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Lula e Bolsonaro prometem IR menor, mas governo perderia até R$ 217 bilhões

Valor da tabela do Imposto de Renda não é corrigido desde 2015 - Guilherme Dionízio/Estadão Conteúdo
Valor da tabela do Imposto de Renda não é corrigido desde 2015 Imagem: Guilherme Dionízio/Estadão Conteúdo

Do UOL, em São Paulo

23/10/2022 04h00

A correção no valor da tabela do Imposto de Renda é promessa dos dois candidatos à Presidência, Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e Jair Bolsonaro (PL). Com a correção, menos pessoas pagariam imposto. A tabela é a mesma desde 2015, última data em que as faixas salariais foram atualizadas.

Hoje só não paga imposto quem recebe salário de até R$ 1.903,98. Se a tabela fosse atualizada, só pagaria imposto quem tivesse salário acima de R$ 4.647,96. Isso representaria uma queda de R$ 184,34 bilhões na arrecadação do governo federal. Pelas propostas dos candidatos, a redução na arrecadação passa de R$ 200 bilhões.

De acordo com a Unafisco (Associação Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal do Brasil), a tabela está defasada e precisaria de uma correção de 144,12%, considerando a inflação acumulada de 1996 a setembro deste ano.

Apesar de terem sido feitas correções na tabela de 1996 até 2015, ano da última atualização, os cálculos da Unafisco mostram que as alterações foram insuficientes para corrigir a defasagem na tabela.

Veja as correções do IR propostas por Lula e Bolsonaro:

Lula: O petista promete dar isenção de IR para quem ganha até R$ 5.000. A ideia, apresentada no segundo turno, é que a correção faça com que a classe média pague menos imposto.

Nem o plano de governo nem as propagandas de Lula na TV e no rádio explicam como a perda de arrecadação seria compensada. À "Folha", o economista Guilherme Mello, que integra a comissão de redação do programa do candidato, disse que parte dessa desoneração seria financiada a partir da tributação dos mais ricos.

Bolsonaro: A proposta de Bolsonaro para a tabela do IR repete a promessa feita ainda em 2018, de aumentar a faixa de isenção para quem ganha até cinco salários mínimos (R$ 6.060).

Em agosto, à Rádio Guaíba, o presidente disse que a mudança já está "conversada" com o ministro Paulo Guedes, da Economia.

"Vai ter atualização da tabela do Imposto de Renda para o próximo ano [2023]. Está garantido já. Não sei o percentual ainda, mas vamos começar a recuperar isso daí [defasagem]", afirmou.

O plano de governo de Bolsonaro diz que "sem a pandemia e com o crescimento econômico, com responsabilidade fiscal, será possível perseguir o objetivo de isentar os trabalhadores que recebam até cinco salários mínimos durante a gestão 2023-2026".

Como a tabela do Imposto de Renda funciona? A tabela define qual percentual de imposto é descontado do salário do trabalhador de acordo com seu pagamento. Quem ganha até R$ 1.903,98 não tem desconto de IR. Quanto maior o salário, maior o desconto.

Qual o impacto das propostas dos candidatos? Um levantamento feito pela Unafisco mostra qual seria o impacto da correção da tabela nos moldes propostos pelas campanhas de Lula e Bolsonaro.

A tabela atual faz com que 8,02 milhões tenham isenção do Imposto de Renda. Com a proposta de Lula, 25,07 milhões de brasileiros não pagariam imposto. Com a proposta de Bolsonaro, 26,02 milhões de brasileiros seriam beneficiados. A Unafisco diz que no total há 34,6 milhões declarantes de Imposto de Renda.

Queda na arrecadação: A proposta de Lula traria uma queda de R$ 194,372 bilhões na arrecadação, enquanto a proposta de Bolsonaro produziria uma redução de R$ 217,385 bilhões.

Qual o problema da defasagem da tabela? Na prática, o brasileiro perde poder de comprar com a cobrança do Imposto de Renda.

O superintendente da Seteco Consultoria Contábil, Francisco Peroni, afirma que o valor da isenção é de R$ 1.903,98 desde 2015. Lá atrás, o salário mínimo era de R$ 788, enquanto hoje é de R$ 1.212.

Peroni diz que os brasileiros têm aumentos salariais pelos dissídios, mas que perdem valores, porque a tabela não é corrigida. Para ele, a correção deveria ser feita, nem que fosse apenas pela inflação.

A correção daria mais condições para as pessoas terem um salário melhor e mais qualidade de vida. Não ter a correção pune as pessoas. Quem ganhava dois salários mínimos em 2015 (R$ 1.576) não pagava Imposto de Renda. Hoje, ganhando os mesmos dois salários mínimos (R$ 2.424), elas pagam.
Francisco Peroni

Ministério não comenta: Procurado pelo UOL, o Ministério da Economia disse que a Receita Federal não vai se manifestar sobre a atual defasagem da tabela.

Propostas difíceis de concretizar: Os especialistas ouvidos pelo UOL dizem que é difícil aprovar mudanças na tabela do Imposto de Renda, porque a perda na arrecadação precisa ser compensada de alguma forma.

Peroni diz que seria excelente se houvesse uma correção da tabela do imposto de renda que isentasse a cobrança para quem ganha R$ 5.000 (proposta de Lula) ou R$ 6.060 (proposta de Bolsonaro). A dificuldade é que os dois não explicam como fariam para bancar a mudança.

Perda de arrecadação é o maior problema: Eduardo Natal, presidente do Comitê de Transação Tributária da Abat (Associação Brasileira da Advocacia Tributária), afirma que a perda de arrecadação é o maior problema.

Para aprovar a correção na tabela, o governo precisa propor novas formas de arrecadação. O texto que foi discutido em 2021 no Congresso falava sobre taxação de dividendos, cobrar Imposto de Renda de fundos imobiliários e aumentar alguns impostos do setor do agronegócio.

Peroni diz que o melhor caminho seria aprovar a correção na tabela com uma reforma tributária, para que a questão da arrecadação fosse resolvida.

A mudança na tabela do Imposto de Renda precisa ser aprovada no Congresso Nacional e se transformar numa lei ordinária para começar a valer. Natal diz que o grande impasse é que os parlamentares precisam propor uma forma de compensar os valores de Imposto de Renda que seriam perdidos com a correção na tabela.

O assunto fica travado no Congresso. A tabela não é aprovada, porque não passam as contrapartidas para compensar a perda de arrecadação.
Eduardo Natal

Assunto já esteve no Congresso: O tema não é novidade e já apareceu em campanhas em outras eleições. Em 2018, Bolsonaro prometeu isenção total para brasileiros que ganhassem até cinco salários mínimos —o que daria R$ 4.770 na época.

No ano seguinte, o discurso de Bolsonaro mudou. No fim de 2019, o presidente disse que o valor da promessa foi reduzido para R$ 3.000.

Com a pandemia e o rombo nas contas do governo em 2020, Bolsonaro jogou a bola para frente: "Vamos tentar, pelo menos em 2022, passar para R$ 3.000."