Campanha eleitoral: Ainda é possível roubar sem recurso à violência

EDITORIAL

Ainda podemos mudar e dar, aos desafios de hoje, uma resposta própria dos actores de hoje. Refazer as regras políticas que nos são impostas, fazer vista grossa às ordens sem rosto e ter cultura de escrutinar decisões políticas que nos empurram a jogos sangrentos, como aqueles de que estamos habituados a ver em todas as fases dos processos eleitorais.

 

Vem estas linhas a propósito da campanha eleitoral que iniciou esta terça-feira (26) e vai até 08 de Outubro. Serão, efetivamente, 13 dias em que os procedentes de violência política de que já estamos acostumados ganharão uma nova forma, depois de um ambiente violento que acompanhou a apresentação dos cabeças-de-listas e passeatas nas vésperas das eleições do início formal da campanha eleitoral.

 

Violência, manipulação do recenseamento, sabotagem das actividades da oposição, intimidações acompanhadas de ameaças de morte entre outros malefícios que mancham o cortejo eleitoral acompanham essa nossa democracia que se recusa a amadurecer, se refugia no argumento de que é jovem, como se isso isentasse os seus protagonistas políticos tão bem identificáveis. Perante a cumplicidade da polícia e a tolerância demostrada dos órgãos da justiça, o receio é este ambiente agudizar e ganhar outros contornos que saem de verbo a acção, conforme o retrato das últimas eleições.

 

Anastácio Matavele, chefe da observação da sociedade civil das eleições nacionais em Gaza, foi morto a tiro por um esquadrão de ataque da polícia, há sensivelmente quatro anos. Os actores eram jovens bem identificados que seguiam aparentemente instruções políticas; dois morreram num acidente de carro imediatamente e um foi autorizado a fugir. Matavele foi morto em plena luz do dia, em Xai-Xai, no dia 7 de Outubro de 2019.

 

Há mais nomes que foram vítimas da brutalidade policial em termos eleitorais e os actores são os mesmos, os órgãos eleitorais e a polícia, que deixam a razão encolher em favor da lógica política que em nada se mostra útil para construção colectiva como Estado.

 

Longe deles pensar que o recurso a meios de Estado e a violência é por si uma demonstração mais evidente de que não estão preparados para gestão de causa pública, optando por ofuscar o exercício democrático que em pé de igualdade, ajudaria a expor os melhores. Quando são os melhores que ganham, é a democracia que ganha. Não aquela democracia enraizada numa lógica económica. Mas aquela que expõe os melhores, num contexto de um mundo mais fragmentado que exige dos políticos estratégias mais diferenciadas de governação. Deixar que ascenda à governantes pessoas com incapacidade de governação comprovada é o mesmo que adiar esse sonho colectivo.

 

Os últimos cinco e dez anos foram capazes de mostrar que o nosso subdesenvolvimento é explicado pela governação, ou seja, está no homem que escolhemos. Uma resposta eficaz na escolha dos governantes pode muito bem constituir essa receita de que tanto precisamos na liberdade dessa herança de violência que transportamos para as urnas e perpetua os nossos contínuos erros administrativos.

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