Sociedade

Mais de cem amigos participam num livro sobre Medeiros Ferreira

19 fevereiro 2015 22:57

O livro "José Medeiros Ferreira: a liberdade interventiva" abre com os depoimentos dos três ex-Presidentes da República eleitos após o 25 de Abril: Ramalho Eanes, Mário Soares e Jorge Sampaio

josé carlos carvalho

Para Jorge Sampaio "o Zé Medeiros é inesquecível". Vasco Cordeiro afirmou que ele "foi desaproveitado pelo país".

19 fevereiro 2015 22:57

"Um livro de amigos", foi como o investigador e politólogo Carlos Gaspar classificou o livro "José Medeiros Ferreira: a liberdade interventiva", apresentado ontem na Fundação Gulbenkian e que constituiu o ponto mais alto do primeiro dia da conferência dedicada a homenagear o cidadão, o político e o historiador.

Iniciativa com a marca da viúva, a pedagoga Maria Emília Brederode Santos, o livro recolhe cerca de 120 depoimentos de amigos das mais variadas áreas políticas e profissionais, quase todos inéditos, e que incluem um cartoon de António e o retrato feito pelo pintor Nikias Skapinakis na cadeia do Aljube em 1962.

O livro abre - ou não tivesse sido Medeiros Ferreira um personagem também institucional - com os depoimentos dos três ex-Presidentes da República eleitos após o 25 de Abril: Ramalho Eanes, Mário Soares e Jorge Sampaio, que privaram, cada um a seu modo e em períodos diferenciados, com o homenageado, que faleceu em Março do ano passado. A obra inclui também o depoimento de quatro ex-presidentes da Assembleia da República, bem como de quem chefiou o Governo Regional dos Açores.

Depois, é uma lista de A a Z, que, como disse o director do Instituto Português de Relações Internacionais, Carlos Gaspar, não deixa de ser "um labirinto", mas que revela como o ex-ministro socialista dos Negócios Estrangeiros foi "uma pessoa especial para cada um dos que escreveram sobre ele".

 

Um presente de anos

A conferência, promovida por um grupo de amigos com o apoio da Fundação Gulbenkian, coincide com a data em que Medeiros Ferreira completaria 73 anos de idade. O livro, sublinhou Gaspar, "é o nosso presente de anos para o José Medeiros Ferreira, mas é também o presente de anos que eles nos dá a todos".

A apresentação do livro esteve a cargo de Jorge Sampaio, seu amigo desde a crise estudantil de 1962 e cujas vidas foram marcadas por mais encontros que desencontros. "Mas adversários nunca fomos", acentuou Sampaio, numa longa intervenção de em que desenhou o trajecto de vida de Medeiros Ferreira nas lutas académicas, no exílio em Genebra, no combate pela Democracia a seguir ao 25 de Abril, no Palácio das Necessidades, no Parlamento (português e europeu) e na Universidade.

"Mas o Zé Medeiros era sobretudo um político! E pensava tudo em função da política. Acreditava sempre nas suas conclusões e era de um maravilhoso optimismo." Na opinião do ex-Presidente da República, Medeiros teve "uma ampla, complexa, activa e brilhante passagem por este mundo", onde "deixou escola" e uma vastíssima reflexão com "referências sempre substantivas".

 

"Personagem controversa, admirada e invejada"

Referindo-se aos últimos meses da sua vida, já marcada pela grave doença que o vitimaria, Sampaio elogiou a forma corajosa como a enfrentou, "sem lamúrias ou tristezas, e incutindo energia nos outros". Evocou o último encontro, um jantar/homenagem na Casa dos Açores em Lisboa, tendo como pretexto o seu último livro, "Não há Mapa Cor-de-Rosa. A história (mal)dita da integração europeia". E foi muito emocionado que recordou o convite de Medeiros Ferreira para se sentar na sua mesa.

Pediu depois desculpa por não conseguir ler o que Mário Mesquita escreve no livro que estava a apresentar. Diz o jornalista açoriano, que foi um dos maiores amigos de Medeiros Ferreira: "O consenso criado nos últimos anos da sua vida - nos media e nas redes sociais - ocultou a personagem controversa, admirada e invejada, que foi ao longo de décadas, e, sobretudo, do 25 de Abril para cá. O seu 'ego', nem sempre bem controlado, não lhe facilitava a vida, nem aos seus amigos, mas, sem ele, o que restaria da sua imagem na cena pública?" "O Zé Medeiros é inesquecível", foi como Sampaio concluiu a sua apresentação.

O livro tem a chancela da editora Tinta da China. Inês Hugon representou a editora na sessão e manifestou a sua satisfação por poder participar neste "processo de celebração de memórias". Vasco Cordeiro, presidente do Governo Regional dos Açores, revelou o seu orgulho por poder associar-se à produção do livro sobre "um grande açoriano que nunca deixou de ter orgulho em ser açoriano". E fazendo-se eco de outras intervenções durante a conferência, Cordeiro não hesitou em afirmar que Madeiros "foi desaproveitado pelo seu país".

A Conferência prossegue hoje, sexta-feira, no auditório 2 da Fundação Gulbenkian e a sessão de encerramento conta com a participação do Presidente Cavaco Silva.