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Biografia

Eduardo Gageiro nasceu em Sacavém a 16 de Fevereiro de 1935. Aos 12 anos, Gageiro publica a sua primeira fotografia no Diário de Notícias.

Entre 1947 e 1957 trabalhou como empregado de escritório na fábrica de loiças de Sacavém, período em que, influenciado pelo convívio com pintores, escultores e operários fabris, o levou a perseguir a fotografia. A vida dos trabalhadores tornou-se um ponto de partida para o que se traduziria numa carreira dedicada às pessoas e aos rostos do povo português sempre capturados a preto e branco.

Em 1957, inicia a sua atividade como repórter fotográfico no Diário Ilustrado. Mais tarde, colaborou ainda com outras publicações tais como o Diário Ilustrado, O Século Ilustrado, Eva, Almanaque, Match Magazine.

Destacam-se ainda os seus muitos trabalhos fotográficos que registaram momentos únicos vividos durante a revolução de 25 de Abril de 1974. Mais tarde, tornou-se fotógrafo da Companhia Nacional de Bailado e da Presidência da República. Foi ainda editor da revista Sábado.

O seu trabalho fotográfico foi merecedor de vários prémios nacionais e internacionais. Destaca-se o 2º prémio do World Press Photo, em 1974, na categoria Portraits; a sua condecoração em 2004 com o título de Comendador da Ordem do Infante D. Henrique pelo presidente da República Jorge Sampaio; e em 2005 a medalha de ouro para melhor fotografia e para melhor fotografia e preto e branco da 11ª Exposição Internacional de Fotografia Artística da China.

Atualmente vive em Lisboa onde mantem viva a sua atividade através de trabalho de freelancer.

CalvárioA mulher de Nazaré

Image

Esta fotografia, tirada por Eduardo Gageiro na Nazaré em 1962 foi capa do jornal impresso Século Ilustrado de 6 de julho de 1963. Encontra-se também publicada no documentário fotográfico Gente, ilustrado por Eduardo Gageiro, de 1971, que retrata os anos 60 em Portugal; inserido-se no capitulo dedicado aos “velhos / velhos do meu país, que sina a vossa a de Calcarrear os dias!”, fotografia 71.

Especificidades técnicas

No momento da sua produção foi utilizada uma câmara Rolleiflex com uma objectiva planar 75mm f-3,5 1-250 – 5,6, com um fitro amarelo – pel. Ilford hp-3 e foi impressa em papel agfa r-r.

No que diz respeito à manipulação, existe apenas um aspeto da imagem que difere em ambos os momentos de publicação: na capa existem nuvens no canto superior esquerdo, enquanto no livro não. De resto, não foi encontrada outra modificação.

diferenças imagens

No momento de produção desta fotografia foi usado o plano contrapicado, onde “a tomada de imagem faz-se de baixo para cima, tendendo a valorizar o motivo fotografado” (Sousa, 2002:80), o que enaltece a mulher de Nazaré, principal elemento da imagem. No entanto, existe outro elemento que também se destaca, a corda das redes de pesca que a mulher carrega nos ombros. Esta corda estendida na diagonal desempenha dois papéis importantes: divide a fotografia em duas partes, quase que deixando na parte inferior as personagens da composição, ou seja, os pescadores, e na parte superior o céu e as nuvens, que ocupam grande parte da imagem; e ainda cria quase que uma linha condutora entre a mulher de Nazaré e os pescadores que se encontram em segundo plano, no canto inferior esquerdo da imagem.

Esta fotografia foi originalmente fotografada a preto e branco, e esta caraterística confere-lhe ainda um maior teor emocional. Para além de carregar ainda mais o negro das vestes da mulher que lhe cobrem o corpo de luto, ainda destaca mais o contraste entre o negro do céu e o branco das nuvens. Esta predominância do céu e das nuvens atrás da mulher, juntamente com o plano utilizado, conferem-lhe o papel principal, uma magnitude tal que quase se pode dizer que ela caminha por entre as nuvens. Na areia (zona terrena), encontram-se as personagens secundárias, os restantes quatro pescadores. Mesmo assim, o pescador que se encontra ligado à corda que a mulher carrega nos ombros tem maior destaque que os restantes.

Há também que realçar o rosto envelhecido e escondido por entre as vestes negras, que com já muitas rugas mostra grande sofrimento, assim como o dos restantes pescadores. Durante este ritual da pesca, todas as pessoas da foto caminham na mesma direção, trabalhando para concretizar o mesmo objetivo. Esta foto trouxe para o domínio artístico e público a dura vida dos pescadores da Nazaré. “Eu limitava-me a fotografar o que sentia. Fui até preso por causa de uma fotografia que fiz na Nazaré”, diz Eduardo Gageiro em entrevista à revista Única de 16 de Dezembro de 2006.

Esta fotografia apareceu apenas na capa e não existe no interior desta edição do Século Ilustrado mais fotografias relacionadas. Desta forma, o único texto que existe a acompanhar esta composição refere apenas a sua autoria e os seus prémios em vários concursos internacionais. No que diz respeito ao livro, a legenda refere o local e o ano em que a fotografia foi tirada.

Nazaré

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No seguimento da análise da fotografia Calvário, segue-se a análise da capa da fotorreportagem “Nazaré”, dada a sua relação técnica e temática com a anterior. Assim, as restantes fotografias não serão alvo de uma análise detalhada.

A fotorreportagem Nazaré saiu no jornal impresso Século Ilustrado de 23 de Outubro de 1965. Este trabalho fotográfico é composto por 13 fotografias a preto e branco da autoria de Eduardo Gageiro, que ocupam 6 páginas do jornal. O objetivo deste trabalho foi o de mostrar a persistência no tempo da cultura da Nazaré e ainda a vida difícil dos seus pescadores e as implicações nas vidas dos familiares. “Mais de metade da população da Nazaré e Sítio é constituída por pescadores e suas famílias, que vivem exclusivamente do mar. Do mar que lhes dá peixe que é pão e por vezes, violência que é morte” (Século Ilustrado – 23/10/1965). Desta vez, nenhuma das imagens desta fotorreportagem consta no documentário fotográfico Gente, de 1971.

nanananan

Desta vez, o foco de atenção está num pescador que mais uma vez carrega as cordas das redes de pesca. Eduardo Gageiro representa assim o mesmo ritual que tinha apresentado dois anos atrás. É visível um claro padrão em ambas as fotografias no que diz respeito às linhas que dividem a imagem. Aqui, é possível encontrar uma terceira linha reta, formada pelo fim da areia. Mais uma vez, uma das cordas diagonais quase divide a imagem em duas partes. Estas três linhas, duas formadas pelas cordas e uma pela areia funcionam como elo de ligação entre as diferentes personagens da composição: a primeira liga os homens pescadores, elementos principais; a segunda liga as mulheres, que se encontram em segundo plano; e a terceira traz ainda mais atenção para os pés descalços. Quanto ao plano utilizado, foi mais uma vez o contrapicado, o que confere uma grande magnitude ao pescador. Enquanto na imagem anterior a mulher se deslocava para a direita, desta vez os intervenientes da imagem deslocam-se para a esquerda. Ao colocar as fotografias ao lado uma da outra, é de ressaltar que as cordas dos dois protagonistas quase se ligam umas às outras, formando um triângulo. O homem também ganha grande destaque ao estar colocado no centro da composição. Mas, se na fotografia anterior, o lado direito com a mulher de Nazaré e as suas vestes negras eram sem dúvida o foco da atenção, desta vez, o foco encontra-se na parte inferir da fotografia. Importa ainda referir os pés e pernas do pescador que parecem não ter fim.

Também como na foto anterior, o céu ocupa quase toda a fotografia, deixando apenas quase que um rodapé para a areia. Uma vez que nesta imagem não é possível avistar o mar parece que aquele percurso dos pescadores não tem fim, intensificando ainda mais o momento. Há ainda que ressaltar a luminosidade da foto que contrasta com o negro do céu da foto anterior.

Por fim, todas as imagens que constituem esta fotorreportagem estão legendadas, o que facilita  processo de descodificação e análise da informação. Para além da legenda, existe também um texto jornalístico que aborda o quotidiano destas pessoas que vivem do mar. “Nas redes de arrastar para terras, velhos, homens, rapazes, mulheres, raparigas da Nazaré têm o seu grande ritual a cumprir. Um ritual milenário, que desde sempre lhes curva as costas do mesmo modo” (Século Ilustrado, 23/10/1965).

Crianças de Lisboa

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Esta fotorreportagem encontra-se no Século Ilustrado do dia 2 de novembro de 1963. Este trabalho é composto por 9 fotografias que ocupam 3 páginas e a capa do jornal. O seu objetivo é o de mostrar que “não é só infância despreocupada e feliz, a vida do «gaiato». Parte do mundo que a cerca, ele sofre na carne e na alma a confluência dos dramas que atolam os homens. Mas os seus olhos cheios de claridade dos dias de sol largo, aguardam, serenos e vagos, um futuro que ainda lhes pertence” (Século Ilustrado – 2/11/1963).

Numa análise geral, as crianças são o elemento principal da composição, não existindo muitos pormenores para desviar a atenção do leitor. Todas as fotografias são a preto e branco, caraterística do trabalho de Eduardo Gageiro. Apesar desta especifiidade em termos de cor, todas as fotos são luminosas, normalmente com o foco de luz incidente nos protagonistas e captadas durante o dia, com luz natural. Através das caraterísticas da objetiva é possível apurar que Eduardo Gageiro fotografou, normalmente, de longe, de forma a não influenciar o comportamento de quem pretendia fotografar. O fotojornalista reflete assim neste trabalho momentos felizes do quotidiano destas crianças, tais como brincadeiras, mas também a pobreza e o abandono. Ao contrário do que foi verificado na fotorreportagem anterior, neste caso, nenhuma das fotografias está legendada. No entanto, o texto da reportagem vai explicando brevemente o teor das fotografias.

É possível encontrar algumas das fotografias que fazem parte desta fotorreportagem no documentário fotográfico Gente, no capítulo dedicado à infância, nomeadamente a fotografia número 12 e 16. Ambas as imagens refletem a situação social das crianças, ao contrário das apresentadas nas primeiras páginas da fotorreportagem que mostram mais o sentido feliz e despreocupado com que vivem o dia a dia. No final do documentário fotográfico é possível ter acesso às caraterísticas das fotografias originais, e a partir daí foi possível apurar que, tanto a foto publicada no jornal Século Ilustrado como a publicada no documentário foram manipuladas.

diferenças crianças

Especificidades técnicas Fotografia 12: A máquina utilizada foi uma Rolleiflex, com uma objetiva de 75 mm f-3,5 1-250-8; foi usado um filtro laranja; película Ilford hp-3; papel agfa r-r

A fotografia 12 foi captada no Alto Cabral em Sacavém, em 1962. N’O Século Ilustrado foi retirado o ar existente na parte superior da imagem, e foi ainda recortada ligeiramente no lado direito. No documentário fotográfico apenas foi recortado o ar da parte superior como é possível verificar através das imagens acima colocadas. Assim, as crianças ganham uma maior magnitude. O plano utilizado foi mais uma vez o contrapicado, o que enaltece as crianças. Nesta foto, as personagens têm uma expressão genuina, aparentando não ter sequer noção deq ue estão a ser fotografadas. Estas fotografias mostram a realidade da população mais pobre. O teor emocional está muito presente pois a criança mais velha parece tomar conta das restantes, mesmo do bebé que carrega no colo. O rosto da rapariga mais velha parece cansado e sobrecarregado. As suas roupas sujas também denunciam a sua realidade social.

diferenças

Especificidades técnicas Fotografia 16: A máquina fotográfica usada foi uma Rolleiflex, com uma objetiva tessar 75 mm f-3,5 1-125 – 5,6; película Ilford hp-3; papel agfa r-r

A fotografia 16 foi tirada em 1964 na Mouraria, em Lisboa. No que diz respeito ao documentário fotográfico, a imagem foi invertida na horizontal, uma vez que as crianças estão no lado contrário da rua, assim como foram também recortadas as margens. No que diz respeito à manipulação da imagem no jornal O Século Ilustrado, foram-lhe recortadas as margens que abrangem as casas da rua onde as crianças se encontram, assim como a própria calçada da rua. Ao retirar o ar da fotografia, destaca-se ainda mais as crianças, direcionando o olhar do leitor. É visível ainda um feixe de luz que incide diretamente sobre estas, o que também contribui para este efeito. Assim, quase não é deixada uma leitura ao critério do leitor, ou seja, não lhe é permitido decidir o que é mais importante pois todos estes fatores mencionados limitam o foco de atenção, estando este, definitivamente nas crianças. No momento de produção da fotografia, imagina-se que Eduardo Gageiro terá fotografado de pé e não de muito perto. As crianças estão descalças e sozinhas, não se avistam os seus pais, mas agem como se não compreendessem a sua realidade, com rostos naturais, quase serenos, ao contrário do que está retratado na imagem anterior. Apesar de não se conseguir perceber bem na fotografia d’O Século Ilustrado, na imagem original é também visível que os adultos caminham normalmente, quase não reparando nas crianças.

Bibliografia
Catálogo de exposição da Câmara Municipal de Loures, Eduardo Gageiro: Rapaz de Sacavém, fotografo do mundo
GAGEIRO, Eduardo (1971), Gente, Editorial O Século, Colecção Albuns, Lisboa
O século Ilustrado, 6 de julho de 1963
O Século Ilustrado, 2 de novembro de 1963
O século Ilustrado, 23 de outubro de 1965

Webgrafia
Entrevista a Eduardo Gageiro (2006), Revista Única, in http://suigeneros.wordpress.com/2006/12/17/entrevista-ao-fotojornalista-eduardo-gageiro/
Sousa, Jorge Pedro (2002), Fotojornalismo: Uma introdução à história, às técnicas e à linguagem da fotografia na imprensa,Porto, in http://www.bocc.ubi.pt/pag/sousa-jorge-pedro-fotojornalismo.pdf

Andreia Almeida
Licenciatura em Ciências da Comunicação: Jornalismo, Assessoria e Multimédia
Faculdade de Letras da Universidade do Porto
2013/2014

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