. A realização de uma auditoria dos processos pendentes, com o objectivo de definir medidas mais precisas, a realizar até final de Junho de 2011 (a análise das estatísticas dos processos pendentes foi já realizada pelo Grupo Dinamizador da Detecção e Liquidação de Processos de Execução - GDLE). 2. A eliminação das pendências nos tribunais até meados de 2013; 3. O reforço da resolução alternativa de litígios através da apresentação da Lei da Arbitragem até final de Setembro de 2011 e da operacionalização da arbitragem para as acções executivas até final de Fevereiro de 2012. Estamos em crer que ao centrar no Agente de Execução a maioria dos actos processuais, simplificando o modelo de execução, investindo na sua formação jurídica e dotando-o de melhores sistemas informáticos, será legítimo aspirar a melhores resultados, senão vejamos: O agregador da advocacia

“Ao centrar no Agente de Execução a maioria dos actos processuais, simplificando o modelo de execução, investindo na sua formação jurídica e dotando-o de melhores sistemas informáticos, será legítimo aspirar a melhores resultados”

“É fundamental alicerçar este modelo no rigor, na ética e na deontologia profissional, de modo a gerar maior confiança na comunidade jurídica, criando-se mecanismos eficazes de fiscalização e sancionamento disciplinar e criminal dos Agentes de Execução”

Em 2005, os Agentes de Execução não podiam aceder electronicamente aos registos da Segurança Social, de identificação civil, ficheiros do RNPC, do registo comercial, automóvel e predial, efectuando-se cerca de 220.000 consultas/ano por carta ou fax, das quais 50 por cento eram respondidas por carta (eliminaram-se custos de envio por carta ou telecópia e encurtou-se o tempo de resposta). O livre acesso à Lista Pública de Execuções e o Registo Informático de Execuções, nos quais são publicitados os valores e os nomes dos devedores, garante a todos os cidadãos e empresas a prevenção de processos votados ao fracasso e promove a responsabilização na concessão de crédito. Porém, é fundamental alicerçar este modelo no rigor, na ética e na deontologia profissional, de modo a gerar maior confiança na comunidade jurídica, criando-se mecanismos eficazes de fiscalização e sancionamento disciplinar e criminal dos Agentes de Execução, através do reforço da actuação da Comissão para a Eficácia das Execuções (CPEE). Apesar de alguns exemplos alarmantes, não devemos “tomar a nuvem por Juno” e considerar que, além da actuação própria da CPEE: - é possível deduzir reclamação ou impugnação dos actos do Agente de Execução para o Juiz; - o exequente tem a faculdade de livremente substituir o Agente de Execução; - qualquer cidadão pode apresentar denúncias relativas a actos praticados por Agente de Execução em http://www.cpee.pt. - em Setembro de 2011 deixou de ser possível a movimentação

Rui Varela Gonçalves Licenciado em Direito pela Universidade Lusíada de Lisboa, possui pósgraduações em Direito de Empresas pelo ISCTE, em Direito do Trabalho e em Direito Fiscal pela Faculdade de Direito de Lisboa e em Gestão de Recursos Humanos pela Universidade Católica. É advogado principal e responsável pelo departamento de Seguros e Gestão de Risco da CCA

da conta cliente pelo Agente de Execução. Sabemos que, num Estado de Direito, um eficaz mecanismo judicial de recuperação de créditos é um bom sintoma de um sistema jurídico globalmente sustentável, um importante factor de desenvolvimento económico, potenciador, inclusivamente, de investimento externo, tarefa para a qual vale seguramente a pena que a comunidade jurídica portuguesa dê o seu indispensável contributo. Outubro de 2011

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Turismo

Regulação ou liberalização? Não é ainda possível saber se o legislador interno alcançou os objectivos de reforço efectivo dos direitos dos consumidores e de aumento da qualidade da prestação dos serviços das agências de viagem e turismo ou se aderiu à vertigem liberalizadora preconizada pela Directiva Bolkestein Numa altura em que no seio da UE se discute o regresso ao modelo regulatório em detrimento da tendência liberalizadora – entretanto instituída por força de uma corrente político-ideológica dominante –, surge, como que em contraciclo com a aludida discussão, o novo regime jurídico de acesso e de exercício da actividade das agências de viagem e turismo, determinado pela Directiva n.º 2006/123/CE, do PE e do Conselho, de 12/12/2006, transposta para o ordenamento jurídico interno pelo Decreto-Lei n.º 92/2010, de 26/07. Delineando os princípios gerais a observar pelos diversos sistemas de acesso e de exercício das actividades de serviços no mercado interno da UE, a denominada Directiva Bolkestein reclamava, há muito, um esforço legislativo acrescido no sentido de simplificar e desburocratizar o acesso e exercício da actividade desenvolvida pelas agências de viagens e turismo (AVT). Com efeito, o Decreto-Lei n.º 61/2011, de 6/05, promoveu a extinção do licenciamento enquanto requisito de acesso à actividade em questão, substituindo-o pela mera comunicação prévia. Tal comunicação far-se-á preferencialmente por via electrónica através do Registo Nacional das Agências de Viagem e Turismo, instrumento organizado pelo Turismo de Portugal, I.P. que, contendo uma relação actualizada dos agentes económicos a operar no mercado, potencia uma mais eficaz fiscalização por parte das entidades públicas competentes e uma monitorização mais fiel à realidade que, a cada momento, se verifica no sector. 16

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“O novo regime deixa de exigir a prestação de caução pelas AVT, para impor a subscrição do fundo de garantia de viagens e turismo que responde solidária e ilimitadamente pelo pagamento dos créditos dos consumidores emergentes do inadimplemento, total ou parcial, dos serviços contratados”

“A par do aumento verificado ao nível das garantias dos consumidores, registou-se um reforço significativo da fiscalização relativa ao exercício da actividade, designadamente, mediante a atribuição de competências à ASAE para a aplicação de medidas cautelares”

Entre as várias alterações introduzidas pelo referido diploma merece especial destaque a possibilidade de as pessoas singulares poderem aceder à actividade, isto para não referir a eliminação da exigência de um capital social mínimo para as pessoas colectivas e, bem assim, a supressão do requisito relativo à existência de um estabelecimento para o exercício da actividade em território nacional. Rompendo com a tradição instaurada pelo Decreto-Lei n.º 263/2007, de 20/06, o novo regime deixa, outrossim, de exigir a prestação de caução pelas AVT, para passar a impor a subscrição pelas mesmas do fundo de garantia de viagens e turismo que responde solidária e ilimitadamente pelo pagamento da totalidade dos créditos dos consumidores emergentes do inadimplemento, total ou parcial, dos serviços contratados às AVT (solução que, de resto, se impunha desde que se conheceram os exactos e nefastos contornos do caso Marsans). A par do aumento verificado ao nível das garantias dos consumidores, registou-se um reforço significativo da fiscalização relativa ao exercício da actividade, designadamente, mediante a atribuição de competências à ASAE para a aplicação de medidas cautelares que, no limite, poderão conduzir à suspensão do exercício da actividade ou ao encerramento temporário do estabelecimento. Todavia, não é ainda possível responder, de forma lograda, à questão de saber se o legislador interno alcançou todos os objectivos a que se propôs, a saber, o reforço efectivo dos direitos dos consumidores, o aumento gradual da

Bruno Neves de Sousa Advogado associado da Cuatrecasas, Gonçalves Pereira & Associados desde 2009. Licenciado em Direito pela Universidade de Coimbra, é professor assistente na Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa

qualidade da prestação dos serviços em causa e, bem assim, a inauguração de um regime de cooperação entre os Estados Membros neste domínio; ou se, pelo contrário, aderiu reflexamente à vertigem liberalizadora preconizada pela Directiva Bolkestein, sendo certo que poucas alternativas lhe restavam para fazer o oposto. O agregador da advocacia



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Testemunho

Ana Duarte

Luís Geraldes, 64 anos, conhece bem os cantos à Brisa. Está na empresa há quase 35 anos. Começou como portageiro, ao mesmo tempo que tirava Direito, no curso nocturno. Chegou a director jurídico, função que enaltece pela possibilidade de prevenir situações de litígio

Ramon de Melo

Conhecer os cantos à casa

O percurso de Luís Geraldes na Brisa é, no mínimo, invulgar: o seu primeiro trabalho na empresa foi como portageiro, hoje é o coordenador da direcção jurídica. A sua entrada na empresa deu-se em 1977, quando, acabado de regressar a Portugal, depois da infância e juventude em Moçambique e já com família constituída, se viu sem trabalho. Por um acaso, surgiu o emprego numa portagem - aceitou e nunca mais abandonou a empresa. A sua história com o Direito começou ainda em Moçambique. Era o curso que queria seguir, mas não existia no país. Aliás, na altura da es18

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colha entre Letras e Ciências, ainda no liceu, foi obrigado a optar por Ciências, porque era a única área existente. A alternativa seria estudar no Continente… Acabou por ingressar em Engenharia Electrotécnica, mas facilmente percebeu que não tinha “jeito nenhum para aquilo”. Desistiu, na convicção de que gostava mesmo era de Direito. Já a trabalhar e casado, resolveu “arrepiar caminho”. Inscreveu-se na Universidade de Coimbra para fazer o curso à distância. Entretanto, a licenciatura abriu em Moçambique, mas, em simultâneo, dava-se uma reviravolta política e Luís Geraldes

era obrigado a regressar a Portugal. Ainda recebeu uma oferta de emprego da Shell, para a África do Sul, mas preferiu voltar ao país de onde saíra aos dois anos. Começou a trabalhar na portagem da Brisa, até agora a sua única “entidade patronal” em Portugal. E ingressou finalmente no curso nocturno da Faculdade de Direito de Lisboa. Frequentava o último ano quando a Brisa decidiu reforçar o núcleo jurídico. Concorreu e foi seleccionado. Deixou a portagem e passou a apoiar o advogado do núcleo dando pareceres internos. Formou-se em 1980. O estágio profissional realizou-

-o com Carlos Palhinha, advogado do Entreposto, após o que passou a exercer advocacia no escritório do professor Dias Marques, de quem recorda com saudade a grande cultura jurídica, a capacidade de trabalho e o apoio que, em termos técnicos, sempre disponibilizou aos colegas que com ele colaboravam. Foi “uma fonte de inspiração”. Em 1989 a Brisa criou uma direcção jurídica autónoma e convidou Luís Geraldes para geri-la. Teve então de optar entre a advocacia de empresa e a advocacia privada - escolheu a primeira. Foi uma decisão muito ponderada, até porque ainda hoje O agregador da advocacia


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não consegue definir qual o tipo de advocacia que prefere: no escritório tinha “coisas encantadoras no domínio profissional”, mas a advocacia empresarial é “aliciante”, principalmente pela questão da “prevenção”. Dentro de uma empresa o advogado consegue actuar de forma mais preventiva do que quando está num escritório. Por norma, num escritório o cliente surge já com uma situação que tem de ser resolvida e o advogado não tem modo de evitar que se chegue a essa situação. Mas esta função de consultoria é fundamental no domínio empresarial: Luís Geraldes argumenta que é a consultoria prestada no âmbito da actividade da empresa, desempenhada por advogados profissionalmente preparados, que evita que se cometam erros, que podem resultar no mínimo em processos de contencioso. É a importância desta função preventiva que tenta transmitir às direcções e empresas do grupo, alertando para que não desenvolvam acções sem que passem pelo crivo do advogado. Ainda assim, a experiência já lhe ensinou que, por vezes, “a realidade suplanta a imaginação” e nem sempre é possível prevenir. No entanto, considera importante que dentro da empresa exista a ideia de um permanente acompanhamento jurídico. No departamento jurídico da Brisa existem constantemente mais de mil processos para ver e resolver. Por isso, em matérias muito específicas a empresa opta por recorrer a advogados externos. É o caso do Direito Laboral. Luís Geraldes justifica que esta abordagem facilita a apreciação de todas as questões, pois pode estar em causa “o colega do lado ou um director” e, além de “extremamente desgastante”, “não seria muito saudável” ser um profissional interno a lidar com estes processos. Também as questões relativas ao Direito Fiscal são, pela sua especificidade, entregues a advogados exteriores à empresa, que é ainda acompanhada por escritórios de advogados em grandes negócios ou operações de empréstimos obrigacionistas. Como director jurídico, Luís Geraldes tem pouco tempo para ir a tribunal, o que lamenta: “De vez em O agregador da advocacia

É a consultoria prestada no âmbito da actividade da empresa, desempenhada por advogados profissionalmente preparados, que evita que se cometam erros, que podem resultar no mínimo em processos de contencioso

quando gostava de lá ir, vestir a toga e divertir-me um pouco”. O gabinete que coordena trabalha três grandes áreas: contencioso, contratos e expropriações; apoio às empresas participadas do grupo; e apoio aos novos negócios e internacionalização, núcleo criado há cerca de um ano. A Brisa – explica - aspira progredir no mercado internacional, pelo que é bastante importante a criação deste núcleo, principalmente com a crise que se faz sentir, em que os projectos não podem ser dados como seguros e definitivos. Ao identificar uma mais-valia da consultoria in house não hesita: “O advogado que está cá dentro conhece muito melhor a empresa do que o advogado que está lá fora”. Além disso, consegue ter contacto directo com os centros da empresa, o que lhe permite responder de forma muito mais célere e “eventualmente com um maior rigor”. Os advogados de empresa, resume, “conhecem os cantos à casa”, sabem onde devem recolher os elementos e a quem os pedir. Quase a completar 35 anos ao serviço da Brisa, Luís Geraldes sente-se um advogado realizado, ainda que seja inevitável olhar para trás e pensar como seria a sua vida se tivesse decidido optar pela advocacia em actividade privada. Não enjeita o percurso que fez, mas de uma coisa tem a certeza: se não fosse advogado tinha “insistido” em tirar o curso de engenharia, que o iria “infernizar a vida toda”.

“O advogado que está cá dentro conhece muito melhor a empresa do que o advogado que está lá fora”

PERFIL

Saudade de Moçambique Luís Geraldes foi para Moçambique com a mãe e irmãos quando tinha apenas dois anos. O pai já estava no país, vivendo no Cabo Delgado, em Mataca. Da infância recorda as longas viagens que fazia para ir de Lourenço Marques, onde estudava, até à casa dos pais. Aos nove anos, percorria sozinho cerca de 3000 km, uma viagem que durava todo o dia. Mas o que recorda com maior saudade é de entrar pelo mato, de carro ou a pé, e não ver ninguém, estar só com a natureza. Algo que não se consegue fazer em Portugal. É dessa

relação com a natureza que sente mais falta. Tal como do cheiro da terra e das brincadeiras que tinha com os nativos: “É uma saudade que não se esquece”. Mas voltar para ficar nem pensar, é em Portugal que tem a família, ainda que mantenha em Moçambique muitos amigos. Em 1998 decidiu mostrar o país às filhas. Foi lá que a mais velha viveu mas só até aos seis meses, pelo que não tinha memórias. Foram, pois, três semanas de regresso ao passado.

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ASAP

“Associações de sociedades de advogados – A experiência brasileira” foi o tema do 3.º painel do 4.º Encontro Nacional da ASAP

A experiência brasileira O CESA - Centro de Estudos das Sociedades de Advogados nasceu da reunião, em Janeiro de 1982, de um grupo de amigos para tratar de interesses comuns, nunca discutidos antes, como seja tributação nas sociedades de advogados, formas de contratações, equipamentos de nova geração, planos de carreira A profissão de advogado conhece três formas de actuação no Brasil: • Advogados do “eu sozinho” - Trata-se de uma figura raramente vista, hoje, em grandes centros urbanos. Um ou outro caso se nos depara: em grandes centros, com advogados criminalistas e ou tributaristas, com nomes de grande reputação e notoriedade, ou em locais, no interior dos Estados, com população pouco expressiva em número. É uma figura que tende a desaparecer. • Escritórios de advocacia - É uma tendência. No dia-a-dia da advocacia, é difícil conseguir trabalhar sem a colaboração de um colega de profissão. É quando aquele advogado do eu sozinho procura um colega, ou mais de um, para dividir os trabalhos. Não se trata de um sociedade prevista em Lei, mas de uma sociedade informal, não proibida por Lei. Pretendem divisão de despesas, no que diz respeito ao espaço ocupado, de secretárias, etc. etc. Cada um trata da sua clientela ou mesmo da clientela comum. Uma colaboração informal, para objetivar os fins profissionais. Nada os proíbe de continuarem assim, contudo não deixa de ser um embrião, em muitos casos, de uma futura sociedade de advogados. • Sociedades de advogados - Previstas na Lei nº 8.906, de 1994 (Estatuto da Ordem dos Advogados do Brasil. 20

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“O CESA congrega mais de 900 sociedades de advogados, em todo o Brasil. As suas principais finalidades são promover estudos e manifestar-se sobre questões jurídicas e assuntos relativos à administração da Justiça e ao exercício da profissão de advogado”

“O acompanhamento constante e pontual das proposições de interesse das sociedades de advogados e da classe como um todo possibilita a apresentação de projetos normativos e o posicionamento acerca de novas legislações e de projetos de lei”

Nada mais é do que um estágio seguinte das duas supra mencionadas. Deverá existir o animus societatis, ou seja, um só corpo, uma entidade, uma personalidade jurídica. Deve ter seus atos constitutivos e posteriores alterações devidamente registrados na OAB, do seu respectivo Estado. É uma tendência, hoje, no Brasil. Somente no Estado de São Paulo temos, atualmente, por volta de 12.000 sociedades de advogados inscritas e atuantes. Em razão da sua importância, temos nos Estados, dentro das seccionais estaduais da OAB, comissões das sociedades de advogados. O próprio Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, com sede em Brasília, constituiu, em 1999, a Comissão Nacional das Sociedades de Advogados, onde são abordados assuntos nacionais trazidos pelas seccionais estaduais. CESA - Centro de Estudos das Sociedades de Advogados Em janeiro de 1982, um grupo de amigos se reuniu para tratar de interesses comuns, nunca discutidos antes, ou seja, tributação nas sociedades de advogados, formas de contratações, equipamentos de nova geração, planos de carreira, tudo que à época nos preocupava. Este grupo se reuniu, informalmente, durante um ano e meio e, então, já com alguma expressão e para poder falar com autoridades públicas, se transformou em pessoa jurídica (CESA - Centro

de Estudos das Sociedades de Advogados), em junho de 1983, já não mais com os 12 primeiros participantes, mas com 37, que foram se agregando. O grupo cresceu e começou ter voz ativa perante a entidade maior, a Ordem dos Advogados do Brasil e, por nossa insistência foi formada, dentro da própria OAB/Seccional de São Paulo, em 1992, a Comissão das Sociedades dos Advogados. Esta comissão examina os pedidos de inscrição e arquivamento das sociedades de advogados. Somente a OAB é competente para arquivar os atos constitutivos das sociedades de advogados e alterações contratuais posteriores. Nenhum outro órgão tem essa competência, nem as Juntas Comerciais e nem os Cartórios de Registro de Pessoas Jurídicas. Hoje, o CESA congrega mais de 900 sociedades de advogados, em todo o Brasil. As suas principais finalidades são promover estudos e manifestar-se sobre questões jurídicas e assuntos relativos à administração da Justiça e ao exercício da profissão de advogado; promover o estudo e a defesa de questões de interesse das associadas; oferecer às associadas estudos e serviços que facilitem o exercício da profissão de advogado; representar os interesses das associadas em face dos órgãos de classe e de outras entidades profissionais; e representar os interesses das associadas em juízo. Em 2007, cumprindo um de seus objetivos sociais, o CESA O agregador da advocacia


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colocou à disposição das associadas uma série de serviços complementares à advocacia, devidamente selecionados entre prestadores de serviços que têm experiência comprovada na área e no atendimento a sociedades de advogados. Esses serviços complementares são pesquisados e selecionados pela Central CESA de Serviços, procurando obter condições favoráveis de contratação, além da excelência na qualidade dos serviços referenciados. Desde a sua fundação, o CESA vem realizando reuniões periódicas com as associadas para discutir assuntos de interesse não só das sociedades de advogados, mas de toda a sociedade civil. Para o desenvolvimento de seus objetivos, o CESA conta com diversos comitês temáticos, com a participação ativa de suas associadas, reunidos em três grandes grupos: 1) Empresarial: 2) Institucional e 3) Resolução de Disputas. O Comitê Empresarial abrange os seguintes subcomitês: Agências Reguladoras - Direito Ambiental - Concorrência e Relações de Consumo - Propriedade Intelectual - Relações Internacionais - Societário - Trabalhista e Previdenciário - Tributário; o Comitê Institucional abrange os seguintes subcomitês: Advocacia Comunitária e Responsabilidade Social - Administração e Ética Profissional - Ensino Jurídico e Contatos com Faculdades - Novos Advogados; e o Comitê de Resolução de Disputas abrange os seguintes subcomitês: Arbitragem - Judiciário - Penal. O CESA participa nas discussões dos temas de maior relevância para a advocacia brasileira, sendo chamado a opinar em diversas situações e matérias. Nesse contexto, os comitês temáticos têm uma atuação muito importante, trabalhando as matérias específicas dentro de seus grupos, promovendo seminários e palestras, nos quais as associadas têm a oportunidade O agregador da advocacia

“O contato com o Poder Judiciário e o Ministério da Justiça é permanente, levando ao conhecimento desses órgãos as preocupações da classe e das sociedades de advogados”

“O CESA participa nas discussões dos temas de maior relevância para a advocacia brasileira”

de manifestar suas posições. Há alguns anos um importante canal de comunicação foi estabelecido com os poderes Executivo, Legislativo e Judiciário. O acompanhamento constante e pontual das proposições de interesse das sociedades de advogados e da classe como um todo possibilita a apresentação de projetos normativos e o posicionamento acerca de novas legislações e de projetos de lei. Exemplo disso é a intensa participação do CESA nas atividades da Frente Parlamentar dos Advogados, que congrega a grande maioria dos nossos representantes no Parlamento Nacional com formação jurídica. O contato com o Poder Judiciário e o Ministério da Justiça é permanente, levando ao conhecimento desses órgãos as preocupações da classe e das sociedades de advogados. O CESA mantém vários convênios e parcerias com órgãos governamentais, possibilitando às associadas maior especialização na sua área de atuação, proporcionando a participação de seus integrantes em estágios supervisionados. As atividades do CESA incluem sempre uma participação significativa na atuação das várias entidades que representam os interesses das sociedades de advogados, bem como em fóruns internacionais como a International Bar Association-IBA, American Bar Association-ABA, Association Internacionale Des Jeunes Avocats-AIJA e International Law Association-ILA. Mensalmente, exceto janeiro e julho, nos reunimos na ultima 3.ª feira do mês, para tratarmos de assuntos de nosso interesse, convidando Juízes, Desembargadores, Juristas para abordarem questões que nos dizem respeito. Mas, de tudo o exposto, o mais gratificante foi e é a amizade e companheirismo que passou a existir entre todos os associados. Tornamo-nos uma grande família!

Orlando di Giacomo Filho Fundador do CESA, é licenciado pela Southwestern Legal Foundation, da Universidade do Texas e sócio da Demarest e Almeida, Advogados, em São Paulo

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Universidade

O espírito de Georgetown O Georgetown Club Portugal apresenta-se como uma iniciativa que, à semelhança do que acontece nos Estados Unidos e em muitos outros países, pretende agregar os hoyas representantes de cada Estado no desenvolvimento de uma actividade social de relevo No ímpeto de integrar os novatos recém-chegados ao campus da Universidade de Georgetown, um dos eventos em que tive o prazer de participar em 2008 quando aterrei em Washington D.C. para iniciar o mestrado foi o get-together organizado pelo Georgetown Alumni Club de D.C., que teve lugar num dos bares – viria a concluir muito depois – mais carismáticos da cidade. O evento reuniu alunos e professores da Universidade, estando todos convidados a levar amigos e estes os seus amigos. O get-together foi extremamente interessante pela descontracção das conversas e pelo encontro de pessoas, despretensiosas e bem-dispostas, com histórias de vida e percursos profissionais extraordinárias. Uma experiência que, partilhada entre pessoas com uma enorme curiosidade pela vida, pelo saber e pela troca de experiências orientada por uma hospitalidade indelevelmente descomprometida, marcou, positivamente, a minha chegada a Georgetown. A participação em eventos organizados pelo Georgetown Alumni Club de Washington D.C. sucedeu-se e a vontade de replicar a atmosfera vivida aquando do regresso a Portugal ficou em carteira. Em 2010, acabada de chegar a Portugal, comecei por contactar o Departamento de Alumni de Georgetown na expectativa de receber o registo de todos os portugueses que tivessem passado pela Universidade. A lista, contudo, não era animadora e estava surpreendentemente desactualizada; amigos que sabia terem completado o mestrado na Universidade não estavam identificados. Decidi, então, contactar esses amigos 22

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“O Club conta com cerca de 30 portugueses, com experiências profissionais e de vida muito diversificadas, no âmbito da política, do direito, da gestão e das artes, que passaram pela Universidade de Georgetown quer na qualidade de alunos, quer na qualidade de investigadores, professores ou professores convidados”

“Espera-se que este tenha sido o primeiro de (muitos) outros eventos organizados pelo Club na expectativa de perpetuar, entre os hoyas portugueses, os princípios e os valores transmitidos pela Universidade de Georgetown”

que, receptivos ao projecto, indicaram outros portugueses que sabiam ter estado na Universidade e o processo de criação do Georgetown Club Portugal foi, naturalmente, evoluindo. O Club conta hoje com cerca de 30 portugueses, com experiências profissionais e de vida muito diversificadas, no âmbito da política, do direito, da gestão e das artes, que passaram pela Universidade de Georgetown quer na qualidade de alunos, quer na qualidade de investigadores, professores ou professores convidados. O Georgetown Club Portugal apresenta-se como uma iniciativa que, à semelhança do que acontece nos Estados Unidos e em muitos países espalhados pelo Mundo, pretende agregar os hoyas representantes de cada Estado ou de cada país no desenvolvimento de uma actividade social de relevo, designadamente através da organização de conferências, debates, tertúlias e de outros eventos de cariz cultural, social, benemérito e científico. O primeiro evento decorreu no passado dia 21 de Setembro, em Lisboa, contando com uma apresentação endereçada por Charles Gustafson, reputadíssimo Professor de Georgetown, à qual se seguiu um porto-de-honra oferecido por um dos membros do Club. O get-together foi precedido por uma sessão informativa dirigida a advogados, realizada por Dory Mayer e Caryon Voland (responsáveis pelo Departamento de LL.M. de Georgetown), as quais, num périplo pela Europa com o desiderato de recrutar novos estudantes, apresentaram a Universidade, os seus professores, métodos de ensino e os variadíssimos progra-

Paula Redondo Pereira Fundadora do Georgetown Club Portugal

mas de LL.M. oferecidos. Espera-se que este tenha sido o primeiro de (muitos) outros eventos organizados pelo Club na expectativa de perpetuar, entre os hoyas portugueses, os princípios e os valores transmitidos pela Universidade de Georgetown. O agregador da advocacia



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Sociedades

Preparar o futuro A SRS Advogados reuniu todos os seus colaboradores em mais um encontro anual, que teve lugar no Hotel Tróia Design, nos dias 23 e 24 de Setembro. Com a presença de diversos convidados, provenientes da área do Direito mas também do sector empresarial e das artes, o evento foi marcado por apresentações e debates sobre temas tão prementes como “O futuro das Sociedades de Advogados” e a “Inovação”. No primeiro painel, moderado por Soares Machado, da SRS, os advogados António Pinto Leite (MLGT), Fernando Campos Ferreira (CS Associados), Paulo Pinheiro (Vieira de Almeida) e Rui Medeiros (Sérvulo) reflectiram sobre qual o futuro das sociedades de advogados em Portugal. Houve ainda uma apresentação de Colin Passmore, senior partner da Simmons & Simmons, seguida de um novo painel dedicado ao tema “Inovação”, moderado por Moreira da Silva (Responsável pelo Departamento de Direito Público da SRS) e apresentado por Pedro Rebelo de Sousa, com João Duque (Professor Catedrático do ISEG), António Câmara (ceo Ydreams) e o músico Pedro Abrunhosa como intervenientes. Ambos os painéis despertaram, pela qualidade dos oradores, grande interesse dos participantes. No dia seguinte foi realizada uma actividade de team building, através da qual foi angariado um donativo para a Operação Nariz Vermelho. 24

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SRS Advogados reuniu em Tróia os seus colaboradores

Da esquerda para a direita: Paulo Pinheiro (VdA), Fernando Campos Ferreira (CS Associados), Soares Machado (SRS), António Pinto Leite (MLGT), Rui Medeiros (Sérvulo)

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Passeio Público

Veio para Lisboa por amor a um português que conheceu em Bona. Doze anos depois, esta advogada nascida na Bulgária não tem dúvidas de que Portugal é o seu País para viver. E foi em Lisboa que Magdalena Ilieva, 35 anos, concluiu o curso de Direito, um sonho de sempre que concretiza na Sérvulo Correia & Associados

Ramon de Melo

Uma búlgara em Lisboa

Magdalena Ilieva estudava Direito em Bona quando conheceu um português que trabalhava na embaixada de Portugal. Apaixonou-se. Foi o princípio dos últimos 12 anos da sua vida: quando o futuro marido teve de regressar, decidiu acompanhá-lo. Fez de Lisboa a sua nova casa, adiando o desejo de vol26

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O Direito, é um sistema “aparentemente muito complexo, mas com uma lógica interna que é um desafio conhecer”

tar ao seu país natal, a Bulgária. Magdalena nasceu há 35 anos em Velingrad, cidade do sul da Bulgária onde passou parte da infância, até que aos 13 anos ingressou num colégio interno. Quando teve de escolher o curso não hesitou – decididamente Direito. Durante dois anos estudou em Sofia, mas acabaria por O agregador da advocacia


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Este ano, de férias no Algarve, com a filha

se mudar para a Alemanha. Inscreveu-se na universidade e frequentou a licenciatura por mais dois anos, até que as questões do coração a trouxeram para Portugal. Pretendia perseguir o sonho de se tornar advogada mas tinha um problema… não dominava o português. Não desistiu, porém. Durante um ano dedicou-se ao estudo da língua, tendo sempre como objectivo o curso de Direito. Conseguiu. No ano seguinte entrou na Faculdade de Direito da Universidade Católica, em Lisboa, onde se licenciou. O caminho até se formar não foi fácil, mas Magdalena foi persistente. Filha de um dentista e de uma engenheira, a advocacia não foi certamente fruto de inspiração familiar. Foi uma decisão ponderada ao longo do tempo, fomentada por uma certa curiosidade sobre o mundo complexo das regras. O Direito é “algo omnipresente a todos os aspectos da vida das pessoas, das empresas, dos países, são as regras”, é um sistema “aparentemente muito complexo, mas com uma lógica interna que

O escritório de fim-de-semana na Lousã, em 2009

é um desafio conhecer”, explica. Com a ingenuidade natural dos 15 anos sonhava seguir Direito e dominar um mundo de regras e toda a complexidade que lhe é inerente. Hoje, percebe que não é possível, mas não se arrepende de ter seguido esta área. Gosta de viver em “permanente desafio” e o Direito permite-lhe isso: “Não nos aborrecemos, não pensamos que podemos chegar a um ponto da nossa vida profissional em que atingimos tudo e sabemos tudo, porque o Direito está em permanente evolução”. É este desafio constante que a seduz na profissão. A primeira experiência profissional de Magdalena no mundo da advocacia foi na sociedade Ferreira Pinto & Associados, onde iniciou o estágio a convite de Fernando Ferreira Pinto. O advogado, que fora seu professor no último ano da licenciatura, tem sido um verdadeiro mentor. No escritório teve o primeiro contacto real com a profissão: deparou-se com alguns casos importantes que a marcaram. Recorda, nomeadamente, uma aquisição de empresa que se

Magdalena elege de entre o amplo mundo do Direito o que define como “a base de todos os ramos”, o Direito Privado. Nos dias de hoje, o Direito Comercial assumiu uma grande relevância, tornando-se uma área em que as sociedades apostam cada vez mais. Foi nessa área que se especializou

Na ilha açoriana de São Miguel, em 2010

revelou um processo bastante complicado. Foi um trabalho “bastante importante e interessante”, com “alguma tensão pelo meio”, que teve o privilégio de acompanhar, enquanto ainda era estagiária. Quando, em 2008, a Ferreira Pinto & Associados se fundiu com a Sérvulo Correia & Associados, Magdalena acompanhou a equipa da Ferreira Pinto e ingressou na nova sociedade. Reconhece que, quando se deu a fusão, os advogados sentiram alguma diferença, mas hoje sente que são “uma sociedade mais consolidada” e que “existe um sentido mais institucional da vivência na sociedade”. Licenciada há sete anos, Magdalena elege de entre o amplo mundo do Direito o que define como “a base de todos os ramos”, o Direito Privado. Nos dias de hoje, o Direito Comercial assumiu uma grande relevância, tornando-se uma área em que as sociedades apostam cada vez mais. Foi nessa área que se especializou. Magdalena Ilieva gosta do seu trabalho e de Portugal, que considera >>>

O agregador da advocacia

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Passeio Público

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“Não nos aborrecemos, não pensamos que podemos chegar a um ponto da nossa vida profissional em que atingimos tudo e sabemos tudo, porque o Direito está em permanente evolução”

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o seu “país de eleição para viver”. Confessa que a adaptação foi muito mais fácil do que na Alemanha, até porque os portugueses “são muito divertidos, comunicam mais e é muito fácil fazer amizades”. Apesar de os búlgaros e os portugueses terem características culturais bastante diferentes, a advogada consegue encontrar alguns pontos em comum – um deles é precisamente a facilidade de comunicação. Isto fá-la sentir-se mais em casa. Na sua opinião, o que faz um país ou uma organização são as pessoas, a sua capacidade de receber e fazer amizades. Daí que o modo de viver dos portugueses, mais especificamente dos lisboetas, a cative. Aprecia a cultura da boa alimentação e as tradições das relações familiares e com amigos. Lisboa já é “a sua cidade”. O “clima agradável” fá-la gostar ainda mais: afinal, sabe o que é viver num país em que na maior parte do ano não se vê o sol… Quando veio para Portugal com o marido, este assumiu a “missão” de lhe mostrar o país, a gastronomia e o “povo real”. Tem cumprido a promessa. E o Algarve é, sem dúvida, o seu “cantinho de férias” e o “refúgio” quando precisa de descansar. Mas, além de Portugal, conhece outros países. Fascina-a o turismo cultural, pegar na mochila e partir à descoberta de cidades e civilizações, algo que costumava fazer mas que, actualmente, tem sido um pouco mais difícil: é que Magdalena tem uma filha de oito anos, ainda não “suficientemente crescida” para estas viagens. No horizonte está uma viagem à Índia ou China, países que lhe despertam alguma curiosidade pelo exotismo e pela diferença. Depois de viajar bastante pela Europa e visitar países de raiz europeia pretende agora conhecer locais com cultura e tradições bastante diferentes. Magdalena foi mãe quando estava no quarto ano da licencia-

O que faz um país ou uma organização são as pessoas, a sua capacidade de receber e fazer amizades. Daí que o modo de viver dos portugueses, mais especificamente dos lisboetas, a cative

tura. É um papel que a profissão, “muito exigente”, torna mais difícil, mas, ainda assim, tem conseguido conciliar as duas coisas, principalmente graças ao apoio do marido e da família. Aproveita ao máximo o tempo que passa com a filha, principalmente para brincar e conversar. E tenta, de forma simples, explicar-lhe que “o advogado ajuda as pessoas a resolver problemas”. A filha já vai dizendo que gostaria de ser advogada, o que agrada a Magdalena, embora não queira interferir na escolha: “Vamos ver se vai seguir Direito”...

PERFIL

A advogada que tocava oboé A advogada da Sérvulo & Associados tocou oboé, durante aproximadamente sete anos, numa orquestra juvenil, na sua terra natal na Bulgária. Em pleno regime socialista havia uma grande aposta na formação cultural e artística das crianças, fomentando a participação neste tipo de actividades. Hoje é algo que recorda com saudade, reconhecendo que a prática do oboé contribuiu bastante para a formação e desenvolvimento da sua personalidade. Com a orquestra fez várias viagens de autocarro pela Europa. Eram viagens divertidas, mas sempre em regime low cost. Magdalena recorda particularmente a ida à Síria, que representou o contacto com outro modo de viver, com mentalidades diferentes, o que a marcou bastante. Era muito nova e esta viagem foi “chocante” em alguns aspectos, mas simultaneamente “fascinante”. Quando aos 13 anos ingressou num colégio longe de Velingrad, abandonou a orquestra e, consequentemente, o oboé. Hoje já não toca… mas deixa a promessa de um dia comprar um oboé e voltar a tocar.

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Trabalho

De vitalício a precário Se até aqui se olhava para o “emprego vitalício” como um dado adquirido, é inegável que este portuguese dream é uma “espécie em vias de extinção”, que não se compadece com a actual realidade sócio-económica, cada vez mais competitiva A necessidade de reforma da nossa estrutura jurídico-laboral tem vindo a incentivar a criação de mecanismos que permitam alcançar uma maior flexibilização da contratação. Um dos mecanismos que tem vindo a assumir maior visibilidade é o contrato de trabalho temporário, que - regulado pela primeira vez no Decreto-Lei n.º 358/89, de 17 de Outubro -, foi incorporado no Código de Trabalho de 2009, não só pela sua crescente utilização, mas sobretudo pela importância que tem vindo a assumir no actual contexto sócio- económico português. De destacar que, segundo dados do Eurostat, entre 1985 e 2005, a utilização do trabalho temporário em Portugal cresceu cerca de 17 por cento, sendo um dos países europeus que actualmente mais recorre a este tipo de contratação. O contrato de trabalho temporário pode ser caracterizado como uma relação triangular, uma vez que pressupõe a interacção de três sujeitos: a empresa de trabalho temporário (que recruta, contrata, remunera e exerce poder disciplinar), a empresa utilizadora (que recebe o trabalhador e, sem o integrar nos seus quadros, exerce, em relação àquele, por delegação da empresa de trabalho temporário, os poderes de autoridade e de direcção próprios da entidade empregadora), e, por fim, o trabalhador (que, não obstante ser contratado pela empresa de trabalho temporário, exerce a sua actividade nas instalações da empresa utilizadora, sob a orientação desta). Este expediente pode ser utilizado nas situações elencadas no n.º 1, do artigo 175º, e nas alíneas a) a g), do n.º 2, do artigo 140º, ambos do Código de Trabalho, entre as quais O agregador da advocacia

“Do ponto de vista do trabalhador não podemos deixar de ponderar que o vínculo estabelecido é temporário - e, por consequência, precário. (…) No entanto, a verdade é que este tipo de contrato representa a possibilidade de se inserir mais rapidamente no mercado de trabalho”

“O contrato de trabalho temporário surge como uma forma de responder às necessidades das empresas no sentido de uma maior flexibilidade de contratação no contexto jurídico-laboral e como uma alternativa (ou falta dela) para o trabalhador”

destacamos o acréscimo excepcional da actividade da empresa, a substituição temporária de trabalhador, a realização de actividades sazonais ou pontuais, a vacatura de posto de trabalho e a realização de projecto temporário. Através da utilização do contrato de trabalho temporário, as empresas utilizadoras deixam de ter a seu cargo o recrutamento e selecção dos trabalhadores, tendo um acesso rápido a um grande número de candidatos, muitas vezes especializados. Deste modo, usufruindo de uma maior flexibilidade contratual, as empresas utilizadoras encontram uma forma de suprir as dificuldades impostas pela legislação laboral, sobretudo no que respeita à contratação a termo. Tudo isto se traduz, necessariamente, numa optimização de custos. Do ponto de vista do trabalhador não podemos deixar de ponderar que o vínculo estabelecido é temporário - e, por consequência, precário. Além disso, acresce ainda que o trabalhador não integra, de modo completo, nenhuma das estruturas empresariais, pois, por um lado, tem um vínculo como uma empresa de trabalho temporário onde não exerce a actividade e, por outro, exerce a sua actividade nas instalações de uma empresa com quem não tem vínculo contratual. No entanto, a verdade é que este tipo de contrato laboral representa para o trabalhador a possibilidade de se inserir mais rapidamente no mercado de trabalho, permitindo-lhe, ainda, colaborar em empresas e participar em projectos a que, de outro modo, não teriam acesso. Se até aqui se olhava para o “emprego vitalício” como um dado adquirido, é inegável que este portuguese dream é uma “espécie

Rodrigues de Melo Advogado, analista de Jurisprudência para a base de dados JusNet, editada pela Coimbra Editora, grupo Wolters Kluwer

em vias de extinção”, que não se compadece com a actual realidade sócio-económica, cada vez mais competitiva. Assim, apesar de todos os inconvenientes, o contrato de trabalho temporário surge como uma forma de responder às necessidades da maioria das empresas no sentido de uma maior flexibilidade de contratação no contexto jurídico-laboral, e como uma alternativa (ou falta dela) para o trabalhador. Outubro de 2011

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Entrevista

Hermínio Santos jornalista hs@briefing.pt

“Para que a advocacia seja melhor desejo, acima de tudo, estabilidade legislativa”, afirma Pedro Santana Lopes, 55 anos, sócio da Global Lawyers. Numa entrevista dada antes de ser nomeado para Provedor da Santa Casa da Misericórdia de Lisboa, o antigo primeiro-ministro faz um balanço positivo do seu regresso à advocacia e diz que há regras do capitalismo que têm de ser banidas

Pedro Santana Lopes, sócio da Global Lawyers

Ramon de Melo

É preciso estabilidade legislativa

Advocatus | Voltou a apostar na advocacia depois de muitos anos na política. Que balanço é que faz deste seu regresso? Pedro Santana Lopes | Faço um balanço positivo. Não é fácil retomar uma actividade profissional liberal depois de anos de interrup30

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ção. Já agora aproveito para explicar porque é que interrompi a actividade, porque muitas pessoas vão para o Governo e continuam com os seus escritórios. Quando fui para a Figueira da Foz, correspondendo a um desafio do Professor Marcelo Rebelo de Sousa, era

advogado na Sociedade Vaz Serra, Moura, Chaves e Associados que na altura se fundiu com outro escritório. Alguns advogados acompanharam esse processo de fusão, mas eu não. Continuei na rua de São Bernardo e com um escritório pequeno, onde tinha alO agregador da advocacia


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gum bom movimento. Com a ida para a Figueira da Foz tornou-se absolutamente impossível continuar, nomeadamente pela incompatibilidade de funções. Quando saí do Governo, em 2005, retomei sozinho a actividade da Pedro Santana Lopes & Associados, no Chiado, em Lisboa, e um ano depois fui convidado pelos meus colegas Manuel Marinheiro, António Gonçalves e João Nogueira da Rocha para vir para este escritório. Advocatus | Quantos sócios é que são nesta sociedade? PSL | Somos sete sócios na sociedade, que está na origem da Global Lawyers. Actualmente trabalhamos muito, e eu em concreto, no acompanhamento de clientes ou de outros novos que aparecem para renegociação de dívida junto de instituições financeiras. Tenho dito que nestas alturas de crises acontece com os advogados o que acontece noutro plano com os médicos – as pessoas em dificuldades procuram mais os médicos. Com os advogados, é em situações de crise que eles são mais procurados e infelizmente, até, em situações de insolvência. Antes da insolvência há uma possibilidade que é a da consolidação dos passivos, da sua dívida, e é isso a que me tenho dedicado nos últimos tempos e é um trabalho de que gosto muito. Advocatus | A sociedade tem outras competências… PSL | Fazemos fundamentalmente administrativo, acompanhamos procedimentos de investimento – mais português no estrangeiro do que estrangeiro em Portugal –, direito laboral e um pouco de direito penal. Trabalhamos também com algumas entidades públicas, nomeadamente autarquias. Advocatus | Esteve 10 anos afastado da advocacia. Que diferenças é que notou neste seu regresso à profissão? PSL | Devo dizer, com franqueza, que encontrei uma classe mais agitada, com confrontos internos mais acesos, como é público e O agregador da advocacia

“Somos sete sócios na sociedade, que está na origem da Global Lawyers. Actualmente trabalhamos muito, e eu em concreto, no acompanhamento de clientes ou de outros novos que aparecem para renegociação de dívida junto de instituições financeiras”

“Não querendo meter a foice em seara alheia acho que é muito difícil, no actual contexto económico, manter as grandes sociedades tal como estão mas cada um saberá de si. A dimensão ideal é a dos pequenos e médios escritórios de advocacia”

notório. Foi algo que eu estranhei um pouco porque aprendi desde muito novo que a profissão de advogado e o magistério da advocacia impunha alguma solidariedade de classe. Foi uma mudança que estranhei mas à qual me habituei pois quem vem da política não pode estranhar isso. Em segundo lugar, notei, e apesar do que se diz, uma maior velocidade de decisão, embora não seja generalizada. Falo nomeadamente dos tribunais com os quais lido mais, embora não vá à barra – é uma pena que eu tenho, nunca fui à barra, e um destes dias irei. A terceira diferença que reparei é na parte administrativa e aqui reconheço ao Governo que esteve em funções antes do actual uma melhoria significativa na vida dos advogados. Tornarmo-nos absolutamente infoincluídos é uma mudança radical em relação há 10 anos.

“Tornarmo-nos absolutamente infoincluídos é uma mudança radical em relação há 10 anos”

Advocatus | Hoje em dia quais são os aspectos que considera essenciais para que o exercício da advocacia melhore em Portugal? PSL | Há muitos aspectos que condicionam o exercício da advocacia mas condicionam a sociedade em geral. Dou-lhe um exemplo: quer os advogados quer todos os outros corpos da Justiça convencerem-se de que o tempo e os bens dos cidadãos, para além do seu direito de personalidade, têm um valor incomensurável. Em segundo lugar que a Justiça e a perspectiva de gestão, ou seja, fazer Justiça e gerir bem, não é incompatível. Por isso acolho de modo positivo as medidas contidas no programa do Governo de libertar um pouco os juízes da obrigatoriedade de intervirem em todos os actos e despachos para que de facto a gestão dos tribunais ocorra de modo mais eficaz. A advocacia em si mesma, com franqueza, é eficiente e capaz se servir bem o cidadão. Sabemos que em Portugal há muitas questões com o acesso ao Direito e os pagamentos do Estado aos advogados mas eu diria que para que >>> Outubro de 2011

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Entrevista

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a advocacia seja melhor desejo, acima de tudo, estabilidade legislativa. Isso, eu li nas intenções da nova ministra, que também o deseja apesar de o programa conter algumas alterações nomeadamente em sede de Processo Civil, no Código Penal e no Processo Penal.

“A Justiça e a perspectiva de gestão, ou seja, fazer Justiça e gerir bem, não é incompatível”

Advocatus | O futuro está nas grandes sociedades de advogados ou há espaço para pequenas sociedades e até para o exercício individual da profissão? PSL | Acho que há espaço para os pequenos escritórios. Fazer advocacia isoladamente é sempre possível mas hoje em dia a exigência de formação multifacetada é tão grande que eu vejo com dificuldade a existência de escritórios com menos de, por exemplo, 10 pessoas, para aqueles que são os ramos do Direito mais solicitados. Não querendo meter a foice em seara alheia acho que é muito difícil, no actual contexto económico, manter as grandes sociedades tal como estão mas cada um saberá de si. A dimensão ideal é a dos pequenos e médios escritórios de advocacia mas não posso deixar de dizer que tenho uma admiração enorme pela forma como as grandes sociedade foram construídas e conseguidas e pela capacidade de se manterem. Advocatus | E a entrada de escritórios estrangeiros em Portugal é, para si, natural? PSL | Desde que nós sejamos capazes de fazer o mesmo. Não podemos olhar para isso de uma forma resignada e portanto temos que, também, ser capazes de tomarmos posições em sociedades estrangeiras e não só depois de elas tomarem a iniciativa. Normalmente todos os escritórios dizem que têm parcerias no Brasil, Angola e Moçambique mas eu, por enquanto, não quero desenvolver parceria nenhuma. Quero consolidar o meu trabalho. Como calcula eu conheço advogados em todos esses países mas ninguém pode dizer que os procurei para estabelecer qualquer parceria.

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“A grande dificuldade em Portugal é tratar do que é óbvio, há coisas que são óbvias e que depois demoram muito tempo a resolver. Por exemplo, o nosso sistema de governo”

“Normalmente todos os escritórios dizem que têm parcerias no Brasil, Angola e Moçambique mas eu, por enquanto, não quero desenvolver parceria nenhuma. Quero consolidar o meu trabalho”

Advocatus | Considera que o Bastonário da Ordem tem feito um bom papel na defesa dos interesses dos advogados? PSL | Tem tido a sua utilidade mas por vezes radicaliza um pouco as suas posições. Mas penso que ele abriu algumas janelas. Eu gosto de ver a classe e o bastonário com uma atitude institucional mais moderada. Conheci-o quando era presidente da Câmara da Figueira da Foz, era ele jornalista e devo dizer que tenho simpatia por ele. Gosto das pessoas desassombradas e diria que concordo com cerca de 51 por cento das suas posições. Acho que é uma pessoa corajosa mas os conflitos públicos no seio da classe é algo que eu não gosto de ver e às vezes alimenta-se isso um pouco em excesso. Advocatus | O que é que diria hoje a um jovem recém-licenciado em Direito que anda à procura do seu primeiro emprego? PSL | Quando estou na Faculdade digo aos meus alunos para fazerem tudo para estudar, que tenham pelo menos 14, porque hoje em dia as licenciaturas são mais curtas, depois há um mestrado e com a sociedade tão competitiva como está, tão fria, tão capaz de marginalizar as pessoas, é muito importante fazer um esforço na nossa formação. Tenho um filho que é advogado e outro que entrou este ano na Clássica e uma filha em Economia, na Universidade Nova, e digo-lhes que façam tudo para terem pelo menos 14 e se não tiverem vão procurar trabalhar com quem tenha um percurso de triunfo e que tenha começado por baixo, com um percurso de dificuldade, de vencer barreiras difíceis. Alguém que não tenha começado na advocacia herdando ou com o escritório feito. Advocatus | Concorda com os estágios de três anos para os recém-licenciados? PSL | Com toda a franqueza acho pesado. Lembro-me muito bem O agregador da advocacia


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“Passamos a vida a tomar grandes medidas – o novo mapa judiciário, fechar centros de saúde – em vez de irmos pelo chamado gradualismo reformista”

do que se dizia quando eu tinha 20 anos e o que representava o serviço militar na vida das pessoas – obviamente que não é a mesma coisa porque com os advogados estamos a falar de um estágio profissional, mas é complicado. Num percurso que precisa também do estímulo é muito complicado dizer às pessoas que estarão três anos sem poderem ter a sua ferramenta profissional. Embora compreenda as dificuldades que existem e que a Ordem procura gerir, do número de advogados que há, da sua distribuição no território, acho pesado. Advocatus | E o que é que sugeriria? PSL | Um ano e meio, dois anos O agregador da advocacia

“Quem é apanhado a copiar já não devia poder ser juiz, por uma questão de exemplo para a sociedade, e ser advogado devia precisar de cinco anos de estágio”

no máximo, seria razoável. Se fosse eu a decidir trabalharia nesse sentido de um ano e meio. Advocatus | O que é que sentiu quando teve conhecimento dos episódios do copianço? PSL | Tristeza. Quem é apanhado a copiar já não devia poder ser juiz, por uma questão de exemplo para a sociedade, e ser advogado devia precisar de cinco anos de estágio. São actividades profissionais que têm a ver com um bem supremo que é a Justiça. Quem lida com esse bem não pode passar por situações dessas. Portanto, acho inconcebível o que se passou e um sinal próprio dos tempos que vivemos que às vezes parecem uma ópera cómica permanente.

Advocatus | Que leitura é que faz do estado do País neste momento? PSL | A grande dificuldade em Portugal é tratar do que é óbvio, há coisas que são óbvias e que depois demoram muito tempo a resolver. Por exemplo, o nosso sistema de governo. Sabemos que gera muita instabilidade, temos choques constantes entre Presidente e primeiro-ministro. Temos o sistema de governo mais original do mundo mas não o resolvemos. Sistema eleitoral: toda a gente diz que há muito deputados, não há ciclos uninominais, mas andamos há 20 anos para resolver esta questão. Passamos a vida nisto. Há outra questão no País, que é grave e tem a ver >>>

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Entrevista

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“É fundamental acreditarmos em nós próprios. A crise que vivemos em 2008 é uma crise de confiança, de valor”

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com a desertificação do território, a concentração de população em Lisboa e no Porto. Acho que é um dos grandes dramas de Portugal. Eu diria que os advogados, os juristas, têm de ser especialmente mobilizados para participar na tarefa da reconstrução administrativa de Portugal. A nossa organização administrativa tem de sofrer uma mudança grande e portanto para nós sermos competitivos é fundamental ter racionalidade, para além dos valores e dos princípios, que não esteja alheada das decisões. Nós temos cada vez mais um País construído em torno de duas grandes cidades e depois o resto está desertificado ou cheio de auto-estradas mas sem pessoas. Passamos a vida a tomar grandes medidas – o novo mapa judiciário, fechar centros de saúde – em vez de irmos pelo chamado gradualismo reformista. Portanto, como eu vejo o estado geral do País é, apesar de tudo, muito endividado, como sabemos, mas onde as pessoas e as instituições vão funcionando apesar do mau sistema de governo, do mau sistema eleitoral e é a isso que se atribui o facto de continuarmos independentes depois de quase nove séculos de História. Agora, esta independência antes defendia-se com canhões, baionetas ou espingardas, hoje em dia defende-se com negociações ou com a titularidade de acções e aí é mais complicado do que foi a defesa com armas. É fundamental acreditarmos em nós próprios. A crise que vivemos em 2008 é uma crise de confiança, de valor. Há subsistemas da sociedade que tiveram desenvolvimentos irracionais, a parte do imobiliário, por exemplo, mas a economia continua a funcionar. O que vivemos é muito uma crise do sistema financeiro, das bolsas, os mercados de capitais, a banca e isto tem que ser regulado. Hoje em dia temos as economias dependentes das agências de rating e do funcionamento dos vendedores e compradores de acções. Não foi só o estado social que foi posto em causa, também o capitalismo, tal como o conhecemos, foi posto em causa e há pro-

“Não foi só o estado social que foi posto em causa, também o capitalismo, tal como o conhecemos, foi posto em causa e há produtos e regras do capitalismo que têm de ser banidas, não são só os subsídios de natal e de férias que têm que acabar”

dutos e regras do capitalismo que têm de ser banidas, não são só os subsídios de natal e de férias que têm que acabar. Enquanto o mundo não se convencer que tem de se sentar à mesa o tempo que for preciso e encontrar uma solução em relação à dívida, às paridades das moedas, aos produtos do sistema financeiro, a hipotecas e aos regimes jurídicos dos mercados de capitais, o cidadão comum não acredita. O futuro de Portugal não depende hoje de nós, depende do mundo. Portanto, não estou pessimista nem optimista. Procuro ser realista. Acho que temos um primeiro-ministro e um líder da oposição que são pessoas contidas e discretas, adequados aos tempos que vivemos. Advocatus | Mas não acha que o actual modelo de desenvolvimento de Portugal poderia ter sido corrigido mais cedo? PSL | Sem dúvida e a culpa é de todos. Os últimos 10 anos foram especialmente graves no endividamento. Foi uma mistura de um facilitismo deslumbrado com a União Europeia e com o que ela nos permitiu, uma crise internacional e direitos internos, falta de regulação. Acho que houve um grande défice de actuação do Banco de Portugal durante uma série de anos. Como é que os economistas não viram isto mais cedo? Como é que não previram uma série de coisas que iam acontecer em Portugal?

“Andar a preparar-me para ir à barra dá-me uma sensação de juventude fantástica. É como se tivesse acabado o meu curso agora. A vida tem de ser isso e há que ter a capacidade de transmitir isso aos outros”

Advocatus | Em Portugal, temos um economista que é Presidente da República e que também contribuiu para o modelo de desenvolvimento do País… PSL | …e que também não viu. Portanto o que aconteceu deve ter sido uma grande surpresa para ele. Fez alertas, mas ninguém fez o alerta para o tipo de desastre que aí vinha. Ninguém fez. Advocatus | O acordo com a troika vai mesmo alterar a nossa forma de viver? PSL | Vai. A grande mudança de hoje em dia é que o papel do EstaO agregador da advocacia


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do, não só em Portugal, vai sofrer uma alteração profunda e de facto o Estado social do século XIX vai aligeirar muito o seu peso, o seu papel, a sua intervenção, porque a questão de fundo – o que eu vou dizer é impopular – é a competitividade com as economias asiáticas, que de facto têm regras diferentes. A União Europeia como existe, e também pelo que está a acontecer, pode ser muito facilmente posta em causa. Eu sou muito céptico em relação à possibilidade da continuação de uma só moeda para todos os países que pertencem neste momento à zona euro. Advocatus | Já assistimos à queda do Muro de Berlim e da União Soviética, ao 11 de Setembro e Londres viveu os piores momentos desde a II Guerra Mundial. Estaremos a assistir ao fim do capitalismo tal como o conhecemos? PSL | Acho que estamos a assistir ao fim de um ciclo. Nós estamos sem ideologia há quase 20 anos, navegamos à vista nesse aspecto. A única ideologia é o liberalismo, o capitalismo mais ou menos social-democrata mas com a queda do Muro de Berlim e a falência de outras propostas ideológicas não há competitividade ideológica. Hoje em dia não há verdadeira escolha entre duas alternativas. A grande diferença resume-se à política fiscal e ao rendimento social de inserção. O que se vai seguir acho que vai ser algo mais exigente, mais implacável, em que os indivíduos têm que, cada vez mais, tomar conta deles próprios, constituir esquemas de segurança social cada vez mais privados, solidários, cooperativos, cada vez com menos controlo do Estado. Advocatus | Dos cargos que ocupou na política, qual aquele de que guarda melhores recordações? PSL | Eu digo sempre que o cargo mais bonito é o de presidente de Câmara porque é aquele que permite mexer mais com a vida das pessoas. Uma das coisas que O agregador da advocacia

“Acho que estamos a assistir ao fim de um ciclo. Nós estamos sem ideologia há quase 20 anos, navegamos à vista nesse aspecto. A única ideologia é o liberalismo, o capitalismo mais ou menos social-democrata”

gostava era entrar nos bairros e bater à porta das pessoas. Como primeiro-ministro isso não é possível. Quando estava em São Bento, como primeiro-ministro, sentia essa falta de ir ter com as pessoas e um presidente da Câmara pode mudar a vida de uma família com uma decisão sua. Advocatus | Actualmente entre a advocacia, o ensino e a política qual é a sua prioridade? PSL | A advocacia e um dia destes tenho que ir à barra. Tenho essa “falha” e ando a preparar-me para isso. Tenho 55 anos e esta é uma nova fase da minha vida. É bom termos sempre a capacidade de imaginar novos desafios, novas experiências. Andar a preparar-me para ir à barra dá-me uma sensação de juventude fantástica. É como se tivesse acabado o meu curso agora. A vida tem de ser isso e há que ter a capacidade de transmitir isso aos outros.

“A União Europeia como existe, e também pelo que está a acontecer, pode ser muito facilmente posta em causa”

PERFIL

“Aprender sempre” O lema de vida de Pedro Santana Lopes resume-se numa expressão: aprender sempre. É isso que diz aos filhos e aos seus alunos da Universidade Lusófona e foi isso que fez toda a vida. “Quando saí do Governo e em momentos que não são fáceis, em que temos de recomeçar, a primeira preocupação foi aprender”, afirma. Uma das primeiras coisas que fez quando saíu de São Bento foi aprender a tocar piano. A música não era uma novidade na sua vida pois até aos 15 anos estudou violoncelo na Gulbenkian, mas o piano exigiu esforço e atenção. Licenciado em Direito pela Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa (1973/1978), Pedro Santana Lopes já fez quase tudo na política portuguesa – foi assessor jurídico do primeiro-ministro Sá Carneiro, autarca, eurodeputado, deputado, secretário de Estado e primeiro-ministro – e ocupou a presidência

do Sporting. Nos anos 80 do século passado foi um dos impulsionadores de um grupo de comunicação social que lançou a Sábado (na sua primeira versão) o semanário O Liberal e a Radiogest. Inscreveu-se na Ordem dos Advogados em 1984 e, entre 1995 e 1996, foi advogado no escritório Vaz Serra, Moura, Chaves e Associados. Na área académica foi investigador do Instituto de Direito Europeu e do Instituto para a Investigação da Ciência Política e Questões Europeias da Universidade de Colónia (1979/80), assistente universitário na Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa, na Universidade Moderna, na Universidade Lusíada, na Universidade Internacional e na Universidade Lusófona (desde 1984). Actualmente é um dos sócios da Global Lawyers, Santana Lopes, Castro, Vieira, Teles, Silva Lopes, Calado, Cardoso & Associados - Sociedade de Advogados.

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Debate

Reformar a prova? Reformar a prova não depende obrigatoriamente de alterações legislativas, podendo ser conseguida pela prática, enquadrada por uma jurisprudência constante Começo por uma declaração de princípios: sou intrinsecamente adverso a qualquer (nova) reforma do processo civil. Desde a (grande) reforma de 1995/1996 foram publicadas 37 alterações ao CPC, que mexeram em partes substanciais do código, mas poucos serão os “utilizadores” dos tribunais que dirão que esse esforço se traduziu numa melhoria generalizada do sistema. Muito pelo contrário, as reformas sucederam-se tão depressa que, na maioria dos casos, nunca iremos concluir se foram úteis ou não. Não quero com isto dizer que o CPC não precise de reforma. Julgo que até poderia ser revogado e substituído por algo diferente. Todavia, a mera observação do que se tem passado nos últimos 15 anos leva-me a concluir que, qualquer que seja o novo código, todos quererão deixar nele a sua marca e em pouco tempo voltaremos à manta de retalhos que é hoje o CPC. Por outro lado, se muitas das críticas ao CPC são mais ou menos constantes, não vejo qualquer consenso relativamente ao que poderiam ser as soluções e o modelo a seguir. Quer isto dizer que, no actual contexto, um novo CPC apenas seria mais do mesmo. Assim, e provavelmente contra a maré, acho que teríamos mais a ganhar em estabelecer que nos próximos dez anos não mexeríamos no CPC. Em dez anos seria possível consolidar jurisprudência (algo que hoje em dia manifestamente não existe), prática forense e, eventualmente, assentar ideias sobre o que deveria ser o novo CPC. Aí sim, talvez se conseguisse um modelo novo (o código civil de 1966 demorou 22 anos a ver a luz). Isto leva-me a outra questão: Será que o CPC tem realmente de ser reformado? É manifesto que tem 36

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“Se muitas das críticas ao CPC são mais ou menos constantes, não vejo qualquer consenso relativamente ao que poderiam ser as soluções e o modelo a seguir. Quer isto dizer que, no actual contexto, um novo CPC apenas seria mais do mesmo”

“Acho que teríamos mais a ganhar em estabelecer que nos próximos dez anos não mexeríamos no CPC. Em dez anos seria possível consolidar jurisprudência (algo que hoje em dia manifestamente não existe), prática forense e, eventualmente, assentar ideias sobre o que deveria ser o novo código”

aspectos a melhorar, nomeadamente, e para chegar ao tema deste texto, em matéria de prova: Instrução: Se o sistema processual é declaradamente dispositivo, em matéria de prova e instrução é claramente inquisitório. Porém, esse carácter não deve manifestar-se apenas no poder de o tribunal se substituir à iniciativa das partes, mas também no de disciplina a actividade das partes durante a instrução. Prova documental: (i) Embora não seja isso que resulta do CPC, a praxe levou a que, mediante o pagamento de uma multa, qualquer documento ou conjunto de documentos possa ser junto praticamente em qualquer altura; (ii) os documentos juntos fora dos articulados deveriam ser verdadeiramente sujeitos a uma análise da sua relevância para a decisão, sendo descartados quando inúteis. No limite, e para evitar o método do facto consumado, a parte deveria pedir autorização para juntar o documento, sem o exibir; (iii) a possibilidade de se pedirem documentos em poder da parte contrária não pode ser usada como expediente para obter o que é que quer que seja, sem qualquer juízo de utilidade ou de reserva; (iv) deverá definir-se em que consiste a “pronúncia sobre documentos”, sem as estritas fronteiras dos artigos 544.º e 546.º, mas sem que se autorizem novos articulados. Prova por confissão das partes: O CPC assenta na tese de que as partes são necessariamente mentirosas; é um modelo inaceitável e pode levar a enormes desequilíbrios entre partes com estruturas diferentes. O Tribunal tem o poder de apreciar livremente tais depoimentos pelo que, por princípio, não devem ser limitados. Prova pericial: (i) As partes devem

Pedro Metello de Nápoles Licenciado pela Faculdade de Direito da Universidade Católica, tem como áreas de prática a Arbitragem e o Contencioso. É sócio da PLMJ e secretário executivo da Associação Portuguesa de Arbitragem

poder regular o regime de remuneração dos peritos; (ii) o Tribunal deve ouvir as partes (ou os outros peritos) na escolha do terceiro perito; (iii) os peritos e os seus relatórios devem estar sujeitos, caso as partes assim o solicitem, a verdadeiro contraditório, se necessário em audiência. Prova testemunhal: (i) As testemunhas têm de depor sobre factos que conheçam, com excepção das testemunhas-peritos, que devem ser expressamente consagradas; (ii) o advogado deve ser impedido de conduzir a testemunha, devendo o tribunal intervir activamente nesse caso; (iii) o tribunal não deve aceitar prova testemunhal quando não é admitida pela lei civil. Se os aspectos supra são (no meu entender) pontos a melhorar, penso que a implementação de quase todos eles não depende obrigatoriamente de alterações legislativas, podendo ser conseguida pela prática, enquadrada por uma jurisprudência constante. Não é portanto por estas razões que será necessário alterar o CPC. Mas talvez isto também seja utopia. O agregador da advocacia


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O verdadeiro problema É muito mais fácil reformar códigos do que mudar mentalidades corporativas há muito confortavelmente instaladas num sistema que tomam, abusivamente, por seu. Mas, sem isso, não haverá Código de Processo Civil que promova uma efectiva melhoria da qualidade do serviço prestado pelo sistema de Justiça aos cidadãos e empresas Os profissionais da Justiça como os advogados têm, muitas vezes, tendência para viver num certo espírito de negação quanto ao real estado do nosso sistema de Justiça. No geral, já todos tivemos boas e más experiências e, portanto, custa-nos assumir a generalização de que a nossa Justiça funciona pessimamente. Por vezes, esquecemo-nos também de que o sistema onde trabalhamos todos os dias não é muito mais do que um serviço. Nobre e importantíssimo é certo, mas um serviço, que deve ser prestado aos cidadãos e empresas que dele necessitam para viverem num verdadeiro Estado de Direito e desenvolverem com segurança a sua convivência social e os seus negócios. Assim, se sairmos de nosso casulo de agentes do sistema e da idílica ideia da Justiça como uma instituição quase suprema e inatacável, e pedirmos àqueles que não vivem do sistema, mas que precisam dele, para classificarem de 0 a 10 este serviço do Estado, o resultado seguramente não irá além de um medíocre. Em poucos anos, a nossa Justiça passou de uma instituição respeitada a um serviço que, no geral, merece, e com razão, total desconfiança dos cidadãos. Um estudo elaborado recentemente pelo Projecto Farol indica que 76 por cento dos Portugueses não confia na Justiça. Como é evidente, esta justificada descrença é também, sem dúvida, um dos principais entraves à competitividade do nosso país. A Justiça civil não é excepção. Pelo contrário, é, em larga medida, nas suas diferentes vertentes, a maior responsável pela desconfiança O agregador da advocacia

“Em poucos anos, a nossa Justiça passou de uma instituição respeitada a um serviço que, no geral, merece, e com razão, total desconfiança dos cidadãos. Um estudo elaborado recentemente pelo Projecto Farol indica que 76 por cento dos Portugueses não confia na Justiça”

“Mais do que um problema de regimento processual, o funcionamento medíocre ou não dos diferentes Tribunais (e por conseguinte do sistema de Justiça que integram), depende, essencialmente, dos meios (ou falta deles) e das pessoas”

dos agentes económicos no sistema. A lentidão é desesperante e inadequada à dinâmica da sociedade actual; a imprevisibilidade das decisões e, muitas vezes, do ritmo dos procedimentos é imprópria; o tratamento que os cidadãos que colaboram com a Justiça recebem do sector é, não raras vezes, absolutamente desrespeitoso. Pergunta-se: tudo isto acontece devido ao texto do nosso Código de Processo Civil? Não me parece... Obviamente, não temos uma lei processual perfeita. É importante que, sem abolirmos os princípios fundamentais, possamos caminhar para uma tendente simplificação de procedimentos, que permita um andamento mais ágil e eficaz dos processos. No entanto, a lei processual, tal como está, não representa um entrave à melhoria do funcionamento do sistema de Justiça, na sua vertente civil. Voltando à nossa experiência profissional, repare-se que as nossas recordações, melhores e piores, dependeram quase sempre do magistrado a que as acções foram distribuídas, da comarca territorialmente competente, do empenho e flexibilidade mental dos funcionários de justiça e, claro está, do próprio desempenho dos advogados envolvidos, se puramente dilatório e malabarista ou se verdadeiramente interessado num funcionamento eficaz do sistema, ainda que, obviamente, acima de tudo, defendendo o interesse dos seus Clientes. As nossas boas e más experiências aconteceram todas sob as mesmas regras do processo civil. Ou seja, mais do que um problema de regimento processual, o funcionamento me-

Francisco Proença de Carvalho Associado principal da Uría Menéndez – Proença de Carvalho. Licenciado em Direito pela Universidade Católica Portuguesa (2003), tem uma pósgraduação em Direito e Gestão de Empresas, pela Nova de Lisboa (2007)

díocre ou não dos diferentes Tribunais (e por conseguinte do sistema de Justiça que integram), depende, essencialmente, dos meios (ou falta deles) e das pessoas. A inexistência de verdadeiros mecanismos de organização e gestão dos Tribunais (que estão finalmente previstos no actual Programa de Governo), a falta de escrutínio, avaliação e responsabilização individual dos agentes judiciários pelo funcionamento do sistema (em que um medíocre é tratado da mesma maneira que um brilhante) e a auto-gestão a que a Justiça tem estado entregue representam o principal problema. É muito mais fácil reformar códigos do que mudar mentalidades corporativas há muito confortavelmente instaladas num sistema que tomam, abusivamente, por seu. Mas, sem isso, não haverá Código de Processo Civil que promova uma efectiva melhoria da qualidade do serviço prestado pelo sistema de Justiça aos cidadãos e empresas. Outubro de 2011

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Debate

Mudar de paradigma A energia devia ser gasta em agilizar processos e mudar comportamentos e não tanto em mudar o processo civil. E, quando falamos em energia, não podemos perder de vista a energia, tempo e dinheiro que todos perdemos cada vez que há uma reforma Nos últimos dez anos há três palavras que estão associadas à Justiça: demora, ineficácia e reforma. Estes vocábulos sumarizam o modo como o sector é visto pela sociedade e este facto deve ser encarado com especial atenção. Todos os dias ouvimos falar em reforma da Justiça, desde o processo executivo ao mapa judiciário, passando pelas regras e até os princípios subjacentes às regras processuais. Estará o mal nas leis ou na forma como as mesmas são utilizadas? Não haverá mecanismos na lei para tornar os processos mais rápidos, mais eficazes e, por isso, sem necessidade de reforma? Existem sim. E a energia devia ser gasta em agilizar processos e mudar comportamentos e não tanto em mudar o processo civil. E quando falamos em energia, não podemos perder de vista a energia, tempo e dinheiro que todos perdemos cada vez que há uma reforma. As reformas levam tempo a ser interiorizadas e isso só se pode traduzir em mais atrasos e ineficiências. Existem, claro, alguns elementos e mecanismos que podem ser avaliados e melhorados, entre os quais destacamos: 1. Supressão de fases processuais que não tragam valor acrescentado aos processos; 2. Simplificação de procedimentos, melhorando e facilitando o diálogo entre os diversos agentes e funcionários de justiça; 3. Reforço da composição amigável de litígios através do fortalecimento do papel me38

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“Estará o mal nas leis ou na forma como as mesmas são utilizadas? Não haverá mecanismos na lei para tornar os processos mais rápidos, mais eficazes e, por isso, sem necessidade de reforma?”

“Reforma, demora e ineficácia estão implicadas entre si. Quantas reformas ou alterações legislativas foram levadas a efeito nos últimos anos e não vigoraram o tempo suficiente para produzirem frutos?”

diador dos juízes e da simplificação e alargamento do recurso à arbitragem; 4. Criação rápida de secções especializadas nos Tribunais de Comércio, principalmente na área da Propriedade Industrial/Intelectual, da Concorrência, Insolvência, Contratos Comerciais, entre outras áreas, concretizando intenções antigas e compromissos emergentes do Memorando de Entendimento acordado com a troika; 5. Reavaliação do papel dos agentes de execução no processo executivo; 6. Estabelecimento de prazos para o cumprimento de actos por parte de todos os agentes judiciais; 7. Restruturação do modo de gestão dos tribunais, atribuindo esta a especialistas e, consequentemente, aliviar os juízes das mesmas, reavaliando-se a necessidade de acometer aos juízes a responsabilidade de elaboração de despachos de mero expediente e inclusivamente de alguns actos mais simples no âmbito dos processos judiciais. Reforma, demora e ineficácia estão implicadas entre si. Quantas reformas ou alterações legislativas foram levadas a efeito nos últimos anos e não vigoraram o tempo suficiente para produzirem frutos? A melhor reforma será, acima de tudo, não reformar as leis mas mudar os comportamentos de todos os agentes da Justiça e isso implica mudar de paradigma.

Jorge Ribeiro Mendonça Advogado na sociedade Franco Caiado Guerreiro & Associados desde 2006. Licenciado pela Faculdade de Direito da Universidade Lisboa, tem como áreas de especialização o Direito Comercial e Societário, Direito Laboral, Contencioso

Joaquim Cunha Ferreira Advogado na sociedade Franco Caiado Guerreiro & Associados, tem como áreas de actuação o Contencioso Laboral, Direito Civil e Comercial. É licenciado e tem uma pós-graduação em Direito do Trabalho pela Faculdade de Direito da Universidade Lusíada de Lisboa

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Gratianne Plateau e Francisco Xavier Esteves são os novos reforços da Miranda para a equipa da África Francófona. Gratianne Plateau é licenciada em Direito e pós-graduada em Resolução de Conflitos e Arbitragem pela Universidade de Assas – Paris 2 (França). Francisco Xavier Esteves é licenciado em Direito pela Faculdade de Direito da Universidade Católica de Lisboa e pós-graduado em Gestão e Avaliação Imobiliária pelo Instituto Superior de Economia e Gestão (ISEG) da Universidade Técnica de Lisboa (2011). Leonor Chastre é a nova aquisição da Gómez-Acebo & Pombo para a área de Propriedade Intelectual e Tecnologias de Informação. A nova sócia da firma transita da Abreu Advogados, onde era sócia desde 2007 e responsável pela mesma área. Pedro Dias Marques é o novo reforço da equipa de Propriedade Industrial da Baptista, Monteverde & Associados (BMA). Após ter terminado a licenciatura em Direito pela Universidade de Lisboa, em 2008, Pedro Dias Marques realizou o Curso de Pós-Graduação em Direito Intelectual na mesma instituição. Colaborou, ainda, com a sociedade Carlos de Sousa e Brito & Associados entre 2009 e 2010. Posteriormente, desempenhou as funções de secretário-geral da Associação Portuguesa de Direito Intelectual entre 2010 e 2011. O agregador da advocacia

Advocatus e Económico TV lançam programa O Advocatus e o Económico TV lançam um programa semanal de televisão onde a actualidade será debatida, explicada e avaliada através de um olhar jurídico. Intitulado “Direito a Falar”, é conduzido pelo director do Advocatus, João Teives, e pelo jornalista do Económico TV Francisco Teixeira. Todas as sextas-feiras, no horário nobre do Económico TV, os anfitriões do programa recebem convidados que debaterão os principais assuntos da actualidade.

BMA retrata regulação do sector publicitário A Baptista, Monteverde & Associados (BMA) é a única sociedade portuguesa presente na publicação internacional “Getting the Deal Through - Right of Publicity 2012”, na qual faz um retrato sobre o Direito da Publicidade em Portugal. Para a selecção foram contactadas diversas jurisdições para responder a questões ligadas ao direito da publicidade. Em Portugal, a BMA foi a única sociedade seleccionada. O sócio da BMA Paulo Monteverde, a associada Joana Mota e o advogado estagiário Pedro Dias Marques são os responsáveis por elaborarem a regulação do sector publicitário em território nacional.

O site do Advocatus em Setembro* As mais lidas SRS reforça equipa administrativa Direito à diferença Sérvulo reforça equipas Leonor Chastre sócia da Gómez-Acebo & Pombo A advogada completa

As mais partilhadas no Facebook Advocatus e Económico TV lançam programa Abreu Advogados distinguida pela Corporate Intl Contexto Competitivo Pendências nos tribunais de trabalho aumentam em tempo de crise Advogados pretendem processar Estado *Dados referentes ao período entre 27 de Agosto e 27 de Setembro.

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Manuel Gouveia Pereira e Nuno Castelão são os novos reforços da Vieira de Almeida & Associados (VdA). Manuel Gouveia Pereira coordenada o núcleo de Ambiente da área de Imobiliário, Urbanismo & Ambiente da sociedade. E Nuno Castelão integra a plataforma internacional VAtlas como Head of International Relations. Era desde há cinco anos associado sénior no departamento de International Capital Markets da Allen & Overy. Madalena Caldeira e Sofia Contente são as novas aquisições da Abreu Advogados. Madalena Caldeira ocupa o cargo de consultora e actua sobretudo nas áreas de prática de Direito do Trabalho e Direito Fiscal. Sofia Contente é a nova associada da firma e integra a equipa da área de prática de Direito do Trabalho. O percurso profissional da advogada engloba passagens por várias sociedades de advogados e pela PT Comunicações, onde foi assessora jurídica durante quatro anos. A Sérvulo & Associados reforçou as equipas da área de Direito Público, Direito Comercial e Societário, e Direito Laboral com a contratação de cinco advogados. Maura Capoulas Santos, Luís Verde de Sousa e Paula Baptista Fernandes integram a equipa de Direito Público. À equipa de Comercial e Societário junta-se Isabel de Alcântara Guerreiro, enquanto Maria Ana Fonseca reforça a equipa de Direito Laboral. AVM reforça escritórios de Lisboa, Porto e Maputo com a contratação de quatro advogados. Mafalda Seabra Pereira integra as equipas de Contencioso, Societário, Bancário e Financeiro do escritório de Lisboa. O escritório do Porto é reforçado com Alexandra Vaz, enquanto Joice Rabeca Quilambo e Esaú Cossa integram a equipa da sociedade em Maputo, Moçambique. 40

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Abreu com a Iberdrola A sociedade prestou assessoria jurídica à Iberdola na operação da transferência da Iberdrola Renovables, S.A. para a Iberdrola Renovables Energía, S.L. A Abreu Advogados prestou serviços nas áreas de prática de direito comercial, fiscal e administrativo e na due diligence. A equipa que levou a cabo esta operação foi liderada pelos sócios Manuel de Andrade Neves e Ana Sofia Batista.

Morais Leitão na privatização da EDP A Morais Leitão, Galvão Teles, Soares da Silva (MLGTS) foi a sociedade escolhida para assessorar o processo de privatização da EDP. Esta foi a escolha do governo depois de ter efectuado uma consulta junto de várias sociedades de advogados. A trabalhar na assessoria jurídica deste processo estão já outras sociedades portuguesas e estrangeiras como a Linklaters, a Campos Ferreira-Sá Carneiro, a PLMJ, a Serra Lopes, a Cortes Martins, Uría-Proença de Carvalho e a Skadden Arps.

CEJ tem novo director O Conselho Geral do Centro de Estudos Judiciários (CEJ) aprovou, por unanimidade, a nomeação de Pedro Barbas Homem para novo director da instituição. O nome do novo director foi sugerido pela ministra da Justiça. Pedro Barbas Homem nasceu em Moçambique em 1960, é licenciado, mestre, doutor e agregado em Direito pela Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa. Actualmente é professor catedrático na Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa e ainda vice-reitor da Universidade de Lisboa para a Área Estratégica de Ciências Jurídicas e Económicas. Simultaneamente, integra a Comissão de Conciliação e Bons Ofícios dos Diferendos entre os Estados da UNESCO. O novo director do CEJ tem ainda uma vasta obra publicada em matérias de Teoria e Filosofia do Direito, História do Direito, História do Pensamento Político, Relações Internacionais e Direito da Educação.

Oficiosas opõem bastonário e ministra Durante a Assembleia Geral Extraordinária da Ordem dos Advogados (OA), o bastonário, Marinho e Pinto, anunciou a intenção processar o Estado português devido à dívida de cerca de 30 milhões para com os advogados oficiosos. Marinho e Pinto voltou também a tecer críticas à auditoria que o Ministério da Justiça está a fazer ao sistema de pagamentos das defesas oficiosas. No entanto, a ministra da Justiça, Paula Teixeira da Cruz, anunciou perante a Comissão Parlamentar de Assuntos Constitucionais que o ministério já efectuou o pagamento de 17,7 milhões de euros da dívida. Garantiu, ainda, que a dívida será paga na totalidade, alertando, contudo, para irregularidades no sistema de apoio judiciário. Segundo a ministra foram detectados “elementos muito perturbadores”, como deslocações a cadeias que não existiram. Paula Teixeira da Cruz criticou também o antigo governo e a Ordem dos Advogados por terminarem com os mecanismos de fiscalização dos actos praticados pelos defensores oficiosos, que o actual executivo pretende repor.

RPA assessorou MOP João Caldeira e Margarida Vila Franca, respectivamente partner e associada principal da área de corporate da Rui Pena & Arnaut (RPA), foram os responsáveis por assessorar o último projecto da MOP - Multimedia Outdoors Portugal. O projecto da MOP consistiu no desenvolvimento do conceito de branding/naming promovido na estação de metro Baixa-Chiado, em Lisboa, agora denominada Baixa-Chiado / PT Bluestation. A área de corporate da RPA tem vindo a desenvolver nos últimos anos actividade no âmbito do mercado da publicidade. No entanto, destaca-se a assessoria jurídica prestada à MOP no âmbito deste projecto devido ao carácter inovador que o caracteriza. O agregador da advocacia


Assine o Advocatus e fique descansado Fundo do Sporting com consultoria VdA A Vieira de Almeida & Associados (VdA) prestou assessoria jurídica à Espírito Santo Fundos de Investimento Mobiliário (ESAF) na constituição do Sporting Portugal Fund. Na operação esteve envolvida a equipa de Organismos de Investimento Colectivo da sociedade, liderada por Pedro Simões Coelho, sócio da área de Direito Bancário & Financeiro, e integrada também por Orlando Vogler Guiné e Pedro Bizarro. Com um capital inicial de 15 milhões de euros, totalmente subscrito, o Sporting Portugal Fund é um fundo especial de investimento mobiliário vocacionado para o investimento em direitos económicos de jogadores da Sporting SAD.

Advogados debatem reforma da justiça

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O VII Congresso dos Advogados Portugueses, que se realizará nos 11, 12 e 13 de Novembro, terá lugar na Figueira da Foz, sob o lema “Para uma reforma da justiça”. A concepção da imagem gráfica desta edição do congresso procura enfatizar elementos que transmitam dignidade e movimento, indispensável a qualquer reforma e energia. A imagem procura ainda “incentivar o cidadão, suscitando uma ideia positiva sobre a advocacia, um sentimento de conforto, despertando a ideia de que os advogados se preocupam consigo”, explica a Ordem dos Advogados.

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Susana Vieira é fã de The Good Wife

Susana Vieira, sócia da Macedo Vitorino & Associados, é fã de The Good Wife porque apresenta uma perspectiva diferente da que é dada normalmente pelas séries. Conta a história de “uma mulher que inicia a carreira profissional num momento da sua vida em que já não o esperava”: trata-se de Alicia Florrick, papel desempenhado por Juliana Margulies que conquistou um Emmy pela sua interpretação na trama. Alicia é casada com o procurador Peter Florrick, que é preso após escândalos políticos e sexuais. Nessa altura assume a responsabilidade de cuidar sozinha dos dois filhos, vendo-se obrigada a retomar a antiga profissão e a enfrentar todos os obstáculos que isso implica. Nesta nova etapa, defronta-se com sentimentos antagónicos. Por um lado, volta a ter uma carreira, o que lhe transmite “alguma valorização profissional”. Por outro lado, tenta encontrar o equilíbrio entre a vida familiar a vida profissional, além de a nível profissional se encontrar em pé de igualdade com os advogados mais novos. Para a advogada da Macedo Vitorino, Alicia Florrick é uma personagem bastante rica e na qual é possível “ver reflectidas questões pessoais e profissionais que afectam seguramente muitas mulheres e não só as advogadas”. No entanto, a personagem mantém um “registo muito contido”, o que a torna ainda mais interessante. A componente de “política e mistério” da série é algo que cativa a advogada, aliada ao facto de abordar questões bastante actuais como o impacto da crise financeira. Semanalmente, Susana Vieira acompanha com interesse o desenrolar desta história e a forma como Alicia Florrick enfrenta as dificuldades que encontra nesta nova etapa da sua vida.

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Hobby

João Leite

João Leite vive actualmente em Timor-Leste, onde ocupa, há cerca de um ano, o cargo de advogado residente responsável pelo escritório da Miranda Correia Amendoeira & Associados. Foi nesta ilha que já foi portuguesa que descobriu o seu hobby preferido - o todo-o-terreno. Praticá-lo permite-lhe partir à aventura e descobrir a beleza do país que o acolheu. “Timor-Leste tem paisagens deslumbrantes. Viajar ‘cá dentro’ é dos maiores prazeres que este país pode proporcionar a quem cá vive”, afirma. É um hobby que não pode praticar todos os dias, mas, entre muito trabalho e pouco tempo livre, João tenta aproveitar o fim-de-semana e pelo menos uma vez por mês parte à aventura por Timor-Leste ao volante do seu jipe. O advogado associado da Miranda começou a praticar todo-o-terreno por sugestão de pessoas que conheceu quando chegou a Timor-Leste. Experimentou e gostou. O que o apaixona neste desporto é que consegue aliar duas coisas que adora fazer: conduzir e viajar. Além disso, entende que a prática de todo-o-terreno pode ser muito útil na formação da personalidade de um advogado: “No todo-o-terreno deparamo-nos, por vezes, com obstáculos aparentemente intransponíveis, pelo que somos obrigados, a par da perícia técnica da condução, a ter muita imaginação para os ultrapassar.” Encontra, por isso, algumas semelhanças com o exercício da advocacia, dado que os conhecimentos técnicos de um advogado só serão uma “verdadeira mais-valia” para o cliente se o advogado tiver “imaginação” para os aplicar.

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João Leite Associado da Miranda Correia Amendoeira & Associados, é licenciado pela Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa (2000). As suas principais áreas de actividade são o Direito Bancário e Financeiro, Comercial e Societário. Actualmente, é o advogado residente responsável pelo escritório da firma em Timor-Leste

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Restaurante

Manuel Falcão director-geral da Nova Expressão

Uma maravilha lisboeta manteiga temperada, boas azeitonas, um cestinho com bom pão e broa e, em querendo, presunto cortado na hora, fino como se recomenda. Nas sobremesas há queijo sem ser só aquela coisa derretida e amanteigada – ou seja, queijo curado como deve ser. Mas há também doces conventuais como o pudim abade de Priscos ou a encharcada, entre outros.

Apuradinho

Rua de Campolide 209 - A Lisboa 213880501 Permite fumadores e tem boa extracção de fumo. Encerra Sábados ao jantar e Domingo todo o dia.

Para este mês escolhi um restaurante que merecia estar na lista das maravilhas gastronómicas portuguesas, mas cuja ementa não ostenta quase nenhuma das escolhas que acabaram eleitas. Eu não gosto da lista final – não gosto da inexistência de jaquinzinhos, nem da falta de lampreia, nem da falta de uma perdiz, nem da ausência de pivetes ou de sopa de beldroegas, já para não falar de uns pastéis de bacalhau. E em vez de um pastel de Belém, no Apuradinho há um pudim abade de Priscos que é uma especialidade. E, além do queijo da serra, há um queijo de Serpa muito curado que é de estarrecer. O único ponto comum, salvo erro, é uma bela alheira que neste restaurante é garantidamente de boa qualidade.

Três décadas No dia 1 de Outubro o Apuradinho fez 29 anos celebrando boa comida portuguesa, caseira e bem apurada. Fica no mesmo local onde até 1982 existiu a muito noctívaga Fábrica, que serviu muitos bifes madrugadores, aí ao fundo da Rua de Campolide. À frente do Apuradinho, desde o primeiro dia, está o casal Albano e Celeste (Bé) Paciência e são eles a alma da casa. Os clientes mais frequentes conhecem-se uns aos outros e cumprimentam-se ao bar enquanto esperam companhia. Na sala, ao almoço, entre os convivas, há de tudo – muitos advogados de vários escritórios das redondezas, gestores e empresários de actividades variadas, alguns dirigentes 44

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desportivos (com alguma predominância benfiquista). O actual secretário de Estado da Cultura, declaradamente um bom garfo, era cliente antes das funções governamentais. Ao jantar a coisa torna-se mais intelectual, com vários professores da Universidade Nova, cujo edifício recente fica praticamente do outro lado da rua. De qualquer forma neste restaurante todos são clientes que querem comer bem, sossegados e com bom serviço e é isso mesmo que a casa oferece.

Os petiscos Vamos por partes – à segunda-feira há sempre algum prato de bacalhau (à Gomes de Sá, à Braz, enrolado em couve lombarda ou em pastel), às quintas de 15 em 15 dias há cozido, pivetes (rabo de boi) aparecem de vez em quando,

pombo bravo com ervilhas idem, na época devida aparecem peças de caça, lampreia e sável (frito com açorda de ovas), o cabrito assado também é visita regular e a raia com beurre noire é muito elogiada. Volta e meia há dobrada (nos meses mais frios), e as pescadinhas com arroz de pimentos são uma especialidade. Depois, na lista há uma série de pratos que podem ir das iscas (sempre recomendáveis) a um naco de bife do lombo tenríssimo. Volta e meia aparecem pastéis de massa tenra e na época de caça há uma lebre com feijoca muito interessante. A garrafeira não é extensa mas é bem escolhida e com preços razoáveis, mas se for para os vinhos da casa (União das Cooperativas do Dão no tinto e D. Ermelinda no branco) não vai nada mal servido. Na mesa, para petiscar, tem uma

O valor do dinheiro O ambiente é muito confortável, a sala é forrada com madeiras, e desenvolve-se por dois lados que circundam o bar onde está sempre o Albano, atento aos menores sinais. A casa permite uma lotação que anda pelas três dezenas de comensais. O local é sossegado e facilita conversas de trabalho mesmo ao almoço e, à noite, é frequente ver pares namoradeiros, obviamente anti-anoréxicos e uma vez por outra alguma pequena conspiração empresarial ou política. Se a escolha de vinhos for comedida uma refeição pode ficar entre 25 a 30 euros por pessoa – mas garanto-vos que aqui cada euro é compensado pela qualidade da matéria-prima, da confecção e do ambiente. O Albano e a Bé têm um restaurante como já há poucos em Lisboa.

BANDA SONORA

Wynton Marsalis & Eric Clapton play the blues Wynton Marsalis fez agora 50 anos e, numa entrevista à “Vanity Fair” disse que os blues eram o grande amor da sua vida. Ouve-se este disco e é isso mesmo que se sente, uma persistente forma de desenvolver a paixão. O trompete de Marsalis e a guitarra eléctrica de Clapton fazem uma invulgar, mas sedutora, combinação em torno de grandes clássicos. Os arranjos são bluesy, muitas vezes a cheirar a Nova Orleães – ouça-se a versão de “Layla” que está neste disco e percebe-se como os dois músicos foram contagiados e se entusiasmaram com as influências recíprocas. Neste registo, gravado

ao vivo em Abril deste ano, na série de concertos “Jazz At The Lincoln Center” em Nova Iorque, para além do diálogo trompete-guitarra, temos a voz de Marsalis em diversos temas. Nos dois clássicos que encerram o disco, “Just a Closer Walk With Thee” e “Corrine, Corrina”, a parte vocal é assegurada pelo grande Taj Mahal. A edição à venda na Amazon oferece um DVD com todo o concerto, que inclui um tema extra também com Taj Mahal, “Stagger Lee”.

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Montra

Estilo descontraído e desportivo A nova colecção Outono /Inverno da PUMA assenta na essência da marca: uma união entre o espírito descontraído e o estilo desportivo, que torna as peças de vestuário, acessórios e calçado modelos únicos. Os diversos modelos de ténis da marca, em cores vibrantes, fazem com que se adequem ao estilo de todos os amantes de calçado desportivo, para looks desportivos, de lazer ou simples descontracção.

Viagem no tempo com ANDORRA A Lacoste Watches lançou uma nova colecção feminina de relógios – ANDORRA – concebida para assinalar o Outono/Inverno de 2011. Os modelos, que possuem os números 12 e 6 em destaque, apresentam-se nos tons platina e branco; cobertos por um cintilante pó de cristais e com braceletes em couro são sofisticados e femininos. Para looks de dia ou de noite, a colecção ANDORRA propõe relógios com um toque delicado de elegância.

Jóias criativas e elegantes A PEKAN apresentou a sua nova colecção de jóias para a estação Outono/Inverno 2011/2012, da qual fazem parte peças caracterizadas pela sua versatilidade. São peças elegantes e delicadas, com um toque de ousadia, onde o ouro e a prata se juntam a cristais de rocha simples, quartzo rutilado e a outras pedras semi-preciosas. Destinadas à mulher cosmopolita e arrojada, enaltecem os diferentes looks.

Um aroma diferente A Hugo Boss acabou de lançar uma nova fragância para homem – Just Different – com um aroma refrescante e suave. Dedicado a homens aventureiros e urbanos, Just Different é um perfume vibrante com um toque fresco que estimula os sentidos para a aventura da noite.

Smartphone social A Vodafone lançou um novo smartphone, dirigido aos amantes das redes sociais - o Vodafone 555 Blue – que se destaca dos restantes telefones pela optimização de funções de acesso a redes sociais. O Vodafone 555 Blue apresenta uma tecla de acesso directo ao Facebook, permitindo ao utilizador uma forma mais rápida de partilhar informação. O agregador da advocacia

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Obra de Arte

Leonor Chastre “Solidão acompanhada”. Para Leonor Chastre esta é a melhor forma de definir a obra que ocupa lugar de destaque no seu escritório: “Evening Clouds”, da autoria de Denis Frémond, artista que antes da pintura se dedicou ao teatro e à ilustração e que retrata com frequência a sua cidade de origem, Boston (EUA). É uma cidade que a sócia da Goméz-Acebo & Pombo muito aprecia, o que explica a sua preferência por “Evening Clouds”, quadro que sente como “uma porta para a tranquilidade”. Por isso o colocou em frente à secretária. Leonor Chastre é uma apaixonada por arte e quando pode perde-se durante horas a apreciar exposições em museus. Provém de uma família com tradição de marchand, pelo que desde cedo lhe foi incutido um gosto profundo por arte. Além disso, a sua principal área de actividade é Propriedade Intelectual, o que a torna particularmente sensível a questões relacionadas com arte e com os direitos dos artistas. Na sua opinião, numa profissão tão densa e exigente como a advocacia, os advogados deviam ter todos “uma porta para o mundo encantado da Alice no país das maravilhas”. Este quadro é a sua. É como que uma passagem para a evasão que a ajuda a recarregar baterias. E sempre que se perde na contemplação encontra um novo pormenor que torna “Evening Clouds” ainda mais especial. Leonor Chastre entende mesmo que os escritórios de advogados “não podem ser só compostos por excepcionais profissionais de Direito”, é necessário que também tenham “aspectos estéticos apelativos”.

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