‘Declaração Balfour’ é a primeira pedra da fundação de Israel: conheça a controversa carta britânica que exigia um Estado para os judeus na Palestina

“O Governo de Sua Majestade saúda o estabelecimento na Palestina de um lar nacional para o povo judeu e envidará os seus melhores esforços para facilitar a realização deste objetivo”: assim constava no primeiro documento, que data de 1917, no qual é referido a possibilidade da existência de Israel. A missiva data de 2 de novembro, um ano antes do final da I Guerra Mundial, e termina com uma declaração de intenções dos responsáveis britânicos: “Está claramente entendido que nada será feito que possa prejudicar os direitos civis e religiosos das comunidades não-judaicas existentes na Palestina, ou os direitos e o estatuto político dos judeus em qualquer outro país.”

De acordo com o jornal espanhol ‘ABC’, estava assim lançada a primeira pedra para um conflito que, desde a Primeira Intifada em 1988, provocou a morte de 13.400 pessoas (87% dos quais palestinianos), segundo dados do Centro de Informação Israelita para os Direitos Humanos nos Territórios Ocupados. A ‘Declaração Balfour’, com 130 palavras, é considerada o primeiro evento importante no processo histórico que conduziu à proclamação do Estado de Israel em 1948. Publicado pelo Governo britânico em 1917, mostra, pela primeira vez, o desejo de uma grande potência para criar um Estado para os judeus na Palestina, que então fazia parte do Império Otomano desde 1517, quando os turcos da Ásia Menor derrotaram os mamelucos.

O país foi dividido em vários distritos administrados por palestino arabizados, sendo que as comunidades cristã e judaica tinham ampla autonomia: a 11 de dezembro de 1917, com a I Guerra Mundial num dos seus momentos mais críticos, decorreu um dos eventos mais críticos para o futuro da Palestina: a Grã-Bretanha entra em Jerusalém e põe fim a quatro séculos de domínio otomano.

A ‘Declaração Balfour’ estava incluída numa carta assinada pelo secretário dos Negócios Estrangeiros britânico, Arthur James Balfour, ao barão Lionel Walter Rothschild, o mais alto líder da comunidade judaica na Grã-Bretanha, com um objetivo claro, mas que demorou 30 anos para ser concedido um pedaço de terra prometida.

Mais de um século depois, a interpretação desta carta é causa de confrontos no Médio Oriente: em Israel, é considerada a primeira pedra do Estado Hebreu, fundado após o fim da II Guerra Mundial. Para os palestinianos, cerca de 90% da população durante 100 anos, esta declaração marca o início de um declínio territorial imparável. Em 2017, por ocasião da celebração do centenário da missiva, os líderes palestinianos lideraram uma manifestação em Ramallah para exigir um pedido de desculpas do Reino Unido pela “injustiça histórica”.

Segundo esta corrente de opinião, ainda antes de assumir o controlo territorial da Palestina, em 1917, o Governo imperial de Londres precisava de garantir o controlo do Canal do Suez para manter a comunicação com as suas colónias na Ásia, tendo a ‘Declaração Balfour’ servido para procurar o apoio dos judeus. Não foi a única missiva: os britânicos cortejaram os egípcios, então colónia inglesa, e até mesmo os curdos, a quem foi prometido o seu próprio Estado se mostrassem apoio contra o Império Otomano.

A I Guerra Mundial e a previsível queda do Império Otomano foram apenas a oportunidade para os povos subjugados, neste caso os judeus, tornarem válidas as suas exigências de independência. E embora a ‘Declaração Balfour’ não tenha sido aplicada, em 1922 a Liga das Nações acabou por atribuir ao Reino Unido um mandato para administrar exclusivamente o território da Terra Santa. Até 1935, a população judaica na Palestina Britânica aumentou de menos de 10% para 27%.

A ‘Declaração Balfour’ teve pouco efeito em termos jurídicos: na verdade, a palavra “Estado” foi deliberadamente evitada no texto. “Era legalmente impotente, porque a Grã-Bretanha não tinha direitos soberanos sobre a Palestina ou autoridade para dispor do território”, garantiu o diplomata americano Sol Linowitz, na segunda metade do século XX. Foi preciso a Assembleia Geral da ONU, em 1947, acordar dividir a Palestina em dois Estados com um regime internacional especial para Jerusalém.

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